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CAPÍTULO 7
     "Os grandes acontecimentos do mundo têm lugar no cérebro."
     (Oscar Wilde)


     Às dez e meia da manhã da segunda-feira seguinte estavam a entrar no avião para
o voo 501 da British Airways. Os estados de espírito de Paulo e de Rodolfo eram,
naturalmente, bem diferentes, apesar de irem sentados mesmo lado a lado.
     Paulo, apesar do apelo do sangue, não tinha muita fé nos resultados daquela
viagem. Acreditava ser possível tirar o irmão da prisão, mas fazer com que ele deixasse
de lhes dar problemas é que não era muito provável. Além disso, a falta de contacto
regular com o irmão, nos últimos anos, apagara quase por completo a ligação entre eles.
     Rodolfo, por seu lado, não podia estar mais satisfeito. Aquela viagem vinha
mesmo a calhar, depois do impacte provocado pelo Aleascript.
     Além disso, a Austrália era um dos países que tinha intenção de visitar,
principalmente desde a excelente publicidade feita aquando dos Jogos Olímpicos de
2000, precisamente em Sydney e noutras quatro cidades australianas: Camberra,
Adelaide, Melbourne e Brisbane.
     Apenas o facto de lhes terem chamado os Jogos do Novo Milénio lhe causava
alguma irritação.
     Amante dos números, não podia conceber que alguém não compreendesse que
2000 era, precisamente, o último ano do século XX, do 2º milénio. Os verdadeiros
Jogos Olímpicos de Verão do novo milénio terão sido os de Atenas, num regresso às
origens.
     — Então, Paulo, conseguiste saber o sítio onde o teu irmão está detido?
     — Não, Rodolfo. Mas não há problema, a polícia vai estar à nossa espera. Vai ser
uma estreia…
     — Ena, tratamento VIP: Visitar o Irmão do Paulo!
     — Isso, bem visto. Vamos ter direito a escolta. Sempre poupamos em transportes!
     — Pois, transportes. Essa palavra vai-nos acompanhar nas próximas muuuuitas
horas! Para já vão ser três, como aperitivo.
     — Desculpa, mas vamos voar numa companhia inglesa. Se se respeitar a
pontualidade britânica, serão apenas duas horas e quarenta — rectificou Paulo.
     — Pois, tens razão. Vinte minutos fazem uma diferença danada em vinte e quatro
horas e quarenta e cinco minutos — ironizou Rodolfo.
— Já viste? Ao todo vamos estar mais de um dia fechados dentro de aviões.
     — Fora as oito horas e tal de espera em Londres — lembrou Rodolfo.
     — O que vai custar mais são as vinte e duas horas de Londres para Sydney. O
máximo tempo seguido que andei de avião foram dez horas e pouco, quando fui a
Moçambique. É quase como se fossemos até Maputo e voltássemos, sem parar! —
desabafou Paulo, subitamente consciente da enormidade daquela jornada que se
avizinhava.
     — Desculpa, mas como sou um fast learner, tenho de rectificar. Não serão vinte e
duas horas mas sim vinte e duas horas e cinco minutos. Got it?


     Heathrow, Londres. 13h e 35m e as rodas a tocarem solo inglês.
     — Eu não disse? Malditos ingleses. Fazem de propósito para chegar a horas só
para gozar com os portugueses — comentou, espirituoso, Rodolfo.


