Estratégias != de Digitalizar
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Estratégias != de Digitalizar

Nestes últimos anos entre minhas próprias experiências e o que vi em conversas com pessoas de outras empresas, acabei percebendo 3 tipos de formas de abordar mudar/evoluir para um novo modelo e não vou tentar explorá-las ao máximo, mas antes de comentar alguns pontos com o intuito de ajudar numa reflexão.

Neste artigo vou falar de 3 tipos de estratégias:

  1. Criar uma Estrutura Nova desconectada da atual
  2. Criar uma Estrutura Nova conectada com a atual
  3. Criar um Núcleo Novo para em seguida "Atualizar" a Estrutura atual

1 - Criando uma Estrutura Nova: TI Bimodal

aranhaverso

Vivi de perto uma experiência em uma empresa que foi bimodal antes deste termo ter sido estabelecido, lá um modelo novo foi estruturado e evoluído de forma independente. Olhando depois, a referência que faço é com células tronco, onde pessoas que eram da TI tradicional, começaram a trabalhar de forma independente, num pequeno núcleo que criou soluções inovadoras. Podemos dizer que os dois "universos" (TI Tradicional 1.0 e TI +Digital 2.0) estavam evoluindo em paralelo e puderam depois convergir de uma forma benéfica para as duas.

Longe de preconceitos (se pode ou não usar open source?, pode ou não usar cloud?, pode ou não usar PaaS?, precisamos validar com pessoas de fora se estamos no caminho certo?..) este núcleo criou soluções inovadoras que em muito contribuíram com o negócio e deste sucesso inicial, virou referência para a empresa, eles cresceram mantendo a cultura inicial da melhor forma que puderam e depois foram "irradiando" este modelo de sucesso para o restante da tecnologia, virando o modelo padrão.

lue skywalker antes de ser um jedi

O curioso foi que neste caso, eles foram referência para fornecedores e o mercado em geral, já que estavam fazendo algo que não existia literatura ainda para explicar, era um como velejar num mar ainda sem bons mapas... Claro, não foi só uma estratégia nascida em um powerpoint, a cultura desta empresa também era aberta e mais focada em ação, em servir, cultivando inovação, pioneirismo e ousadia. Havia um grande incentivo para pessoas no agir, em fazer, e isso, na minha opinião, foi fundamental para o nascimento desta nova forma e de deixar que ela se propagasse. Era de certa forma como conhecer o Luke Skywalker se tornando um Jedi.

Posso dizer que aqui as pessoas eram muito estimuladas a fazer, a tentar e aprender. Isso já fazia parte da cultura e não precisava exatamente de novos modelos mentais para que as pessoas colaborassem entre diferentes áreas para colocar suas ideias em prática, ou seja, abraçar o novo não era algo que poderia "rachar" um modelo estabelecido, abraçar o novo já fazia parte da cultura e dos valores da companhia.

Aqui o modelo cresceu organicamente, vou fazer um comentário que julgo muito importante antes de seguirmos para os outros 2: quando olhamos outras empresas temos que tomar cuidado, porque não temos muito contexto, e neste caso existia uma cultura organizacional que permitia este tipo de mudança.

Nem todos os terrenos são férteis, e nem em todos conseguimos plantar qualquer coisa, por isso é preciso tentar obter o máximo de informação para podermos contextualizar e buscar o que de tudo o que vimos e ouvimos podemos usar no nosso caso.

Às vezes olhamos um jardim bonito e pensamos que é simples replicar, mas para um jardim bonito, precisamos de um bom jardineiro, mas também de luz, água, sombra, um terreno fértil, adequar o que vamos plantar ao terreno... e teremos o nosso jardim bonito, e não necessariamente um jardim que vimos em outro lugar na nossa casa.


2 - Criando uma Estrutura Nova Conectada à Atual

Neste caso, o modelo foi iniciar a adoção de um modelo digital dentro do que algumas empresas chamavam de "Área de Desenvolvimento".

Foram criadas células iniciais no formato de produto, com metodologia ágil que logo foram escaladas para vários squads, com a criação de centros de excelência (CoE - Center of Excellence) para práticas ágeis e para Tecnologia.

Matrix Agente Smith Clone

Teve apoio de uma consultoria que tinha um modelo bem definido, baseado em suas próprias práticas, foi um processo de replicar um modelo já conhecido, testado e de sucesso. Um ponto que foi bem interessante, e que vale destacar em relação ao próximo caso, é que existiu uma fase prévia de passar um entendimento para o corpo executivo, foram realizados workshops com casos de sucesso e depoimentos de empresas mais avançadas na sua jornada de transformação, e foi possível ver que os executivos se empenharam em estudar, se preparar, entendendo com um bom nível de profundidade do que envolve uma jornada digital, eles compreendiam bem o modelo digital e realmente se engajaram em tentar ajudar a fazer as mudanças darem certo.

