Livro Eletrônico
Aula 00
Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas -
Pós-Edital
Professores: Alexandre Vastella, Filipe Martins
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Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella
Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos
Aula 01 – Principais paradigmas teóricos
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Política Internacional
Aula 00 – Visão da Prova e do Curso: conceitos básicos, atores, processos e instituições.
Aula 01 – Principais paradigmas teóricos: Realismo, Liberalismo, Construtivismo e outros.
Introdução ao curso de Política Internacional – CACD 2019 ...............................................2
Visão geral do curso.......................................................................................................................................2
Visão geral da prova e cronograma de aulas ................................................................................................3
Conceitos básicos – atores, processos e instituições ..........................................................6
Relações internacionais e política internacional............................................................................................6
Tratados de Vestfália (1648)..........................................................................................................................8
Sistema Internacional.....................................................................................................................................9
Atores internacionais ...................................................................................................................................10
Princípios da territorialidade, da soberania e da autonomia. .....................................................................10
Níveis de análise: sistêmico, supra-estatal, estatal e societal/individual....................................................11
Sistema internacional e ordem internacional ..............................................................................................12
Anarquia do sistema internacional ..............................................................................................................13
Atores estatais – Estado nacional................................................................................................................15
Atores não estatais – Organizações internacionais.....................................................................................16
Instituição e organização .............................................................................................................................17
Balança de poder..........................................................................................................................................18
Interdependência complexa.........................................................................................................................20
Conceitos básicos de relações internacionais................................................................... 21
Teoria das relações internacionais...............................................................................................................21
Cinco regras básicas do relacionamento entre Estados...............................................................................22
Objetivos das teorias de relações internacionais.........................................................................................23
Objetos de estudo e principais divergências entre teorias ..........................................................................25
A tradição realista............................................................................................................ 26
Antecedentes e panorama geral do Realismo .............................................................................................26
A sistematização do Realismo – Carr e Morgenthau...................................................................................29
Seis princípios do Realismo Político..............................................................................................................30
Correntes do realismo: realismo clássico, realismo científico e realismo estrutural (neorrealismo). .........34
A tradição liberal ............................................................................................................. 37
Antecedentes da tradição liberal .................................................................................................................37
Conceitos centrais da tradição liberal..........................................................................................................39
Principais pressupostos da tradição liberal..................................................................................................42
Neoliberalismo .............................................................................................................................................44
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Introdução ao curso de Política Internacional – CACD 2019
Visão geral do curso
É com grande satisfação que lançamos o curso de Política Internacional para o Concurso de
Admissão à Carreira de Diplomata de 2019.
O curso será coordenado pelo Prof. Filipe Martins, que é bacharel em Relações Internacionais pela
UnB com certificação profissional em forecasting e análise de risco; sendo um analista político bastante
conhecido no mercado, possuindo experiência no Tribunal Superior Eleitoral, na Embaixada dos Estados
Unidos da América e em consultorias privadas. Martins será o responsável pelo conteúdo do curso, pela
organização das aulas, pela didática desenvolvida, pela gravação dos vídeos e pelo fórum de dúvidas; ou
seja, por praticamente todo o pacote de aulas.
As aulas em PDF serão escritas por mim, Prof. Alexandre Vastella. Para quem não me conhece, sou
professor de Geografia há três anos aqui no Estratégia Concursos. Embora tenha meu curso próprio de
Geografia para o CACD; para Política Internacional, vou utilizar como base o conteúdo, a didática, a
organização de tópicos e a estrutura deixada pelo Prof. Filipe Martins. Ou seja, será ele o responsável.
Este é um curso voltado para o CACD – prova bastante difícil, exigente, e com uma amplitude de
temas muito grande. Por isso, tenham consciência de que o conteúdo é bastante extenso – mais de 700
páginas em PDF, mais de 100 horas de vídeo-aulas e resolução de questões. Parece ambicioso, e
realmente é. Nós do Estratégia Concursos trabalhamos assim. A ideia é fazermos um trabalho denso e
exigente para que você seja aprovado!
Sendo assim, cada aula de nosso curso será composta de três partes: 1) gravação em vídeo; 2)
material em PDF; e 3) fórum de dúvidas. O tempo máximo de resposta do Fórum de Dúvidas é de cinco
dias úteis. Lembrando que com exceção deste primeiro PDF – cujo conteúdo abarca duas aulas em vídeo –
para todas as outras ocasiões, haverá uma aula em PDF para cada aula em vídeo.
Para que possamos continuar fazendo este trabalho, pedimos que não comprem material pirata e
não comprem material de rateio. Não quero ser chato logo de início, mas tenham consciência que a única
empresa legalmente autorizada a vender este curso é o Estratégia Concursos por meio do site oficial:
www.estratégiaconcursos.com.br. Além do material ser eletronicamente rastreado (o que pode dar um
problemão para quem compra curso ilegalmente), pensem que construir um PDF como este aqui
demanda horas e horas de preparação e estudo. Sendo assim, não é justo que outras pessoas roubem o
nosso material e ganhem dinheiro em cima dele sem fazer nada.
Alexandre Vastella, Filipe Martins
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Nosso curso será bastante aprofundado e lhe dará todas as ferramentas para você ir muito bem
(mesmo!) no TPS e nas provas discursivas. Trabalharemos com o edital “na mão”, o mais focado possível,
procurando trabalhar aquilo que a banca CESPE/UNB pede nas provas do CACD.
Sei que muitos que estão lendo essa aula agora são iniciantes ou possuem muita dificuldade em
Política Internacional. Nosso curso não exigirá conhecimentos prévios. Portanto, se você nunca estudou,
ou está iniciando seus estudos em Política Internacional, ou se já estudou mas teve imensa dificuldade,
fique tranquilo pois nosso curso atenderá aos seus anseios perfeitamente. Por outro lado, se você já
estudou os temas, e apenas quer revisá-los, ou quer um maior aprofundamento em alguns itens, o curso
também será bastante útil, seja pela quantidade de exercícios comentados que teremos ou pelo rigor no
tratamento da matéria.
Visão geral da prova e cronograma de aulas
Quando pensamos em Política Internacional vinculada à mídia e imaginário popular, partimos de
uma base ampla e pouco conceitual, cujo enfoque é bem diferente do que a gente precisa ter no CACD.
Para a prova, além da bagagem conceitual que destoa do senso comum, devemos entender os quatro
eixos de Política Internacional que aparecem de forma muito clara no edital, que são: a) teoria das
relações internacionais, b) política externa brasileira, c) relações bilaterais do Brasil e integração
regional, e: d) temas e a agendas internacionais. Devemos, portanto, ter uma visão específica de política
internacional, tomando cuidado com vulgaridades e visões técnicas não adotadas pela banca.
Detalharemos abaixo estes quatro eixos:
Primeiramente, a teoria das relações internacionais corresponde à esfera teórica da Política
Internacional, abarcando a totalidade do arcabouço conceitual, teórico e analítico que permite trabalhar e
problematizar todas as questões que a gente vai abordar ao longo do curso. Assim sendo, todos os
fenômenos e fatos que nós vamos estudar podem ser abarcados pela teoria das relações internacionais.
Diferentemente da teoria das relações internacionais, a política externa brasileira é composta
apenas de conceitos, e não de abordagens teóricas; apreende, portanto, uma base factual. Podemos
perceber claramente este eixo quando o edital pede, por exemplo, o entendimento da evolução da política
externa brasileira entre 1945 – no cenário estabelecido após a Segunda Guerra Mundial – até os dias
atuais. Dentro deste item, a gente vai entender a importância das relações bilaterais do Brasil, com
destaque às relações Brasil-Estados Unidos, Brasil-Argentina, e Brasil-BRICS (especialmente a China que é
nosso principal parceiro comercial). De certo modo, porém, estas relações são abarcadas tanto pela política
externa brasileira quanto pela teoria das relações internacionais.
Sob a luz da política externa brasileira, vamos compreender as relações bilaterais do Brasil e
integração regional. Evidentemente, será dada uma atenção maior aos parceiros mais importantes como
Estados Unidos, Argentina, China, Inglaterra, França e Alemanha; mas sem deixar de lado a atuação
brasileira face aos países periféricos, o que a banca chama de relações sul-sul. Também serão abordadas
as relações intercontinentais, como por exemplo, o contexto regional sul-americano, as relações do Brasil
com os países asiáticos, africanos e europeus de um modo geral. Este conhecimento será necessário tanto
para responder às questões objetivas quanto (e principalmente!) para as questões discursivas do CACD,
que costumam englobar estes eixos de forma muito transversal.
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Por último, os temas e agendas internacionais dizem respeito aos principais temas que movem a
política internacional, não apenas no que se refere à política externa do Brasil, mas também à política
externa de outros países (especialmente Estados Unidos, China e países da Europa Ocidental); e que,
portanto, dão o tom de aquilo que ocorre nas relações internacionais no mundo. Temas como a
segurança e a paz, o meio ambiente, e os direitos humanos, por exemplo, são temas internacionais que
dão origem a agendas internacionais; ou seja, a objetivos e pautas mais específicas.
Como era de se esperar, a teoria das relações internacionais, a política externa brasileira, as
relações bilaterais do Brasil e a integração regional, e os temas e a agendas internacionais aparecem de
forma integrada na prova do CACD. Para termos uma ideia, segue abaixo o último edital publicado em 2018
[fonte]:
Edital 2018 CACD – Itens de Política Internacional
1. Relações internacionais: conceitos básicos, atores, processos, instituições e principais paradigmas
teóricos.
2. A política externa brasileira: evolução desde 1945, principais vertentes e linhas de ação.
3. O Brasil e a América do Sul.
3.1 Integração na América do Sul.
3.2 O MERCOSUL: origens do processo de integração no Cone Sul.
3.3 Objetivos, características e estágio atual de integração.
3.4 A Iniciativa de Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA).
3.5 A União Sul-Americana de Nações: objetivos e estrutura.
3.6 O Conselho de Defesa da América do Sul.
4. A política externa argentina; a Argentina e o Brasil.
5. A política externa norte-americana e relações com o Brasil.
6. Relações do Brasil com os demais países do hemisfério.
7. A Política externa francesa e relações com o Brasil.
8. Política externa inglesa e relações com o Brasil.
9. Política externa alemã e relações com o Brasil.
10. A União Europeia e o Brasil.
11. Política externa russa e relações com o Brasil.
12. A África e o Brasil.
13. A política externa da China, da Índia e do Japão; relações com o Brasil.
14. Oriente 29/32 Médio: a questão palestina; Síria, Iraque, Irã e outras situações nacionais relevantes.
15. A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
16. A agenda internacional e o Brasil:
16.1 O multilateralismo de dimensão universal: a ONU; as Conferências Internacionais; os órgãos
multilaterais.
16.2 Desenvolvimento.
16.3 Pobreza e ações de combate à fome.
16.4 Meio ambiente.
16.5 Direitos Humanos.
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16.6 Comércio internacional e Organização Mundial do Comércio (OMC).
16.7 Sistema financeiro internacional. 16.8 Desarmamento e não-proliferação.
16.9 Conflito étnico, sectário e nacionalismo: os casos do Bálcãs e do Oriente Médio (por exemplo:
Síria, Líbano, Iraque).
16.10 Crimes de guerra e crimes contra a humanidade: genocídio, holocausto e a Corte Penal
Internacional.
16.11 Políticas de identidade: gênero, raça e religião como vetores da política mundial.
16.12 Terrorismo.
16.13 Narcotráfico.
16.14 A reforma das Nações Unidas.
17. O Brasil e o sistema interamericano.
18. O Brasil e a formação dos blocos econômicos.
19. A dimensão da segurança na política exterior do Brasil.
20. O Brasil e as coalizões internacionais: o G-20, o IBAS e o BRICS.
21. O Brasil e a cooperação sul-sul.
Com base nestes itens (e são muitos itens!), nós teremos 33 aulas (32 de conteúdo novo e um
último resumão), de acordo com a seguinte sequência:
Sequência de Aulas
0 Visão Geral da Prova e do Curso: conceitos básicos, atores, processos e instituições.
1 Principais paradigmas teóricos: Realismo, Liberalismo, Construtivismo e outras teorias
2 Principais marcos e debates teóricos
3 A Política Externa Brasileira: princípios e diretrizes da política externa brasileira
4
Política Externa Brasileira (1945 – 1985): a evolução desde 1945, principais vertentes e linhas de ação
(Parte 1)
5
Política Externa Brasileira (1945 – 1985): a evolução desde 1945, principais vertentes e linhas de ação
(Parte 2)
6
Política Externa Brasileira (1985 – 2018): a evolução desde 1945, principais vertentes e linhas de ação
(Parte 1)
7
Política Externa Brasileira (1985 – 2018): a evolução desde 1945, principais vertentes e linhas de ação
(Parte 2)
8 A política externa norte-americana e relações com o Brasil.
9
A União Europeia e o Brasil: as relações do Brasil com o bloco europeu e com seus principais
membros
10 A política externa argentina: a Argentina e o Brasil.
11 O Brasil e seu entorno regional: América do Sul e as Américas
12 O Brasil e a América do Sul
13 Relações do Brasil com a África
14 Relações do Brasil com o Oriente Médio
15 Relações do Brasil com a Ásia e o Indo-Pacífico
16 Relações do Brasil com os BRICS
17 Relações do Brasil com Portugal e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
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18 O Brasil e o Sistema Interamericano: a OEA
19 O MERCOSUL
20 A União Sul-Americana de Nações (Unasul) e outras iniciativas
21 Organizações e Regimes internacionais
22 Sistema ONU - Origens e Carta da ONU
23 Sistema ONU - Evolução e Reforma
24 Sistema ONU - O Brasil e as Nações Unidas
25 Sistema Financeiro Internacional
26 Sistema Multilateral de Comércio: a OMC
27 Desenvolvimento Sustentável, Meio Ambiente e Direitos Humanos
28 A dimensão da segurança na política exterior do Brasil
29 O Brasil, as Coalizões Internacionais e a Cooperação Sul-Sul: BRICS, IBAS, G-20
30 Políticas de identidade: Conflito étnico, religioso, sectário e a ascensão do nacionalismo
31 O Oriente Médio e seus Impactos nas Relações Internacionais
32
Crimes de guerra e crimes contra a humanidade: conflitos civis, genocídio, holocausto e a Corte Penal
Internacional.
33 Resumão
Conceitos básicos – atores, processos e instituições
Relações internacionais e política internacional
Agora que já vimos a estrutura do curso, vamos tratar especificamente da base teórica essencial.
Veremos as definições conceituais de Política Internacional, de relações internacionais e demais conceitos
básicos e centrais necessários à construção de uma base de conhecimento sobre teoria das relações
internacionais, política externa brasileira, relações bilaterais do Brasil, inserção brasileira no cenário
internacional e também sobre temas/agendas que veremos adiante.
Primeiramente, as relações internacionais são interações entre unidades políticas. No âmbito
doméstico, as unidades políticas podem ser, por exemplo, partidos políticos ou organizações não
governamentais; já em política internacional (assunto que interessa para nós), as unidades políticas
normalmente correspondem aos Estados nacionais. Deste modo, quando falamos em política externa do
Brasil estamos falando essencialmente da política externa do Estado brasileiro. É importante ter em
mente, portanto, que o Estado é a principal unidade política no âmbito da Política Internacional.
Porém, para além das unidades políticas estatais, que se referem ao Estado nacional, a política
internacional também é composta por unidades políticas não-estatais, como por exemplo, as organizações
não-governamentais (ONGS), as organizações internacionais e as empresas multinacionais. Todavia,
mesmo com a emergência dos atores não-estatais observada nas últimas décadas, o Estado continua
sendo o principal ator das relações internacionais; ou seja, entre nações, ou entre Estados nacionais.
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Unidades políticas estatais Estado nacional
Unidades políticas não-estatais ONGs, empresas multi e transnacionais.
As relações internacionais – ou seja, as interações entre unidades políticas com capacidade de
agência internacional – podem ser de diversos tipos: culturais, religiosas, políticas, econômicas, etc.
Normalmente, porém nem sempre, estas relações são protagonizadas por Estados nacionais. Assim, as
relações Brasil-Estados Unidos, por exemplo, são encabeçadas por representantes do Estado brasileiro e
representantes do Estado dos Estados Unidos. No entanto, demais atores de agência internacional, como
por exemplo, corporações transnacionais, ONGs, ou até mesmo determinados indivíduos, também podem
se relacionar internacionalmente.
As relações internacionais (letras minúsculas) abrangem os fluxos internacionais; ou seja, as
relações entre países de modo abrangente no âmbito cultural, religoso, turístico, comunicativo, entre
outras. Por outro lado, as Relações Internacionais (letras maiúsculas) dizem respeito ao campo de estudo,
à disciplina, ao curso, à área acadêmica que se dedica ao estudo das relações internacionais.
relações
internacionais
Quando escrita em letra minúscula, as relações internacionais se referem às interações
entre unidades políticas com capacidade de agência internacional, podendo ocorrer
entre atores estatais e/ou não-estatais. Trata-se da rede dinâmica e abrangente das
relações em si.
Relações
Internacionais
Quando escrita em letra maiúscula, as Relações Internacionais se referem ao campo de
estudo, à disciplina, ao curso, à área acadêmica que se dedica ao estudo das relações
internacionais.
Política
internacional
Lida não apenas com as relações internacionais em si, mas principalmente com a
dinâmica de poder nelas envolvidas por uma perspectiva de interação entre Estados
nacionais. Portanto, o conceito de política internacional é mais abrangente que o de
relações internacionais.
Neste curso, nós temos um interesse bastante específico na seleção de futuros diplomatas. É por
isso que pensamos aqui, muito mais em política internacional do que em relações internacionais. É
verdade que as relações internacionais precisam ser entendidas, principalmente no que diz respeito às suas
principais instituições, processos, fluxos e conceitos básicos; no entanto é na política internacional que
está o nosso foco para o CACD.
Ao contrário das relações internacionais, a política internacional não se preocupa somente com as
relações religiosas, culturais, econômicas ou demais interações entre atores de agência internacional, mas
apenas quando estas relações descreverem uma abordagem política oficial, tratamento dado por uma
perspectiva dos Estados nacionais ou por organizações internacionais reconhecidas por estes. A política
internacional, portanto, lida muito mais com uma dinâmica de poder; ou, com outras palavras, com as
interações de poder e/ou cooperação entre unidades políticas.
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Tratados de Vestfália (1648)
As relações internacionais adotam como marco histórico os Tratados de Vestfália (1648), também
conhecidos como Paz de Vestfália; uma série de tratados assinados na Alemanha com a finalidade de
estabelecer, entre outras coisas, o respeito à soberania dos Estados. Trata-se, por conseguinte, do marco
inicial nos debates a respeito da soberania estatal.
Estes tratados foram assinados em um contexto nitidamente religioso: naquele período, havia
ocorrido uma série de guerras religiosas entre nações europeias, motivadas principalmente por conflitos
entre católicos e protestantes; como por exemplo, a Guerra dos Trinta Anos que terminou com o massacre
de São Bartolomeu. Havia, portanto uma sobreposição entre o poder do Estado (exercido pelos monarcas)
e o poder religioso (cujo Papa era a maior autoridade); e para atingir a paz, era necessário equalizar isso;
ou seja, determinar qual seria, de fato, a autoridade máxima dentro de um território. Ficou acordado que
a partir dos Tratados de Vestfália, os príncipes, os monarcas e os Reis passariam a ter o direito de escolher
e determinar soberanamente qual seria a religião praticada dentro dos seus territórios; ou seja, dentro
de suas fronteiras.
“A chamada “Paz de Vestefália” é o momento histórico marcado pela assinatura de dois
tratados, celebrados nas cidades alemãs de Münster e Osnabrück, os quais, de maneira sucinta,
colocaram fim à Guerra dos Trinta Anos e estabeleceram os novos limites territoriais das
principais nações europeias da época. A Guerra dos Trinta anos teve início em 1618, fruto das
tensões religiosas observadas por toda Europa, que opunham a Igreja Católica – mais
importante instituição política da era medieval – e as emergentes religiões protestantes,
notadamente a Calvinista e a Luterana.” [fonte]
Não é o foco desta aula entender a disputa religiosa e nem o contexto europeu do século XVII, mas
sim, compreender que os Tratados de Vestfália foram o marco inicial do sistema internacional europeu,
modelo que com o passar dos séculos, se espalhou para o restante do planeta. Assim, a concepção de
soberania estatal, que primeiramente se estabeleceu dentro da Europa, foi sendo paulatinamente levado
às colônias e posteriormente, aos países independentes na época pós-colonial. Esse processo inclui o Brasil,
que momento ainda era colônia de Portugal, um Estado europeu influenciado pelas ideias de Vestfália.
Após um longo período de conflitos, líderes europeus assinam a Paz de Vestfália, inaugurando o sistema internacional moderno (G. Terborch, 1648). Este é
um marco histórico das relações internacionais, pois inaugura o modelo estadocêntrico com predominância do Estado nacional.
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Sistema Internacional
Tendo em vista um sistema internacional formado pelas interações entre unidades políticas com
capacidade de ação Internacional e também determinado pela Paz de Vestfália que até hoje vigora no
centro das relações internacionais, veremos agora alguns básicos que nos ajudam a compreender um
pouco melhor o que é a política internacional e o que são as relações internacionais.
O primeiro conceito é o conceito de sistema internacional, que também pode ser colocado como
um sinônimo de arena internacional. Trata-se do palco ou da arena onde as interações entre unidades
políticas se dão. Sendo assim, o sistema internacional abarca todas as unidades políticas de vigência
internacional. Então, o sistema internacional nada mais é do que a arena onde se dão as relações
internacionais entre todos os atores ali inseridos.
Sistema internacional ou Arena internacional
Palco onde as relações internacionais ocorrem, englobando as
interações entre todos os atores, processos e instituições.
Podem assumir diferentes configurações (sistema anárquico ou
sistema hierárquico); e também distintas organizações de
poder (exemplo: multipolar ou bipolar).
O Tratado de Vestfália, por exemplo, foi basicamente costurado nas relações entre os estados
europeus. Naquela época, fala-se muito mais em sistema europeu do que sistema internacional
propriamente dito; afinal, este não havia englobado todo o mundo, nem todas as demais unidades
políticas que se organizavam naquela época, seja no modelo tribal, imperial, ou no modelo que fosse.
Atualmente, no entanto, ao contrário do que ocorria no século XVII, podemos sim pensar em um sistema
internacional que engloba todas as nações, quer sejam reconhecidas ou não. Então hoje nós temos de
fato uma arena que engloba todos estes atores, todas essas unidades políticas que interagem dentro da
arena; e ai essa interação pode se dar de diferentes modos e assumir diferentes configurações.
Tendo essa abrangência em vista, o sistema internacional, de acordo com o ponto de vista, pode ser
um sistema internacional organizado, no qual existe uma ordem; e pode também, ser um sistema
internacional anárquico onde não necessariamente existe uma ordem, uma hierarquia ou uma autoridade
central que possa exercer soberania perante aos demais.
Sistema internacional organizado Organizado de acordo com uma ordem pré-estabelecida
Sistema internacional anárquico Não existe ordem ou hierarquia pré-estabelecida.
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Atores internacionais
Conforme vimos anteriormente, quem possui capacidade de ação dentro dos sistemas
internacionais são unidades políticas dotadas de coesão e continuidade. Historicamente, a principal
unidade política é o Estado, no entanto, também existem as unidades políticas não estatais.
O maior exemplo de atores não estatais são as organizações
internacionais, que embora sejam formadas por Estados, possuem uma
capacidade de agência própria. Deste universo, destaca-se a Organização
das Nações Unidas (ONU) (logo à direita), que é formada por múltiplos
Estados (Brasil, Estados Unidos, Argentina, vários países europeus,
africanos, etc.). Contudo, a ONU não é apenas a pura soma de seus
membros: a organização possui uma burocracia própria e permanente, uma
sede, um documento fundacional que serve como carta que vai dirigir as
suas ações, tem inclusive um secretariado geral cheio de burocratas à sua
disposição, técnicos, especialistas, escritórios temáticos específicos; funcionando
basicamente como um órgão executivo.
Quando a se posiciona, toma decisões, e/ou age no âmbito internacional para além da vontade dos
Estados que a compõem, a ONU também se configura como um ator de vigência internacional. Trataremos
este assunto mais à frente: por enquanto é importante entender as diferenças entre atores estatais e não
estatais. Neste curso, trataremos com maior ênfase nos atores estatais e nas organizações internacionais.
Princípios da territorialidade, da soberania e da autonomia.
No sistema internacional, há três princípios fundamentais relacionados à ideia de Estado: a
territorialidade, a soberania e a autonomia.
O primeiro princípio diz respeito à territorialidade no qual a humanidade é organizada,
principalmente entre comunidades com fronteiras delimitadas. Em sua forma mais nuclear, a unidade
política possui relação com a família. Indivíduos que se casam, têm filhos e formam famílias constituem a
primeira base social. Por sua vez, um conjunto de famílias – com primos, primas, tios, tias, etc. – pode
formar um clã ou uma tribo. Para que haja a convivência social harmônica, essa tribo se organiza de acordo
com regras que determinam certa ordem; garantindo assim, a segurança e liberdade mínimas – princípios
que vimos anteriormente. Esta configuração vai ficando cada vez mais explícita quando ocorre uma
evolução social: estas tribos podem se fortalecer, tornando-se vilarejos; e posteriormente, cidades. É
evidente que este processo nem sempre ocorre em um percurso histórico linear, mas tem alguma relação
até chegar ao que nós chamamos de Estados nacionais; estes, que se estabelecem de forma realmente
clara só em 1648 com os Tratados de Vestfália.
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Neste contexto, toda a comunidade se organiza de acordo de uma territorialidade específica; ou
seja, dentro de um determinado território delimitado por fronteiras, sejam elas reconhecidas por
vizinhos ou pelo mero uso da força a qual impõe este respeito à fronteira. Basicamente o que a gente
precisa entender é que a territorialidade é essencial para a compreensão das relações internacionais: em
um mapa-múndi, por exemplo, podemos ver claramente a delimitação dos territórios políticos, como por
exemplo, onde o Brasil começa e onde o Brasil termina. Estas delimitações políticas, moldadas por
inúmeros conflitos e acordos durante a história, precisam ser respeitadas. Logo, o respeito da
territorialidade se dá pelo exercício da soberania. Ou seja, só há territorialidade onde há soberania; e daí
pode-se partir para o segundo princípio.
Dentro das fronteiras de um país, o Estado possui a autoridade legal, suprema, incondicional e
exclusiva; ou seja, possui a soberania. Se essa autoridade central é desafiada – como em diversos
momentos da história – podem ocorrer guerras civis ou uma interferências externas. Porém, em uma
situação de normalidade, a extraterritorialidade é respeitada pelo exercício da soberania que nada mais é
do que o monopólio da autoridade que se impõe por meio da exclusividade do uso legítimo da força.
Três princípios fundamentais
Territorialidade
A humanidade é organizada, principalmente, entre comunidades com fronteiras
delimitadas.
Soberania
Dentro das fronteiras, o Estado ou governo tem um mandato de autoridade legal
que é supremo, incondicional e exclusivo.
Autonomia
O princípio da autodeterminação ou autogoverno constrói países como agentes
autônomos da atividade política, social e econômica dentro das fronteiras fixas que
separam a esfera doméstica do mundo exterior.
Por fim, o exercício da soberania pressupõe a autonomia que está relacionada ao princípio da
autodeterminação ou autogoverno dos povos que concebe países como agentes autônomos da atividade
política, social e econômica dentro das fronteiras fixas que separam a esfera doméstica do mundo exterior.
Logo, os três princípios se relacionam uns aos outros: a territorialidade pressupõe a delimitação de
fronteiras onde é necessário haver o exercício da soberania que consequentemente pressupõe a
autonomia e a liberdade para agir em diversas esferas (política e social econômica e etc.).
Níveis de análise: sistêmico, supra-estatal, estatal e societal/individual.
Tendo em vista os conceitos anteriores, agora podemos entender as diferentes camadas destas
relações; ou seja, os diversos níveis de análise. Os níveis de análise são diferentes abordagens utilizadas
para compreender um determinado fenômeno internacional podendo variar de acordo com o objeto o
momento e a finalidade. São quatro categorias: nível sistêmico (sistema internacional); nível supra-estatal
(relações bilaterais); nível estatal (Estado); e nível societal/individual (sociedade civil).
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Níveis de análise
Nível sistêmico.
Sistema internacional.
Nível estatal.
Estado.
Nível supra-estatal.
Relações bilaterais.
Nível societal/individual.
Sociedade Civil.
O primeiro nível é o sistêmico, que conforme o nome sugere, lida com o sistema internacional de
forma geral. Neste nível, alguns questionamos podem ser feitos. Quais os princípios e processos globais do
sistema internacional? Este sistema internacional é anárquico ou possui certa organização? De que modo
este sistema, como um todo, afeta as relações políticas? Trata-se, portanto, do estudo de fenômenos em
escala global, e não de Estados específicos ou a relação entre estes. O segundo nível é o nível supra-
estatal; ou seja, algo que se dê acima do nível estatal, porém, que não seja tão abrangente quanto o nível
sistêmico global. Ocorre, por exemplo, entre as regiões do planeta. Neste nível, podemos analisar, por
exemplo, a América do Sul, a África subsaariana, a Europa Ocidental, e assim por diante. Por sua vez, o
nível estatal dá ênfase a um único Estado. Um exemplo de análise em nível estatal são as relações da
política externa brasileira.
Por fim, o nível societal se refere à sociedade que está dentro do Estado, o que engloba diversas
escalas. É neste nível que se encontra a sociedade civil no qual se formam alguns consensos de processo
decisório. Este nível abarca, portanto, tanto a sociedade de forma geral quanto indivíduos de grande
influência, tais como: presidentes de uma nação, grandes nomes das elites governamentais, empresários
notáveis, formadores de opinião, intelectuais, etc. Ao longo do curso, o estudo da política externa brasileira
será focada nos três ultimos níveis, em destaque ao estatal e ao societal.
Sistema internacional e ordem internacional
Deste modo, faz-se se necessário distinguir sistema internacional de ordem internacional.