     Estava tudo a correr bem. Como as malas tinham sido despachadas directamente
para Sydney, em pouco mais de trinta minutos estavam a apanhar o metro na estação do
Terminal 3. Descontando o tempo necessário para o embarque seguinte, teriam quase
sete horas para circular por Londres.
     Rodolfo conhecia relativamente bem a cidade, do seu tempo de jornalista. Paulo
nunca lá tinha estado.
     — Bem-vindo ao tube. Itube, Youtube, toda a gente tube. Mas atenção, mind the
gap. By the way, já reparaste como estes bifes se julgam superiores a toda a gente?
     — Então?
     — Então? Fácil. Duvidam que a gente repare no espaço que vai da porta do metro
ao cais de embarque. Conduzir pela direita? Qual quê? Vamos ser diferentes e circular
pela esquerda. Lá acham que a gente não vai olhar para a direita (sim, direita) quando
atravessa a rua e vai de pintar grandes letreiros nas estradas. Graus celcius? Ná, o
pessoal curte é Fahrenheit. Quilómetros? Milhas, meus caros, milhas! Qual euro, qual
carapuça, viva a bela da libra. Quilos? Credo, o que está a dar são libras.
     — Tens razão. Essa coisa de se pesarem em dinheiro é mesmo esquisita. Uma
espécie de tiopatinhasice.
     — LOL. Libras, Ó Libras!
Numa hora chegaram à estação de Piccadilly Circus, seguindo a linha azul escura,
Piccadilly. Com outra hora para o regresso, dispunham de cinco horas para passear.
      — Proponho uma caneca num pub. Alinhas? — perguntou Paulo, animado.
      — Pois claro. Olha, vamos já a este. On Anon é um nome meio esquisito mas
parece ter bom aspecto.


      Em vez de uma, beberam duas canecas cada um. Saíram ainda mais animados do
que haviam entrado e puseram-se a caminhar.
      Paulo gostava de ver o Palácio de Buckingham e, se possível, o render da guarda.
      Rodolfo queria visitar a London Library, a qual ficava a apenas alguns minutos a
pé, na St. James Square. Por coincidência, mesmo na direcção do Palácio.
      Combinado.
      Depois da visita à famosa biblioteca, passaram pelo Green Park¸ uma enorme área
verde como tantas outras em Londres, e chegaram, finalmente, ao Palácio de
Buckingham, residência oficial da rainha Isabel II. Para infelicidade de Paulo, o render
da guarda ocorre em dias alternados fora do verão mas por volta das onze da manhã.
      — Desculpa, Paulo, não me lembrei que a cerimónia já teria passado. Já lá vão uns
anitos desde a minha última visita e o Aleascript, apesar de tudo, ocupa muito espaço do
meu disco duro.
      — Paciência, Rodolfo, não faz mal. Já estou habituado a falhar coisas do género.
O ano passado, em Roma, quando me estava a dirigir para o Vaticano, comecei a ver
muita gente a caminhar na minha direcção, em sentido contrário ao meu. Claro, não
podia ser eu o único a estar certo e a cerimónia papal tinha terminado há instantes. No
problem!
      Perdida a possibilidade de assistir a esta tradicional cerimónia da Royal Guard,
iniciada em 1660 e realizada, nos dias de hoje, da mesma maneira que se iniciou,
optaram por dar um saltinho ao famoso Hyde Park, mais um dos prados verdejantes da
capital inglesa.
      Paulo ficou encantado com a extensão de relva e, sobretudo, com um animal que
nunca vira ao vivo. Neste final de Outono, os esquilos andavam bastante atarefados,
amealhando o que podiam para enfrentar o inverno que se avizinhava. Conseguiram ver
bastantes e, inclusive, dar-lhes pedaços de pão.
      — Bem, estes bichos são mesmo engraçados. Se bem que, pelo tamanho, se
devessem chamar esgramas!
— E comem praticamente de tudo. Assim uma espécie de cabras dos parques
londrinos — completou Rodolfo, lembrando-se do destino de um suculento hambúrguer
que pretendera comer, há uns anos, neste mesmo parque.
     — Entretanto, o melhor é regressarmos, ou ainda temos de ir a nado até à
Austrália! Let’s go!