O buy-in é algo muito importante como pude observar no caso 3, o corpo executivo entender os princípios, prós e contras e estarem dispostos a embarcar e defender um modelo diferente do pragmático comando e controle.

Por mais antiquado que possa parecer falar de comando e controle, num mundo onde o ágil/devops/cloud são o "novo normal" e onde falar de organizações "tradicionais" é como falar de um carro antigo (câmbio manual e somente a gasolina), é difícil compartilhar responsabilidades, decisões e não falar em datas, mas antes em entregáveis de valor que serão priorizados... Do ponto de vista executivo a previsibilidade de certos itens são vitais para execução de uma estratégia com múltiplas ações, e nem sempre é possível compartilhar o big picture do board com as equipes que estão concretizando a representação digital do negócio.

É difícil para os executivos que aprovaram alguns milhões para criar squads/tribes, não se verem como "donos" dos recursos/times de produto, ou de no momento em que as coisas não parecem estar saindo do jeito que pensaram, eles não voltarem para o conhecido comando/controle e práticas a tanto anos utilizadas para termos mais previsibilidade na execução e entrega.

Não devemos esquecer que em muitos casos, as empresas não estão desbravando novos negócios com inovação, elas estão tentando digitalizar ao máximo o seu negócio para expandir as possibilidades de chegar/encantar seus clientes e daí buscar novas formas de negócio.

retrofuturismo

Houve momentos sinuosos, e o flerte com o antigo com uma roupagem nova era algo que estava à espreita, como um retrofuturismo, onde imaginamos o futuro com os paradigmas atuais. Então o ágil pode sofrer uma mistura do pragmatismo, mas nada comparado ao que pode acontecer no caso 3.


3 - Criar um Núcleo Novo para "Atualizar" a Estrutura atual

big bang - inflation

Aqui foi como o Alan Guth explicou como o Big Bang fica consistente com o universo que vemos atualmente, teve um processo de "Inflação", logo que o processo de Transformação Digital foi iniciado, ele foi rapidamente expandido por toda a cadeia de valor.

Acelerar mudanças, pode ser como tentar jogar Tetris em alta velocidade logo no início do jogo, onde os seus reflexos não estão adaptados ainda. Se um grupo de pessoas se levanta e começa a correr, é claro que não vão correr na mesma velocidade, e essa assimetria pode fazer você parar para reagrupar, e talvez pensar que antes de começar a correr estava melhor, mas o problema não estava no "o que" e sim, no "como".

Faz parte do jogo, tentar acelerar, correr riscos e ir adiante, mas quando falamos de pessoas, você precisa de líderes inspiradores, capazes de engajar em uma mudança, mas mantendo uma coesão. E isso pode ser muito diferente de pessoas preparadas, a gente não muda o mundo por decreto... precisamos de pessoas que tenham habilidades de comunicar ideias em diferentes formas, mas que também tenha um pano de fundo que propicie o engajamento.

Este modelo, na minha opinião pode ser o mais problemático de todos, você pode acabar não tendo núcleos funcionais que possam ser consistentemente usados como modelos para o restante da empresa, isso somado à falta de entendimento de como sustentar um novo modelo fica expostos a toda sorte de intempéries e em idas e vindas que podem gerar desconfiança no modelo.

Mas afinal o que pode dar Errado?

Tem vários itens que podem ser subestimados na pressa de digitalizar sua empresa e dificultar muito:

  1. Liderança: como conter a "radiação" do: sempre foi assim, isso aí não funciona/já tentaram isso antes e não funcionou, não é disso que a empresa precisa. Muitas lideranças que não tiveram experiência prévia com este tipo de práticas podem inadvertidamente "jogar contra". Nas organizações mais típicas, a estabilidade estava em manter o alinhamento com a parte de cima, e em modelos orientados a produto/inovação, é importante que a parte de cima busque mais estar alinhada para que parte tática suporte mais o operacional;
  2. Buy-in Executivo: diziam que Cuba queria os capitalistas e não o capitalismo, devemos avaliar se queremos Agilidade sem Agilistas ou Agilistas sem Agilidade. Se já temos uma visão clara do que precisamos fazer e precisamos de pessoas que façam (limitando o ownership/liberdade) ou se gostaríamos de usar a visão das pessoas para construir algo melhor/inovador. No primeiro existe um senso maior de que a equipe é minha para concretizar a estratégia, e no segundo um senso de que também faço parte da equipe e preciso escutar e ser disponível para que caminhe bem e tenha uma boa comunicação;
  3. Trazendo Experiências Novas: pessoas novas na companhia convivendo com as pessoas mais antigas e não conseguindo irrigar de forma positiva com formas diferentes de agir e fazer, possivelmente não se beneficiando do time-to-market e gerando problemas no que apesar de não ser tão rápido, funcionava - não consegue cultivar o bom do novo, não preserva o que já existe de bom e acaba com uma mutação não desejada;
  4. Engajamento: o choque de cultura e expectativas que podem gerar perdas de profissionais em grandes quantidades. Quem chega esta alinhada com uma visão que é mais aspiracional/idealizada do que real, e quem já esta pode se sentir desconectada com a empresa;
  5. "Copy/Paste" de Práticas Ágeis: não conseguir implantar bem o modelo mental do Ágil e/ou ver a Agilidade demasiadamente afastada das ideias do Manifesto Ágil. muitos já devem ter visto práticas ágeis disfarçadas ou desfiguradas com comando/controle, é claro que precisamos ter gorvernança, mas se pesarmos a mão, vamos acabar só trocando os nomes das pessoas (Agilista => Gerente de Projeto, PO => Analista de Negócio, Release/Sprint => Cronograma com datas fixas e reportadas em fóruns que o time não participa, com justificativas formais);

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O mundo é uma senóide e acabamos vendo itens do passado reencarnados numa versão aprimorada, mas é importante ver se colisão dos modelos pode ser de tal forma que a o retorno a várias práticas antigas pode ser bem difícil de conter e desfigurar grande parte do que se pretendia, avalie bem em como comunicar as mudanças para as pessoas em como será feito o recrutamento.


Core Business: Eficiência em Escala + (ou versus ?) Produtos de Inovação

Um aspecto importante é o tipo de core business. Muitas empresas tem um modelo já estabelecido e eficiente de ter economia em escala, onde o importante é termos custos baixos de forma consistente para termos uma margem sadia.

A versão "produtificada" do negócio implica em você ter equipes de tecnologia desenvolvendo a versão digital da sua empresa, onde você esta mais exposto a aspectos intangíveis. De certa forma, é como se investisse em campanhas de marketing digitais, aqui o seu ativo principal não é somente a sua forma de realizar o seu negócio, mas ter pessoas que consigam digitalizar o que te diferencia e criar modelos novos a partir daí.

Se você tratar as pessoas que estão digitalizando o seu negócio com o mesmo modelo mental de como obtêm economia em escala, pode ter um menor retorno no uso de modelos de trabalho com Agilidade e técnicas mais novas de gestão que exploram bastante a colaboração, ownership, sentimento de dono, testes de novas ideias (fail fast, learn faster)... Ter um ambiente colaborativo pode ajudar muito em ideias novas que podem ser vitais em possibilitar a dar passos importantes e mais rápido.

Seguindo Modelos

No caso 2 e 3, são casos onde houve a oportunidade de seguir frameworks de como fazer, não estou dizendo aqui que foram grandes fracassos, mas sim a distância em criar algo sustentável como foi no caso 1.

E nestes duas formas, me intrigou inicialmente o fato de ter um manual não garante o sucesso e se você não tiver, de verdade, vontade de mudar e conseguir passar isso para o máximo de pessoas na empresa. Você tem que querer mudar e não só acompanhar o mercado, ou ainda, e talvez pior, se preocupar mais em parecer que tem um modelo operacional mais atual. Depois foi ficando mais claro que a diferença estava fortemente associada com a cultura/liderança (o por quê da mudança e onde vamos chegar) que pode ser muito mais decisivo que o "como/o que".

De certa forma, as empresas são como as pessoas, é difícil mudarmos quando estamos durante anos fazendo as coisas do mesmo jeito, mudar de hábito não é um processo fácil, e pode nem ser possível, independente do impacto que eles gerem em nós. E mudar artificialmente e/ou bruscamente, pode ser um convite a recaídas no comportamento indesejado. Temos que ter convicção na mudança que estamos fazendo.

Vejo que as empresas passam pelos mesmos dilemas e desafios, algumas vão conseguir mudar o suficiente para estarem conectadas com o momento atual e outras não, podendo serem substituídas em algum momento por novos entrantes com um peso muito menor do legado organizacional.

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E se não houver um bom clima e pessoas que consigam usar bem as metologias mais modernas, vai ser difícil deixar modelo comando-e-controle de lado para ter resultados.

Douglas Braga

A.I Advisor | CIO | CDO | CAIO | Diretor | Inovação em Inteligência Artificial e Lean/Agile🚀

3 a

Sempre muito certeiro Ari Oliveira Neto

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