Conforme vimos anteriormente, o sistema internacional é a arena onde se dão as relações internacionais,
englobando todos os processos, instituições e atores; trata-se, portanto, de um conceito político
envolvendo mecanismos de poder e relacionamentos entre atores internacionais. Ao contrário do sistema
internacional (ordem política), a ordem internacional é um conceito jurídico, focando no modo que o
sistema internacional é organizado dentro de uma coerência ética e jurídica. O quadro abaixo explica
melhor estas diferenças:
Sistema internacional (conceito político) Ordem internacional (conceito jurídico)
Foca nas relações de poder que se dão dentro do
sistema internacional, regido de acordo com uma
lógica do poder (item abaixo)
Refere-se ao modo com que o sistema internacional
é organizado do ponto de vista jurídico. Relaciona-
se, portanto, com a lógica legal-normativa (abaixo).
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Lógica do poder Lógica legal-normativa
A lógica do poder se refere à relação de
sobrevivência e segurança entre os Estados. Isso
ocorre por meio de disputas de poder entre atores
internacionais (item abaixo).
Refere-se especialmente ao direito internacional.
Neste caso, não estamos falando de “força”, mas de
princípios éticos e legais que devem ser seguidos
pelos sujeitos do direito internacional (item abaixo).
Atores internacionais Sujeitos do direito internacional
São as unidades políticas com capacidade de
agência internacional. Agindo de acordo com a
lógica do poder, estes atores podem ser
organizados em várias polaridades diferentes (item
abaixo).
Os sujeitos possuem obrigações, direitos e deveres.
Agindo de acordo com os princípios legais da lógica
legal-normativa, estes sujeitos se relacionam em
diferentes lateralidades (item abaixo).
Polaridade Lateralidade
Refere-se aos polos que emanam o poder, podendo
ser: unipolar (um país central detém o poder);
bipolar (dois países centrais disputando o poder);
ou, multipolar (poder fragmentado).
Refere-se aos meios de ação de poder, podendo
ser: unilateral (Estado que age sozinho); bilateral
(relação ou vínculo entre dois Estados); ou
plurilateral (pluralidade de lados, como vários
Estados envolvidos em um acordo).
Resumindo: o sistema internacional – que se refere a uma ordem política – é regido por uma lógica
de poder que influencia a dinâmica dos atores internacionais; o que pode resultar em diferentes
polaridades. Por ser um conceito jurídico, a ordem internacional exige uma lógica legal-normativa para
regular os direitos e deveres dos sujeitos do direito internacional; que podem se relacionar em diferentes
lateralidades.
Anarquia do sistema internacional
Agora que já conhecemos como funciona o sistema internacional, podemos entender o conceito de
anarquia internacional. Neste contexto, anarquia pode ser entendida como a ausência de governo central,
ou ausência de autoridade internacional.
Anarquia
“Sistema político e social baseado na negação do princípio de autoridade governamental
[...] De modo geral, ausência de governo, de liderança; desordem por ausência de
autoridade reguladora; desregramento, desorganização:” [fonte]
Isto não significa que o sistema internacional é caótico ou desordenado, mas sim, que existe uma
organização de Estados e/ou atores que não conta com a presença de uma autoridade central. Não há,
portanto, autoridade que se impõe de cima para baixo e tampouco poder de polícia. Neste caso, se um
Estado fosse agredido por outro Estado, não seria possível recorrer à polícia tal como um cidadão comum
ao ser agredido em âmbito doméstico. No sistema internacional anárquico, não existe hierarquia de poder
e nem autoridade central. Vejamos o esquema abaixo:
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Anarquia do sistema internacional
Não há autoridade central: Não existe uma autoridade que comanda
o planeta inteiro, mas sim, Estados e/ou atores internacionais
disputando poder isoladamente.
Não há polícia: Se não há autoridade central, também não existe
uma polícia planetária.
Sobrevivência incerta: Visto que o sistema internacional é
anárquico, cada Estado busca sobreviver e manter/ampliar o seu
poder.
Desconfiança: Como existe uma constante incerteza pela
sobrevivência, isso gera desconfiança mútua entre os atores
internacionais.
Auto-ajuda: No sistema internacional, os Estados contam apenas
com a ajuda de outros Estados.
Dilema da segurança: por estarem preocupados com a segurança, os
Estados acabam se armando cada vez mais. Esta preocupação
excessiva, no entanto, traz o efeito contrário: o aumento das tensões
internacionais.
Suponha que o círculo azul (acima) seja o sistema internacional. Dentro deste sistema, não há uma
autoridade central, mas sim, múltiplos estados com diferentes poderes, que não conseguem a imposição
de sua força/poder a outros de uma única vez. Em um sistema anárquico, como não existe autoridade
central, cada Estado fica responsável por garantir a sua própria segurança e sobrevivência. A segurança
das pessoas, portanto, dependeria basicamente das suas próprias capacidades e dos seus próprios meios
de se defender. No sistema internacional, portanto, não há polícia.
Em seu livro Leviatã, e em âmbito doméstico, Thomas Hobbes tratar esta anarquia como “estado de
natureza”; ou seja, a ausência da capacidade de regular ou interferir certo ordenamento nas relações
sociais. Neste caso, há uma situação marcada pela guerra de todos contra todos, no qual “o homem é o
lobo do homem”. Ou seja, nada impede, por exemplo, que outro homem similar a mim cometa uma
agressão ou violência. Hobbes conclama, portanto, à necessidade um Estado como meio de garantir certa
ordem e segurança os indivíduos. Forma-se, portanto, uma relação inversamente proporcional entre
liberdade e segurança: o indivíduo cede parcialmente a sua liberdade para o Estado; e em troca, o Estado
proporciona segurança e ordem.
No sistema internacional, contudo, a noção de ordem é bem mais complexa. Neste caso, existe um
grande consenso entre realistas e liberais (inclusive entre os construtivistas) que neste ambiente
anárquico a sobrevivência é incerta, e isso gera desconfiança. Essa desconfiança significa que o Estado
deve ficar sempre alerta e desconfiando de tudo e de todos, pois um estado de conflito é sempre iminente.
Deste modo, os atores internacionais podem contar apenas com a auto-ajuda; ou seja, no sistema
internacional, os Estados contam apenas com a ajuda de outros estados. No entanto, essa relação cria
efeitos colaterais. Se um Estado torna-se dependente de outro Estado, então, perde parte de sua
soberania e de sua capacidade de agir autonomamente no sistema internacional.
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Para garantirem sua sobrevivência e manutenção, os Estados estão constantemente se armando e
se equipando, buscando no primeiro momento o poder dissuasório para que não sejam atacados e
também buscando uma capacidade de ataque caso seja necessário, o que pode inclusive, acarretar em
ações ofensivas. Vejamos uma situação hipotética: se o “Estado A” tem armas, outros Estados ficam com
medo de ataca-lo. Contudo, se o “Estado B” se fortalecer a ponto de colocar a sua soberania em xeque, o
“Estado A” vai ampliar ainda mais a sua capacidade de defesa e ataque. Neste caso, ocorre um ciclo no
qual cada Estado possui uma tendência de se armar cada vez mais. Iremos desenvolver esse assunto na
Teoria Realista, mas é consenso entre todas as escolas teóricas que os Estados possuem esta tendência.
Este cenário cria o dilema de segurança. Por estarem preocupados com a segurança, os Estados
acabam se armando cada vez mais; contudo, este processo contraditoriamente aumenta os riscos com a
segurança. Um sistema anárquico, teoricamente caótico em desorganizado, pode perfeitamente levar a
este contexto de guerra de todos contra todos. A preocupação com a segurança pode levar a uma corrida
armamentista; o que paradoxalmente pode levar a mais conflitos e tensões.
A maioria dos teóricos considera que este cenário vigorou em toda a história humana. O Império
Romano, por exemplo, conseguiu impor, ao menos dentro de seus limites, certa ordem por conta da
autoridade central, uma unipolaridade que disfarçava a anarquia internacional. O sistema internacional,
portanto, é anárquico, não possui autoridade central, não possui poder de polícia, e é frequentemente
levado ao dilema de segurança.
Atores estatais – Estado nacional
Para serem configurados como Estados nacionais, os atores precisam ter os seguintes elementos:
fronteiras, população, governo central, soberania, reconhecimento e monopólio do uso da força:
Elementos que constituem o Estado no sistema internacional anárquico
Fronteiras
A delimitação física do Estado
População
Os moradores do Estado
Governo central
A autoridade do Estado
Soberania
A capacidade de exercer a autoridade do Estado
Reconhecimento
O reconhecimento do Estado no sistema internacional
Monopólio do uso da força
Manutenção da ordem exercida por aparatos bélicos.
O círculo maior representa o “Estado A” o círculo inferior, o “Estado B”. Entre ambos, existem
fronteiras – um dos pré-requisitos do princípio da territorialidade – na qual podemos identificar
claramente onde os Estados começam e onde os Estados terminam. Os estados também precisam ter uma
população; ou seja, pessoas que vivem dentro deste território delimitado por fronteiras. Além disso,
também precisa ter um governo central para regular e normatizar o território. Um Estado também precisa
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possuir a sua própria soberania; ou seja, a capacidade de utilizar o governo central para exercer a
autoridade dentro do território delimitado por fronteiras. A soberania pressupõe o monopólio do uso da
força, e a capacidade de exercer a autoridade legal de modo supremo, incondicional e exclusivo. Isto
significa que é a vontade do Estado que prevalece dentro de suas fronteiras. Todo esse contexto vale tanto
para o “Estado A” quanto para o “Estado B”.
Além de soberania, população, governo central e fronteiras, todo Estado precisa ter
reconhecimento. Então, “O Estado B” é reconhecido pelo “Estado A”, que por sua vez reconhece o “Estado
B”. Uma vez que os Estados reconhecem uns aos outros, também reconhecem a suas soberanias, o que
implica no respeito aos limites territoriais e fronteiriços. Se o Estado possui soberania, também detém o
monopólio do uso da força; ou seja, a manutenção da sobrevivência derivada da autoridade central
exercida por aparatos bélicos.
Atores não estatais – Organizações internacionais
Além dos atores estatais, também existem os atores não estatais, especialmente as organizações
internacionais, cujo maior exemplo é a Organização das Nações Unidas (ONU). Dentro destas
organizações, existem múltiplos Estados, que escolhem ou não integrar estas organizações, muita das
vezes cedendo parcialmente a sua soberania. Na maior parte das vezes, inclusive, estas organizações são
criadas pelos próprios Estados.
Neste contexto, as organizações internacionais podem ter diferentes motivações; podendo ser
regionais, como a União Europeia; ou temáticas, como por exemplo, a Organização Mundial do Comércio
(OMC) que lida somente com o tema “comércio”; ou as finalísticas, que possuem uma finalidade
específica, como por exemplo, a ONU cujo objetivo é obter a paz mundial duradoura pela ótica da
segurança coletiva. É importante disser, no entanto, que a segurança coletiva pressupõe a ideia voluntária
dos Estados de agregarem ou não estas instituições.
Organizações internacionais
Regionais
Englobam uma determinada região do planeta; por
exemplo: a União Europeia.
Temáticas
Possuem um determinado tema, como por exemplo, a
Organização Mundial do Comércio.
Finalísticas
Possuem uma determinada finalidade, como por exemplo, a
ONU que possui a finalidade de obter/manter a paz
mundial.
Contexto pós-1945
Foi a partir do final da Segunda Guerra Mundial que estas
organizações foram sendo criadas ou concebidas.
Foi a partir de 1945, com o final da Segunda Guerra Mundial, que as principais instituições que
conhecemos hoje começaram a ser criadas. Em busca da paz e da regulação mundiais do cenário pós-
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guerra sugiram, por exemplo, a Organização das Nações Unidas, o Banco Mundial, o Fundo Monetário
Internacional e o Acordo Geral Sobre Tarifas e Comércio (GATT) que posteriormente deu origem à
Organização Mundial do Comércio. No caso específico da ONU, ainda na esteira dos traumas da Segunda
Guerra, a ideia central era impedir um novo conflito global de grandes proporções. Neste caso, um ataque
a qualquer um destes membros significaria um ataque a todos os membros.
Instituição e organização
Neste item, vamos entender a diferença entre instituição e organização, dois conceitos-chave da
Política Internacional. Primeiro, seguem as definições [fonte]:
Instituição
“Estrutura social, estabelecida por lei, que tem vigência em certo Estado ou para certo
povo”.
Organização
“Instituição, associação ou entidade que atua no âmbito dos interesses comuns;
organismo”.
A instituição está ligada com a ideia de estrutura social, ou seja, algo que independe uma
burocracia definida. A organização, por sua vez, é uma associação/entidade que necessariamente possui
figuras de comando, burocracias e regras próprias. Seguem alguns exemplos:
Exemplo de instituição Exemplo de organização
Guerra Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).
Comércio União Europeia, MERCOSUL, NAFTA.
Cooperação Organização das Nações Unidas (ONU)
Para entender esta distinção vamos analisar o debate doméstico. A partir de 2013, por exemplo,
acirraram-se as discussões sobre a instituição familiar. Como não possui burocracia própria, a família não é
uma organização propriamente dita, mas sim uma instituição que tem sido discutida tanto pela população
quanto pelos nossos representantes eleitos na Câmara, ou ainda, pelos juízes do Supremo Tribunal Federal
(STF). O debate normalmente gira em torno do conceito de família: se ela deve ser compreendida de forma
orgânica e historicamente definida ou considerar os novos arranjos. A família, portanto, é uma instituição
e não uma organização.
No cenário internacional, também existe essa distinção. O comércio é uma instituição
internacional, e não uma organização internacional. É verdade que existem organizações criadas com a
finalidade de regular o comércio, mas estes termos não podem ser confundidos. O comércio é uma
instituição, e assim sendo, existem organizações que cuidam dessas instituições como, por exemplo, a
OMC. Esta organização possui um regimento de funcionamento, uma burocracia própria e elementos
tangíveis. Ao contrário da organização OMC, a instituição comércio não pode ser percebida ou apalpada
sensorialmente.
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Outra instituição Internacional é a guerra, o processo no qual dois ou mais Estados buscam resolver
uma controvérsia ou uma disputa. A guerra, a cooperação e o comércio são as principais instituições que
regem o sistema internacional.
Por sua vez, estas instituições envolvem processos. A guerra, por exemplo, possui processos de paz
ou conflito, além, das relações de poder. Processos de poder e de cooperação podem resolver qualquer
tipo de conflito ou controvérsia. Partindo desse pressuposto, no próximo item trabalharemos a instituição
guerra e o processo das relações de poder, também conhecido como balança de poder.
Balança de poder
Conforme vimos anteriormente, visto que o sistema internacional anárquico não possui autoridade
central nem poder de polícia, este estabelece uma lógica do poder que consiste basicamente na
desconfiança e na ideia de autoajuda. Neste sistema, os Estados – além de buscarem a estabilidade –
também procuram o equilíbrio na balança de poder, ou o equilíbrio de poder. Isso ocorre porque os
Estados querem preservar a sua sobrevivência ou aumentar o seu poder, e isso pode ser feito por meio de
alianças. Vejamos alguns exemplos nos quadros abaixo:
Balança de poder – Situação 01
Neste sistema internacional (círculo azul), todos os
Estados convivem de forma anárquica sem
autoridade central e sem poder de política
internacional. Cada um está preocupado com sua
própria sobrevivência.
Para que o “Estado A” preserve a sua sobrevivência,
deverá aumentar o seu poder; e para isso, pode
adotar uma postura ofensiva em relação ao
“Estado B”. Fortalecido, ele pode muito bem
derrotar os Estados C, D e E, garantindo a sua
hegemonia no sistema internacional.
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Também preocupados com as suas respectivas
sobrevivências, os Estados C, D e E ficam analisando
atentamente o conflito entre os Estados A e B,
tentando fazer prognósticos do que poderá ocorrer.
Acuados pelo expansionismo do “Estado A”, todos
os demais Estados (C, D, E e o já atacado B) podem
então, fazer uma mega-aliança para neutralizar a
ameaça militar do “Estado A”.
Partindo-se da mesma situação anterior (um sistema internacional anárquico), o desfecho da
balança de poder poderia ser diferente caso outras medidas fossem tomadas, conforme o quadro abaixo:
Balança de poder – Situação 02
Ao invés de atacar o “Estado B” (situação anterior), o
“Estado A” poderia formar uma aliança com o
“Estado B”. Juntos, estes dois Estados seriam mais
poderosos do que os outros.
Esta dupla aliança poderia atacar o “Estado C”,
subjugando-o e aumentando ainda mais o poder
dos Estados A e B.
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Obrigado pelos Estados A e B, o “Estado C” poderia, a
contragosto, tornar-se parte da aliança.
A grande aliança – que agora é tripla – passaria a
exercer a hegemonia global. Neste cenário, os
Estados D e E ficariam completamente
dominados.
Evidentemente, estes foram apenas dois exemplos. O importante aqui é entender a enorme gama
de possibilidades que o ajustamento da balança de poder oferece. Neste sentido, existem dois tipos de
alianças: as de balanceamento ou as de revisionismo. As primeiras buscam alterar a balança atual de
poder; já no caso das segundas, o Estado simplesmente se ajusta para devolver o equilíbrio que havia em
um cenário anterior. Durante a Europa do século XIX, por exemplo, a balança de poder permaneceu quase
estável, sem grandes conflitos, apenas com guerras curtas e pontuais. No século XX, no entanto, com a
eclosão da Primeira Guerra Mundial, houve um ajustamento dramático da balança de poder, com os
Estados revendo drasticamente suas alianças e atitudes bélicas.
Interdependência complexa
Quando pensamos em cooperação internacional, sobretudo no que diz respeito ao comércio – uma
instituição que ganhou importância com a globalização – também podemos entender o sistema
internacional como uma arena de interdependência complexa. Isto significa que os atores internacionais,
ao estarem cada vez mais conectados, também estão cada vez mais dependentes, o que reduz a
possibilidade de conflitos diretos. O quadro abaixo ilustra esta inderdependência:
No esquema abaixo, os Estados estão representados por círculos; as organizações internacionais
representadas por estrelas; e as empresas multi e transnacionais, por quadrados. Este é o modelo que
melhor representa o sistema internacional contemporâneo: uma conexão intensa entre atores estatais e
não estatais, marcada pela maior interdependência nos ramos da comunicação, transporte, comércio,
cultura e finanças. Visto que a ação de um ator afeta o outro ator, não existem claras fronteiras ou
separações entre eles. Uma empresa na China, por exemplo, pode ser afetada por medidas do governo
norte-americano.
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Interdependência complexa
Estados não são os únicos atores:
- Organizações internacionais
- ONGs
- Multinacionais/transnacionais
Atores interconectados
- Comércio
- Finanças
- Comunicações
Conceitos básicos de relações internacionais
Teoria das relações internacionais
As relações internacionais costumam adotar como marco histórico originário a Paz de Vestefália
(1648), uma série de tratados assinados na Alemanha que colocam fim a uma sequência de conflitos entre
protestantes e católicos e reconhecem a soberania dos príncipes e dos reis. A partir deste momento,
ocorre a consolidação do Estado como unidade política soberana dentro de seu próprio território;
gozando, portanto, de capacidade de exercer uso legítimo da força sem ser desafiado. Doravante, ocorre
uma grande evolução nas relações internacionais, sobretudo no que diz respeito à evolução dos sistemas
estatais.
No entanto, a evolução das teorias das relações internacionais somente ocorreu no século XX,
quando um houve um desenvolvimento mais claro deste campo. Antes disso, vale lembrar, as Relações
Internacionais eram tratadas de forma pouco sistemática. Quanto à finalidade das teorias de relações
internacionais:
“As teorias das relações internacionais têm a finalidade de formular métodos e conceitos
que permitam compreender a natureza e o fundamento do sistema internacional, bem como
explicar os fenômenos mais importantes que moldam a política mundial” (Massari e Nogueira –
grifo nosso).
Deste modo, as teoria das relações internacionais tem como objetivo lançar luz sobre as relações
internacionais; considerando a enorme complexidade de relações entre atores estatais e não-estatais.
Servem, portanto, para compreendermos melhor estas relações e dinâmicas, entendendo de que modo o
sistema internacional funciona, tanto no que diz respeito à sua natureza geral quanto à natureza de cada
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um de seus atores. As teorias de relações internacionais servem para nos esclarecer sobre o que está
acontecendo nas relações internacionais.
Ainda segundo esta concepção, os métodos seriam sistemas de abordagem, ferramentas
explicativas e também, os próprios conceitos. Com base neles, é possível fazer prognósticos e análises
específicas. Está todo mundo curioso, por exemplo, para saber o que o Trump e seus aliados vão fazer em
relação à Síria. Para isso, nós temos métodos e conceitos que podem nos ajudar a compreender um pouco
melhor o que pode ser esperado disso; ou então, uma vez consumada a ação, de que modo aquilo vai
repercutir ao longo dos anos. Essa definição do Messari e Nogueira está em um manual chamado Teoria
das Relações Internacionais, obra que costuma ser cara aos membros da banca que realizam a prova do
Instituto Rio Branco.
Cinco regras básicas do relacionamento entre Estados
Levando em consideração a teoria das relações internacionais, os Estados se relacionam de acordo
com cinco regras básicas:
Segurança
Proteção dos cidadãos (ou do próprio Estado) contra ameaças internas e externas. Trata-se
basicamente da proteção da sobrevivência da continuidade da existência do Estado ou de
seus cidadãos.
Liberdade
Trata-se do nível de autonomia do Estado e dos cidadãos. A liberdade, portanto, pode ser
individual ou nacional.
Ordem
Maneira pela qual se organizam as relações internacionais, de modo a garantir aos países
estabilidade e previsibilidade.
Justiça
Defesa de princípios éticos e do cumprimento dos Direitos Humanos, civis, políticos, sociais e
econômicos.
Bem estar Prosperidade e bem-estar socioeconômico como prioridade.
Embora estas regras sejam universais, cada teoria irá trata-las de forma diferenciada. Ainda nesta
aula, mais à frente, quando estudarmos sobre o realismo e o liberalismo, poderemos compreender
melhor. Por ora, o quadro abaixo resume as principais abordagens. Prestem atenção nesse quadro!
Escola Principal ênfase Principais desdobramentos
Realismo Segurança
Política de poder
Equilíbrio de poder
Guerra
Liberalismo Liberdade
Cooperação
Paz
Progresso
Escola inglesa
Ordem Interesses comuns
Regras
InstituiçõesJustiça
Teorias de EPI Bem-estar Desenvolvimento
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Pobreza
Igualdade
Para o Realismo, a segurança diz respeito à disputa de poder entre os Estados e os atores pelo
poder. Essa tendência de disputa pelo poder, de todos competindo entre si, pode levar a um equilíbrio de
poder, mas também pode levar a um dilema de segurança, que basicamente consistiria em uma busca por
mais segurança que paradoxalmente culminaria em mais riscos para segurança. Em suma, o realismo põe a
segurança como ênfase principal.
No caso do Liberalismo, a maior ênfase se encontra na liberdade, princípio que reflete dentro desta
teoria como uma busca pela cooperação, ou seja, não ocorre uma simples disputa de poder, nem uma
disputa clara no sentido de “testar forças”. A ideia da cooperação pressupõe a participação voluntária e
espontânea; pressupõe, portanto, que a liberdade seja respeitada. Do mesmo modo, a liberdade é um pré-
requisito para a paz e o progresso.
Já os princípios de ordem e justiça estão vinculados a Escola Inglesa. Conforme veremos na
próxima aula, esta escola enfatiza os interesses comuns entre os Estados e entre os atores internacionais,
bem como a observância das regras e às instituições existentes nesse âmbito.
As Teorias de Economia Política Internacional (EPI) dizem respeito às teorias que envolvam política
e economia; tal como o liberalismo, o marxismo. Por exemplo, as teorias marxistas (sistema-mundo,
imperialismo e teorias derivadas à ideologia marxista) vão dar uma ênfase grande no papel do
desenvolvimento vinculada ao bem estar, ao combate à pobreza e na igualdade. No marxismo não é
necessário apenas liberdade, mas também uma igualdade para que este bem estar seja atingido. Com o
avançar do curso, estes conceitos e teorias vão ficando cada vez mais interligados, principalmente entre
segurança, liberdade, ordem/justiça e bem estar em várias correntes e escolas político-econômicas.
Objetivos das teorias de relações internacionais
Podemos citar oito finalidades ou objetivos principais das teorias das relações internacionais,
conforme o quadro abaixo:
Teoria das Relações Internacionais: Definição
Atribuir sentido à complexidade
Tornar a realidade inteligível
Identificar padrões recorrentes no comportamento dos Estados e na interação entre eles
Explicar as leis da política internacional
Explicar e prever comportamentos
Tradições de pensamento
Informar e esclarecer conceitos
Criticar as formas de dominação
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A primeira delas é atribuir sentido à complexidade. O sistema internacional é bastante denso,
envolvendo um grande número de Estados, eventos bastante complicados de se entender, guerras,
acordos de paz, acordos de cooperação, acordos comerciais, etc. Dada essa complexidade, as teorias de
relações internacionais existem exatamente para atribuir nexo/sentido, achar o fio da meada e organizar
então, todas essas informações. Ou seja, tornar a realidade inteligível. Isso é importante para que
entendamos questões complexas e qualifiquemos nossas respostas, sobretudo na terceira fase da prova,
etapa que exige maior enriquecimento conceitual e teórico.
Dentro dessa complexidade toda, ou dentro dessa realidade opaca, será que existem padrões que
se repetem? Será que os comportamentos dos Estados são sempre aleatórios e caóticos ou seguem alguma
lógica? Existem regras nisso? Justamente para responder essas perguntas, as teorias também servem para
identificar padrões recorrentes no comportamento dos Estados e na interação entre eles. Assim, é
possível derivar uma lógica de como estes atores agem e interagem entre si, e de que modo, portanto,
podemos fazer uma leitura das relações internacionais; entendendo, por exemplo, quais os padrões
enfatizados pelo realismo, pelo liberalismo, etc. Isso tudo nos ajuda a compreender não só a teoria, mas
também a realidade internacional.
A teoria também ajuda a explicar as leis da política internacional. Se existem padrões recorrentes
no comportamento e na interação entre os Estados, também é possível que existam leis. Será que existe
uma Lei Geral da Guerra? Como a podemos explicar os conflitos internacionais? Como podemos explicar
também o início dos acordos de cooperação? E os acordos comerciais? E a busca de cooperação nas áreas
mais variadas? Será que existem leis que regem esses acontecimentos ou processos? Será que existe um
padrão tão recorrente que ele se tornou uma regra geral inescapável? As leis da política internacional,
portanto, ajudam a tornar a realidade mais simples e inteligível.
Com base nesses preceitos, podemos explicar e prever comportamentos. Por exemplo: será que os
Estados Unidos irão interferir na situação da Síria? Será que Estados Unidos e seus aliados irão entrar em
conflito com a Rússia? As teorias nos fornecem, portanto, as ferramentas que nos ajudariam a explicar o
que está acontecendo, o porquê destas tensões; não apenas de forma factual, mas de forma teórico-
conceitual qualificando estes fatos. Dentro deste cenário, Existem metodologias que nos vão permitir, ou
pelo menos ter a capacidade de antecipar algumas movimentações, de determinados comportamentos
estatais.
Nós também podemos definir as teorias das relações internacionais como tradições de
pensamento. Isso significa, então, que existe um acúmulo de conhecimento, de sabedoria, de fatos, de
dados, que podem nos ajudar. Então, se várias pessoas refletiram sobre um determinado assunto, isso nos
pode ser útil para informar e esclarecer conceitos.
Por fim, nós temos a ideia de que as teorias podem servir não só para explicar, informar ou
esclarecer conceitos, mas também para criticar as formas de dominação. Isso ocorre, sobretudo, com as
teorias críticas, que estudaremos rapidamente porque não costuma ser muito cobrado. A teoria feminista,
por exemplo, já apareceu na prova, é uma teoria crítica, pois está muito mais preocupada em criticar as
relações de dominação do que apontar como as coisas realmente funcionam no sistema internacional.
Grosso modo, a teoria crítica dá uma ênfase muito maior ao papel da crítica do que ao papel explanatório e
científico, do ponto de vista de fazer previsões.
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Objetos de estudo e principais divergências entre teorias
Tendo estas teorias em vista, podemos avançar e entender o que elas enfatizam, ou qual o objeto
de estudo destas teorias; e também, no que elas divergem. No quadro abaixo, estão citados o objeto de
estudo das teorias das relações internacionais, e também as principais divergências entre elas. As teorias
podem ser estudadas sob a perspectiva ontológica ou epistemológica
Objeto de
estudo
Ontologia O que podemos/devemos conhecer.
Discorre sobre o estudo do ser, sobre aquilo que nós olhados como realidade, sobre “o que
é”, o que nos interessa enquanto uma realidade existente.
Epistemologia Como conhecemos.
Discorre sobre o estudo do conhecimento, sobre o método que o conhecimento é
apreendido, a forma com que o conhecimento é acessado.
Principais
divergências
Questões éticas
Atores centrais
Relações centrais
A ontologia diz respeito ao estudo do ser, ou seja, aquilo que nós enxergamos como sendo a
realidade, sobre “o que é”. Conforme veremos posteriormente, o realismo olha para o sistema
internacional como algo que existe em si mesmo, algo factual; e por essa perspectiva, ele vai identificar,
por exemplo, as relações de poder entre Estados. Para escola realista, por exemplo, o objeto de estudo
dentro deste âmbito ontológico são as relações de poder entre os atores estatais; ou seja, entre unidades
políticas organizadas. Já para os liberais, também existe uma ênfase nas relações internacionais entre
Estados, mas envolvendo outros atores, como por exemplo, as organizações internacionais. Logo, é correto
dizer que concepção ontológica varia de acordo com cada teoria.
Corrente Ontologia principal (o que devemos conhecer?)
Realismo Relações de poder entre atores estatais
Liberalismo Relações de poder entre atores estatais e não-estatais
A epistemologia, por sua vez, diz respeito ao método. Há, portanto, uma perspectiva científica.
Será que a ciência é capaz de explicar objetivamente certos fenômenos? Será que as ideias são imutáveis
ou será que não existe verdade absoluta? Isso são questões que passam pela discussão epistemológica;
deste modo, se a ontologia é o “estudo do ser”, a epistemologia é o “estudo do conhecimento”.
No âmbito das relações internacionais, quando questionamos a configuração do sistema
internacional, ou a natureza dos diferentes Estados ou dos diferentes atores, estamos fazendo reflexões
no âmbito da epistemologia. E esses questionamentos possuem variáveis: a teoria construtivista, por
exemplo, acredita que todo o conhecimento é socialmente construído. Já o realismo, acredita que existe
uma constante, ou seja, que existem comportamentos ou padrões que se repetem.