     Chegaram a tempo. Ainda não estava ninguém na gate para o voo BA 15.
     — Paulo, estou preocupado com duas coisas.
     — Diz lá, Rodolfo.
     — Já reparaste que vamos voar num Triple Seven?
     — Num quê?
     — Num Boeing 777.
     — Não, não tinha reparado. Qual é o problema?
     — Espero bem que não comece a largar peças como o das Linhas Aéreas de
Angola, há uns tempos, sobre Almada e Cacilhas!
     — Eh, pá, não sabia que íamos num avião desses. Cruzes, canhoto! E a segunda
coisa que te preocupa, qual é?
     — Sabes qual é a autonomia dum 777, em quilómetros?
     — Não faço ideia. Dez mil?
     — Dezassete mil.
     — Como é que sabes isso, pá?
     — Não te esqueças que fui jornalista e agora escritor. Investigar é um hábito! Esta
semana deu para pesquisar umas coisas…
     — E?
     — Sabes qual a distância entre Londres e Sydney?
     — Tendo em conta que o voo é directo, presumo que seja inferior aos dezassete
mil quilómetros que referiste, não?
     — Não. Experimentei uma página da net1 onde se pode calcular a distância entre
quaisquer duas cidades do mundo e descobri que Londres e Sydney distam,
precisamente, dezassete mil e dois quilómetros!
     — Significa que teremos de ir dois quilómetros a planar, não? — zombou Paulo,
divertido com aqueles dados que Rodolfo apresentava.


     1
         (http://www.horlogeparlante.com/pt/distance.php)
— Ná. Cá para mim têm um jerrycan de combustível guardado na cozinha. A
meio da viagem, fazem um sorteio entre os passageiros para ver quem vai lá fora com o
jerrycan e um funil — brincou Rodolfo, visivelmente bem-disposto.
     — LOL. Leva Oitenta Litros.


     A viagem decorreu sem incidentes, embora Paulo e Rodolfo quase desesperassem
por as horas passarem tão devagar.
     Ainda assim, os filmes, as refeições e a leitura de jornais amenizaram um pouco o
tédio por passar tanto tempo a bordo.
     Umas caminhadas corredor afora serviram para desentorpecer as pernas e para
prevenir as indesejáveis tromboses venosas.
     Eram 6h30m locais, menos onze horas em Londres e em Lisboa, quando aterraram
no aeroporto Kingsford Smith, em Sydney.
     Finalmente…