Sendo assim, as diferentes teorias de relações internacionais possuem divergências, que se dão
sobretudo em relação às questões éticas, aos atores centrais, e às relações centrais:
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Divergências entre teorias de relações internacionais
Questões éticas
Cada teoria vai partir de um conjunto de pressupostos morais, com uma visão sobre como o mundo é ou
sobre como o mundo deveria ser; mesmo que seja como no caso do realismo, uma perspectiva quase que
isenta de reflexões morais. De qualquer modo, há um raciocínio ou reflexão sobre questões éticas. E todas
as teorias vão passar por isso. No caso do liberalismo, por exemplo, a questão ética é mais clara que no
realismo, isso porque eles enfatizam muito os princípios da liberdade, da defesa, da propriedade; em suma,
vários princípios vinculados a tradição iluminista que se inicia com a revolução francesa.
Atores centrais
As teorias também adotam diferentes perspectivas sobre o quais são os atores centrais da arena
internacional. Para o realismo, por exemplo, o que importa é a relação entre Estados, e não entre os
demais grupos nestes países. Já para os liberais, os Estados ainda têm certa primazia, mas outros atores
também podem se destacar, inclusive indivíduos.
Relações centrais
Além das questões éticas e dos atores centrais, as teorias também divergem sobre as relações centrais.
Qual é a natureza das principais relações? Quais são as principais relações que os teóricos de cada escola
enfatizam? Por exemplo, visto que o realismo se preocupa com as relações dos atores estatais;
consequentemente, as relações centrais são as relações entre Estados.
A tradição realista
Antecedentes e panorama geral do Realismo
Conforme anteriormente mencionamos, a tradição realista é a escola mais consolidada na Política
Internacional, sendo o principal paradigma teórico do ramo nos dias atuais. É amplamente utilizada por
analistas, diplomatas, escritores, políticos e demais profissionais do primeiro mundo. A maior parte dos
diplomatas americanos, secretários americanos, ou presidentes americanos, por exemplo, seguem a
tradição realista. Veremos abaixo um panorama histórico do realismo.
A tradição realista – antecedentes
Tucídides (balança de poder). Maquiavel (moral própria à política).
Hobbes (anarquia). Tragédia grega (ambição, medo e húbris).
As teorias de relações internacionais começaram a ser cientificamente sistematizadas somente no
século XX, mas suas origens remontam à Grécia antiga, quando o historiador Tucídides (460a.c-395a.c)
escreveu a História da Guerra do Peloponeso, um dos livros que deu origem à ciência histórica. Ao longo
de todo esse tempo – desde a Era Clássica, passando pela Idade Média, pela Modernidade até chegar aos
dias atuais – as ideias de Tucídides sempre foram muito presentes.
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A principal contribuição de Tucídides é a ideia de balança de poder. Nesse livro História da Guerra
do Peloponeso, ele revela e o que seria o exercício do poder, de que modo o poder funcionaria, e qual
seria a lógica do Poder. Ele faz isso a partir da análise de um fato histórico, a partir de eventos factuais.
Dentro deste livro, existe um diálogo entre mélios e atenienses, dois povos gregos. Enquanto os
atenienses eram uma grande potência, os mélios eram militarmente fracos. Os atenienses, neste diálogo,
impõem aos médios à supremacia militar, restando a estes apenas duas opções: ou a rendição ou a
completa destruição. Em seguida, os médios tentam resistir afirmando que poderiam contar com ajuda de
outros povos. No entanto, os atenienses afirmaram que ninguém teria coragem de combater contra eles,
os reis dos Mares. Os médios resistem, e conforme os atenienses anunciaram, foram trucidados pelas
frotas marítimas de Atenas. Esse diálogo é um exemplo claro da balança de poder.
Dentro desta balança de poder, os estados fazem alianças para balancear ou contra-balancear o
poder; organizar, digamos assim, um sistema internacional em que nenhum estado se sobressaia. Era
exatamente o caso de Atenas, que começava se sobressair de tal modo que nenhum outro estado teria a
coragem ou a audácia de se aliar aos mélios. Atenas, pelo menos em um período curto, conseguiu
estabelecer a sua hegemonia; no entanto, outros estados logo se organizariam para formar uma aliança
para derrota-la. Esta é a lógica da balança do poder, onde o pensamento realista está muito claro.
Tucídides (460a.c-395a.c) – balança de poder
O filósofo grego Tucídides foi o primeiro a teorizar sobre balança de poder. Trata-se
da tendência dos Estados de balancearem ou contrabalancearem o poder
hegemônico existente na arena internacional. Para evidenciar sua teoria, o filósofo
explora a disputa entre atenienses e mélios, no qual os segundos foram massacrados
pelos primeiros.
O filósofo e historiador Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi outro antecedente muito importante
para as teorias do realismo. Sua obra “O Príncipe” é bastante conhecida em vários setores da sociedade,
sendo inclusive, utilizada para além das discussões político-filosóficas; o que inclui os meios empresarial,
pessoal, esportivo, etc. Maquiavel ficou internacionalmente reconhecido por separar a moral da política, o
que deu origem à famosa ideia de que “os fins justificam os meios”. Neste sentido, importam muito mais
as consequências e os resultados de determinados atos do que a sua moralidade. É por isso que os realistas
costumam ser bastante pragmáticos, se importando mais com resultados concretos do que com processos
ou princípios morais.
Nicolau Maquiavel (1469-1527) – “os fins justificam os meios”
Por meio do livro “O Príncipe”, Maquiavel separa a moral da política. O pensamento
maquiavélico, portanto, é focado nos resultados práticos e não nos problemas
morais. Desde que os fins sejam atingidos, não importa quais meios sejam
empregados. O pensamento de Maquiavel é influente até hoje.
Após Tucícides e Maquiavel, outra influência bastante importante para o realismo foi Thomas
Hobbes (1588-1679). Em âmbito doméstico, segundo Hobbes, há um contrato social que permite a
ascensão do Estado, do Leviatã, da autoridade Central que vai impor as regras dentro do território. No
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entanto, esse contrato social ainda não havia ocorrido em âmbito internacional (pelo menos não em sua
época). Logo, para este autor, o sistema internacional não possui uma autoridade central, sem ninguém
que possa desfrutar do uso legítimo da força. Neste caso, vários estados podem fazer o uso da força de
forma descentralizada.
Logo, segundo a ideia hobbiniana de estado da natureza, o mundo é controlado de forma
anárquica, sem autoridade central, onde prevalece a guerra de todos contra todos. Sendo assim, os
Estados tendem a buscar cada vez mais poder, não apenas pelo simples prazer do controle, mas sim,
porque estes precisam se proteger de ameaças; afinal, não há segurança e/ou estabilidade em um sistema
anárquico. E daí vem a famosa frase de Hobbes: “o homem é o lobo do homem”. Por esta perspectiva,
embora a guerra seja uma instituição Internacional que deva observar regras do direito humanitário, se um
determinado Estado for mais poderoso do que todos os demais, ele pode simplesmente ignorar estas
regras que ninguém vai fazer nada a respeito.
Thomas Hobbes (1588-1679) – “o homem é o lobo do homem”
Para Hobbes, o estado de natureza do sistema internacional é anárquico, sem
autoridade central, sem poder de política, onde prevalece a guerra de todos contra
todos. Em âmbito doméstico, existe um contrato social onde o Estado fica
responsável por garantir a ordem; no entanto, esse contrato não existe em âmbito
internacional. Entender Hobbes é fundamental para entender o realismo!
Outro nome bastante conhecido no realismo político é o de Max Weber (1864-1920), que
desenvolveu as ideias de Maquiavel tornando-as mais aceitáveis. Para Weber, existem dois tipos de ética: a
ética de princípios e a ética de responsabilidade. A primeira se refere aos valores sublimes e elevados
como, por exemplo, a paz, a liberdade, ou o respeito às leis. Já a ética de responsabilidade diz respeito à
responsabilidade perante a consequência dos atos. Max Weber vai mostrar que muitas pessoas, às vezes
“embriagadas” (palavra que ele usa) pela ética dos princípios, por exemplo, em relação à Liberdade, pode
acabar fazendo mal à própria Liberdade se ela não tiver a disponibilidade de dobrar esse princípio
momentaneamente. Por exemplo: se um determinado chefe de Estado não cerceia a liberdade de um
criminoso, isso pode fazer com que esse criminoso se imponha a toda uma sociedade, acabando com a
liberdade de um número enorme de pessoas. Neste caso, paradoxalmente, é preciso limitar certa dose de
liberdade para atingir uma liberdade maior. Logo, os dois princípios andam juntos.
Este processo leva a certa relativização de princípios morais em prol de seus resultados práticos.
Neste sentido, tanto Maquiavel quanto Weber defendem que os chefes de Estado (ou os próprios Estados)
podem em alguma medida mentir ou trapacear desde que isso seja necessário para garantir, por exemplo,
a segurança dos cidadãos, ou a própria continuidade de existência de um determinado estado. Esta
manobra, embora não seja bem vista, é amplamente utilizada nas relações internacionais e domésticas dos
Estados. Na política, por exemplo, ocorre muito.
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Max Weber (1864-1920) – ética de princípios e ética da responsabilidade.
Para Weber, existem dois tipos de ética que andam juntos. A ética dos princípios se
refere aos valores elevados (paz, liberdade, etc.). Já ética da responsabilidade
consiste na responsabilidade perante a consequência dos atos. Um Estado pode, por
exemplo, sacrificar a liberdade de um criminoso (ética da responsabilidade) em prol
da segurança da população (ética de princípios).
Por fim, o realismo político também vai ser influenciado pela tragédia grega, um gênero de teatro
mais antigo que Tucídides. Este gênero trabalha com a antropomorfização; isto é, a atribuição de
características humanas ao Estado. É por isso que na linguagem dos realistas clássicos, os Estados possuem
ambição, medo, ou até mesmo hubris. De acordo com a tragédia grega, hubris é a pessoa que se deixa
embriagar ou cegar pelo poder. Contraditoriamente, esta cegueira cria uma vulnerabilidade que culmina
na sua própria queda. Muitos teóricos, inclusive, vão enxergar as relações internacionais como algo
essencialmente trágico que mais cedo ou mais tarde leva ao conflito ou à guerra.
Tragédia grega
A tragédia grega influenciou bastante o realismo político principalmente por
conta dos conceitos de antropomorfização (atribuição de características
humanas ao Estado) e hubris (pessoa que se deixa cegar pelo poder,
provocando a sua queda; no caso, o Estado). O sistema internacional é trágico
porque existe uma alternância entre paz e guerra.
A sistematização do Realismo – Carr e Morgenthau
Embora os antecedentes de Tucídides, Maquiavel, Hobbes e Weber tenham sido fundamentais, o
realismo político só foi se desenvolver no século XX com as ideias de E.H. Carl e Hans Morgenthau.
Criticando certo idealismo que no cenário acadêmico no início do século XX, Edward Hallett Carr (1892-
1982) propôs uma abordagem realista às relações internacionais; isto é, focando mais nos resultados do
que nos ideais ou nos princípios morais. Em seu livro “20 anos de crise”, Carr atribui a culpa da Primeira e
da Segunda Guerra mundiais aos liberais, a quem ele se referia como “idealistas”. Enquanto os liberais
estavam ingenuamente preocupados com ideais de liberdade, paz, ou cooperação, a Alemanha – pouco se
lidando a princípios abstratos – se armava e tentava garantir a sua hegemonia. Para Carr, a ingenuidade
dos idealistas provocou duas guerras mundiais. A alternativa, portanto, seria o realismo político que
busque priorizar resultados e não princípios. Ou seja, retomando Weber, algo que preze pela ética da
responsabilidade.
Ao contrário de Carr, que desenvolveu seu trabalho a partir de uma perspectiva histórica, o autor
Hans Morgenthau (1904-1980) também se preocupou com a perspectiva teórica. Morgenthau escreveu
um livro chamado “Política entre as nações”. Nesta obra, descreve quais os princípios, comportamentos e
padrões que regem o sistema internacional. Justamente por isso, Morgenthau é considerado um dos
principais nomes das Relações Internacionais.
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Ao estabelecerem as bases do realismo político, Morgenthau e Carr abrem um debate sobre o
questionamento do idealismo liberal; este marcado pela busca da paz, da prosperidade, da fraternidade,
da igualdade, da liberdade, entre outros princípios. Grosso modo, os idealistas propunham um cenário
futuro dizendo como o mundo deveria ser. Já os realistas, menos utópicos e mais pragmáticos, estavam
preocupados em compreender o funcionamento das relações internacionais.
O que pensavam Carr e Morgenthau, os dois principais realistas do século XX?
Edward Hallett Carr (1892-1982) – perspectiva histórica
Para Carr, as duas guerras mundiais foram causadas por idealistas liberais, que de
forma irresponsável, deixaram a Alemanha se armar e alterar a balança de poder.
Para evitar novos confrontos, seria necessário que os Estados se orientassem por
resultados práticos e não por idealismos (paz, liberdade, etc.).
Hans Morgenthau (1904-1980) – perspectiva teórica
Morgenthau, por uma perspectiva teórica, explicou e teorizou sobre os princípios,
comportamentos e padrões que regem o sistema internacional. É dele, por exemplo,
as concepções de soberania estatal, dilema de segurança ou busca pela
sobrevivência.
Seis princípios do Realismo Político
Em sua obra, Hans Morgenthau propôs seis princípios de funcionamento do sistema internacional;
princípios estes, amplamente adotados por estudos realistas posteriores. Conforme o quadro abaixo:
Seis princípios do realismo político
01 – Estados soberanos são os atores essenciais.
Neste momento, em um contexto de entreguerras, Morgenthau teorizou, de forma
bastante pessimista, que os estados são os únicos atores que importam na arena
internacional. Um exemplo disso seria a falência da Liga das Nações, entidade criada
com o objetivo de manter a paz após a Primeira Guerra Mundial. Evidentemente, com a
globalização ocorrida nas últimas décadas, esta concepção foi sendo questionada, mas era
este protagonismo estatal que vigorou em quase todo o século XX.
02 – Busca permanente pela sobrevivência, pelo poder e pela hegemonia.
Visto que o sistema internacional é anárquico (conforme teorizou Hobbes), este é marcado por uma
situação constante de risco e ameaças. Se não existe uma autoridade central garantindo a ordem, a lei ou
a observância das regras, o Estado pode contar apenas consigo próprio e não com seus vizinhos ou
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aliados; afinal, em momento de vulnerabilidade crítico, as alianças podem ser
reconfiguradas.
É neste contexto que surge a ideia de auto ajuda – a concepção de que os
Estados só podem contar com a sua própria ajuda e com seus próprios
recursos. E para isso, há uma busca permanente pela sobrevivência; o que
impulsiona a busca pelo poder. Consequentemente, a busca pelo poder, pode
levar – e normalmente leva – à busca pela hegemonia, ou seja, a busca do poder absoluto de forma que o
Estado consiga se sobressair perante aos demais.
03 – Moral, valores e ideologia são irrelevantes.
Tomando como perspectiva Maquiavel e de Weber, não é útil, para os
analistas de relações internacionais, conhecer quais são os valores, os
princípios, as crenças subjetivas dos atores envolvidos. Sendo assim, as
questões morais, religiosas e ideológicas vão ser deixas em segundo
plano. Esse pensamento foi adotado com muita frequência pelos
secretários de Estado, pelos estrategistas, pelos diplomatas, pelos
militares americanos durante a Guerra Fria, por exemplo. Na época, eles
afirmavam que o fato da União Soviética ser comunista (ou seja, com
ideologia totalmente distinta à deles) não eliminava o fato de prevalecer uma disputa pela hegemonia
internacional entre os dois Estados envolvidos.
Segundo esta concepção de Morgenthau, pouco importa, por exemplo, que o Irã seja islâmico e que os
Estados Unidos seja um país de maioria cristã. Isso, para ele, não vai afetar em nada, pois ambos vão agir
acordo com a busca pela sobrevivência, pelo poder e pela hegemonia.
04 – Jogo de soma zero
Para os realistas existe um Jogo de soma zero que significa basicamente que não existe
uma relação em que todos possam ganhar concomitantemente. Dentro do sistema
internacional, devido a esta lógica do poder, quando um Estado ganha,
necessariamente outro perde. Isso significa, por exemplo, que se os Estados Unidos
ganharem poder, necessariamente outro Estado vai perdê-lo; e isto se deve exatamente
por essa lógica do poder e da sobrevivência que se impõe no cenário internacional.
Esta é uma perspectiva diametralmente oposta ao liberalismo, que fala na ideia de um jogo de ganha-
ganha, ou seja, quando um Estado ganha por meio da cooperação com outro, principalmente no âmbito
comercial, ambos podem ter vantagens. Veremos este assunto mais à frente.
05 – Distinção entre política interna e externa
A distinção entre política interna e externa está vinculada com a separação entre
moral, valores e ideologias. Isso quer dizer, basicamente, que o processo interno
da política interna de um país não reflete na sua política externa. Conforme
veremos adiante, outros autores desenvolveram esta ideia, como o neorrealista
Kenneth Waltz.
Por essa perspectiva, os Estados funcionariam como bolas de bilhar em um
sistema internacional, no qual só é possível enxergar a superfície e não o centro.
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Logo, o que ocorre dentro do âmbito doméstico não tem relevância, e isso inclui os valores do partido
eleito ou da maioria da população. Neste sentido, pouco vai mudar, por exemplo, se o presidente do Brasil
for Lula ou Bolsonaro, pois ambos vão atuar de acordo com a lógica do poder inerente ao sistema
internacional.
06 – Dilema de segurança
Conforme vimos anteriormente, a ideia do dilema de segurança tem a ver com a busca permanente pelo
poder e pela hegemonia. Visto que o sistema internacional não conta com poder de polícia e que os
Estados só podem contar com a autoajuda, há uma busca constante pela sobrevivência, pelo poder e pela
hegemonia.
Se um Estado pode contar apenas consigo próprio, é necessário se
armar e se proteger; ou seja, dissuadir os outros Estados de ataca-lo e
garantir assim, a sua sobrevivência. Só que quando um Estado
aumenta o seu poder, isso gera desconfiança em outro Estado,
que consequentemente também vai aumentar o seu poder. E
aumentando seu poder, faz com que o primeiro estado também
volte a aumentar. Isso gera uma corrida armamentista
interminável. O dilema de segurança é exatamente isso: a
excessiva preocupação com a segurança, ao invés de gerar a
própria segurança, acaba acirrando as tensões e elevando o risco
de conflitos.
Tendo o quadro e o texto acima em vista, os principais pressupostos do realismo são:
A tradição realista: principais pressupostos
Anarquia
internacional
O sistema internacional é sempre anárquico. Não significa que há o caos, mas apenas a
ausência de uma autoridade central, ausência de um poder de polícia. Há ali, certa
incerteza em relação ao destino das nações, porque não há ninguém mantendo a
ordem.
Sistema
internacional
conflitivo
Como há uma anarquia, isso leva a um sistema internacional conflitivo. Basicamente,
há uma busca constante pela sobrevivência que leva a uma busca por poder, que tem
um efeito colateral de gerar mais preocupação (dilema da segurança).
Centralidade do
Estado
As relações internacionais giram em torno do Estado, neste caso, o que importam são
os atores estatais.
Jogo de poder
A lógica que se impõe no realismo é a lógica do poder. Ou seja, o que importa não é a
questão moral (busca pela paz, liberdade, etc.), mas sim, o poder, pois é ele que garante
a sobrevivência do Estado.
Sobrevivência A sobrevivência, portanto, está no centro das relações internacionais.
Desconfiança e
auto-ajuda
A busca pela sobrevivência em um sistema anárquico e conflitivo leva à desconfiança. O
Hobbes fala em um estado de natureza em que há uma guerra de todos contra todos,
ou seja, supõe que o ataque pode vir de qualquer lado. Todos são inimigos em
potencial, e isso evidentemente, gera uma grande desconfiança, que também pode ser
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resumida na frase do Hobbes: “o homem é o lobo do homem”. No caso, o Estado seria
o lobo do Estado.
Esta desconfiança gera a lógica da autoajuda. Ou seja, a ideia de que ao não confiar em
nenhum outro Estado, os Estados confiam apenas em si próprios, podendo contar
apenas com a sua própria ajuda.
Cooperação
(dentro da
lógica de poder)
A auto-ajuda gera uma cooperação dentro da lógica de poder. Só há cooperação
quando há interesse. Desfeito o contexto de interesse, a cooperação é desfeita
(exemplo dos EUA e URSS que lutaram lado a lado e depois desfizeram a aliança e
entraram na tensão da Guerra Fria). A cooperação é sempre momentânea, pontual e
atende à lógica de poder.
Tendo esses pressupostos em vista, e retomando a ideia da Tragédia Grega, a política sempre
acaba em tragédia. Sempre vai ter um Estado desafiando ao outro, novas potências contestando velhas
potências, e isso leva o sistema internacional a uma constante mutação de sua configuração e a uma série
de conflitos. Existem diferentes arranjos mais ou menos estáveis, arranjos que são mais ou menos
propensos ao conflito.
Com base nestes pressupostos, os realistas podem aplicar a teoria à prática. Será, por exemplo,
que a bipolaridade que havia na Guerra Fria era mais ou menos pacífica do que a multipolaridade? Será,
por exemplo, que a ascensão da China provocará um conflito com os Estados Unidos? Muitos teóricos
realistas, como John Mearshaimer, acreditam nessa possibilidade. Conforme a China cresce, ela poderá
interferir nos interesses americanos, e além do choque comercial-econômico como já ocorre, também
existirá uma disputa político-militar.
CAI NA PROVA
Cespe/UNB (CACD/2010)
1. O paradigma realista de análise das relações internacionais enfatiza as relações de poder entre as comunidades
políticas e organizadas. De acordo com essa visão, prevalecem nessas interações as relações de força e
desconfiança, o que acaba conduzindo ao chamado dilema de segurança.
COMENTÁRIO
De fato, a tradição realista enfatiza as “relações de poder” entre “comunidades políticas e organizadas”, o
que seriam os Estados nacionais. Também está correto o fato de que prevalecem nestas interações as
relações de força e desconfiança (princípio de autoajuda). Sendo assim, para se protegerem e garantirem a
sua sobrevivência na anarquia internacional, os Estados acabam investindo pesado em armamentos. No
entanto, essa preocupação excessiva com segurança acaba conduzindo ao “dilema de segurança”. Este
dilema significa que paradoxalmente, ao investirem em segurança, os Estados aumentam a desconfiança de
outros Estados que também acabam investindo em segurança e no final, o risco de conflito aumenta.
Gabarito: Certo
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Cespe/UNB (CACD/2010)
2. A referida teoria baseia-se, em grande medida, no princípio da antropomorfização dos Estados nacionais, no
sentido de que estes podem ser caracterizados como entidades possuidoras de atributos psicológicos humanos,
tais como honra, decepção e desejo de glória e poder.
COMENTÁRIO
Sim, no realismo ocorre a antropomorfização dos Estados, ou seja, a atribuição de características psicológicas
humanas ao ator estatal; então, a questão está correta. Gabarito: Certo
Correntes do realismo: realismo clássico, realismo científico e realismo
estrutural (neorrealismo).
Analisando a história do realismo, há uma grande evolução que vem desde Tucídides, passando por
Maquiavel, Hobbes e Weber; e aí sim, como teoria das relações internacionais, surgindo com Carr e
Morgenthau, criando aquilo que ficaria conhecido como realismo clássico.
Posteriormente, surgiram outras vertentes de realismo, como por exemplo, o neorrealismo, cujo
maior expoente foi o norte-americano Kenneth Waltz (1924-2013). Waltz trouxer mudanças mais
epistemológicas do que ontológicas para o realismo, com a preocupação de atribuí-lo uma qualificação
científica mais robusta.
Sendo assim, além da antropomorfização e do vínculo com a literatura e a filosofia que o
Morgenthau fazia, o realismo poderia adotar alguns princípios behavioristas, trabalhando com a ideia de
cálculo racional; ou seja, a ideia de que todos os atores buscam maximizar os seus ganhos e reduzir na
máxima medida possível, as suas perdas. Ele passa a adaptar isso às relações internacionais e daí vem o
realismo estrutural ou neorrealismo. No quadro abaixo é possível entender melhor esta distinção:
A tradição realista: principais vertentes
Realismo clássico
Crítica ao idealismo (Carr)
Teoria pura das Relações Internacionais (Morgenthau)
Base Histórica e Filosófica
Antropomorfização
Realismo científico (Waltz)
Matematização (Modelagem/Teoria dos Jogos)
Metodologia das Ciências Naturais
Realismo estrutural (Neorealismo) (Waltz)
Ênfase na estrutura do Sistema Internacional
(behaviorismo)
Duas Vertentes: Realismo Defensivo e Realismo Ofensivo
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Conforme vimos anteriormente, o realismo clássico consistia em uma crítica ao idealismo
(principalmente com Carr) e a busca por uma teoria pura das relações internacionais com o Morgenthau
(se se preocupava com teorias puras). Ambos foram influenciados por Maquiavel, Hobbes, Webber, e
demais filósofos, pensadores ou historiadores. Logo, o ferramental do realismo clássico era
predominantemente humanístico, usando filosofia, literatura, fatos históricos, para pensar as relações
internacionais. É deste contexto, por exemplo, que surgiu a ideia de antromorfização; ou seja, a tentativa
de entender as relações entre Estados de acordo com a psicologia humana.
Com o realismo científico proposto por Kenneth Waltz, a base humanística – embasada na filosofia,
na história e na literatura é enfraquecida. Waltz tenta fazer uma matematização dos pressupostos do
realismo, utilizando modelos estatísticos e também teoria dos jogos, cálculos racionais que permitem
compreender uma série de situações. Busca, portanto, metodologias das ciências naturais.
Kenneth Waltz (1924-2013) – neorrealismo e realismo científico
Com a preocupação de atribuir uma carga científica mais robusta ao realismo,
Waltz foi o principal idealizador do realismo científico e do realismo
estrutural (neorrealismo). Se o realismo clássico (correntes pré-Waltz) tinha
uma base humanística mais carregada, as correntes propostas por Waltz
adotavam métodos matemáticos, estatísticos e comportamentais.
No entanto, o realismo clássico possui uma importância muito maior do que o científico. O que o
científico faz é trazer algumas questões epistemológicas que aí sim, vão dar origem ao neorrealismo,
corrente também concebida por Waltz. O realismo estrutural (neorrealismo), parte desta base mais
científica que tenta observar algumas metodologias das ciências naturais, mas tem como principal
característica a ênfase na estrutura do sistema internacional, motivo pelo qual o neorrealismo também é
chamado realismo estrutural (ênfase na estrutura do sistema internacional adotando princípios
behavioristas, partindo de certa matematização também).
E aí surgem duas vertentes: o realismo defensivo e o realismo ofensivo. Basicamente, a diferença
entre ambos é que os adeptos do realismo defensivo (como o próprio Waltz) vão dizer que os Estados
estão preocupados com a sobrevivência, e que para eles, basta ter a garantia de que continuarão
sobrevivendo. Portanto, eles buscam tanto poder quanto seja necessário para sobreviver. Já os
neorrealistas ofensivos acreditam o contrário: a sobrevivência é sim importante, mas que por isso mesmo,
os Estados sempre adotam uma postura ofensiva, de expandir o seu poder cada vez mais
independentemente da situação, que ele jamais vai se sentir seguro. Para os realistas ou neorrealistas
ofensivos os Estados devem sempre expandir o seu poder, independentemente das consequências até que
o conflito ocorra.
Subvertentes do neorrealismo
Realismo defensivo
Os Estados devem procurar poder suficiente para garantir a sua sobrevivência
(postura defensiva)..
Realismo ofensivo
Justamente porque a sobrevivência é importante é que os Estados devem expandir
seu poder o máximo possível (postura ofensiva)
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Para entendermos esta diferença na prática, vamos voltar ao John Mershaimer, autor já citado por
conta da ascensão chinesa. O autor enfatiza que devido ao crescimento da China e a sua ascensão
enquanto potência regional, ela não vai poder adotar uma postura defensiva para sempre. Segundo esta
perspectiva, se a China continuar crescendo, irá necessariamente entrar em conflitos dentro do próprio
contexto asiático ou indo-pacífico, como por exemplo, com a Índia ou o Japão. Seria nesse momento que
os Estados Unidos interviriam, provocando um choque entre a ascendente China e a já estabelecida
potência norte-americana. Um neorrealista defensivo poderia negar esta realidade, afirmando que
embora a China esteja ampliando seu poder, ela ainda não se sente ameaçada e, portanto, não iniciaria um
conflito de forma independente. Um conflito, neste caso, ocorreria somente se houvesse uma falha de
percepção que levasse a China a ideia de que os Estados Unidos poderiam atacá-la a qualquer momento.
Repare, no quadro abaixo, que tanto o realismo clássico quanto as correntes recentes
(neorrealismo e realismo científico) acreditam nos mesmos pressupostos e princípios. Logo, a diferença
está no método empregado, e não na essência.
Realismo clássico Neorrealismo e realismo científico
Moralidade
Separação entre moral pessoal e moral
do estado
Separação entre moral pessoal e moral do
estado
Atores
Estados nacionais são os principais
atores
Estados nacionais são os principais atores
Relações Relações de poder entre estados Relações de poder entre estados
Ontologia
Interação entre estados no sistema
internacional.
Interação entre estados no sistema
internacional.
Epistemologia
Humanística (fatos históricos, raciocínio
filosófico)
Matemático-estatístico. (abordagem
racionalista)
O realismo clássico adota o antropomorfismo estatal, atribuindo características do homem para o
Estado, que seria dotado de ambições, glória, honra, medo, etc. Há um certo moralismo, não no sentido de
se preocupar com questões éticas, mas no sentido de ver essas relações com aquela visão de tragédia,
como se fosse algo negativo; ou seja, de forma pessimista. Por outro lado, os neorrealistas não vão atribuir
sentimentos às relações internacionais, mas sim tentar entendê-las como elas são; portanto, há uma
abordagem racionalista; ou seja, behaviorista (da palavra behavior que significa comportamento). A ideia
central é que os Estados adotam comportamentos racionais, que podem ser calculados e medidos de
modo bastante objetivo, havendo uma ênfase nos condicionantes do sistema e no comportamento dos
Estados dentro destes condicionantes.
Conforme vimos acima, o neorrealismo também é chamado de realismo estrutural, havendo uma
predominância nos condicionantes do sistema. Logo, para esta corrente, há um enfoque na configuração
de poder dentro do sistema, ou seja, a lógica e o comportamento adotado pelos Estados. Essa abordagem
racional pressupõe uma busca pelas respostas racionais dos atores estatais aos desafios e condicionantes
postos pelo sistema internacional. Basicamente, há uma troca do antropomorfismo pela abordagem
racional pautado pelo cálculo racional que os estados devem fazer para maximizar seus ganhos e
minimizar suas perdas. Se no realismo clássico há um pessimismo de que tudo acaba em tragédia, de que
tudo vai acabar muito mal, simplesmente porque essa é a natureza das coisas; no realismo estrutural,
parte-se de uma ênfase no sistema internacional e na sua configuração. Então essa é a principal diferença
entre o realismo clássico e o neorrealismo.
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Tanto no neorrealismo quanto no realismo científico, o autor mais importante é o do Kenneth
Waltz, o pai dessa vertente. Como ele já faleceu, atualmente estas correntes são seguidas por nomes como
Robert Jervis, Stephen Walt, e John Mearsheimer. O quadro abaixo resume as principais distinções entre
realismo clássico, realismo científico e neorrealismo.
Realismo clássico
• Antropomorfismo estatal, moralismo, pessimismo.
• Base humanística (literária, histórica, filosófica, etc.)
• Influências de Tucídides, Maquiavel, Weber, Hobbes
• Sistematização com Carr e Morgenthau.
Realismo científico
• Base estatístico-matemática
• Metodologias das ciências exatas e biológicas, com forte influência positivista
• Principal autor: Kenneth Waltz.
Realismo estrutural ou neorrealismo
• Abordagem racionalista com ênfase nos condicionantes do sistema
• Influência do behaviorismo
• Principal autor também é Kenneth Waltz.
• Realismo defensivo e realismo ofensivo
A tradição liberal
Antecedentes da tradição liberal
Junto à tradição realista, a tradição liberal é a mais importante nas relações internacionais. Assim
como no caso do realismo, foi apenas no século XX que o liberalismo surgiu no campo das relações
internacionais. Por questões de foco, não vamos estudar o “liberalismo econômico”, nem o “liberalismo
político” – estes sim com sólidos antecedentes antes do século XX – mas sim, focar nas relações
internacionais. As raízes do liberalismo podem ser rastreadas até o iluminismo, seja ele francês, alemão ou
inglês. Portanto, esta corrente possui certa influência de figuras como Kant, Russeau, Locke; nomes que
foram importantes para definir o conjunto de valores e princípios que regem, de algum modo essa tradição
teórica que é chamada de tradição liberal, mas que também é conhecida como tradição idealista,
justamente por dar ênfase aos princípios morais, éticos e filosóficos.
No quadro abaixo, são evidenciadas as principais ideais dos principais autores que antecederam e
influenciaram o pensamento liberal, que são: Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), Immanuel Kant (1724 -
1804), Adam Smith (1723 - 1790), John Locke (1632 - 1704) e Hugo Grotius (1583 - 1645).
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Antecedentes e influências da tradição liberal
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778)
Ao contrário do pensamento realista de Hobbes (homem é o lobo do homem, ou
seja, natureza inclinada ao mal), Rousseau defendia que a natureza humana era
essencialmente boa.
Para Hobbes, se deixados à sua própria sorte, naquele estado de natureza, os
homens tenderiam a fazer guerra de todos contra todos.
Para o Rousseau, no entanto, o homem teria uma natureza essencialmente boa,
porém, seria corrompido pelas instituições, pela propriedade privada, e por
outros fatores sociais.
Enquanto o pessimismo de Hobbes influenciou o realismo político, o idealismo de
Rousseau influenciou o liberalismo.
Immanuel Kant (1724 - 1804)
(Racionalismo e Cosmopolitismo)
Sendo uma das influências mais importantes na tradição liberal, Kant defendia o
racionalismo. Ou seja, a ideia de que pelo uso da razão, pela comunicação clara,
pela reflexão, seria possível chegar à resolução de todos os problemas sociais e
políticos. Kant também pregava o cosmopolitismo, que diz respeito ao
universalismo dos valores, tais como paz, liberdade e prosperidade.
Estaria assim, formada a base do pensamento liberal. A natureza humana seria
essencialmente boa e inclinada para o bem (Rousseau); a razão humana possuiria
a capacidade de resolver problemas (Kant); e os valores adotados pelos liberais
(liberdade, paz, prosperidade), seriam valores universais, ou seja, não variariam de
cultura para cultura (Kant).
Adam Smith (1723 - 1790)
Smith possui uma enorme influência na tradição liberal, sobretudo nas ideias de
comercio internacional, do comércio em geral, e liberdade econômica.
Smith foi um dos principais teóricos do capitalismo, sistema econômico que
ganhou força após a Revolução Industrial. Segundo este, o capitalismo seria
definido por meio da troca voluntária de trabalho e regido pela “mão invisível” do
livre mercado; ou seja, um sistema que dá autonomia para o indivíduo.
John Locke (1632 - 1704)
As contribuições principais de Locke são a ideias de contratualismo, ou seja, a
concepção de que os indivíduos devem escolher suas instituições e
representantes; e também a de propriedade privada, tanto no sentido de algo que
você possui (casa, carro, um bem que deve ser respeitado e tomado como algo
sagrado), quando no sentido de auto-propriedade (ideia de que você deve ter o
direito de defender a sua vida em todas as circunstâncias, porque o seu corpo, a
sua vida, é a sua primeira propriedade).
O Locke traz a defesa da liberdade, da propriedade e da vida. A vida defendida
por meio da paz; a liberdade e a propriedade por meio das instituições.
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Hugo Grotius (1583 - 1645)
Embora tenha antecedido os pensadores citados acima, Grotius é considerado um
dos fundadores do direito internacional, cujas regras serviram de base para as
concepções iluministas que surgiriam no século XVII.
Retomando os pontos centrais do quadro acima, Rousseau contrasta com Hobbes, explorando a
ideia do “bom selvagem”, de que o homem em sua origem, vivia pacificamente, harmoniosamente, e que
isso foi sendo perdido conforme as instituições sociais foram sendo criadas de modo a pervertê-las. Na
essência do liberalismo, portanto, existe essa visão de que a natureza humana é uma natureza boa e que
em determinadas circunstâncias, se ocorrerem os estímulos corretos, o homem sempre vai buscar a paz,
a cooperação, as relações espontâneas, seja por meio do comércio ou outros tipos de relações. E isso vai
ser muito enfatizado pelos teóricos liberais.
É por isso que os liberais dão uma ênfase muito grande ao regime democrático, fazendo uma
grande defesa das democracias, do império das leis, do sistema representativo, ou seja, as democracias
liberais. Também vão fazer uma grande defesa do livre comércio, da liberdade de compra e venda, da
liberdade de empreender, da livre iniciativa com influência mais clara de Adam Smith e outros
economistas liberais. Por meio do Kant, temos a essa ideia do racionalismo iluminista. Aquela ideia de que
a razão é capaz de resolver todos os problemas humanos e sociais desde que haja espaço para
comunicação, para troca de informações. Ainda para Kant, temos a ideia de cosmopolitismo, ou seja, a a
ideia de que os valores como a liberdade, o individualismo, democracia, são, ou pelo menos devem
aspirar ser, universais. E isso possui uma relação estreita com a Revolução Francesa, quando pensamos em
igualdade, liberdade e fraternidade.
Conceitos centrais da tradição liberal
Tendo os antecedentes em vista, segue abaixo um quadro-explicativo com os principais conceitos
da tradição liberal, que são: valorização de outros atores que não sejam os estatais, interdependência
complexa, busca de ganhos compartilhados e necessidade de cooperação internacional, diferenças entre
hard power e soft power e relações entre política interna e externa; e finalmente, a tríade entre guerra
justa, intervenções humanitárias e responsabilidade em proteger (R2P).
Conceitos centrais da tradição liberal
01 – Valorização de outros atores (não-estatais, OIs, ONGs, multinacionais)
Diferentemente da tradição realista, a tradição liberal também considera os atores não estatais, e não
somente o Estado. Nessa categoria entram as organizações internacionais, as organizações não
governamentais, as empresas multinacionais; e inclusive, alguns indivíduos que podem ser considerados
atores internacionais relevantes, desde que tenham a abrangência e capacidade de afetar as relações
internacionais. Um exemplo de indivíduo que possui agência internacional é o investidor George Soros,
homem que possui, inclusive, o poder de decidir o rumo de algumas nações específicas. Basicamente por
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meio de suas movimentações na bolsa de valores, Soros foi responsável pela quebra do banco da
Inglaterra e pela insolvência da moeda tailandesa. Para os liberais, portanto, essas relações também
devem ser consideradas.
Ao contrário do realismo – cuja ideologia e pressupostos morais são pouco
relevantes – o liberalismo considera os valores defendidos por líderes de
Estado, como por exemplo, presidentes da república. No realismo, não há
nenhum impacto claro dos valores, princípios e ideologias nas relações
interacionais, tampouco na atuação dos estados no âmbito externo. Já para
os liberais, ocorre o contrário: as ideologias valores e princípios impactam
diretamente as relações internacionais, determinando, portanto, sua
própria orientação. Do mesmo modo, ao contrário da concepção realista de
“bola de bilhar”, para o liberalismo, o que acontece dentro dos Estados, em
âmbito doméstico, afeta diretamente o que ocorre no âmbito externo.
02 – Interdependências complexas entre atores e agendas
Visto que o liberalismo considera a multiplicidade de autores, há uma concepção de interdependência
complexa entre atores e agendas. Primeiramente, os atores dependem uns dos outros, principalmente no
que diz respeito ao comércio, às comunicações, aos fluxos migratórios, e às demais relações internacionais
que ocorrem no mundo. Ou seja, uma dependência mútua entre os atores internacionais; entre os
estados, as ONGs, as organizações não governamentais. Isso significa, por exemplo, que, os EUA mantém
relações comerciais com a China, e portanto, dependem dessas relações comerciais para manter e
sustentar a sua prosperidade e o seu crescimento econômico: muitas empresas americanas pautam toda a
sua existência, toda a sua atividade, em torno de produtos vindos ou enviados da/para China. Isso significa
então, que existe uma interdependência bastante complexa de modo que algo que impacte uma das
partes, também pode impactar a outra.
Esta multiplicidade e interdependência de relações cria um cenário
internacional volátil. Ou seja, ao contrário do que ocorria
antigamente, os Estados nacionais não têm tanta margem para saírem
guerreando uns com os outros sem grandes consequências. O
comércio, por exemplo, é uma instituição que incita a cooperação e
diminui os riscos de conflitos. Segundo os liberais, Estados que mantém
relações comerciais livres uns com os outros têm a tendência de não
irem para a guerra. Portanto, é possível buscar a paz por meio do
comércio, não porque os estados sejam pacíficos ou não queiram a guerra,
mas porque eles sabem que ao entrar em guerra, os interesses tanto dos Estados quanto de seus cidadãos
vão ser afetados. Se os Estados Unidos atacarem a China, por exemplo, pode ser que empresas
americanas instaladas em território chinês sejam destruídas. Além do comércio, a interdependência
também ocorre por meio do turismo, das redes de comunicação, e de outras formas de integração.
Além disso, nós temos que levar em consideração a interdependência complexa das agendas. Para os
realistas, a agenda prioritária, e talvez a única que importe, seja a agenda do poder, que lida com questões
de segurança (sobrevivência no centro de todas as relações). No entanto, para os liberais, a agenda de
segurança está relacionada com outras agendas, como por exemplo, a de meio ambiente, a de
desenvolvimento econômico, ou a de direitos humanos. A segurança, por exemplo, pode ser impactada de
acordo com o regime implantado em cada país (república, ditadura, democracia, anarquia, etc.), que pode,
por sua vez, ser afetada por questões ambientais, de direitos humanos, de economia, etc. Essa
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interdependência ocorre tanto entre os atores quanto entre as agendas, sem uma hierarquia clara.
03 – Busca dos ganhos compartilhados/ Cooperação internacional não é só possível como necessária
Em contraste com o jogo de soma zero (realismo), o liberalismo prega a busca dos ganhos
compartilhados. Isso significa que partindo dessa premissa liberal de que o comércio, as relações
espontâneas e a cooperação são benéficos, os Estados podem ter ganhos compartilhados, sem
necessariamente uma das partes sair perdendo.
Nesse caso, é possível que os dois vençam juntos, significando que quando
um Estado oferece algo que outro Estado deseja, e este oferece algo em
troca, os dois podem se beneficiar por meio da cooperação. Isso não
significa, porém, que os dois vão ganhar igualmente, mas sim, que podem ter
ganhos relativos.
Vamos imaginar um exemplo hipotético no qual tanto o “Estado A” quanto o “Estado B” crescem
igualmente 3% ao ano. Após uma eventual cooperação comercial, o “Estado A” passa a crescer 5% e o
“Estado B”, 7%. São ganhos diferentes, mas ambos estão assumindo patamares melhores. Isso é, portanto,
um jogo de ganha-ganha, pois todos os atores envolvidos estão se beneficiando por meio da
cooperação. Esta perspectiva é, portanto, oposta ao do realismo que enfatiza a lógica do poder no qual os
estados estão todos em disputa em uma guerra de todos contra todos. Logo, para os liberais, a
cooperação internacional não só é possível, como é necessária.
04 – Hard Power e Soft Power/Política interna afeta política externa
Os liberais também tratam da divisão entre hard power e soft power. Hard power é o
poder tangível, tradicional, das relações de poder, da força, militar, da agenda de
segurança muito relacionada ao próprio realismo. Já o soft power é um poder mais
brando, oriundo da capacidade de influenciar por meio das ideias, dos valores, da
cultura e da imagem que se projeta internacionalmente.
Sendo assim, os liberais dão uma grande ênfase à importância do soft power em um
mundo de interdependência complexa. Diferentemente do realismo, eles defendem
que a politica interna afeta a política externa. Então, para o Kenneth Waltz, o Estado
era visto como uma bola de bilhar que podíamos ver apenas a superfície. Contudo, os
liberais pensam ao contrário: o Estado não seria uma bola de bilhar, mas sim, algo
totalmente transparente que precisa ser analisado desde dentro, observando por
exemplo, o regime, os valores, ou partido que está no poder daquele Estado.
05 – Guerra Justa/Intervenções humanitárias/R2P
Por fim, alguns conceitos que os liberais enfatizam que dizem respeito à agenda de segurança é a ideia
combinada de guerra justa, intervenções huminatárias e R2P (responsability to protect). De acordo com
os liberais, a guerra justa é somente a guerra de legítima defesa. Por essa lógica, um Estado só está
justificado a entrar em um conflito quando ele está se defendendo de um ataque prévio, tanto a si próprio
quanto a terceiros. Caso contrário, nada justifica a guerra.
A exceção desta regra ocorre quando o Estado executa intervenções humanitárias em outro Estado. Isso
pode acontecer, por exemplo, quando o Estado “atacado” viola as obrigações de fornecer segurança ou
proteger os direitos humanos de seus cidadãos. Neste caso, a ONU, por exemplo, pode interferir porque
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esta organização internacional possui uma responsabilidade de proteger (R2P).
Sendo assim, o Estado só pode entrar em guerra para se defender (guerra justa), ao menos que
intervenções humanitárias sejam necessárias, pois estes possuem responsabilidade de proteger (R2P).
É importante perceber, portanto, que ao contrário do realismo, o
liberalismo coloca o indivíduo e a sociedade civil acima do Estado.
Vejamos um exemplo hipotético. Suponhamos que o Estado brasileiro
comece a assassinar pessoas de modo totalmente arbitrário, cometendo
genocídio contra sua própria população. Muito provavelmente esse fato
seria levado para organizações internacionais (ONU, OEA, UNASUL, etc.)
para ser discutido e deliberado. A Síria e a Venezuela estão passando por
essa situação.
Principais pressupostos da tradição liberal
Uma vez entendidos os antecedentes e os conceitos centrais da tradição liberal, estudaremos
alguns de seus principais pressupostos:
A tradição liberal: principais pressupostos
Livre comércio
 Prosperidade
 Paz
O livre comércio se baseia na liberdade de empreendimento e na livre
iniciativa nas relações espontâneas entre indivíduos e/ou Estados. Quando
existe o comércio, existe uma pessoa que voluntariamente deseja comprar de
uma pessoa que voluntariamente deseja vender, formando um vínculo social
totalmente espontâneo e livre, sendo uma das bases para relações mais
pacíficas e prósperas. Este conceito é válido tanto para o comércio em âmbito
domestico quanto internacional.
Democracia
 Prosperidade
 Paz
No realismo, as ideologias e valores não afetam a política externa; já no
liberalismo, alguns valores estão no centro das relações internacionais. Estes
valores precisam estar presentes para que a natureza boa do homem não seja
corrompida (Roussseau). Sendo assim, a prosperidade e a paz podem ser
atingidas por meio da democracia, sistema onde há maior liberdade individual.
Este sistema política é importante, inclusive, porque os liberais acreditam que
democracias não entram em guerra entre si (teoria da paz democrática).
Neste caso, quando há duas democracias próximas de um conflito, as
populações levariam seus chefes de estado a buscarem soluções pacíficas para
as controvérsias.
Instituições
 Prosperidade
 Paz
A própria democracia pressupõe instituições; pressupõe que haja, por exemplo,
uma instituição de representatividade da população eleita. Exige também que
exista um império das leis aliado a um sistema judiciário para julgar essas leis.
Elas garantem as liberdades individuais, os direitos humanos, e a liberdade da
população de fazer as melhores escolhas levando em consideração os seus
valores, seus interesses e não somente o “interesse nacional” abstrato como os
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fazem os realistas.
Foco no indivíduo
Ao contrário do realismo, o liberalismo foca no individuo; rejeitando assim, a
ideia utilitária de que se pode sacrificar um individuo em prol da maioria. Sendo
assim, o individuo é mais importante que o Estado.
Cada indivíduo possui um valor próprio que não pode ser instrumentalizado ou
relativizado. A concepção maquiavélica de que os “fins justificam os meios” é,
portanto, rejeitada pelo liberalismo.
A pessoa não pode, por exemplo, ser assassinada apenas para garantir a
segurança de outras pessoas. Acreditam, portanto, que o interesse individual
não pode ser sacrificado em nome do interesse nacional. Não é correto
relativizar as instituições, substituir a democracia por uma ditadura ou adotar
posições protecionistas. Os liberais acreditam que estes valores são os únicos
que garantem as liberdades e os direitos individuais.
Autopropriedade e
propriedade
Este pressuposto significa que a ideia de que a propriedade individual é um
valor que deve ser respeitado a todo custo, tanto a propriedade no sentido
externo (propriedade privada material) quanto a autopropriedade (vida
humana). De com Locke, a vida deve ser defendida porque é a primeira
propriedade que deriva todas as outras. E aí retomamos a ideia de guerra justa,
no qual o único conflito justificado é o conflito de autodefesa.
Crença na razão
A crença na razão é derivada do iluminismo, principalmente do iluminismo
francês e alemão, mas um pouco do inglês e holandês. De modo geral, trata-se
da ideia de que a razão humana é quase que ilimitada na sua capacidade e
pode encontrar soluções para todos os problemas, não apenas problemas
naturais ou exatos e objetivos, mas também problemas sociais. A democracia e
o livre comércio, por exemplo, seriam artifícios criados pela razão humana e que
garantiriam um ambiente mais próspero.
O estado é um perigo
para os indivíduos
Se no realismo político, o Estado pode ser perigoso para outro Estado, no
liberalismo, a situação é mais complexa. Pela ótica liberal, o Estado não
somente é um perigo para outro Estado, mas também para indivíduos que
precisam ser protegidos a todo custo. Desta premissa que deriva a ideia de
responsabilidade de proteger (R2P) e de intervenções humanitárias.
Neste ponto, a principal distinção entre o realismo e o liberalismo, é que o
liberalismo dá uma ênfase muito grande para os valores, enquanto os realistas
dão uma ênfase muito grande para os resultados.
Comparando o realismo com o liberalismo, podemos chegar à seguinte conclusão:
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Realismo Liberalismo
Epistemologia
Tanto realismo quanto liberalismo são teorias que explicam as relações internacionais,
sendo possível prever acontecimentos futuros de acordo com pressupostos racionais.
Ontologia
O objeto central são as relações de
poder entre Estados.
O objeto central são as relações de cooperação
entre indivíduos e seus desdobramentos
institucionais, no qual o Estado é somente mais
um desdobramento.
Atitude moral
O que importa são os resultados
(pragmatismo). Reflexões morais
devem ser separadas da pratica
politica.
Tem um núcleo de valores iluministas que
(liberdade, igualdade e fraternidade), que devem
ser defendidos. Não se preocupa só como as
relações internacionais são, mas como devem ser.
Atores Estado é o principal ator.
Estado é um ator importante, mas existem outros
atores também.
Neoliberalismo
A partir da década de 1970, o mundo passa por uma série de transformações que acabam
determinando a necessidade de revisão da teoria liberal. Entre estas mudanças estão o aumento da fluidez
do sistema financeiro internacional, a relativização do padrão ouro, e principalmente, a intensificação da
interdependência tanto entre os atores quanto entre as agendas. Neste sentido, os neoliberais tentam
entender de que modo estas mudanças afetam as relações internacionais. O quadro abaixo resume os
principais pressupostos do neoliberalismo (alguns são bem parecidos com o liberalismo clássico).
A tradição liberal: neoliberalismo
01 – Intensificação da interdependência
Com a crescente complexidade e interdependência entre os atores, os Estados precisam ser ajudados por
meio da cooperação criando organizações internacionais para administrar estes problemas e para explorar
melhor as oportunidades que surgem disso. Então, essas organizações e regimes se tornam proeminentes
para a administração de conflitos e interesses.
Assim como os liberais, os neoliberais afirmam que não se deve considerar somente o Estado como ator
internacional, pois as demais organizações possuem uma relevância crescente no mundo atual. Na
atualidade, inclusive, os indivíduos possuem cada vez mais meios de se manifestar; o que acaba alterando
o processo de tomada de decisão dos Estados nacionais. Com a globalização e o avanço da técnica, a
interdependência entre atores torna-se cada vez mais complexa e dinâmica.
02 – Regimes e organizações internacionais se tornam proeminentes na administração de conflitos e
interesses
Tendo o aumento da interdependência em vista, os Estados não dão mais conta de administrar as
relações entre os atores internacionais. Os Estados, portanto, não conseguem mais controlar tudo que
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ocorre através de suas fronteiras, tanto do ponto de vista territorial quanto do aspecto imaterial (fluxos de
comunicação, comércio e ideias, por exemplo). Não é possível, por exemplo, controlar o acesso à internet
de todos os cidadãos, bem como o contato que eles têm com outras realidades e culturas de outros países,
outros contextos. O Estado não consegue sequer controlar os fluxos comerciais. Esta crescente
incapacidade estatal provoca o aumento dos crimes transnacionais, tais como tráfico de drogas, armas ou
órgãos. Como estes problemas se tornam cada vez mais internacionais, precisam, cada vez mais, ser
atacados com uma perspectiva internacional. Sendo assim, para os neoliberais, regimes e organizações
internacionais são proeminentes na administração de conflitos e interesses.
Para isso, dizem os neoliberais, é preciso criar instituições internacionais capazes de lidar com cada um
dos temas específicos, como comércio, comunicação, segurança, entre outros. Por sua vez, o conjunto
dessas organizações (junto com as leis e instituições existentes), forma o que nós chamamos de regime
internacional.
03 – Condições para a cooperação: transparência, custo de transação e comunicação.
Alguns desdobramentos teóricos interessantes que os neoliberais fazem dizem respeito às condições para
a cooperação ocorra. Três pressupostos necessários:
I – Transparência
Os liberais afirmam que os ser humano pode resolver seus problemas por meio da razão (Kant) e que tem
uma natureza essencialmente boa, mas que as instituições podem acabar o corrompendo (Rousseau).
O que os neoliberais dizem é que as organizações internacionais podem criar uma moldura onde essa
natureza boa pode florescer. Se os atores internacionais possuem segredos e se comunicam de forma
pouco clara, isso aumenta a desconfiança do sistema internacional. Logo, é preciso transparência para que
haja a cooperação.
II – Custo de transação
Os neoliberais procuram diminuir os custos de transação, mantendo permanentemente uma organização
internacional com uma burocracia própria constantemente trabalhando em um determinado contato. Isso,
de acordo com alguns teóricos, ajuda a manter as relações com os atores internacionais.
III – Comunicação
Diminuindo os custos de transação e criando aquela “moldura” dentro da organização para que haja várias
rodadas de negociação, os Estados tornam-se mais propensos ao diálogo. Neste sentido, em caso de
choque de interesses, um Estado pode consultar as organizações internacionais (como a ONU ou a OMC) e
intermediado por elas, de forma transparente, chegar a uma solução pacífica para conflitos. E chegando a
uma solução pacífica, pode-se chegar a uma cooperação para que ambos os estados se beneficiem disso,
o famoso jogo de ganha-ganha.
04 – Interesse nacional não-unitário
Hoje é muito difícil definir o interesse único de uma nação, pois existem inúmeros grupos (partidos,
facções, organizações domésticas, etc.) que nem sempre concordam com o interesse nacional. Além disso,
respeitando o pressuposto liberal de “foco no indivíduo”, mesmo que a maioria da população concorde
com determinado objetivo, caso haja algum indivíduo discordante, ele não pode ser ignorado e deve ter
sua voz representada.
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05 – A anarquia pode ser superada
Os liberais acreditam que por meio dos regimes das organizações internacionais, a anarquia do sistema
internacional (teorizada pelos realistas) pode ser superada. Os regimes internacionais podem criar regras,
leis e princípios que devem ser observados e sendo observados, podem colocar então, certa ordem dentro
do sistema internacional. Neste caso, há instâncias criando restrições para “o que pode” e “o que não
pode” ser feito.
Além disso, dentro do neoliberalismo, existem dois desdobramentos: funcionalismo e o
neofuncionalismo.
A tradição liberal: teorias relacionadas
Funcionalismo (Miltrany) e Neofuncionalismo (Haas): tendência à integração regional (UE) e à
cooperação internacional (ONU) via processo de spill-over (“derramamento”) entre fronteiras e setores
Teoria da paz democrática (questionável): democracias não lutam entre si
Principais nomes do liberalismo: Joseph Nye, Robert Keohane e Ernest Haas.
Tendo este cenário em vista, o funcionalismo de David Miltrany (1888-1975) é muito próximo ao
liberalismo. Esta teoria surge basicamente com a finalidade de explicar o processo de integração regional
ocorrido em algumas áreas do globo, sobretudo na Europa com a União Europeia, mas também em outras
áreas como na própria América do Sul.
O contexto para esta teoria é o aumento da integração global ocorrido nas últimas décadas. Se no
mundo contemporâneo, os Estados falham em controlar os fluxos migratórios, financeiros e comerciais
que ocorrem dentro e para/com seus respectivos territórios, isto significa que existe um processo de
derramamento (spill-over) entre fronteiras e setores – inclusive relacionado com a interdependência
complexa que vimos anteriormente. Ou seja, os problemas que afetam a França, por exemplo, em um
mundo interconectado e globalizado, também se “derramam” para a Alemanha, para a Espanha, etc. Um
Estado, portanto, não age ou sofre as consequências isoladamente, mas sim, faz parte de um contexto de
“derramamento” maior. Neste contexto, as soluções para os problemas precisam ser pensadas de forma
integrada entre os Estados.
A União Europeia (foto) é um exemplo de funcionalismo: à medida que a integração global aumenta, a cooperação torna-se cada vez mais
necessária.
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Durante o século XX, esta busca pela integração fez surgir, por exemplo, a União Europeia. A
origem deste bloco inicialmente veio da ideia de comercializar carvão e aço (Comunidade Europeia do
Carvão e do Aço – CECA); ou seja, tinha finalidades bastante específicas e pontuais. Se a CECA era
basicamente uma organização internacional que administrava estes recursos naturais, a União Europeia
atual tornou-se bem mais complexa, inclusive possuindo acordos de migração e moeda própria. Portanto, o
que originalmente destinava-se somente à comercialização de carvão e aço, evoluiu para uma integração
quase completa em diversos setores (políticos, regulatórios, migratórios, monetários, etc.).
Derivada do funcionalismo, surge a teoria do neofuncionalismo proposta por Ernest Haas (1921 –
1986). Neste caso, para além da integração regional e da busca por soluções em conjunto estudada por
Miltrany, há uma preocupação com a cooperação internacional; ou seja, em escala maior e com outros
elementos. Exemplos destas cooperações podem ser a ONU ou a Organização Mundial do Comércio (OMC).
David Miltrany (1888 - 1975) e Ernest Haas (1921 – 1986)
Funcionalismo e neofuncionalismo
O funcionalismo e o neofuncionalismo acreditam que com a maior
integração global ocorrida no século XX, há um derramamento
(spill-over) de problemas de um Estado para outro. Logo, as
soluções devem ser pensadas em conjunto, o que leva à
necessidade de integração regional.
Por último, há a teoria da paz democrática. Segundo os liberais, regimes democráticos são mais
propensos a paz e a prosperidade do que demais formas de governo, como por exemplo, ditaduras. No
entanto, como é difícil definir o que é democracia. Basta lembrar, por exemplo, que a Coreia do Norte se
chama República Popular da Coreia. Afinal, o que é democracia? Chegando a uma definição, como verificar
se nunca houve um conflito entre elas? Não vamos entrar no mérito destas questões, mas é importante ter
ideia da complexidade deste tema.
Existem outros nomes importantes no liberalismo, tais como: Joseph Nye (responsável tanto pela
teoria da interdependência complexa); Robert Keohane (responsável pela diferenciação entre hard power
e soft power); e os já citados David Miltrany (funcionalismo) Ernest Hass (neofuncionalismo). No entanto,
por questões de foco, apenas vamos citá-los sem alongar muito o assunto. Na próxima aula, veremos as
demais tradições (construtivista, escola inglesa, escola francesa, escola de copenhague, marxismo, e
teorias críticas). No entanto, já adiantamos que como o realismo e o liberalismo são as principais escolas,
as demais teorias serão menos detalhadas.