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Capítulo 7 aleascript

  • 1. CAPÍTULO 7 "Os grandes acontecimentos do mundo têm lugar no cérebro." (Oscar Wilde) Às dez e meia da manhã da segunda-feira seguinte estavam a entrar no avião para o voo 501 da British Airways. Os estados de espírito de Paulo e de Rodolfo eram, naturalmente, bem diferentes, apesar de irem sentados mesmo lado a lado. Paulo, apesar do apelo do sangue, não tinha muita fé nos resultados daquela viagem. Acreditava ser possível tirar o irmão da prisão, mas fazer com que ele deixasse de lhes dar problemas é que não era muito provável. Além disso, a falta de contacto regular com o irmão, nos últimos anos, apagara quase por completo a ligação entre eles. Rodolfo, por seu lado, não podia estar mais satisfeito. Aquela viagem vinha mesmo a calhar, depois do impacte provocado pelo Aleascript. Além disso, a Austrália era um dos países que tinha intenção de visitar, principalmente desde a excelente publicidade feita aquando dos Jogos Olímpicos de 2000, precisamente em Sydney e noutras quatro cidades australianas: Camberra, Adelaide, Melbourne e Brisbane. Apenas o facto de lhes terem chamado os Jogos do Novo Milénio lhe causava alguma irritação. Amante dos números, não podia conceber que alguém não compreendesse que 2000 era, precisamente, o último ano do século XX, do 2º milénio. Os verdadeiros Jogos Olímpicos de Verão do novo milénio terão sido os de Atenas, num regresso às origens. — Então, Paulo, conseguiste saber o sítio onde o teu irmão está detido? — Não, Rodolfo. Mas não há problema, a polícia vai estar à nossa espera. Vai ser uma estreia… — Ena, tratamento VIP: Visitar o Irmão do Paulo! — Isso, bem visto. Vamos ter direito a escolta. Sempre poupamos em transportes! — Pois, transportes. Essa palavra vai-nos acompanhar nas próximas muuuuitas horas! Para já vão ser três, como aperitivo. — Desculpa, mas vamos voar numa companhia inglesa. Se se respeitar a pontualidade britânica, serão apenas duas horas e quarenta — rectificou Paulo. — Pois, tens razão. Vinte minutos fazem uma diferença danada em vinte e quatro horas e quarenta e cinco minutos — ironizou Rodolfo.
  • 2. — Já viste? Ao todo vamos estar mais de um dia fechados dentro de aviões. — Fora as oito horas e tal de espera em Londres — lembrou Rodolfo. — O que vai custar mais são as vinte e duas horas de Londres para Sydney. O máximo tempo seguido que andei de avião foram dez horas e pouco, quando fui a Moçambique. É quase como se fossemos até Maputo e voltássemos, sem parar! — desabafou Paulo, subitamente consciente da enormidade daquela jornada que se avizinhava. — Desculpa, mas como sou um fast learner, tenho de rectificar. Não serão vinte e duas horas mas sim vinte e duas horas e cinco minutos. Got it? Heathrow, Londres. 13h e 35m e as rodas a tocarem solo inglês. — Eu não disse? Malditos ingleses. Fazem de propósito para chegar a horas só para gozar com os portugueses — comentou, espirituoso, Rodolfo. Estava tudo a correr bem. Como as malas tinham sido despachadas directamente para Sydney, em pouco mais de trinta minutos estavam a apanhar o metro na estação do Terminal 3. Descontando o tempo necessário para o embarque seguinte, teriam quase sete horas para circular por Londres. Rodolfo conhecia relativamente bem a cidade, do seu tempo de jornalista. Paulo nunca lá tinha estado. — Bem-vindo ao tube. Itube, Youtube, toda a gente tube. Mas atenção, mind the gap. By the way, já reparaste como estes bifes se julgam superiores a toda a gente? — Então? — Então? Fácil. Duvidam que a gente repare no espaço que vai da porta do metro ao cais de embarque. Conduzir pela direita? Qual quê? Vamos ser diferentes e circular pela esquerda. Lá acham que a gente não vai olhar para a direita (sim, direita) quando atravessa a rua e vai de pintar grandes letreiros nas estradas. Graus celcius? Ná, o pessoal curte é Fahrenheit. Quilómetros? Milhas, meus caros, milhas! Qual euro, qual carapuça, viva a bela da libra. Quilos? Credo, o que está a dar são libras. — Tens razão. Essa coisa de se pesarem em dinheiro é mesmo esquisita. Uma espécie de tiopatinhasice. — LOL. Libras, Ó Libras!
  • 3. Numa hora chegaram à estação de Piccadilly Circus, seguindo a linha azul escura, Piccadilly. Com outra hora para o regresso, dispunham de cinco horas para passear. — Proponho uma caneca num pub. Alinhas? — perguntou Paulo, animado. — Pois claro. Olha, vamos já a este. On Anon é um nome meio esquisito mas parece ter bom aspecto. Em vez de uma, beberam duas canecas cada um. Saíram ainda mais animados do que haviam entrado e puseram-se a caminhar. Paulo gostava de ver o Palácio de Buckingham e, se possível, o render da guarda. Rodolfo queria visitar a London Library, a qual ficava a apenas alguns minutos a pé, na St. James Square. Por coincidência, mesmo na direcção do Palácio. Combinado. Depois da visita à famosa biblioteca, passaram pelo Green Park¸ uma enorme área verde como tantas outras em Londres, e chegaram, finalmente, ao Palácio de Buckingham, residência oficial da rainha Isabel II. Para infelicidade de Paulo, o render da guarda ocorre em dias alternados fora do verão mas por volta das onze da manhã. — Desculpa, Paulo, não me lembrei que a cerimónia já teria passado. Já lá vão uns anitos desde a minha última visita e o Aleascript, apesar de tudo, ocupa muito espaço do meu disco duro. — Paciência, Rodolfo, não faz mal. Já estou habituado a falhar coisas do género. O ano passado, em Roma, quando me estava a dirigir para o Vaticano, comecei a ver muita gente a caminhar na minha direcção, em sentido contrário ao meu. Claro, não podia ser eu o único a estar certo e a cerimónia papal tinha terminado há instantes. No problem! Perdida a possibilidade de assistir a esta tradicional cerimónia da Royal Guard, iniciada em 1660 e realizada, nos dias de hoje, da mesma maneira que se iniciou, optaram por dar um saltinho ao famoso Hyde Park, mais um dos prados verdejantes da capital inglesa. Paulo ficou encantado com a extensão de relva e, sobretudo, com um animal que nunca vira ao vivo. Neste final de Outono, os esquilos andavam bastante atarefados, amealhando o que podiam para enfrentar o inverno que se avizinhava. Conseguiram ver bastantes e, inclusive, dar-lhes pedaços de pão. — Bem, estes bichos são mesmo engraçados. Se bem que, pelo tamanho, se devessem chamar esgramas!
  • 4. — E comem praticamente de tudo. Assim uma espécie de cabras dos parques londrinos — completou Rodolfo, lembrando-se do destino de um suculento hambúrguer que pretendera comer, há uns anos, neste mesmo parque. — Entretanto, o melhor é regressarmos, ou ainda temos de ir a nado até à Austrália! Let’s go! Chegaram a tempo. Ainda não estava ninguém na gate para o voo BA 15. — Paulo, estou preocupado com duas coisas. — Diz lá, Rodolfo. — Já reparaste que vamos voar num Triple Seven? — Num quê? — Num Boeing 777. — Não, não tinha reparado. Qual é o problema? — Espero bem que não comece a largar peças como o das Linhas Aéreas de Angola, há uns tempos, sobre Almada e Cacilhas! — Eh, pá, não sabia que íamos num avião desses. Cruzes, canhoto! E a segunda coisa que te preocupa, qual é? — Sabes qual é a autonomia dum 777, em quilómetros? — Não faço ideia. Dez mil? — Dezassete mil. — Como é que sabes isso, pá? — Não te esqueças que fui jornalista e agora escritor. Investigar é um hábito! Esta semana deu para pesquisar umas coisas… — E? — Sabes qual a distância entre Londres e Sydney? — Tendo em conta que o voo é directo, presumo que seja inferior aos dezassete mil quilómetros que referiste, não? — Não. Experimentei uma página da net1 onde se pode calcular a distância entre quaisquer duas cidades do mundo e descobri que Londres e Sydney distam, precisamente, dezassete mil e dois quilómetros! — Significa que teremos de ir dois quilómetros a planar, não? — zombou Paulo, divertido com aqueles dados que Rodolfo apresentava. 1 (http://www.horlogeparlante.com/pt/distance.php)
  • 5. — Ná. Cá para mim têm um jerrycan de combustível guardado na cozinha. A meio da viagem, fazem um sorteio entre os passageiros para ver quem vai lá fora com o jerrycan e um funil — brincou Rodolfo, visivelmente bem-disposto. — LOL. Leva Oitenta Litros. A viagem decorreu sem incidentes, embora Paulo e Rodolfo quase desesperassem por as horas passarem tão devagar. Ainda assim, os filmes, as refeições e a leitura de jornais amenizaram um pouco o tédio por passar tanto tempo a bordo. Umas caminhadas corredor afora serviram para desentorpecer as pernas e para prevenir as indesejáveis tromboses venosas. Eram 6h30m locais, menos onze horas em Londres e em Lisboa, quando aterraram no aeroporto Kingsford Smith, em Sydney. Finalmente…