CAI NA PROVA
Cespe/UNB (CACD/2016)
3. A teoria da interdependência complexa, desenvolvida por institucionalistas liberais como Robert Keohane e
Joseph Nye, é caracterizada pela não hierarquização de temas de política internacional.
COMENTÁRIO
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É verdade que a interdependência complexa (que gera a interdependência entre atores estatais e não-
estatais) mina a hierarquia entre os temas e agendas. No século XIX, por exemplo, havia uma preocupação
excessiva com segurança. Hoje, com um mundo cada vez mais interconectado, estes temas acabam sendo
tratados com certa igualdade e interdependência. Então, a segurança é tratada junto com meio-ambiente,
comércio, infraestrutura, comunicação, etc. Logo, não há hierarquia entre estes temas. Gabarito: Certo
Cespe/UNB (CACD/2016)
4. De acordo com o liberalismo institucional, as instituições internacionais, como as Nações Unidas, a Organização
Mundial do Comércio e a União Europeia, ajudam a promover a cooperação entre os Estados, mitigando assim,
as consequências da anarquia do sistema internacional.
COMENTÁRIO
De fato, a cooperação pregada pelo liberalismo, ajuda a mitigar as consequências da anarquia do sistema
internacional. As organizações internacionais servem exatamente para este interesse, pois atacam os
problemas coletivamente (derramamento). Deste modo, ao contrário dos realistas, os liberais acreditam que
a anarquia pode ser superada. Gabarito: Certo
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  • 2. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 1 48 Política Internacional Aula 00 – Visão da Prova e do Curso: conceitos básicos, atores, processos e instituições. Aula 01 – Principais paradigmas teóricos: Realismo, Liberalismo, Construtivismo e outros. Introdução ao curso de Política Internacional – CACD 2019 ...............................................2 Visão geral do curso.......................................................................................................................................2 Visão geral da prova e cronograma de aulas ................................................................................................3 Conceitos básicos – atores, processos e instituições ..........................................................6 Relações internacionais e política internacional............................................................................................6 Tratados de Vestfália (1648)..........................................................................................................................8 Sistema Internacional.....................................................................................................................................9 Atores internacionais ...................................................................................................................................10 Princípios da territorialidade, da soberania e da autonomia. .....................................................................10 Níveis de análise: sistêmico, supra-estatal, estatal e societal/individual....................................................11 Sistema internacional e ordem internacional ..............................................................................................12 Anarquia do sistema internacional ..............................................................................................................13 Atores estatais – Estado nacional................................................................................................................15 Atores não estatais – Organizações internacionais.....................................................................................16 Instituição e organização .............................................................................................................................17 Balança de poder..........................................................................................................................................18 Interdependência complexa.........................................................................................................................20 Conceitos básicos de relações internacionais................................................................... 21 Teoria das relações internacionais...............................................................................................................21 Cinco regras básicas do relacionamento entre Estados...............................................................................22 Objetivos das teorias de relações internacionais.........................................................................................23 Objetos de estudo e principais divergências entre teorias ..........................................................................25 A tradição realista............................................................................................................ 26 Antecedentes e panorama geral do Realismo .............................................................................................26 A sistematização do Realismo – Carr e Morgenthau...................................................................................29 Seis princípios do Realismo Político..............................................................................................................30 Correntes do realismo: realismo clássico, realismo científico e realismo estrutural (neorrealismo). .........34 A tradição liberal ............................................................................................................. 37 Antecedentes da tradição liberal .................................................................................................................37 Conceitos centrais da tradição liberal..........................................................................................................39 Principais pressupostos da tradição liberal..................................................................................................42 Neoliberalismo .............................................................................................................................................44 Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 3. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 2 48 Introdução ao curso de Política Internacional – CACD 2019 Visão geral do curso É com grande satisfação que lançamos o curso de Política Internacional para o Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata de 2019. O curso será coordenado pelo Prof. Filipe Martins, que é bacharel em Relações Internacionais pela UnB com certificação profissional em forecasting e análise de risco; sendo um analista político bastante conhecido no mercado, possuindo experiência no Tribunal Superior Eleitoral, na Embaixada dos Estados Unidos da América e em consultorias privadas. Martins será o responsável pelo conteúdo do curso, pela organização das aulas, pela didática desenvolvida, pela gravação dos vídeos e pelo fórum de dúvidas; ou seja, por praticamente todo o pacote de aulas. As aulas em PDF serão escritas por mim, Prof. Alexandre Vastella. Para quem não me conhece, sou professor de Geografia há três anos aqui no Estratégia Concursos. Embora tenha meu curso próprio de Geografia para o CACD; para Política Internacional, vou utilizar como base o conteúdo, a didática, a organização de tópicos e a estrutura deixada pelo Prof. Filipe Martins. Ou seja, será ele o responsável. Este é um curso voltado para o CACD – prova bastante difícil, exigente, e com uma amplitude de temas muito grande. Por isso, tenham consciência de que o conteúdo é bastante extenso – mais de 700 páginas em PDF, mais de 100 horas de vídeo-aulas e resolução de questões. Parece ambicioso, e realmente é. Nós do Estratégia Concursos trabalhamos assim. A ideia é fazermos um trabalho denso e exigente para que você seja aprovado! Sendo assim, cada aula de nosso curso será composta de três partes: 1) gravação em vídeo; 2) material em PDF; e 3) fórum de dúvidas. O tempo máximo de resposta do Fórum de Dúvidas é de cinco dias úteis. Lembrando que com exceção deste primeiro PDF – cujo conteúdo abarca duas aulas em vídeo – para todas as outras ocasiões, haverá uma aula em PDF para cada aula em vídeo. Para que possamos continuar fazendo este trabalho, pedimos que não comprem material pirata e não comprem material de rateio. Não quero ser chato logo de início, mas tenham consciência que a única empresa legalmente autorizada a vender este curso é o Estratégia Concursos por meio do site oficial: www.estratégiaconcursos.com.br. Além do material ser eletronicamente rastreado (o que pode dar um problemão para quem compra curso ilegalmente), pensem que construir um PDF como este aqui demanda horas e horas de preparação e estudo. Sendo assim, não é justo que outras pessoas roubem o nosso material e ganhem dinheiro em cima dele sem fazer nada. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 4. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 3 48 Nosso curso será bastante aprofundado e lhe dará todas as ferramentas para você ir muito bem (mesmo!) no TPS e nas provas discursivas. Trabalharemos com o edital “na mão”, o mais focado possível, procurando trabalhar aquilo que a banca CESPE/UNB pede nas provas do CACD. Sei que muitos que estão lendo essa aula agora são iniciantes ou possuem muita dificuldade em Política Internacional. Nosso curso não exigirá conhecimentos prévios. Portanto, se você nunca estudou, ou está iniciando seus estudos em Política Internacional, ou se já estudou mas teve imensa dificuldade, fique tranquilo pois nosso curso atenderá aos seus anseios perfeitamente. Por outro lado, se você já estudou os temas, e apenas quer revisá-los, ou quer um maior aprofundamento em alguns itens, o curso também será bastante útil, seja pela quantidade de exercícios comentados que teremos ou pelo rigor no tratamento da matéria. Visão geral da prova e cronograma de aulas Quando pensamos em Política Internacional vinculada à mídia e imaginário popular, partimos de uma base ampla e pouco conceitual, cujo enfoque é bem diferente do que a gente precisa ter no CACD. Para a prova, além da bagagem conceitual que destoa do senso comum, devemos entender os quatro eixos de Política Internacional que aparecem de forma muito clara no edital, que são: a) teoria das relações internacionais, b) política externa brasileira, c) relações bilaterais do Brasil e integração regional, e: d) temas e a agendas internacionais. Devemos, portanto, ter uma visão específica de política internacional, tomando cuidado com vulgaridades e visões técnicas não adotadas pela banca. Detalharemos abaixo estes quatro eixos: Primeiramente, a teoria das relações internacionais corresponde à esfera teórica da Política Internacional, abarcando a totalidade do arcabouço conceitual, teórico e analítico que permite trabalhar e problematizar todas as questões que a gente vai abordar ao longo do curso. Assim sendo, todos os fenômenos e fatos que nós vamos estudar podem ser abarcados pela teoria das relações internacionais. Diferentemente da teoria das relações internacionais, a política externa brasileira é composta apenas de conceitos, e não de abordagens teóricas; apreende, portanto, uma base factual. Podemos perceber claramente este eixo quando o edital pede, por exemplo, o entendimento da evolução da política externa brasileira entre 1945 – no cenário estabelecido após a Segunda Guerra Mundial – até os dias atuais. Dentro deste item, a gente vai entender a importância das relações bilaterais do Brasil, com destaque às relações Brasil-Estados Unidos, Brasil-Argentina, e Brasil-BRICS (especialmente a China que é nosso principal parceiro comercial). De certo modo, porém, estas relações são abarcadas tanto pela política externa brasileira quanto pela teoria das relações internacionais. Sob a luz da política externa brasileira, vamos compreender as relações bilaterais do Brasil e integração regional. Evidentemente, será dada uma atenção maior aos parceiros mais importantes como Estados Unidos, Argentina, China, Inglaterra, França e Alemanha; mas sem deixar de lado a atuação brasileira face aos países periféricos, o que a banca chama de relações sul-sul. Também serão abordadas as relações intercontinentais, como por exemplo, o contexto regional sul-americano, as relações do Brasil com os países asiáticos, africanos e europeus de um modo geral. Este conhecimento será necessário tanto para responder às questões objetivas quanto (e principalmente!) para as questões discursivas do CACD, que costumam englobar estes eixos de forma muito transversal. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 5. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 4 48 Por último, os temas e agendas internacionais dizem respeito aos principais temas que movem a política internacional, não apenas no que se refere à política externa do Brasil, mas também à política externa de outros países (especialmente Estados Unidos, China e países da Europa Ocidental); e que, portanto, dão o tom de aquilo que ocorre nas relações internacionais no mundo. Temas como a segurança e a paz, o meio ambiente, e os direitos humanos, por exemplo, são temas internacionais que dão origem a agendas internacionais; ou seja, a objetivos e pautas mais específicas. Como era de se esperar, a teoria das relações internacionais, a política externa brasileira, as relações bilaterais do Brasil e a integração regional, e os temas e a agendas internacionais aparecem de forma integrada na prova do CACD. Para termos uma ideia, segue abaixo o último edital publicado em 2018 [fonte]: Edital 2018 CACD – Itens de Política Internacional 1. Relações internacionais: conceitos básicos, atores, processos, instituições e principais paradigmas teóricos. 2. A política externa brasileira: evolução desde 1945, principais vertentes e linhas de ação. 3. O Brasil e a América do Sul. 3.1 Integração na América do Sul. 3.2 O MERCOSUL: origens do processo de integração no Cone Sul. 3.3 Objetivos, características e estágio atual de integração. 3.4 A Iniciativa de Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA). 3.5 A União Sul-Americana de Nações: objetivos e estrutura. 3.6 O Conselho de Defesa da América do Sul. 4. A política externa argentina; a Argentina e o Brasil. 5. A política externa norte-americana e relações com o Brasil. 6. Relações do Brasil com os demais países do hemisfério. 7. A Política externa francesa e relações com o Brasil. 8. Política externa inglesa e relações com o Brasil. 9. Política externa alemã e relações com o Brasil. 10. A União Europeia e o Brasil. 11. Política externa russa e relações com o Brasil. 12. A África e o Brasil. 13. A política externa da China, da Índia e do Japão; relações com o Brasil. 14. Oriente 29/32 Médio: a questão palestina; Síria, Iraque, Irã e outras situações nacionais relevantes. 15. A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. 16. A agenda internacional e o Brasil: 16.1 O multilateralismo de dimensão universal: a ONU; as Conferências Internacionais; os órgãos multilaterais. 16.2 Desenvolvimento. 16.3 Pobreza e ações de combate à fome. 16.4 Meio ambiente. 16.5 Direitos Humanos. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 6. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 5 48 16.6 Comércio internacional e Organização Mundial do Comércio (OMC). 16.7 Sistema financeiro internacional. 16.8 Desarmamento e não-proliferação. 16.9 Conflito étnico, sectário e nacionalismo: os casos do Bálcãs e do Oriente Médio (por exemplo: Síria, Líbano, Iraque). 16.10 Crimes de guerra e crimes contra a humanidade: genocídio, holocausto e a Corte Penal Internacional. 16.11 Políticas de identidade: gênero, raça e religião como vetores da política mundial. 16.12 Terrorismo. 16.13 Narcotráfico. 16.14 A reforma das Nações Unidas. 17. O Brasil e o sistema interamericano. 18. O Brasil e a formação dos blocos econômicos. 19. A dimensão da segurança na política exterior do Brasil. 20. O Brasil e as coalizões internacionais: o G-20, o IBAS e o BRICS. 21. O Brasil e a cooperação sul-sul. Com base nestes itens (e são muitos itens!), nós teremos 33 aulas (32 de conteúdo novo e um último resumão), de acordo com a seguinte sequência: Sequência de Aulas 0 Visão Geral da Prova e do Curso: conceitos básicos, atores, processos e instituições. 1 Principais paradigmas teóricos: Realismo, Liberalismo, Construtivismo e outras teorias 2 Principais marcos e debates teóricos 3 A Política Externa Brasileira: princípios e diretrizes da política externa brasileira 4 Política Externa Brasileira (1945 – 1985): a evolução desde 1945, principais vertentes e linhas de ação (Parte 1) 5 Política Externa Brasileira (1945 – 1985): a evolução desde 1945, principais vertentes e linhas de ação (Parte 2) 6 Política Externa Brasileira (1985 – 2018): a evolução desde 1945, principais vertentes e linhas de ação (Parte 1) 7 Política Externa Brasileira (1985 – 2018): a evolução desde 1945, principais vertentes e linhas de ação (Parte 2) 8 A política externa norte-americana e relações com o Brasil. 9 A União Europeia e o Brasil: as relações do Brasil com o bloco europeu e com seus principais membros 10 A política externa argentina: a Argentina e o Brasil. 11 O Brasil e seu entorno regional: América do Sul e as Américas 12 O Brasil e a América do Sul 13 Relações do Brasil com a África 14 Relações do Brasil com o Oriente Médio 15 Relações do Brasil com a Ásia e o Indo-Pacífico 16 Relações do Brasil com os BRICS 17 Relações do Brasil com Portugal e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 7. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 6 48 18 O Brasil e o Sistema Interamericano: a OEA 19 O MERCOSUL 20 A União Sul-Americana de Nações (Unasul) e outras iniciativas 21 Organizações e Regimes internacionais 22 Sistema ONU - Origens e Carta da ONU 23 Sistema ONU - Evolução e Reforma 24 Sistema ONU - O Brasil e as Nações Unidas 25 Sistema Financeiro Internacional 26 Sistema Multilateral de Comércio: a OMC 27 Desenvolvimento Sustentável, Meio Ambiente e Direitos Humanos 28 A dimensão da segurança na política exterior do Brasil 29 O Brasil, as Coalizões Internacionais e a Cooperação Sul-Sul: BRICS, IBAS, G-20 30 Políticas de identidade: Conflito étnico, religioso, sectário e a ascensão do nacionalismo 31 O Oriente Médio e seus Impactos nas Relações Internacionais 32 Crimes de guerra e crimes contra a humanidade: conflitos civis, genocídio, holocausto e a Corte Penal Internacional. 33 Resumão Conceitos básicos – atores, processos e instituições Relações internacionais e política internacional Agora que já vimos a estrutura do curso, vamos tratar especificamente da base teórica essencial. Veremos as definições conceituais de Política Internacional, de relações internacionais e demais conceitos básicos e centrais necessários à construção de uma base de conhecimento sobre teoria das relações internacionais, política externa brasileira, relações bilaterais do Brasil, inserção brasileira no cenário internacional e também sobre temas/agendas que veremos adiante. Primeiramente, as relações internacionais são interações entre unidades políticas. No âmbito doméstico, as unidades políticas podem ser, por exemplo, partidos políticos ou organizações não governamentais; já em política internacional (assunto que interessa para nós), as unidades políticas normalmente correspondem aos Estados nacionais. Deste modo, quando falamos em política externa do Brasil estamos falando essencialmente da política externa do Estado brasileiro. É importante ter em mente, portanto, que o Estado é a principal unidade política no âmbito da Política Internacional. Porém, para além das unidades políticas estatais, que se referem ao Estado nacional, a política internacional também é composta por unidades políticas não-estatais, como por exemplo, as organizações não-governamentais (ONGS), as organizações internacionais e as empresas multinacionais. Todavia, mesmo com a emergência dos atores não-estatais observada nas últimas décadas, o Estado continua sendo o principal ator das relações internacionais; ou seja, entre nações, ou entre Estados nacionais. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 8. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 7 48 Unidades políticas estatais Estado nacional Unidades políticas não-estatais ONGs, empresas multi e transnacionais. As relações internacionais – ou seja, as interações entre unidades políticas com capacidade de agência internacional – podem ser de diversos tipos: culturais, religiosas, políticas, econômicas, etc. Normalmente, porém nem sempre, estas relações são protagonizadas por Estados nacionais. Assim, as relações Brasil-Estados Unidos, por exemplo, são encabeçadas por representantes do Estado brasileiro e representantes do Estado dos Estados Unidos. No entanto, demais atores de agência internacional, como por exemplo, corporações transnacionais, ONGs, ou até mesmo determinados indivíduos, também podem se relacionar internacionalmente. As relações internacionais (letras minúsculas) abrangem os fluxos internacionais; ou seja, as relações entre países de modo abrangente no âmbito cultural, religoso, turístico, comunicativo, entre outras. Por outro lado, as Relações Internacionais (letras maiúsculas) dizem respeito ao campo de estudo, à disciplina, ao curso, à área acadêmica que se dedica ao estudo das relações internacionais. relações internacionais Quando escrita em letra minúscula, as relações internacionais se referem às interações entre unidades políticas com capacidade de agência internacional, podendo ocorrer entre atores estatais e/ou não-estatais. Trata-se da rede dinâmica e abrangente das relações em si. Relações Internacionais Quando escrita em letra maiúscula, as Relações Internacionais se referem ao campo de estudo, à disciplina, ao curso, à área acadêmica que se dedica ao estudo das relações internacionais. Política internacional Lida não apenas com as relações internacionais em si, mas principalmente com a dinâmica de poder nelas envolvidas por uma perspectiva de interação entre Estados nacionais. Portanto, o conceito de política internacional é mais abrangente que o de relações internacionais. Neste curso, nós temos um interesse bastante específico na seleção de futuros diplomatas. É por isso que pensamos aqui, muito mais em política internacional do que em relações internacionais. É verdade que as relações internacionais precisam ser entendidas, principalmente no que diz respeito às suas principais instituições, processos, fluxos e conceitos básicos; no entanto é na política internacional que está o nosso foco para o CACD. Ao contrário das relações internacionais, a política internacional não se preocupa somente com as relações religiosas, culturais, econômicas ou demais interações entre atores de agência internacional, mas apenas quando estas relações descreverem uma abordagem política oficial, tratamento dado por uma perspectiva dos Estados nacionais ou por organizações internacionais reconhecidas por estes. A política internacional, portanto, lida muito mais com uma dinâmica de poder; ou, com outras palavras, com as interações de poder e/ou cooperação entre unidades políticas. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 9. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 8 48 Tratados de Vestfália (1648) As relações internacionais adotam como marco histórico os Tratados de Vestfália (1648), também conhecidos como Paz de Vestfália; uma série de tratados assinados na Alemanha com a finalidade de estabelecer, entre outras coisas, o respeito à soberania dos Estados. Trata-se, por conseguinte, do marco inicial nos debates a respeito da soberania estatal. Estes tratados foram assinados em um contexto nitidamente religioso: naquele período, havia ocorrido uma série de guerras religiosas entre nações europeias, motivadas principalmente por conflitos entre católicos e protestantes; como por exemplo, a Guerra dos Trinta Anos que terminou com o massacre de São Bartolomeu. Havia, portanto uma sobreposição entre o poder do Estado (exercido pelos monarcas) e o poder religioso (cujo Papa era a maior autoridade); e para atingir a paz, era necessário equalizar isso; ou seja, determinar qual seria, de fato, a autoridade máxima dentro de um território. Ficou acordado que a partir dos Tratados de Vestfália, os príncipes, os monarcas e os Reis passariam a ter o direito de escolher e determinar soberanamente qual seria a religião praticada dentro dos seus territórios; ou seja, dentro de suas fronteiras. “A chamada “Paz de Vestefália” é o momento histórico marcado pela assinatura de dois tratados, celebrados nas cidades alemãs de Münster e Osnabrück, os quais, de maneira sucinta, colocaram fim à Guerra dos Trinta Anos e estabeleceram os novos limites territoriais das principais nações europeias da época. A Guerra dos Trinta anos teve início em 1618, fruto das tensões religiosas observadas por toda Europa, que opunham a Igreja Católica – mais importante instituição política da era medieval – e as emergentes religiões protestantes, notadamente a Calvinista e a Luterana.” [fonte] Não é o foco desta aula entender a disputa religiosa e nem o contexto europeu do século XVII, mas sim, compreender que os Tratados de Vestfália foram o marco inicial do sistema internacional europeu, modelo que com o passar dos séculos, se espalhou para o restante do planeta. Assim, a concepção de soberania estatal, que primeiramente se estabeleceu dentro da Europa, foi sendo paulatinamente levado às colônias e posteriormente, aos países independentes na época pós-colonial. Esse processo inclui o Brasil, que momento ainda era colônia de Portugal, um Estado europeu influenciado pelas ideias de Vestfália. Após um longo período de conflitos, líderes europeus assinam a Paz de Vestfália, inaugurando o sistema internacional moderno (G. Terborch, 1648). Este é um marco histórico das relações internacionais, pois inaugura o modelo estadocêntrico com predominância do Estado nacional. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 10. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 9 48 Sistema Internacional Tendo em vista um sistema internacional formado pelas interações entre unidades políticas com capacidade de ação Internacional e também determinado pela Paz de Vestfália que até hoje vigora no centro das relações internacionais, veremos agora alguns básicos que nos ajudam a compreender um pouco melhor o que é a política internacional e o que são as relações internacionais. O primeiro conceito é o conceito de sistema internacional, que também pode ser colocado como um sinônimo de arena internacional. Trata-se do palco ou da arena onde as interações entre unidades políticas se dão. Sendo assim, o sistema internacional abarca todas as unidades políticas de vigência internacional. Então, o sistema internacional nada mais é do que a arena onde se dão as relações internacionais entre todos os atores ali inseridos. Sistema internacional ou Arena internacional Palco onde as relações internacionais ocorrem, englobando as interações entre todos os atores, processos e instituições. Podem assumir diferentes configurações (sistema anárquico ou sistema hierárquico); e também distintas organizações de poder (exemplo: multipolar ou bipolar). O Tratado de Vestfália, por exemplo, foi basicamente costurado nas relações entre os estados europeus. Naquela época, fala-se muito mais em sistema europeu do que sistema internacional propriamente dito; afinal, este não havia englobado todo o mundo, nem todas as demais unidades políticas que se organizavam naquela época, seja no modelo tribal, imperial, ou no modelo que fosse. Atualmente, no entanto, ao contrário do que ocorria no século XVII, podemos sim pensar em um sistema internacional que engloba todas as nações, quer sejam reconhecidas ou não. Então hoje nós temos de fato uma arena que engloba todos estes atores, todas essas unidades políticas que interagem dentro da arena; e ai essa interação pode se dar de diferentes modos e assumir diferentes configurações. Tendo essa abrangência em vista, o sistema internacional, de acordo com o ponto de vista, pode ser um sistema internacional organizado, no qual existe uma ordem; e pode também, ser um sistema internacional anárquico onde não necessariamente existe uma ordem, uma hierarquia ou uma autoridade central que possa exercer soberania perante aos demais. Sistema internacional organizado Organizado de acordo com uma ordem pré-estabelecida Sistema internacional anárquico Não existe ordem ou hierarquia pré-estabelecida. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 11. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 10 48 Atores internacionais Conforme vimos anteriormente, quem possui capacidade de ação dentro dos sistemas internacionais são unidades políticas dotadas de coesão e continuidade. Historicamente, a principal unidade política é o Estado, no entanto, também existem as unidades políticas não estatais. O maior exemplo de atores não estatais são as organizações internacionais, que embora sejam formadas por Estados, possuem uma capacidade de agência própria. Deste universo, destaca-se a Organização das Nações Unidas (ONU) (logo à direita), que é formada por múltiplos Estados (Brasil, Estados Unidos, Argentina, vários países europeus, africanos, etc.). Contudo, a ONU não é apenas a pura soma de seus membros: a organização possui uma burocracia própria e permanente, uma sede, um documento fundacional que serve como carta que vai dirigir as suas ações, tem inclusive um secretariado geral cheio de burocratas à sua disposição, técnicos, especialistas, escritórios temáticos específicos; funcionando basicamente como um órgão executivo. Quando a se posiciona, toma decisões, e/ou age no âmbito internacional para além da vontade dos Estados que a compõem, a ONU também se configura como um ator de vigência internacional. Trataremos este assunto mais à frente: por enquanto é importante entender as diferenças entre atores estatais e não estatais. Neste curso, trataremos com maior ênfase nos atores estatais e nas organizações internacionais. Princípios da territorialidade, da soberania e da autonomia. No sistema internacional, há três princípios fundamentais relacionados à ideia de Estado: a territorialidade, a soberania e a autonomia. O primeiro princípio diz respeito à territorialidade no qual a humanidade é organizada, principalmente entre comunidades com fronteiras delimitadas. Em sua forma mais nuclear, a unidade política possui relação com a família. Indivíduos que se casam, têm filhos e formam famílias constituem a primeira base social. Por sua vez, um conjunto de famílias – com primos, primas, tios, tias, etc. – pode formar um clã ou uma tribo. Para que haja a convivência social harmônica, essa tribo se organiza de acordo com regras que determinam certa ordem; garantindo assim, a segurança e liberdade mínimas – princípios que vimos anteriormente. Esta configuração vai ficando cada vez mais explícita quando ocorre uma evolução social: estas tribos podem se fortalecer, tornando-se vilarejos; e posteriormente, cidades. É evidente que este processo nem sempre ocorre em um percurso histórico linear, mas tem alguma relação até chegar ao que nós chamamos de Estados nacionais; estes, que se estabelecem de forma realmente clara só em 1648 com os Tratados de Vestfália. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 12. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 11 48 Neste contexto, toda a comunidade se organiza de acordo de uma territorialidade específica; ou seja, dentro de um determinado território delimitado por fronteiras, sejam elas reconhecidas por vizinhos ou pelo mero uso da força a qual impõe este respeito à fronteira. Basicamente o que a gente precisa entender é que a territorialidade é essencial para a compreensão das relações internacionais: em um mapa-múndi, por exemplo, podemos ver claramente a delimitação dos territórios políticos, como por exemplo, onde o Brasil começa e onde o Brasil termina. Estas delimitações políticas, moldadas por inúmeros conflitos e acordos durante a história, precisam ser respeitadas. Logo, o respeito da territorialidade se dá pelo exercício da soberania. Ou seja, só há territorialidade onde há soberania; e daí pode-se partir para o segundo princípio. Dentro das fronteiras de um país, o Estado possui a autoridade legal, suprema, incondicional e exclusiva; ou seja, possui a soberania. Se essa autoridade central é desafiada – como em diversos momentos da história – podem ocorrer guerras civis ou uma interferências externas. Porém, em uma situação de normalidade, a extraterritorialidade é respeitada pelo exercício da soberania que nada mais é do que o monopólio da autoridade que se impõe por meio da exclusividade do uso legítimo da força. Três princípios fundamentais Territorialidade A humanidade é organizada, principalmente, entre comunidades com fronteiras delimitadas. Soberania Dentro das fronteiras, o Estado ou governo tem um mandato de autoridade legal que é supremo, incondicional e exclusivo. Autonomia O princípio da autodeterminação ou autogoverno constrói países como agentes autônomos da atividade política, social e econômica dentro das fronteiras fixas que separam a esfera doméstica do mundo exterior. Por fim, o exercício da soberania pressupõe a autonomia que está relacionada ao princípio da autodeterminação ou autogoverno dos povos que concebe países como agentes autônomos da atividade política, social e econômica dentro das fronteiras fixas que separam a esfera doméstica do mundo exterior. Logo, os três princípios se relacionam uns aos outros: a territorialidade pressupõe a delimitação de fronteiras onde é necessário haver o exercício da soberania que consequentemente pressupõe a autonomia e a liberdade para agir em diversas esferas (política e social econômica e etc.). Níveis de análise: sistêmico, supra-estatal, estatal e societal/individual. Tendo em vista os conceitos anteriores, agora podemos entender as diferentes camadas destas relações; ou seja, os diversos níveis de análise. Os níveis de análise são diferentes abordagens utilizadas para compreender um determinado fenômeno internacional podendo variar de acordo com o objeto o momento e a finalidade. São quatro categorias: nível sistêmico (sistema internacional); nível supra-estatal (relações bilaterais); nível estatal (Estado); e nível societal/individual (sociedade civil). Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 13. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 12 48 Níveis de análise Nível sistêmico. Sistema internacional. Nível estatal. Estado. Nível supra-estatal. Relações bilaterais. Nível societal/individual. Sociedade Civil. O primeiro nível é o sistêmico, que conforme o nome sugere, lida com o sistema internacional de forma geral. Neste nível, alguns questionamos podem ser feitos. Quais os princípios e processos globais do sistema internacional? Este sistema internacional é anárquico ou possui certa organização? De que modo este sistema, como um todo, afeta as relações políticas? Trata-se, portanto, do estudo de fenômenos em escala global, e não de Estados específicos ou a relação entre estes. O segundo nível é o nível supra- estatal; ou seja, algo que se dê acima do nível estatal, porém, que não seja tão abrangente quanto o nível sistêmico global. Ocorre, por exemplo, entre as regiões do planeta. Neste nível, podemos analisar, por exemplo, a América do Sul, a África subsaariana, a Europa Ocidental, e assim por diante. Por sua vez, o nível estatal dá ênfase a um único Estado. Um exemplo de análise em nível estatal são as relações da política externa brasileira. Por fim, o nível societal se refere à sociedade que está dentro do Estado, o que engloba diversas escalas. É neste nível que se encontra a sociedade civil no qual se formam alguns consensos de processo decisório. Este nível abarca, portanto, tanto a sociedade de forma geral quanto indivíduos de grande influência, tais como: presidentes de uma nação, grandes nomes das elites governamentais, empresários notáveis, formadores de opinião, intelectuais, etc. Ao longo do curso, o estudo da política externa brasileira será focada nos três ultimos níveis, em destaque ao estatal e ao societal. Sistema internacional e ordem internacional Deste modo, faz-se se necessário distinguir sistema internacional de ordem internacional. Conforme vimos anteriormente, o sistema internacional é a arena onde se dão as relações internacionais, englobando todos os processos, instituições e atores; trata-se, portanto, de um conceito político envolvendo mecanismos de poder e relacionamentos entre atores internacionais. Ao contrário do sistema internacional (ordem política), a ordem internacional é um conceito jurídico, focando no modo que o sistema internacional é organizado dentro de uma coerência ética e jurídica. O quadro abaixo explica melhor estas diferenças: Sistema internacional (conceito político) Ordem internacional (conceito jurídico) Foca nas relações de poder que se dão dentro do sistema internacional, regido de acordo com uma lógica do poder (item abaixo) Refere-se ao modo com que o sistema internacional é organizado do ponto de vista jurídico. Relaciona- se, portanto, com a lógica legal-normativa (abaixo). Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 14. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 13 48 Lógica do poder Lógica legal-normativa A lógica do poder se refere à relação de sobrevivência e segurança entre os Estados. Isso ocorre por meio de disputas de poder entre atores internacionais (item abaixo). Refere-se especialmente ao direito internacional. Neste caso, não estamos falando de “força”, mas de princípios éticos e legais que devem ser seguidos pelos sujeitos do direito internacional (item abaixo). Atores internacionais Sujeitos do direito internacional São as unidades políticas com capacidade de agência internacional. Agindo de acordo com a lógica do poder, estes atores podem ser organizados em várias polaridades diferentes (item abaixo). Os sujeitos possuem obrigações, direitos e deveres. Agindo de acordo com os princípios legais da lógica legal-normativa, estes sujeitos se relacionam em diferentes lateralidades (item abaixo). Polaridade Lateralidade Refere-se aos polos que emanam o poder, podendo ser: unipolar (um país central detém o poder); bipolar (dois países centrais disputando o poder); ou, multipolar (poder fragmentado). Refere-se aos meios de ação de poder, podendo ser: unilateral (Estado que age sozinho); bilateral (relação ou vínculo entre dois Estados); ou plurilateral (pluralidade de lados, como vários Estados envolvidos em um acordo). Resumindo: o sistema internacional – que se refere a uma ordem política – é regido por uma lógica de poder que influencia a dinâmica dos atores internacionais; o que pode resultar em diferentes polaridades. Por ser um conceito jurídico, a ordem internacional exige uma lógica legal-normativa para regular os direitos e deveres dos sujeitos do direito internacional; que podem se relacionar em diferentes lateralidades. Anarquia do sistema internacional Agora que já conhecemos como funciona o sistema internacional, podemos entender o conceito de anarquia internacional. Neste contexto, anarquia pode ser entendida como a ausência de governo central, ou ausência de autoridade internacional. Anarquia “Sistema político e social baseado na negação do princípio de autoridade governamental [...] De modo geral, ausência de governo, de liderança; desordem por ausência de autoridade reguladora; desregramento, desorganização:” [fonte] Isto não significa que o sistema internacional é caótico ou desordenado, mas sim, que existe uma organização de Estados e/ou atores que não conta com a presença de uma autoridade central. Não há, portanto, autoridade que se impõe de cima para baixo e tampouco poder de polícia. Neste caso, se um Estado fosse agredido por outro Estado, não seria possível recorrer à polícia tal como um cidadão comum ao ser agredido em âmbito doméstico. No sistema internacional anárquico, não existe hierarquia de poder e nem autoridade central. Vejamos o esquema abaixo: Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 15. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 14 48 Anarquia do sistema internacional Não há autoridade central: Não existe uma autoridade que comanda o planeta inteiro, mas sim, Estados e/ou atores internacionais disputando poder isoladamente. Não há polícia: Se não há autoridade central, também não existe uma polícia planetária. Sobrevivência incerta: Visto que o sistema internacional é anárquico, cada Estado busca sobreviver e manter/ampliar o seu poder. Desconfiança: Como existe uma constante incerteza pela sobrevivência, isso gera desconfiança mútua entre os atores internacionais. Auto-ajuda: No sistema internacional, os Estados contam apenas com a ajuda de outros Estados. Dilema da segurança: por estarem preocupados com a segurança, os Estados acabam se armando cada vez mais. Esta preocupação excessiva, no entanto, traz o efeito contrário: o aumento das tensões internacionais. Suponha que o círculo azul (acima) seja o sistema internacional. Dentro deste sistema, não há uma autoridade central, mas sim, múltiplos estados com diferentes poderes, que não conseguem a imposição de sua força/poder a outros de uma única vez. Em um sistema anárquico, como não existe autoridade central, cada Estado fica responsável por garantir a sua própria segurança e sobrevivência. A segurança das pessoas, portanto, dependeria basicamente das suas próprias capacidades e dos seus próprios meios de se defender. No sistema internacional, portanto, não há polícia. Em seu livro Leviatã, e em âmbito doméstico, Thomas Hobbes tratar esta anarquia como “estado de natureza”; ou seja, a ausência da capacidade de regular ou interferir certo ordenamento nas relações sociais. Neste caso, há uma situação marcada pela guerra de todos contra todos, no qual “o homem é o lobo do homem”. Ou seja, nada impede, por exemplo, que outro homem similar a mim cometa uma agressão ou violência. Hobbes conclama, portanto, à necessidade um Estado como meio de garantir certa ordem e segurança os indivíduos. Forma-se, portanto, uma relação inversamente proporcional entre liberdade e segurança: o indivíduo cede parcialmente a sua liberdade para o Estado; e em troca, o Estado proporciona segurança e ordem. No sistema internacional, contudo, a noção de ordem é bem mais complexa. Neste caso, existe um grande consenso entre realistas e liberais (inclusive entre os construtivistas) que neste ambiente anárquico a sobrevivência é incerta, e isso gera desconfiança. Essa desconfiança significa que o Estado deve ficar sempre alerta e desconfiando de tudo e de todos, pois um estado de conflito é sempre iminente. Deste modo, os atores internacionais podem contar apenas com a auto-ajuda; ou seja, no sistema internacional, os Estados contam apenas com a ajuda de outros estados. No entanto, essa relação cria efeitos colaterais. Se um Estado torna-se dependente de outro Estado, então, perde parte de sua soberania e de sua capacidade de agir autonomamente no sistema internacional. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 16. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 15 48 Para garantirem sua sobrevivência e manutenção, os Estados estão constantemente se armando e se equipando, buscando no primeiro momento o poder dissuasório para que não sejam atacados e também buscando uma capacidade de ataque caso seja necessário, o que pode inclusive, acarretar em ações ofensivas. Vejamos uma situação hipotética: se o “Estado A” tem armas, outros Estados ficam com medo de ataca-lo. Contudo, se o “Estado B” se fortalecer a ponto de colocar a sua soberania em xeque, o “Estado A” vai ampliar ainda mais a sua capacidade de defesa e ataque. Neste caso, ocorre um ciclo no qual cada Estado possui uma tendência de se armar cada vez mais. Iremos desenvolver esse assunto na Teoria Realista, mas é consenso entre todas as escolas teóricas que os Estados possuem esta tendência. Este cenário cria o dilema de segurança. Por estarem preocupados com a segurança, os Estados acabam se armando cada vez mais; contudo, este processo contraditoriamente aumenta os riscos com a segurança. Um sistema anárquico, teoricamente caótico em desorganizado, pode perfeitamente levar a este contexto de guerra de todos contra todos. A preocupação com a segurança pode levar a uma corrida armamentista; o que paradoxalmente pode levar a mais conflitos e tensões. A maioria dos teóricos considera que este cenário vigorou em toda a história humana. O Império Romano, por exemplo, conseguiu impor, ao menos dentro de seus limites, certa ordem por conta da autoridade central, uma unipolaridade que disfarçava a anarquia internacional. O sistema internacional, portanto, é anárquico, não possui autoridade central, não possui poder de polícia, e é frequentemente levado ao dilema de segurança. Atores estatais – Estado nacional Para serem configurados como Estados nacionais, os atores precisam ter os seguintes elementos: fronteiras, população, governo central, soberania, reconhecimento e monopólio do uso da força: Elementos que constituem o Estado no sistema internacional anárquico Fronteiras A delimitação física do Estado População Os moradores do Estado Governo central A autoridade do Estado Soberania A capacidade de exercer a autoridade do Estado Reconhecimento O reconhecimento do Estado no sistema internacional Monopólio do uso da força Manutenção da ordem exercida por aparatos bélicos. O círculo maior representa o “Estado A” o círculo inferior, o “Estado B”. Entre ambos, existem fronteiras – um dos pré-requisitos do princípio da territorialidade – na qual podemos identificar claramente onde os Estados começam e onde os Estados terminam. Os estados também precisam ter uma população; ou seja, pessoas que vivem dentro deste território delimitado por fronteiras. Além disso, também precisa ter um governo central para regular e normatizar o território. Um Estado também precisa Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 17. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 16 48 possuir a sua própria soberania; ou seja, a capacidade de utilizar o governo central para exercer a autoridade dentro do território delimitado por fronteiras. A soberania pressupõe o monopólio do uso da força, e a capacidade de exercer a autoridade legal de modo supremo, incondicional e exclusivo. Isto significa que é a vontade do Estado que prevalece dentro de suas fronteiras. Todo esse contexto vale tanto para o “Estado A” quanto para o “Estado B”. Além de soberania, população, governo central e fronteiras, todo Estado precisa ter reconhecimento. Então, “O Estado B” é reconhecido pelo “Estado A”, que por sua vez reconhece o “Estado B”. Uma vez que os Estados reconhecem uns aos outros, também reconhecem a suas soberanias, o que implica no respeito aos limites territoriais e fronteiriços. Se o Estado possui soberania, também detém o monopólio do uso da força; ou seja, a manutenção da sobrevivência derivada da autoridade central exercida por aparatos bélicos. Atores não estatais – Organizações internacionais Além dos atores estatais, também existem os atores não estatais, especialmente as organizações internacionais, cujo maior exemplo é a Organização das Nações Unidas (ONU). Dentro destas organizações, existem múltiplos Estados, que escolhem ou não integrar estas organizações, muita das vezes cedendo parcialmente a sua soberania. Na maior parte das vezes, inclusive, estas organizações são criadas pelos próprios Estados. Neste contexto, as organizações internacionais podem ter diferentes motivações; podendo ser regionais, como a União Europeia; ou temáticas, como por exemplo, a Organização Mundial do Comércio (OMC) que lida somente com o tema “comércio”; ou as finalísticas, que possuem uma finalidade específica, como por exemplo, a ONU cujo objetivo é obter a paz mundial duradoura pela ótica da segurança coletiva. É importante disser, no entanto, que a segurança coletiva pressupõe a ideia voluntária dos Estados de agregarem ou não estas instituições. Organizações internacionais Regionais Englobam uma determinada região do planeta; por exemplo: a União Europeia. Temáticas Possuem um determinado tema, como por exemplo, a Organização Mundial do Comércio. Finalísticas Possuem uma determinada finalidade, como por exemplo, a ONU que possui a finalidade de obter/manter a paz mundial. Contexto pós-1945 Foi a partir do final da Segunda Guerra Mundial que estas organizações foram sendo criadas ou concebidas. Foi a partir de 1945, com o final da Segunda Guerra Mundial, que as principais instituições que conhecemos hoje começaram a ser criadas. Em busca da paz e da regulação mundiais do cenário pós- Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 18. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 17 48 guerra sugiram, por exemplo, a Organização das Nações Unidas, o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e o Acordo Geral Sobre Tarifas e Comércio (GATT) que posteriormente deu origem à Organização Mundial do Comércio. No caso específico da ONU, ainda na esteira dos traumas da Segunda Guerra, a ideia central era impedir um novo conflito global de grandes proporções. Neste caso, um ataque a qualquer um destes membros significaria um ataque a todos os membros. Instituição e organização Neste item, vamos entender a diferença entre instituição e organização, dois conceitos-chave da Política Internacional. Primeiro, seguem as definições [fonte]: Instituição “Estrutura social, estabelecida por lei, que tem vigência em certo Estado ou para certo povo”. Organização “Instituição, associação ou entidade que atua no âmbito dos interesses comuns; organismo”. A instituição está ligada com a ideia de estrutura social, ou seja, algo que independe uma burocracia definida. A organização, por sua vez, é uma associação/entidade que necessariamente possui figuras de comando, burocracias e regras próprias. Seguem alguns exemplos: Exemplo de instituição Exemplo de organização Guerra Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Comércio União Europeia, MERCOSUL, NAFTA. Cooperação Organização das Nações Unidas (ONU) Para entender esta distinção vamos analisar o debate doméstico. A partir de 2013, por exemplo, acirraram-se as discussões sobre a instituição familiar. Como não possui burocracia própria, a família não é uma organização propriamente dita, mas sim uma instituição que tem sido discutida tanto pela população quanto pelos nossos representantes eleitos na Câmara, ou ainda, pelos juízes do Supremo Tribunal Federal (STF). O debate normalmente gira em torno do conceito de família: se ela deve ser compreendida de forma orgânica e historicamente definida ou considerar os novos arranjos. A família, portanto, é uma instituição e não uma organização. No cenário internacional, também existe essa distinção. O comércio é uma instituição internacional, e não uma organização internacional. É verdade que existem organizações criadas com a finalidade de regular o comércio, mas estes termos não podem ser confundidos. O comércio é uma instituição, e assim sendo, existem organizações que cuidam dessas instituições como, por exemplo, a OMC. Esta organização possui um regimento de funcionamento, uma burocracia própria e elementos tangíveis. Ao contrário da organização OMC, a instituição comércio não pode ser percebida ou apalpada sensorialmente. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 19. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 18 48 Outra instituição Internacional é a guerra, o processo no qual dois ou mais Estados buscam resolver uma controvérsia ou uma disputa. A guerra, a cooperação e o comércio são as principais instituições que regem o sistema internacional. Por sua vez, estas instituições envolvem processos. A guerra, por exemplo, possui processos de paz ou conflito, além, das relações de poder. Processos de poder e de cooperação podem resolver qualquer tipo de conflito ou controvérsia. Partindo desse pressuposto, no próximo item trabalharemos a instituição guerra e o processo das relações de poder, também conhecido como balança de poder. Balança de poder Conforme vimos anteriormente, visto que o sistema internacional anárquico não possui autoridade central nem poder de polícia, este estabelece uma lógica do poder que consiste basicamente na desconfiança e na ideia de autoajuda. Neste sistema, os Estados – além de buscarem a estabilidade – também procuram o equilíbrio na balança de poder, ou o equilíbrio de poder. Isso ocorre porque os Estados querem preservar a sua sobrevivência ou aumentar o seu poder, e isso pode ser feito por meio de alianças. Vejamos alguns exemplos nos quadros abaixo: Balança de poder – Situação 01 Neste sistema internacional (círculo azul), todos os Estados convivem de forma anárquica sem autoridade central e sem poder de política internacional. Cada um está preocupado com sua própria sobrevivência. Para que o “Estado A” preserve a sua sobrevivência, deverá aumentar o seu poder; e para isso, pode adotar uma postura ofensiva em relação ao “Estado B”. Fortalecido, ele pode muito bem derrotar os Estados C, D e E, garantindo a sua hegemonia no sistema internacional. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 20. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 19 48 Também preocupados com as suas respectivas sobrevivências, os Estados C, D e E ficam analisando atentamente o conflito entre os Estados A e B, tentando fazer prognósticos do que poderá ocorrer. Acuados pelo expansionismo do “Estado A”, todos os demais Estados (C, D, E e o já atacado B) podem então, fazer uma mega-aliança para neutralizar a ameaça militar do “Estado A”. Partindo-se da mesma situação anterior (um sistema internacional anárquico), o desfecho da balança de poder poderia ser diferente caso outras medidas fossem tomadas, conforme o quadro abaixo: Balança de poder – Situação 02 Ao invés de atacar o “Estado B” (situação anterior), o “Estado A” poderia formar uma aliança com o “Estado B”. Juntos, estes dois Estados seriam mais poderosos do que os outros. Esta dupla aliança poderia atacar o “Estado C”, subjugando-o e aumentando ainda mais o poder dos Estados A e B. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO ==0== 0
  • 21. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 20 48 Obrigado pelos Estados A e B, o “Estado C” poderia, a contragosto, tornar-se parte da aliança. A grande aliança – que agora é tripla – passaria a exercer a hegemonia global. Neste cenário, os Estados D e E ficariam completamente dominados. Evidentemente, estes foram apenas dois exemplos. O importante aqui é entender a enorme gama de possibilidades que o ajustamento da balança de poder oferece. Neste sentido, existem dois tipos de alianças: as de balanceamento ou as de revisionismo. As primeiras buscam alterar a balança atual de poder; já no caso das segundas, o Estado simplesmente se ajusta para devolver o equilíbrio que havia em um cenário anterior. Durante a Europa do século XIX, por exemplo, a balança de poder permaneceu quase estável, sem grandes conflitos, apenas com guerras curtas e pontuais. No século XX, no entanto, com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, houve um ajustamento dramático da balança de poder, com os Estados revendo drasticamente suas alianças e atitudes bélicas. Interdependência complexa Quando pensamos em cooperação internacional, sobretudo no que diz respeito ao comércio – uma instituição que ganhou importância com a globalização – também podemos entender o sistema internacional como uma arena de interdependência complexa. Isto significa que os atores internacionais, ao estarem cada vez mais conectados, também estão cada vez mais dependentes, o que reduz a possibilidade de conflitos diretos. O quadro abaixo ilustra esta inderdependência: No esquema abaixo, os Estados estão representados por círculos; as organizações internacionais representadas por estrelas; e as empresas multi e transnacionais, por quadrados. Este é o modelo que melhor representa o sistema internacional contemporâneo: uma conexão intensa entre atores estatais e não estatais, marcada pela maior interdependência nos ramos da comunicação, transporte, comércio, cultura e finanças. Visto que a ação de um ator afeta o outro ator, não existem claras fronteiras ou separações entre eles. Uma empresa na China, por exemplo, pode ser afetada por medidas do governo norte-americano. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 22. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 21 48 Interdependência complexa Estados não são os únicos atores: - Organizações internacionais - ONGs - Multinacionais/transnacionais Atores interconectados - Comércio - Finanças - Comunicações Conceitos básicos de relações internacionais Teoria das relações internacionais As relações internacionais costumam adotar como marco histórico originário a Paz de Vestefália (1648), uma série de tratados assinados na Alemanha que colocam fim a uma sequência de conflitos entre protestantes e católicos e reconhecem a soberania dos príncipes e dos reis. A partir deste momento, ocorre a consolidação do Estado como unidade política soberana dentro de seu próprio território; gozando, portanto, de capacidade de exercer uso legítimo da força sem ser desafiado. Doravante, ocorre uma grande evolução nas relações internacionais, sobretudo no que diz respeito à evolução dos sistemas estatais. No entanto, a evolução das teorias das relações internacionais somente ocorreu no século XX, quando um houve um desenvolvimento mais claro deste campo. Antes disso, vale lembrar, as Relações Internacionais eram tratadas de forma pouco sistemática. Quanto à finalidade das teorias de relações internacionais: “As teorias das relações internacionais têm a finalidade de formular métodos e conceitos que permitam compreender a natureza e o fundamento do sistema internacional, bem como explicar os fenômenos mais importantes que moldam a política mundial” (Massari e Nogueira – grifo nosso). Deste modo, as teoria das relações internacionais tem como objetivo lançar luz sobre as relações internacionais; considerando a enorme complexidade de relações entre atores estatais e não-estatais. Servem, portanto, para compreendermos melhor estas relações e dinâmicas, entendendo de que modo o sistema internacional funciona, tanto no que diz respeito à sua natureza geral quanto à natureza de cada Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 23. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 22 48 um de seus atores. As teorias de relações internacionais servem para nos esclarecer sobre o que está acontecendo nas relações internacionais. Ainda segundo esta concepção, os métodos seriam sistemas de abordagem, ferramentas explicativas e também, os próprios conceitos. Com base neles, é possível fazer prognósticos e análises específicas. Está todo mundo curioso, por exemplo, para saber o que o Trump e seus aliados vão fazer em relação à Síria. Para isso, nós temos métodos e conceitos que podem nos ajudar a compreender um pouco melhor o que pode ser esperado disso; ou então, uma vez consumada a ação, de que modo aquilo vai repercutir ao longo dos anos. Essa definição do Messari e Nogueira está em um manual chamado Teoria das Relações Internacionais, obra que costuma ser cara aos membros da banca que realizam a prova do Instituto Rio Branco. Cinco regras básicas do relacionamento entre Estados Levando em consideração a teoria das relações internacionais, os Estados se relacionam de acordo com cinco regras básicas: Segurança Proteção dos cidadãos (ou do próprio Estado) contra ameaças internas e externas. Trata-se basicamente da proteção da sobrevivência da continuidade da existência do Estado ou de seus cidadãos. Liberdade Trata-se do nível de autonomia do Estado e dos cidadãos. A liberdade, portanto, pode ser individual ou nacional. Ordem Maneira pela qual se organizam as relações internacionais, de modo a garantir aos países estabilidade e previsibilidade. Justiça Defesa de princípios éticos e do cumprimento dos Direitos Humanos, civis, políticos, sociais e econômicos. Bem estar Prosperidade e bem-estar socioeconômico como prioridade. Embora estas regras sejam universais, cada teoria irá trata-las de forma diferenciada. Ainda nesta aula, mais à frente, quando estudarmos sobre o realismo e o liberalismo, poderemos compreender melhor. Por ora, o quadro abaixo resume as principais abordagens. Prestem atenção nesse quadro! Escola Principal ênfase Principais desdobramentos Realismo Segurança Política de poder Equilíbrio de poder Guerra Liberalismo Liberdade Cooperação Paz Progresso Escola inglesa Ordem Interesses comuns Regras InstituiçõesJustiça Teorias de EPI Bem-estar Desenvolvimento Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 24. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 23 48 Pobreza Igualdade Para o Realismo, a segurança diz respeito à disputa de poder entre os Estados e os atores pelo poder. Essa tendência de disputa pelo poder, de todos competindo entre si, pode levar a um equilíbrio de poder, mas também pode levar a um dilema de segurança, que basicamente consistiria em uma busca por mais segurança que paradoxalmente culminaria em mais riscos para segurança. Em suma, o realismo põe a segurança como ênfase principal. No caso do Liberalismo, a maior ênfase se encontra na liberdade, princípio que reflete dentro desta teoria como uma busca pela cooperação, ou seja, não ocorre uma simples disputa de poder, nem uma disputa clara no sentido de “testar forças”. A ideia da cooperação pressupõe a participação voluntária e espontânea; pressupõe, portanto, que a liberdade seja respeitada. Do mesmo modo, a liberdade é um pré- requisito para a paz e o progresso. Já os princípios de ordem e justiça estão vinculados a Escola Inglesa. Conforme veremos na próxima aula, esta escola enfatiza os interesses comuns entre os Estados e entre os atores internacionais, bem como a observância das regras e às instituições existentes nesse âmbito. As Teorias de Economia Política Internacional (EPI) dizem respeito às teorias que envolvam política e economia; tal como o liberalismo, o marxismo. Por exemplo, as teorias marxistas (sistema-mundo, imperialismo e teorias derivadas à ideologia marxista) vão dar uma ênfase grande no papel do desenvolvimento vinculada ao bem estar, ao combate à pobreza e na igualdade. No marxismo não é necessário apenas liberdade, mas também uma igualdade para que este bem estar seja atingido. Com o avançar do curso, estes conceitos e teorias vão ficando cada vez mais interligados, principalmente entre segurança, liberdade, ordem/justiça e bem estar em várias correntes e escolas político-econômicas. Objetivos das teorias de relações internacionais Podemos citar oito finalidades ou objetivos principais das teorias das relações internacionais, conforme o quadro abaixo: Teoria das Relações Internacionais: Definição Atribuir sentido à complexidade Tornar a realidade inteligível Identificar padrões recorrentes no comportamento dos Estados e na interação entre eles Explicar as leis da política internacional Explicar e prever comportamentos Tradições de pensamento Informar e esclarecer conceitos Criticar as formas de dominação Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 25. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 24 48 A primeira delas é atribuir sentido à complexidade. O sistema internacional é bastante denso, envolvendo um grande número de Estados, eventos bastante complicados de se entender, guerras, acordos de paz, acordos de cooperação, acordos comerciais, etc. Dada essa complexidade, as teorias de relações internacionais existem exatamente para atribuir nexo/sentido, achar o fio da meada e organizar então, todas essas informações. Ou seja, tornar a realidade inteligível. Isso é importante para que entendamos questões complexas e qualifiquemos nossas respostas, sobretudo na terceira fase da prova, etapa que exige maior enriquecimento conceitual e teórico. Dentro dessa complexidade toda, ou dentro dessa realidade opaca, será que existem padrões que se repetem? Será que os comportamentos dos Estados são sempre aleatórios e caóticos ou seguem alguma lógica? Existem regras nisso? Justamente para responder essas perguntas, as teorias também servem para identificar padrões recorrentes no comportamento dos Estados e na interação entre eles. Assim, é possível derivar uma lógica de como estes atores agem e interagem entre si, e de que modo, portanto, podemos fazer uma leitura das relações internacionais; entendendo, por exemplo, quais os padrões enfatizados pelo realismo, pelo liberalismo, etc. Isso tudo nos ajuda a compreender não só a teoria, mas também a realidade internacional. A teoria também ajuda a explicar as leis da política internacional. Se existem padrões recorrentes no comportamento e na interação entre os Estados, também é possível que existam leis. Será que existe uma Lei Geral da Guerra? Como a podemos explicar os conflitos internacionais? Como podemos explicar também o início dos acordos de cooperação? E os acordos comerciais? E a busca de cooperação nas áreas mais variadas? Será que existem leis que regem esses acontecimentos ou processos? Será que existe um padrão tão recorrente que ele se tornou uma regra geral inescapável? As leis da política internacional, portanto, ajudam a tornar a realidade mais simples e inteligível. Com base nesses preceitos, podemos explicar e prever comportamentos. Por exemplo: será que os Estados Unidos irão interferir na situação da Síria? Será que Estados Unidos e seus aliados irão entrar em conflito com a Rússia? As teorias nos fornecem, portanto, as ferramentas que nos ajudariam a explicar o que está acontecendo, o porquê destas tensões; não apenas de forma factual, mas de forma teórico- conceitual qualificando estes fatos. Dentro deste cenário, Existem metodologias que nos vão permitir, ou pelo menos ter a capacidade de antecipar algumas movimentações, de determinados comportamentos estatais. Nós também podemos definir as teorias das relações internacionais como tradições de pensamento. Isso significa, então, que existe um acúmulo de conhecimento, de sabedoria, de fatos, de dados, que podem nos ajudar. Então, se várias pessoas refletiram sobre um determinado assunto, isso nos pode ser útil para informar e esclarecer conceitos. Por fim, nós temos a ideia de que as teorias podem servir não só para explicar, informar ou esclarecer conceitos, mas também para criticar as formas de dominação. Isso ocorre, sobretudo, com as teorias críticas, que estudaremos rapidamente porque não costuma ser muito cobrado. A teoria feminista, por exemplo, já apareceu na prova, é uma teoria crítica, pois está muito mais preocupada em criticar as relações de dominação do que apontar como as coisas realmente funcionam no sistema internacional. Grosso modo, a teoria crítica dá uma ênfase muito maior ao papel da crítica do que ao papel explanatório e científico, do ponto de vista de fazer previsões. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 26. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 25 48 Objetos de estudo e principais divergências entre teorias Tendo estas teorias em vista, podemos avançar e entender o que elas enfatizam, ou qual o objeto de estudo destas teorias; e também, no que elas divergem. No quadro abaixo, estão citados o objeto de estudo das teorias das relações internacionais, e também as principais divergências entre elas. As teorias podem ser estudadas sob a perspectiva ontológica ou epistemológica Objeto de estudo Ontologia O que podemos/devemos conhecer. Discorre sobre o estudo do ser, sobre aquilo que nós olhados como realidade, sobre “o que é”, o que nos interessa enquanto uma realidade existente. Epistemologia Como conhecemos. Discorre sobre o estudo do conhecimento, sobre o método que o conhecimento é apreendido, a forma com que o conhecimento é acessado. Principais divergências Questões éticas Atores centrais Relações centrais A ontologia diz respeito ao estudo do ser, ou seja, aquilo que nós enxergamos como sendo a realidade, sobre “o que é”. Conforme veremos posteriormente, o realismo olha para o sistema internacional como algo que existe em si mesmo, algo factual; e por essa perspectiva, ele vai identificar, por exemplo, as relações de poder entre Estados. Para escola realista, por exemplo, o objeto de estudo dentro deste âmbito ontológico são as relações de poder entre os atores estatais; ou seja, entre unidades políticas organizadas. Já para os liberais, também existe uma ênfase nas relações internacionais entre Estados, mas envolvendo outros atores, como por exemplo, as organizações internacionais. Logo, é correto dizer que concepção ontológica varia de acordo com cada teoria. Corrente Ontologia principal (o que devemos conhecer?) Realismo Relações de poder entre atores estatais Liberalismo Relações de poder entre atores estatais e não-estatais A epistemologia, por sua vez, diz respeito ao método. Há, portanto, uma perspectiva científica. Será que a ciência é capaz de explicar objetivamente certos fenômenos? Será que as ideias são imutáveis ou será que não existe verdade absoluta? Isso são questões que passam pela discussão epistemológica; deste modo, se a ontologia é o “estudo do ser”, a epistemologia é o “estudo do conhecimento”. No âmbito das relações internacionais, quando questionamos a configuração do sistema internacional, ou a natureza dos diferentes Estados ou dos diferentes atores, estamos fazendo reflexões no âmbito da epistemologia. E esses questionamentos possuem variáveis: a teoria construtivista, por exemplo, acredita que todo o conhecimento é socialmente construído. Já o realismo, acredita que existe uma constante, ou seja, que existem comportamentos ou padrões que se repetem. Sendo assim, as diferentes teorias de relações internacionais possuem divergências, que se dão sobretudo em relação às questões éticas, aos atores centrais, e às relações centrais: Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 27. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 26 48 Divergências entre teorias de relações internacionais Questões éticas Cada teoria vai partir de um conjunto de pressupostos morais, com uma visão sobre como o mundo é ou sobre como o mundo deveria ser; mesmo que seja como no caso do realismo, uma perspectiva quase que isenta de reflexões morais. De qualquer modo, há um raciocínio ou reflexão sobre questões éticas. E todas as teorias vão passar por isso. No caso do liberalismo, por exemplo, a questão ética é mais clara que no realismo, isso porque eles enfatizam muito os princípios da liberdade, da defesa, da propriedade; em suma, vários princípios vinculados a tradição iluminista que se inicia com a revolução francesa. Atores centrais As teorias também adotam diferentes perspectivas sobre o quais são os atores centrais da arena internacional. Para o realismo, por exemplo, o que importa é a relação entre Estados, e não entre os demais grupos nestes países. Já para os liberais, os Estados ainda têm certa primazia, mas outros atores também podem se destacar, inclusive indivíduos. Relações centrais Além das questões éticas e dos atores centrais, as teorias também divergem sobre as relações centrais. Qual é a natureza das principais relações? Quais são as principais relações que os teóricos de cada escola enfatizam? Por exemplo, visto que o realismo se preocupa com as relações dos atores estatais; consequentemente, as relações centrais são as relações entre Estados. A tradição realista Antecedentes e panorama geral do Realismo Conforme anteriormente mencionamos, a tradição realista é a escola mais consolidada na Política Internacional, sendo o principal paradigma teórico do ramo nos dias atuais. É amplamente utilizada por analistas, diplomatas, escritores, políticos e demais profissionais do primeiro mundo. A maior parte dos diplomatas americanos, secretários americanos, ou presidentes americanos, por exemplo, seguem a tradição realista. Veremos abaixo um panorama histórico do realismo. A tradição realista – antecedentes Tucídides (balança de poder). Maquiavel (moral própria à política). Hobbes (anarquia). Tragédia grega (ambição, medo e húbris). As teorias de relações internacionais começaram a ser cientificamente sistematizadas somente no século XX, mas suas origens remontam à Grécia antiga, quando o historiador Tucídides (460a.c-395a.c) escreveu a História da Guerra do Peloponeso, um dos livros que deu origem à ciência histórica. Ao longo de todo esse tempo – desde a Era Clássica, passando pela Idade Média, pela Modernidade até chegar aos dias atuais – as ideias de Tucídides sempre foram muito presentes. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 28. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 27 48 A principal contribuição de Tucídides é a ideia de balança de poder. Nesse livro História da Guerra do Peloponeso, ele revela e o que seria o exercício do poder, de que modo o poder funcionaria, e qual seria a lógica do Poder. Ele faz isso a partir da análise de um fato histórico, a partir de eventos factuais. Dentro deste livro, existe um diálogo entre mélios e atenienses, dois povos gregos. Enquanto os atenienses eram uma grande potência, os mélios eram militarmente fracos. Os atenienses, neste diálogo, impõem aos médios à supremacia militar, restando a estes apenas duas opções: ou a rendição ou a completa destruição. Em seguida, os médios tentam resistir afirmando que poderiam contar com ajuda de outros povos. No entanto, os atenienses afirmaram que ninguém teria coragem de combater contra eles, os reis dos Mares. Os médios resistem, e conforme os atenienses anunciaram, foram trucidados pelas frotas marítimas de Atenas. Esse diálogo é um exemplo claro da balança de poder. Dentro desta balança de poder, os estados fazem alianças para balancear ou contra-balancear o poder; organizar, digamos assim, um sistema internacional em que nenhum estado se sobressaia. Era exatamente o caso de Atenas, que começava se sobressair de tal modo que nenhum outro estado teria a coragem ou a audácia de se aliar aos mélios. Atenas, pelo menos em um período curto, conseguiu estabelecer a sua hegemonia; no entanto, outros estados logo se organizariam para formar uma aliança para derrota-la. Esta é a lógica da balança do poder, onde o pensamento realista está muito claro. Tucídides (460a.c-395a.c) – balança de poder O filósofo grego Tucídides foi o primeiro a teorizar sobre balança de poder. Trata-se da tendência dos Estados de balancearem ou contrabalancearem o poder hegemônico existente na arena internacional. Para evidenciar sua teoria, o filósofo explora a disputa entre atenienses e mélios, no qual os segundos foram massacrados pelos primeiros. O filósofo e historiador Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi outro antecedente muito importante para as teorias do realismo. Sua obra “O Príncipe” é bastante conhecida em vários setores da sociedade, sendo inclusive, utilizada para além das discussões político-filosóficas; o que inclui os meios empresarial, pessoal, esportivo, etc. Maquiavel ficou internacionalmente reconhecido por separar a moral da política, o que deu origem à famosa ideia de que “os fins justificam os meios”. Neste sentido, importam muito mais as consequências e os resultados de determinados atos do que a sua moralidade. É por isso que os realistas costumam ser bastante pragmáticos, se importando mais com resultados concretos do que com processos ou princípios morais. Nicolau Maquiavel (1469-1527) – “os fins justificam os meios” Por meio do livro “O Príncipe”, Maquiavel separa a moral da política. O pensamento maquiavélico, portanto, é focado nos resultados práticos e não nos problemas morais. Desde que os fins sejam atingidos, não importa quais meios sejam empregados. O pensamento de Maquiavel é influente até hoje. Após Tucícides e Maquiavel, outra influência bastante importante para o realismo foi Thomas Hobbes (1588-1679). Em âmbito doméstico, segundo Hobbes, há um contrato social que permite a ascensão do Estado, do Leviatã, da autoridade Central que vai impor as regras dentro do território. No Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 29. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 28 48 entanto, esse contrato social ainda não havia ocorrido em âmbito internacional (pelo menos não em sua época). Logo, para este autor, o sistema internacional não possui uma autoridade central, sem ninguém que possa desfrutar do uso legítimo da força. Neste caso, vários estados podem fazer o uso da força de forma descentralizada. Logo, segundo a ideia hobbiniana de estado da natureza, o mundo é controlado de forma anárquica, sem autoridade central, onde prevalece a guerra de todos contra todos. Sendo assim, os Estados tendem a buscar cada vez mais poder, não apenas pelo simples prazer do controle, mas sim, porque estes precisam se proteger de ameaças; afinal, não há segurança e/ou estabilidade em um sistema anárquico. E daí vem a famosa frase de Hobbes: “o homem é o lobo do homem”. Por esta perspectiva, embora a guerra seja uma instituição Internacional que deva observar regras do direito humanitário, se um determinado Estado for mais poderoso do que todos os demais, ele pode simplesmente ignorar estas regras que ninguém vai fazer nada a respeito. Thomas Hobbes (1588-1679) – “o homem é o lobo do homem” Para Hobbes, o estado de natureza do sistema internacional é anárquico, sem autoridade central, sem poder de política, onde prevalece a guerra de todos contra todos. Em âmbito doméstico, existe um contrato social onde o Estado fica responsável por garantir a ordem; no entanto, esse contrato não existe em âmbito internacional. Entender Hobbes é fundamental para entender o realismo! Outro nome bastante conhecido no realismo político é o de Max Weber (1864-1920), que desenvolveu as ideias de Maquiavel tornando-as mais aceitáveis. Para Weber, existem dois tipos de ética: a ética de princípios e a ética de responsabilidade. A primeira se refere aos valores sublimes e elevados como, por exemplo, a paz, a liberdade, ou o respeito às leis. Já a ética de responsabilidade diz respeito à responsabilidade perante a consequência dos atos. Max Weber vai mostrar que muitas pessoas, às vezes “embriagadas” (palavra que ele usa) pela ética dos princípios, por exemplo, em relação à Liberdade, pode acabar fazendo mal à própria Liberdade se ela não tiver a disponibilidade de dobrar esse princípio momentaneamente. Por exemplo: se um determinado chefe de Estado não cerceia a liberdade de um criminoso, isso pode fazer com que esse criminoso se imponha a toda uma sociedade, acabando com a liberdade de um número enorme de pessoas. Neste caso, paradoxalmente, é preciso limitar certa dose de liberdade para atingir uma liberdade maior. Logo, os dois princípios andam juntos. Este processo leva a certa relativização de princípios morais em prol de seus resultados práticos. Neste sentido, tanto Maquiavel quanto Weber defendem que os chefes de Estado (ou os próprios Estados) podem em alguma medida mentir ou trapacear desde que isso seja necessário para garantir, por exemplo, a segurança dos cidadãos, ou a própria continuidade de existência de um determinado estado. Esta manobra, embora não seja bem vista, é amplamente utilizada nas relações internacionais e domésticas dos Estados. Na política, por exemplo, ocorre muito. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 30. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 29 48 Max Weber (1864-1920) – ética de princípios e ética da responsabilidade. Para Weber, existem dois tipos de ética que andam juntos. A ética dos princípios se refere aos valores elevados (paz, liberdade, etc.). Já ética da responsabilidade consiste na responsabilidade perante a consequência dos atos. Um Estado pode, por exemplo, sacrificar a liberdade de um criminoso (ética da responsabilidade) em prol da segurança da população (ética de princípios). Por fim, o realismo político também vai ser influenciado pela tragédia grega, um gênero de teatro mais antigo que Tucídides. Este gênero trabalha com a antropomorfização; isto é, a atribuição de características humanas ao Estado. É por isso que na linguagem dos realistas clássicos, os Estados possuem ambição, medo, ou até mesmo hubris. De acordo com a tragédia grega, hubris é a pessoa que se deixa embriagar ou cegar pelo poder. Contraditoriamente, esta cegueira cria uma vulnerabilidade que culmina na sua própria queda. Muitos teóricos, inclusive, vão enxergar as relações internacionais como algo essencialmente trágico que mais cedo ou mais tarde leva ao conflito ou à guerra. Tragédia grega A tragédia grega influenciou bastante o realismo político principalmente por conta dos conceitos de antropomorfização (atribuição de características humanas ao Estado) e hubris (pessoa que se deixa cegar pelo poder, provocando a sua queda; no caso, o Estado). O sistema internacional é trágico porque existe uma alternância entre paz e guerra. A sistematização do Realismo – Carr e Morgenthau Embora os antecedentes de Tucídides, Maquiavel, Hobbes e Weber tenham sido fundamentais, o realismo político só foi se desenvolver no século XX com as ideias de E.H. Carl e Hans Morgenthau. Criticando certo idealismo que no cenário acadêmico no início do século XX, Edward Hallett Carr (1892- 1982) propôs uma abordagem realista às relações internacionais; isto é, focando mais nos resultados do que nos ideais ou nos princípios morais. Em seu livro “20 anos de crise”, Carr atribui a culpa da Primeira e da Segunda Guerra mundiais aos liberais, a quem ele se referia como “idealistas”. Enquanto os liberais estavam ingenuamente preocupados com ideais de liberdade, paz, ou cooperação, a Alemanha – pouco se lidando a princípios abstratos – se armava e tentava garantir a sua hegemonia. Para Carr, a ingenuidade dos idealistas provocou duas guerras mundiais. A alternativa, portanto, seria o realismo político que busque priorizar resultados e não princípios. Ou seja, retomando Weber, algo que preze pela ética da responsabilidade. Ao contrário de Carr, que desenvolveu seu trabalho a partir de uma perspectiva histórica, o autor Hans Morgenthau (1904-1980) também se preocupou com a perspectiva teórica. Morgenthau escreveu um livro chamado “Política entre as nações”. Nesta obra, descreve quais os princípios, comportamentos e padrões que regem o sistema internacional. Justamente por isso, Morgenthau é considerado um dos principais nomes das Relações Internacionais. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 31. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 30 48 Ao estabelecerem as bases do realismo político, Morgenthau e Carr abrem um debate sobre o questionamento do idealismo liberal; este marcado pela busca da paz, da prosperidade, da fraternidade, da igualdade, da liberdade, entre outros princípios. Grosso modo, os idealistas propunham um cenário futuro dizendo como o mundo deveria ser. Já os realistas, menos utópicos e mais pragmáticos, estavam preocupados em compreender o funcionamento das relações internacionais. O que pensavam Carr e Morgenthau, os dois principais realistas do século XX? Edward Hallett Carr (1892-1982) – perspectiva histórica Para Carr, as duas guerras mundiais foram causadas por idealistas liberais, que de forma irresponsável, deixaram a Alemanha se armar e alterar a balança de poder. Para evitar novos confrontos, seria necessário que os Estados se orientassem por resultados práticos e não por idealismos (paz, liberdade, etc.). Hans Morgenthau (1904-1980) – perspectiva teórica Morgenthau, por uma perspectiva teórica, explicou e teorizou sobre os princípios, comportamentos e padrões que regem o sistema internacional. É dele, por exemplo, as concepções de soberania estatal, dilema de segurança ou busca pela sobrevivência. Seis princípios do Realismo Político Em sua obra, Hans Morgenthau propôs seis princípios de funcionamento do sistema internacional; princípios estes, amplamente adotados por estudos realistas posteriores. Conforme o quadro abaixo: Seis princípios do realismo político 01 – Estados soberanos são os atores essenciais. Neste momento, em um contexto de entreguerras, Morgenthau teorizou, de forma bastante pessimista, que os estados são os únicos atores que importam na arena internacional. Um exemplo disso seria a falência da Liga das Nações, entidade criada com o objetivo de manter a paz após a Primeira Guerra Mundial. Evidentemente, com a globalização ocorrida nas últimas décadas, esta concepção foi sendo questionada, mas era este protagonismo estatal que vigorou em quase todo o século XX. 02 – Busca permanente pela sobrevivência, pelo poder e pela hegemonia. Visto que o sistema internacional é anárquico (conforme teorizou Hobbes), este é marcado por uma situação constante de risco e ameaças. Se não existe uma autoridade central garantindo a ordem, a lei ou a observância das regras, o Estado pode contar apenas consigo próprio e não com seus vizinhos ou Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 32. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 31 48 aliados; afinal, em momento de vulnerabilidade crítico, as alianças podem ser reconfiguradas. É neste contexto que surge a ideia de auto ajuda – a concepção de que os Estados só podem contar com a sua própria ajuda e com seus próprios recursos. E para isso, há uma busca permanente pela sobrevivência; o que impulsiona a busca pelo poder. Consequentemente, a busca pelo poder, pode levar – e normalmente leva – à busca pela hegemonia, ou seja, a busca do poder absoluto de forma que o Estado consiga se sobressair perante aos demais. 03 – Moral, valores e ideologia são irrelevantes. Tomando como perspectiva Maquiavel e de Weber, não é útil, para os analistas de relações internacionais, conhecer quais são os valores, os princípios, as crenças subjetivas dos atores envolvidos. Sendo assim, as questões morais, religiosas e ideológicas vão ser deixas em segundo plano. Esse pensamento foi adotado com muita frequência pelos secretários de Estado, pelos estrategistas, pelos diplomatas, pelos militares americanos durante a Guerra Fria, por exemplo. Na época, eles afirmavam que o fato da União Soviética ser comunista (ou seja, com ideologia totalmente distinta à deles) não eliminava o fato de prevalecer uma disputa pela hegemonia internacional entre os dois Estados envolvidos. Segundo esta concepção de Morgenthau, pouco importa, por exemplo, que o Irã seja islâmico e que os Estados Unidos seja um país de maioria cristã. Isso, para ele, não vai afetar em nada, pois ambos vão agir acordo com a busca pela sobrevivência, pelo poder e pela hegemonia. 04 – Jogo de soma zero Para os realistas existe um Jogo de soma zero que significa basicamente que não existe uma relação em que todos possam ganhar concomitantemente. Dentro do sistema internacional, devido a esta lógica do poder, quando um Estado ganha, necessariamente outro perde. Isso significa, por exemplo, que se os Estados Unidos ganharem poder, necessariamente outro Estado vai perdê-lo; e isto se deve exatamente por essa lógica do poder e da sobrevivência que se impõe no cenário internacional. Esta é uma perspectiva diametralmente oposta ao liberalismo, que fala na ideia de um jogo de ganha- ganha, ou seja, quando um Estado ganha por meio da cooperação com outro, principalmente no âmbito comercial, ambos podem ter vantagens. Veremos este assunto mais à frente. 05 – Distinção entre política interna e externa A distinção entre política interna e externa está vinculada com a separação entre moral, valores e ideologias. Isso quer dizer, basicamente, que o processo interno da política interna de um país não reflete na sua política externa. Conforme veremos adiante, outros autores desenvolveram esta ideia, como o neorrealista Kenneth Waltz. Por essa perspectiva, os Estados funcionariam como bolas de bilhar em um sistema internacional, no qual só é possível enxergar a superfície e não o centro. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 33. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 32 48 Logo, o que ocorre dentro do âmbito doméstico não tem relevância, e isso inclui os valores do partido eleito ou da maioria da população. Neste sentido, pouco vai mudar, por exemplo, se o presidente do Brasil for Lula ou Bolsonaro, pois ambos vão atuar de acordo com a lógica do poder inerente ao sistema internacional. 06 – Dilema de segurança Conforme vimos anteriormente, a ideia do dilema de segurança tem a ver com a busca permanente pelo poder e pela hegemonia. Visto que o sistema internacional não conta com poder de polícia e que os Estados só podem contar com a autoajuda, há uma busca constante pela sobrevivência, pelo poder e pela hegemonia. Se um Estado pode contar apenas consigo próprio, é necessário se armar e se proteger; ou seja, dissuadir os outros Estados de ataca-lo e garantir assim, a sua sobrevivência. Só que quando um Estado aumenta o seu poder, isso gera desconfiança em outro Estado, que consequentemente também vai aumentar o seu poder. E aumentando seu poder, faz com que o primeiro estado também volte a aumentar. Isso gera uma corrida armamentista interminável. O dilema de segurança é exatamente isso: a excessiva preocupação com a segurança, ao invés de gerar a própria segurança, acaba acirrando as tensões e elevando o risco de conflitos. Tendo o quadro e o texto acima em vista, os principais pressupostos do realismo são: A tradição realista: principais pressupostos Anarquia internacional O sistema internacional é sempre anárquico. Não significa que há o caos, mas apenas a ausência de uma autoridade central, ausência de um poder de polícia. Há ali, certa incerteza em relação ao destino das nações, porque não há ninguém mantendo a ordem. Sistema internacional conflitivo Como há uma anarquia, isso leva a um sistema internacional conflitivo. Basicamente, há uma busca constante pela sobrevivência que leva a uma busca por poder, que tem um efeito colateral de gerar mais preocupação (dilema da segurança). Centralidade do Estado As relações internacionais giram em torno do Estado, neste caso, o que importam são os atores estatais. Jogo de poder A lógica que se impõe no realismo é a lógica do poder. Ou seja, o que importa não é a questão moral (busca pela paz, liberdade, etc.), mas sim, o poder, pois é ele que garante a sobrevivência do Estado. Sobrevivência A sobrevivência, portanto, está no centro das relações internacionais. Desconfiança e auto-ajuda A busca pela sobrevivência em um sistema anárquico e conflitivo leva à desconfiança. O Hobbes fala em um estado de natureza em que há uma guerra de todos contra todos, ou seja, supõe que o ataque pode vir de qualquer lado. Todos são inimigos em potencial, e isso evidentemente, gera uma grande desconfiança, que também pode ser Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 34. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 33 48 resumida na frase do Hobbes: “o homem é o lobo do homem”. No caso, o Estado seria o lobo do Estado. Esta desconfiança gera a lógica da autoajuda. Ou seja, a ideia de que ao não confiar em nenhum outro Estado, os Estados confiam apenas em si próprios, podendo contar apenas com a sua própria ajuda. Cooperação (dentro da lógica de poder) A auto-ajuda gera uma cooperação dentro da lógica de poder. Só há cooperação quando há interesse. Desfeito o contexto de interesse, a cooperação é desfeita (exemplo dos EUA e URSS que lutaram lado a lado e depois desfizeram a aliança e entraram na tensão da Guerra Fria). A cooperação é sempre momentânea, pontual e atende à lógica de poder. Tendo esses pressupostos em vista, e retomando a ideia da Tragédia Grega, a política sempre acaba em tragédia. Sempre vai ter um Estado desafiando ao outro, novas potências contestando velhas potências, e isso leva o sistema internacional a uma constante mutação de sua configuração e a uma série de conflitos. Existem diferentes arranjos mais ou menos estáveis, arranjos que são mais ou menos propensos ao conflito. Com base nestes pressupostos, os realistas podem aplicar a teoria à prática. Será, por exemplo, que a bipolaridade que havia na Guerra Fria era mais ou menos pacífica do que a multipolaridade? Será, por exemplo, que a ascensão da China provocará um conflito com os Estados Unidos? Muitos teóricos realistas, como John Mearshaimer, acreditam nessa possibilidade. Conforme a China cresce, ela poderá interferir nos interesses americanos, e além do choque comercial-econômico como já ocorre, também existirá uma disputa político-militar. CAI NA PROVA Cespe/UNB (CACD/2010) 1. O paradigma realista de análise das relações internacionais enfatiza as relações de poder entre as comunidades políticas e organizadas. De acordo com essa visão, prevalecem nessas interações as relações de força e desconfiança, o que acaba conduzindo ao chamado dilema de segurança. COMENTÁRIO De fato, a tradição realista enfatiza as “relações de poder” entre “comunidades políticas e organizadas”, o que seriam os Estados nacionais. Também está correto o fato de que prevalecem nestas interações as relações de força e desconfiança (princípio de autoajuda). Sendo assim, para se protegerem e garantirem a sua sobrevivência na anarquia internacional, os Estados acabam investindo pesado em armamentos. No entanto, essa preocupação excessiva com segurança acaba conduzindo ao “dilema de segurança”. Este dilema significa que paradoxalmente, ao investirem em segurança, os Estados aumentam a desconfiança de outros Estados que também acabam investindo em segurança e no final, o risco de conflito aumenta. Gabarito: Certo Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 35. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 34 48 Cespe/UNB (CACD/2010) 2. A referida teoria baseia-se, em grande medida, no princípio da antropomorfização dos Estados nacionais, no sentido de que estes podem ser caracterizados como entidades possuidoras de atributos psicológicos humanos, tais como honra, decepção e desejo de glória e poder. COMENTÁRIO Sim, no realismo ocorre a antropomorfização dos Estados, ou seja, a atribuição de características psicológicas humanas ao ator estatal; então, a questão está correta. Gabarito: Certo Correntes do realismo: realismo clássico, realismo científico e realismo estrutural (neorrealismo). Analisando a história do realismo, há uma grande evolução que vem desde Tucídides, passando por Maquiavel, Hobbes e Weber; e aí sim, como teoria das relações internacionais, surgindo com Carr e Morgenthau, criando aquilo que ficaria conhecido como realismo clássico. Posteriormente, surgiram outras vertentes de realismo, como por exemplo, o neorrealismo, cujo maior expoente foi o norte-americano Kenneth Waltz (1924-2013). Waltz trouxer mudanças mais epistemológicas do que ontológicas para o realismo, com a preocupação de atribuí-lo uma qualificação científica mais robusta. Sendo assim, além da antropomorfização e do vínculo com a literatura e a filosofia que o Morgenthau fazia, o realismo poderia adotar alguns princípios behavioristas, trabalhando com a ideia de cálculo racional; ou seja, a ideia de que todos os atores buscam maximizar os seus ganhos e reduzir na máxima medida possível, as suas perdas. Ele passa a adaptar isso às relações internacionais e daí vem o realismo estrutural ou neorrealismo. No quadro abaixo é possível entender melhor esta distinção: A tradição realista: principais vertentes Realismo clássico Crítica ao idealismo (Carr) Teoria pura das Relações Internacionais (Morgenthau) Base Histórica e Filosófica Antropomorfização Realismo científico (Waltz) Matematização (Modelagem/Teoria dos Jogos) Metodologia das Ciências Naturais Realismo estrutural (Neorealismo) (Waltz) Ênfase na estrutura do Sistema Internacional (behaviorismo) Duas Vertentes: Realismo Defensivo e Realismo Ofensivo Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 36. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 35 48 Conforme vimos anteriormente, o realismo clássico consistia em uma crítica ao idealismo (principalmente com Carr) e a busca por uma teoria pura das relações internacionais com o Morgenthau (se se preocupava com teorias puras). Ambos foram influenciados por Maquiavel, Hobbes, Webber, e demais filósofos, pensadores ou historiadores. Logo, o ferramental do realismo clássico era predominantemente humanístico, usando filosofia, literatura, fatos históricos, para pensar as relações internacionais. É deste contexto, por exemplo, que surgiu a ideia de antromorfização; ou seja, a tentativa de entender as relações entre Estados de acordo com a psicologia humana. Com o realismo científico proposto por Kenneth Waltz, a base humanística – embasada na filosofia, na história e na literatura é enfraquecida. Waltz tenta fazer uma matematização dos pressupostos do realismo, utilizando modelos estatísticos e também teoria dos jogos, cálculos racionais que permitem compreender uma série de situações. Busca, portanto, metodologias das ciências naturais. Kenneth Waltz (1924-2013) – neorrealismo e realismo científico Com a preocupação de atribuir uma carga científica mais robusta ao realismo, Waltz foi o principal idealizador do realismo científico e do realismo estrutural (neorrealismo). Se o realismo clássico (correntes pré-Waltz) tinha uma base humanística mais carregada, as correntes propostas por Waltz adotavam métodos matemáticos, estatísticos e comportamentais. No entanto, o realismo clássico possui uma importância muito maior do que o científico. O que o científico faz é trazer algumas questões epistemológicas que aí sim, vão dar origem ao neorrealismo, corrente também concebida por Waltz. O realismo estrutural (neorrealismo), parte desta base mais científica que tenta observar algumas metodologias das ciências naturais, mas tem como principal característica a ênfase na estrutura do sistema internacional, motivo pelo qual o neorrealismo também é chamado realismo estrutural (ênfase na estrutura do sistema internacional adotando princípios behavioristas, partindo de certa matematização também). E aí surgem duas vertentes: o realismo defensivo e o realismo ofensivo. Basicamente, a diferença entre ambos é que os adeptos do realismo defensivo (como o próprio Waltz) vão dizer que os Estados estão preocupados com a sobrevivência, e que para eles, basta ter a garantia de que continuarão sobrevivendo. Portanto, eles buscam tanto poder quanto seja necessário para sobreviver. Já os neorrealistas ofensivos acreditam o contrário: a sobrevivência é sim importante, mas que por isso mesmo, os Estados sempre adotam uma postura ofensiva, de expandir o seu poder cada vez mais independentemente da situação, que ele jamais vai se sentir seguro. Para os realistas ou neorrealistas ofensivos os Estados devem sempre expandir o seu poder, independentemente das consequências até que o conflito ocorra. Subvertentes do neorrealismo Realismo defensivo Os Estados devem procurar poder suficiente para garantir a sua sobrevivência (postura defensiva).. Realismo ofensivo Justamente porque a sobrevivência é importante é que os Estados devem expandir seu poder o máximo possível (postura ofensiva) Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 37. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 36 48 Para entendermos esta diferença na prática, vamos voltar ao John Mershaimer, autor já citado por conta da ascensão chinesa. O autor enfatiza que devido ao crescimento da China e a sua ascensão enquanto potência regional, ela não vai poder adotar uma postura defensiva para sempre. Segundo esta perspectiva, se a China continuar crescendo, irá necessariamente entrar em conflitos dentro do próprio contexto asiático ou indo-pacífico, como por exemplo, com a Índia ou o Japão. Seria nesse momento que os Estados Unidos interviriam, provocando um choque entre a ascendente China e a já estabelecida potência norte-americana. Um neorrealista defensivo poderia negar esta realidade, afirmando que embora a China esteja ampliando seu poder, ela ainda não se sente ameaçada e, portanto, não iniciaria um conflito de forma independente. Um conflito, neste caso, ocorreria somente se houvesse uma falha de percepção que levasse a China a ideia de que os Estados Unidos poderiam atacá-la a qualquer momento. Repare, no quadro abaixo, que tanto o realismo clássico quanto as correntes recentes (neorrealismo e realismo científico) acreditam nos mesmos pressupostos e princípios. Logo, a diferença está no método empregado, e não na essência. Realismo clássico Neorrealismo e realismo científico Moralidade Separação entre moral pessoal e moral do estado Separação entre moral pessoal e moral do estado Atores Estados nacionais são os principais atores Estados nacionais são os principais atores Relações Relações de poder entre estados Relações de poder entre estados Ontologia Interação entre estados no sistema internacional. Interação entre estados no sistema internacional. Epistemologia Humanística (fatos históricos, raciocínio filosófico) Matemático-estatístico. (abordagem racionalista) O realismo clássico adota o antropomorfismo estatal, atribuindo características do homem para o Estado, que seria dotado de ambições, glória, honra, medo, etc. Há um certo moralismo, não no sentido de se preocupar com questões éticas, mas no sentido de ver essas relações com aquela visão de tragédia, como se fosse algo negativo; ou seja, de forma pessimista. Por outro lado, os neorrealistas não vão atribuir sentimentos às relações internacionais, mas sim tentar entendê-las como elas são; portanto, há uma abordagem racionalista; ou seja, behaviorista (da palavra behavior que significa comportamento). A ideia central é que os Estados adotam comportamentos racionais, que podem ser calculados e medidos de modo bastante objetivo, havendo uma ênfase nos condicionantes do sistema e no comportamento dos Estados dentro destes condicionantes. Conforme vimos acima, o neorrealismo também é chamado de realismo estrutural, havendo uma predominância nos condicionantes do sistema. Logo, para esta corrente, há um enfoque na configuração de poder dentro do sistema, ou seja, a lógica e o comportamento adotado pelos Estados. Essa abordagem racional pressupõe uma busca pelas respostas racionais dos atores estatais aos desafios e condicionantes postos pelo sistema internacional. Basicamente, há uma troca do antropomorfismo pela abordagem racional pautado pelo cálculo racional que os estados devem fazer para maximizar seus ganhos e minimizar suas perdas. Se no realismo clássico há um pessimismo de que tudo acaba em tragédia, de que tudo vai acabar muito mal, simplesmente porque essa é a natureza das coisas; no realismo estrutural, parte-se de uma ênfase no sistema internacional e na sua configuração. Então essa é a principal diferença entre o realismo clássico e o neorrealismo. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 38. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 37 48 Tanto no neorrealismo quanto no realismo científico, o autor mais importante é o do Kenneth Waltz, o pai dessa vertente. Como ele já faleceu, atualmente estas correntes são seguidas por nomes como Robert Jervis, Stephen Walt, e John Mearsheimer. O quadro abaixo resume as principais distinções entre realismo clássico, realismo científico e neorrealismo. Realismo clássico • Antropomorfismo estatal, moralismo, pessimismo. • Base humanística (literária, histórica, filosófica, etc.) • Influências de Tucídides, Maquiavel, Weber, Hobbes • Sistematização com Carr e Morgenthau. Realismo científico • Base estatístico-matemática • Metodologias das ciências exatas e biológicas, com forte influência positivista • Principal autor: Kenneth Waltz. Realismo estrutural ou neorrealismo • Abordagem racionalista com ênfase nos condicionantes do sistema • Influência do behaviorismo • Principal autor também é Kenneth Waltz. • Realismo defensivo e realismo ofensivo A tradição liberal Antecedentes da tradição liberal Junto à tradição realista, a tradição liberal é a mais importante nas relações internacionais. Assim como no caso do realismo, foi apenas no século XX que o liberalismo surgiu no campo das relações internacionais. Por questões de foco, não vamos estudar o “liberalismo econômico”, nem o “liberalismo político” – estes sim com sólidos antecedentes antes do século XX – mas sim, focar nas relações internacionais. As raízes do liberalismo podem ser rastreadas até o iluminismo, seja ele francês, alemão ou inglês. Portanto, esta corrente possui certa influência de figuras como Kant, Russeau, Locke; nomes que foram importantes para definir o conjunto de valores e princípios que regem, de algum modo essa tradição teórica que é chamada de tradição liberal, mas que também é conhecida como tradição idealista, justamente por dar ênfase aos princípios morais, éticos e filosóficos. No quadro abaixo, são evidenciadas as principais ideais dos principais autores que antecederam e influenciaram o pensamento liberal, que são: Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), Immanuel Kant (1724 - 1804), Adam Smith (1723 - 1790), John Locke (1632 - 1704) e Hugo Grotius (1583 - 1645). Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 39. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 38 48 Antecedentes e influências da tradição liberal Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) Ao contrário do pensamento realista de Hobbes (homem é o lobo do homem, ou seja, natureza inclinada ao mal), Rousseau defendia que a natureza humana era essencialmente boa. Para Hobbes, se deixados à sua própria sorte, naquele estado de natureza, os homens tenderiam a fazer guerra de todos contra todos. Para o Rousseau, no entanto, o homem teria uma natureza essencialmente boa, porém, seria corrompido pelas instituições, pela propriedade privada, e por outros fatores sociais. Enquanto o pessimismo de Hobbes influenciou o realismo político, o idealismo de Rousseau influenciou o liberalismo. Immanuel Kant (1724 - 1804) (Racionalismo e Cosmopolitismo) Sendo uma das influências mais importantes na tradição liberal, Kant defendia o racionalismo. Ou seja, a ideia de que pelo uso da razão, pela comunicação clara, pela reflexão, seria possível chegar à resolução de todos os problemas sociais e políticos. Kant também pregava o cosmopolitismo, que diz respeito ao universalismo dos valores, tais como paz, liberdade e prosperidade. Estaria assim, formada a base do pensamento liberal. A natureza humana seria essencialmente boa e inclinada para o bem (Rousseau); a razão humana possuiria a capacidade de resolver problemas (Kant); e os valores adotados pelos liberais (liberdade, paz, prosperidade), seriam valores universais, ou seja, não variariam de cultura para cultura (Kant). Adam Smith (1723 - 1790) Smith possui uma enorme influência na tradição liberal, sobretudo nas ideias de comercio internacional, do comércio em geral, e liberdade econômica. Smith foi um dos principais teóricos do capitalismo, sistema econômico que ganhou força após a Revolução Industrial. Segundo este, o capitalismo seria definido por meio da troca voluntária de trabalho e regido pela “mão invisível” do livre mercado; ou seja, um sistema que dá autonomia para o indivíduo. John Locke (1632 - 1704) As contribuições principais de Locke são a ideias de contratualismo, ou seja, a concepção de que os indivíduos devem escolher suas instituições e representantes; e também a de propriedade privada, tanto no sentido de algo que você possui (casa, carro, um bem que deve ser respeitado e tomado como algo sagrado), quando no sentido de auto-propriedade (ideia de que você deve ter o direito de defender a sua vida em todas as circunstâncias, porque o seu corpo, a sua vida, é a sua primeira propriedade). O Locke traz a defesa da liberdade, da propriedade e da vida. A vida defendida por meio da paz; a liberdade e a propriedade por meio das instituições. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 40. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 39 48 Hugo Grotius (1583 - 1645) Embora tenha antecedido os pensadores citados acima, Grotius é considerado um dos fundadores do direito internacional, cujas regras serviram de base para as concepções iluministas que surgiriam no século XVII. Retomando os pontos centrais do quadro acima, Rousseau contrasta com Hobbes, explorando a ideia do “bom selvagem”, de que o homem em sua origem, vivia pacificamente, harmoniosamente, e que isso foi sendo perdido conforme as instituições sociais foram sendo criadas de modo a pervertê-las. Na essência do liberalismo, portanto, existe essa visão de que a natureza humana é uma natureza boa e que em determinadas circunstâncias, se ocorrerem os estímulos corretos, o homem sempre vai buscar a paz, a cooperação, as relações espontâneas, seja por meio do comércio ou outros tipos de relações. E isso vai ser muito enfatizado pelos teóricos liberais. É por isso que os liberais dão uma ênfase muito grande ao regime democrático, fazendo uma grande defesa das democracias, do império das leis, do sistema representativo, ou seja, as democracias liberais. Também vão fazer uma grande defesa do livre comércio, da liberdade de compra e venda, da liberdade de empreender, da livre iniciativa com influência mais clara de Adam Smith e outros economistas liberais. Por meio do Kant, temos a essa ideia do racionalismo iluminista. Aquela ideia de que a razão é capaz de resolver todos os problemas humanos e sociais desde que haja espaço para comunicação, para troca de informações. Ainda para Kant, temos a ideia de cosmopolitismo, ou seja, a a ideia de que os valores como a liberdade, o individualismo, democracia, são, ou pelo menos devem aspirar ser, universais. E isso possui uma relação estreita com a Revolução Francesa, quando pensamos em igualdade, liberdade e fraternidade. Conceitos centrais da tradição liberal Tendo os antecedentes em vista, segue abaixo um quadro-explicativo com os principais conceitos da tradição liberal, que são: valorização de outros atores que não sejam os estatais, interdependência complexa, busca de ganhos compartilhados e necessidade de cooperação internacional, diferenças entre hard power e soft power e relações entre política interna e externa; e finalmente, a tríade entre guerra justa, intervenções humanitárias e responsabilidade em proteger (R2P). Conceitos centrais da tradição liberal 01 – Valorização de outros atores (não-estatais, OIs, ONGs, multinacionais) Diferentemente da tradição realista, a tradição liberal também considera os atores não estatais, e não somente o Estado. Nessa categoria entram as organizações internacionais, as organizações não governamentais, as empresas multinacionais; e inclusive, alguns indivíduos que podem ser considerados atores internacionais relevantes, desde que tenham a abrangência e capacidade de afetar as relações internacionais. Um exemplo de indivíduo que possui agência internacional é o investidor George Soros, homem que possui, inclusive, o poder de decidir o rumo de algumas nações específicas. Basicamente por Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 41. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 40 48 meio de suas movimentações na bolsa de valores, Soros foi responsável pela quebra do banco da Inglaterra e pela insolvência da moeda tailandesa. Para os liberais, portanto, essas relações também devem ser consideradas. Ao contrário do realismo – cuja ideologia e pressupostos morais são pouco relevantes – o liberalismo considera os valores defendidos por líderes de Estado, como por exemplo, presidentes da república. No realismo, não há nenhum impacto claro dos valores, princípios e ideologias nas relações interacionais, tampouco na atuação dos estados no âmbito externo. Já para os liberais, ocorre o contrário: as ideologias valores e princípios impactam diretamente as relações internacionais, determinando, portanto, sua própria orientação. Do mesmo modo, ao contrário da concepção realista de “bola de bilhar”, para o liberalismo, o que acontece dentro dos Estados, em âmbito doméstico, afeta diretamente o que ocorre no âmbito externo. 02 – Interdependências complexas entre atores e agendas Visto que o liberalismo considera a multiplicidade de autores, há uma concepção de interdependência complexa entre atores e agendas. Primeiramente, os atores dependem uns dos outros, principalmente no que diz respeito ao comércio, às comunicações, aos fluxos migratórios, e às demais relações internacionais que ocorrem no mundo. Ou seja, uma dependência mútua entre os atores internacionais; entre os estados, as ONGs, as organizações não governamentais. Isso significa, por exemplo, que, os EUA mantém relações comerciais com a China, e portanto, dependem dessas relações comerciais para manter e sustentar a sua prosperidade e o seu crescimento econômico: muitas empresas americanas pautam toda a sua existência, toda a sua atividade, em torno de produtos vindos ou enviados da/para China. Isso significa então, que existe uma interdependência bastante complexa de modo que algo que impacte uma das partes, também pode impactar a outra. Esta multiplicidade e interdependência de relações cria um cenário internacional volátil. Ou seja, ao contrário do que ocorria antigamente, os Estados nacionais não têm tanta margem para saírem guerreando uns com os outros sem grandes consequências. O comércio, por exemplo, é uma instituição que incita a cooperação e diminui os riscos de conflitos. Segundo os liberais, Estados que mantém relações comerciais livres uns com os outros têm a tendência de não irem para a guerra. Portanto, é possível buscar a paz por meio do comércio, não porque os estados sejam pacíficos ou não queiram a guerra, mas porque eles sabem que ao entrar em guerra, os interesses tanto dos Estados quanto de seus cidadãos vão ser afetados. Se os Estados Unidos atacarem a China, por exemplo, pode ser que empresas americanas instaladas em território chinês sejam destruídas. Além do comércio, a interdependência também ocorre por meio do turismo, das redes de comunicação, e de outras formas de integração. Além disso, nós temos que levar em consideração a interdependência complexa das agendas. Para os realistas, a agenda prioritária, e talvez a única que importe, seja a agenda do poder, que lida com questões de segurança (sobrevivência no centro de todas as relações). No entanto, para os liberais, a agenda de segurança está relacionada com outras agendas, como por exemplo, a de meio ambiente, a de desenvolvimento econômico, ou a de direitos humanos. A segurança, por exemplo, pode ser impactada de acordo com o regime implantado em cada país (república, ditadura, democracia, anarquia, etc.), que pode, por sua vez, ser afetada por questões ambientais, de direitos humanos, de economia, etc. Essa Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 42. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 41 48 interdependência ocorre tanto entre os atores quanto entre as agendas, sem uma hierarquia clara. 03 – Busca dos ganhos compartilhados/ Cooperação internacional não é só possível como necessária Em contraste com o jogo de soma zero (realismo), o liberalismo prega a busca dos ganhos compartilhados. Isso significa que partindo dessa premissa liberal de que o comércio, as relações espontâneas e a cooperação são benéficos, os Estados podem ter ganhos compartilhados, sem necessariamente uma das partes sair perdendo. Nesse caso, é possível que os dois vençam juntos, significando que quando um Estado oferece algo que outro Estado deseja, e este oferece algo em troca, os dois podem se beneficiar por meio da cooperação. Isso não significa, porém, que os dois vão ganhar igualmente, mas sim, que podem ter ganhos relativos. Vamos imaginar um exemplo hipotético no qual tanto o “Estado A” quanto o “Estado B” crescem igualmente 3% ao ano. Após uma eventual cooperação comercial, o “Estado A” passa a crescer 5% e o “Estado B”, 7%. São ganhos diferentes, mas ambos estão assumindo patamares melhores. Isso é, portanto, um jogo de ganha-ganha, pois todos os atores envolvidos estão se beneficiando por meio da cooperação. Esta perspectiva é, portanto, oposta ao do realismo que enfatiza a lógica do poder no qual os estados estão todos em disputa em uma guerra de todos contra todos. Logo, para os liberais, a cooperação internacional não só é possível, como é necessária. 04 – Hard Power e Soft Power/Política interna afeta política externa Os liberais também tratam da divisão entre hard power e soft power. Hard power é o poder tangível, tradicional, das relações de poder, da força, militar, da agenda de segurança muito relacionada ao próprio realismo. Já o soft power é um poder mais brando, oriundo da capacidade de influenciar por meio das ideias, dos valores, da cultura e da imagem que se projeta internacionalmente. Sendo assim, os liberais dão uma grande ênfase à importância do soft power em um mundo de interdependência complexa. Diferentemente do realismo, eles defendem que a politica interna afeta a política externa. Então, para o Kenneth Waltz, o Estado era visto como uma bola de bilhar que podíamos ver apenas a superfície. Contudo, os liberais pensam ao contrário: o Estado não seria uma bola de bilhar, mas sim, algo totalmente transparente que precisa ser analisado desde dentro, observando por exemplo, o regime, os valores, ou partido que está no poder daquele Estado. 05 – Guerra Justa/Intervenções humanitárias/R2P Por fim, alguns conceitos que os liberais enfatizam que dizem respeito à agenda de segurança é a ideia combinada de guerra justa, intervenções huminatárias e R2P (responsability to protect). De acordo com os liberais, a guerra justa é somente a guerra de legítima defesa. Por essa lógica, um Estado só está justificado a entrar em um conflito quando ele está se defendendo de um ataque prévio, tanto a si próprio quanto a terceiros. Caso contrário, nada justifica a guerra. A exceção desta regra ocorre quando o Estado executa intervenções humanitárias em outro Estado. Isso pode acontecer, por exemplo, quando o Estado “atacado” viola as obrigações de fornecer segurança ou proteger os direitos humanos de seus cidadãos. Neste caso, a ONU, por exemplo, pode interferir porque Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 43. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 42 48 esta organização internacional possui uma responsabilidade de proteger (R2P). Sendo assim, o Estado só pode entrar em guerra para se defender (guerra justa), ao menos que intervenções humanitárias sejam necessárias, pois estes possuem responsabilidade de proteger (R2P). É importante perceber, portanto, que ao contrário do realismo, o liberalismo coloca o indivíduo e a sociedade civil acima do Estado. Vejamos um exemplo hipotético. Suponhamos que o Estado brasileiro comece a assassinar pessoas de modo totalmente arbitrário, cometendo genocídio contra sua própria população. Muito provavelmente esse fato seria levado para organizações internacionais (ONU, OEA, UNASUL, etc.) para ser discutido e deliberado. A Síria e a Venezuela estão passando por essa situação. Principais pressupostos da tradição liberal Uma vez entendidos os antecedentes e os conceitos centrais da tradição liberal, estudaremos alguns de seus principais pressupostos: A tradição liberal: principais pressupostos Livre comércio  Prosperidade  Paz O livre comércio se baseia na liberdade de empreendimento e na livre iniciativa nas relações espontâneas entre indivíduos e/ou Estados. Quando existe o comércio, existe uma pessoa que voluntariamente deseja comprar de uma pessoa que voluntariamente deseja vender, formando um vínculo social totalmente espontâneo e livre, sendo uma das bases para relações mais pacíficas e prósperas. Este conceito é válido tanto para o comércio em âmbito domestico quanto internacional. Democracia  Prosperidade  Paz No realismo, as ideologias e valores não afetam a política externa; já no liberalismo, alguns valores estão no centro das relações internacionais. Estes valores precisam estar presentes para que a natureza boa do homem não seja corrompida (Roussseau). Sendo assim, a prosperidade e a paz podem ser atingidas por meio da democracia, sistema onde há maior liberdade individual. Este sistema política é importante, inclusive, porque os liberais acreditam que democracias não entram em guerra entre si (teoria da paz democrática). Neste caso, quando há duas democracias próximas de um conflito, as populações levariam seus chefes de estado a buscarem soluções pacíficas para as controvérsias. Instituições  Prosperidade  Paz A própria democracia pressupõe instituições; pressupõe que haja, por exemplo, uma instituição de representatividade da população eleita. Exige também que exista um império das leis aliado a um sistema judiciário para julgar essas leis. Elas garantem as liberdades individuais, os direitos humanos, e a liberdade da população de fazer as melhores escolhas levando em consideração os seus valores, seus interesses e não somente o “interesse nacional” abstrato como os Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 44. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 43 48 fazem os realistas. Foco no indivíduo Ao contrário do realismo, o liberalismo foca no individuo; rejeitando assim, a ideia utilitária de que se pode sacrificar um individuo em prol da maioria. Sendo assim, o individuo é mais importante que o Estado. Cada indivíduo possui um valor próprio que não pode ser instrumentalizado ou relativizado. A concepção maquiavélica de que os “fins justificam os meios” é, portanto, rejeitada pelo liberalismo. A pessoa não pode, por exemplo, ser assassinada apenas para garantir a segurança de outras pessoas. Acreditam, portanto, que o interesse individual não pode ser sacrificado em nome do interesse nacional. Não é correto relativizar as instituições, substituir a democracia por uma ditadura ou adotar posições protecionistas. Os liberais acreditam que estes valores são os únicos que garantem as liberdades e os direitos individuais. Autopropriedade e propriedade Este pressuposto significa que a ideia de que a propriedade individual é um valor que deve ser respeitado a todo custo, tanto a propriedade no sentido externo (propriedade privada material) quanto a autopropriedade (vida humana). De com Locke, a vida deve ser defendida porque é a primeira propriedade que deriva todas as outras. E aí retomamos a ideia de guerra justa, no qual o único conflito justificado é o conflito de autodefesa. Crença na razão A crença na razão é derivada do iluminismo, principalmente do iluminismo francês e alemão, mas um pouco do inglês e holandês. De modo geral, trata-se da ideia de que a razão humana é quase que ilimitada na sua capacidade e pode encontrar soluções para todos os problemas, não apenas problemas naturais ou exatos e objetivos, mas também problemas sociais. A democracia e o livre comércio, por exemplo, seriam artifícios criados pela razão humana e que garantiriam um ambiente mais próspero. O estado é um perigo para os indivíduos Se no realismo político, o Estado pode ser perigoso para outro Estado, no liberalismo, a situação é mais complexa. Pela ótica liberal, o Estado não somente é um perigo para outro Estado, mas também para indivíduos que precisam ser protegidos a todo custo. Desta premissa que deriva a ideia de responsabilidade de proteger (R2P) e de intervenções humanitárias. Neste ponto, a principal distinção entre o realismo e o liberalismo, é que o liberalismo dá uma ênfase muito grande para os valores, enquanto os realistas dão uma ênfase muito grande para os resultados. Comparando o realismo com o liberalismo, podemos chegar à seguinte conclusão: Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 45. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 44 48 Realismo Liberalismo Epistemologia Tanto realismo quanto liberalismo são teorias que explicam as relações internacionais, sendo possível prever acontecimentos futuros de acordo com pressupostos racionais. Ontologia O objeto central são as relações de poder entre Estados. O objeto central são as relações de cooperação entre indivíduos e seus desdobramentos institucionais, no qual o Estado é somente mais um desdobramento. Atitude moral O que importa são os resultados (pragmatismo). Reflexões morais devem ser separadas da pratica politica. Tem um núcleo de valores iluministas que (liberdade, igualdade e fraternidade), que devem ser defendidos. Não se preocupa só como as relações internacionais são, mas como devem ser. Atores Estado é o principal ator. Estado é um ator importante, mas existem outros atores também. Neoliberalismo A partir da década de 1970, o mundo passa por uma série de transformações que acabam determinando a necessidade de revisão da teoria liberal. Entre estas mudanças estão o aumento da fluidez do sistema financeiro internacional, a relativização do padrão ouro, e principalmente, a intensificação da interdependência tanto entre os atores quanto entre as agendas. Neste sentido, os neoliberais tentam entender de que modo estas mudanças afetam as relações internacionais. O quadro abaixo resume os principais pressupostos do neoliberalismo (alguns são bem parecidos com o liberalismo clássico). A tradição liberal: neoliberalismo 01 – Intensificação da interdependência Com a crescente complexidade e interdependência entre os atores, os Estados precisam ser ajudados por meio da cooperação criando organizações internacionais para administrar estes problemas e para explorar melhor as oportunidades que surgem disso. Então, essas organizações e regimes se tornam proeminentes para a administração de conflitos e interesses. Assim como os liberais, os neoliberais afirmam que não se deve considerar somente o Estado como ator internacional, pois as demais organizações possuem uma relevância crescente no mundo atual. Na atualidade, inclusive, os indivíduos possuem cada vez mais meios de se manifestar; o que acaba alterando o processo de tomada de decisão dos Estados nacionais. Com a globalização e o avanço da técnica, a interdependência entre atores torna-se cada vez mais complexa e dinâmica. 02 – Regimes e organizações internacionais se tornam proeminentes na administração de conflitos e interesses Tendo o aumento da interdependência em vista, os Estados não dão mais conta de administrar as relações entre os atores internacionais. Os Estados, portanto, não conseguem mais controlar tudo que Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 46. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 45 48 ocorre através de suas fronteiras, tanto do ponto de vista territorial quanto do aspecto imaterial (fluxos de comunicação, comércio e ideias, por exemplo). Não é possível, por exemplo, controlar o acesso à internet de todos os cidadãos, bem como o contato que eles têm com outras realidades e culturas de outros países, outros contextos. O Estado não consegue sequer controlar os fluxos comerciais. Esta crescente incapacidade estatal provoca o aumento dos crimes transnacionais, tais como tráfico de drogas, armas ou órgãos. Como estes problemas se tornam cada vez mais internacionais, precisam, cada vez mais, ser atacados com uma perspectiva internacional. Sendo assim, para os neoliberais, regimes e organizações internacionais são proeminentes na administração de conflitos e interesses. Para isso, dizem os neoliberais, é preciso criar instituições internacionais capazes de lidar com cada um dos temas específicos, como comércio, comunicação, segurança, entre outros. Por sua vez, o conjunto dessas organizações (junto com as leis e instituições existentes), forma o que nós chamamos de regime internacional. 03 – Condições para a cooperação: transparência, custo de transação e comunicação. Alguns desdobramentos teóricos interessantes que os neoliberais fazem dizem respeito às condições para a cooperação ocorra. Três pressupostos necessários: I – Transparência Os liberais afirmam que os ser humano pode resolver seus problemas por meio da razão (Kant) e que tem uma natureza essencialmente boa, mas que as instituições podem acabar o corrompendo (Rousseau). O que os neoliberais dizem é que as organizações internacionais podem criar uma moldura onde essa natureza boa pode florescer. Se os atores internacionais possuem segredos e se comunicam de forma pouco clara, isso aumenta a desconfiança do sistema internacional. Logo, é preciso transparência para que haja a cooperação. II – Custo de transação Os neoliberais procuram diminuir os custos de transação, mantendo permanentemente uma organização internacional com uma burocracia própria constantemente trabalhando em um determinado contato. Isso, de acordo com alguns teóricos, ajuda a manter as relações com os atores internacionais. III – Comunicação Diminuindo os custos de transação e criando aquela “moldura” dentro da organização para que haja várias rodadas de negociação, os Estados tornam-se mais propensos ao diálogo. Neste sentido, em caso de choque de interesses, um Estado pode consultar as organizações internacionais (como a ONU ou a OMC) e intermediado por elas, de forma transparente, chegar a uma solução pacífica para conflitos. E chegando a uma solução pacífica, pode-se chegar a uma cooperação para que ambos os estados se beneficiem disso, o famoso jogo de ganha-ganha. 04 – Interesse nacional não-unitário Hoje é muito difícil definir o interesse único de uma nação, pois existem inúmeros grupos (partidos, facções, organizações domésticas, etc.) que nem sempre concordam com o interesse nacional. Além disso, respeitando o pressuposto liberal de “foco no indivíduo”, mesmo que a maioria da população concorde com determinado objetivo, caso haja algum indivíduo discordante, ele não pode ser ignorado e deve ter sua voz representada. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 47. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 46 48 05 – A anarquia pode ser superada Os liberais acreditam que por meio dos regimes das organizações internacionais, a anarquia do sistema internacional (teorizada pelos realistas) pode ser superada. Os regimes internacionais podem criar regras, leis e princípios que devem ser observados e sendo observados, podem colocar então, certa ordem dentro do sistema internacional. Neste caso, há instâncias criando restrições para “o que pode” e “o que não pode” ser feito. Além disso, dentro do neoliberalismo, existem dois desdobramentos: funcionalismo e o neofuncionalismo. A tradição liberal: teorias relacionadas Funcionalismo (Miltrany) e Neofuncionalismo (Haas): tendência à integração regional (UE) e à cooperação internacional (ONU) via processo de spill-over (“derramamento”) entre fronteiras e setores Teoria da paz democrática (questionável): democracias não lutam entre si Principais nomes do liberalismo: Joseph Nye, Robert Keohane e Ernest Haas. Tendo este cenário em vista, o funcionalismo de David Miltrany (1888-1975) é muito próximo ao liberalismo. Esta teoria surge basicamente com a finalidade de explicar o processo de integração regional ocorrido em algumas áreas do globo, sobretudo na Europa com a União Europeia, mas também em outras áreas como na própria América do Sul. O contexto para esta teoria é o aumento da integração global ocorrido nas últimas décadas. Se no mundo contemporâneo, os Estados falham em controlar os fluxos migratórios, financeiros e comerciais que ocorrem dentro e para/com seus respectivos territórios, isto significa que existe um processo de derramamento (spill-over) entre fronteiras e setores – inclusive relacionado com a interdependência complexa que vimos anteriormente. Ou seja, os problemas que afetam a França, por exemplo, em um mundo interconectado e globalizado, também se “derramam” para a Alemanha, para a Espanha, etc. Um Estado, portanto, não age ou sofre as consequências isoladamente, mas sim, faz parte de um contexto de “derramamento” maior. Neste contexto, as soluções para os problemas precisam ser pensadas de forma integrada entre os Estados. A União Europeia (foto) é um exemplo de funcionalismo: à medida que a integração global aumenta, a cooperação torna-se cada vez mais necessária. Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 48. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 47 48 Durante o século XX, esta busca pela integração fez surgir, por exemplo, a União Europeia. A origem deste bloco inicialmente veio da ideia de comercializar carvão e aço (Comunidade Europeia do Carvão e do Aço – CECA); ou seja, tinha finalidades bastante específicas e pontuais. Se a CECA era basicamente uma organização internacional que administrava estes recursos naturais, a União Europeia atual tornou-se bem mais complexa, inclusive possuindo acordos de migração e moeda própria. Portanto, o que originalmente destinava-se somente à comercialização de carvão e aço, evoluiu para uma integração quase completa em diversos setores (políticos, regulatórios, migratórios, monetários, etc.). Derivada do funcionalismo, surge a teoria do neofuncionalismo proposta por Ernest Haas (1921 – 1986). Neste caso, para além da integração regional e da busca por soluções em conjunto estudada por Miltrany, há uma preocupação com a cooperação internacional; ou seja, em escala maior e com outros elementos. Exemplos destas cooperações podem ser a ONU ou a Organização Mundial do Comércio (OMC). David Miltrany (1888 - 1975) e Ernest Haas (1921 – 1986) Funcionalismo e neofuncionalismo O funcionalismo e o neofuncionalismo acreditam que com a maior integração global ocorrida no século XX, há um derramamento (spill-over) de problemas de um Estado para outro. Logo, as soluções devem ser pensadas em conjunto, o que leva à necessidade de integração regional. Por último, há a teoria da paz democrática. Segundo os liberais, regimes democráticos são mais propensos a paz e a prosperidade do que demais formas de governo, como por exemplo, ditaduras. No entanto, como é difícil definir o que é democracia. Basta lembrar, por exemplo, que a Coreia do Norte se chama República Popular da Coreia. Afinal, o que é democracia? Chegando a uma definição, como verificar se nunca houve um conflito entre elas? Não vamos entrar no mérito destas questões, mas é importante ter ideia da complexidade deste tema. Existem outros nomes importantes no liberalismo, tais como: Joseph Nye (responsável tanto pela teoria da interdependência complexa); Robert Keohane (responsável pela diferenciação entre hard power e soft power); e os já citados David Miltrany (funcionalismo) Ernest Hass (neofuncionalismo). No entanto, por questões de foco, apenas vamos citá-los sem alongar muito o assunto. Na próxima aula, veremos as demais tradições (construtivista, escola inglesa, escola francesa, escola de copenhague, marxismo, e teorias críticas). No entanto, já adiantamos que como o realismo e o liberalismo são as principais escolas, as demais teorias serão menos detalhadas. CAI NA PROVA Cespe/UNB (CACD/2016) 3. A teoria da interdependência complexa, desenvolvida por institucionalistas liberais como Robert Keohane e Joseph Nye, é caracterizada pela não hierarquização de temas de política internacional. COMENTÁRIO Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO
  • 49. Prof. Filipe Martins e Prof. Alexandre Vastella Aula 00 – Visão Geral da Prova e conceitos básicos Aula 01 – Principais paradigmas teóricos 48 48 É verdade que a interdependência complexa (que gera a interdependência entre atores estatais e não- estatais) mina a hierarquia entre os temas e agendas. No século XIX, por exemplo, havia uma preocupação excessiva com segurança. Hoje, com um mundo cada vez mais interconectado, estes temas acabam sendo tratados com certa igualdade e interdependência. Então, a segurança é tratada junto com meio-ambiente, comércio, infraestrutura, comunicação, etc. Logo, não há hierarquia entre estes temas. Gabarito: Certo Cespe/UNB (CACD/2016) 4. De acordo com o liberalismo institucional, as instituições internacionais, como as Nações Unidas, a Organização Mundial do Comércio e a União Europeia, ajudam a promover a cooperação entre os Estados, mitigando assim, as consequências da anarquia do sistema internacional. COMENTÁRIO De fato, a cooperação pregada pelo liberalismo, ajuda a mitigar as consequências da anarquia do sistema internacional. As organizações internacionais servem exatamente para este interesse, pois atacam os problemas coletivamente (derramamento). Deste modo, ao contrário dos realistas, os liberais acreditam que a anarquia pode ser superada. Gabarito: Certo Alexandre Vastella, Filipe Martins Aula 00 Política Internacional p/ CACD (Primeira e Segunda Fases) - Com Videoaulas - Pós-Edital www.estrategiaconcursos.com.br 0 00000000000 - DEMO