Comissão Organizadora do XI Encontro Regional de Agroecologia Nordeste




    XI Encontro Regional de Agroecologia Nordeste
                        XI ERA NE
“Agroecologia: livro pra comida, prato para educação”




                      Cruz das Almas, março de 2010

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Canção da Terra

 Tudo aconteceu num outro dia
      Hora da Ave Maria
     O universo viu gerar
No princípio o verbo se fez fogo,
     Nem atlas tinha globo
    Mas tinha nome o lugar

       Era Terra, terra...

  E fez o criador a natureza
  Fez os campos fez floresta,
   Fez os bichos, fez o mar
 Fez por fim, então a rebeldia
    Que nos da a garantia
     Que nos leva a lutar

       Pela Terra, terra...

Madre Terra nossa esperança,
  Onde a vida da seus frutos
   O teu filho vem cantar
 Ser o teu sonho por inteiro,
 Sou sem terra sou guerreiro
  Com a missão de semear

        A terra, terra...

     Mas apesar de tudo
   O latifúndio e feito inço
     Que precisa acabar
Romper as cercas da ignorância
  Que produz a intolerância
   Terra é de quem plantar

        A terra, terra...




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O que é o ERA?


                                           Cruz das Almas – Bahia – UFRB
                                              21 a 25 de abril de 2010




O ERA será um evento de caráter regional abrangendo os estados do Nordeste, realizado
  pela FEAB com o apoio da ABEEF e ENEBio, para estudo, prática e capacitação para
     agroecologia, destinado a participação de agricultores, populações tradicionais,
    estudantes, profissionais de diversas áreas do conhecimento, movimentos sociais,
sindicatos de trabalhadores rurais-STR´s, e Organizações Não Governamentais - ONG´s.
Estima-se a participação de 300 (trezentas) pessoas sendo 200 (duzentos) estudantes e
  100 (cem) camponeses. Um espaço de ampla discussão entre o meio acadêmico e a
 sociedade, que faça com que estudantes, trabalhadores rurais, populações tradicionais,
   movimentos sociais e profissionais debatam, elaborem, troquem saberes e valores
         articulando um intercâmbio científico, técnico, social, político e cultural.

      A partir dos anos 70, os estudantes de Agronomia começaram a sentir a necessidade de
  desenvolver esforços para entender o modelo de desenvolvimento agropecuário que estava se
implantando no país, conhecido como “Revolução Verde”, buscando analisar suas consequências
 e sua influência na qualidade do ensino da Agronomia. Com isso, a FEAB a quase duas décadas
  vem realizando eventos que debatam o modelo agrário e agrícola no mundo, e em especial no
    Brasil, construindo uma alternativa ao modo convencional de produção. Estes eventos foram
   iniciados durante o início da década de 80, quando se realizaram os Encontros Brasileiros de
     Agricultura Alternativa – EBAA’s, que foram fundamentais para a consolidação de um novo
  método de trabalhar a natureza, que fica conhecido como “Agricultura Alternativa”. No início da
   década de 90, a FEAB fez com que estes eventos tomassem um caráter regional propondo a
  realização dos Encontros Regionais de Agricultura Alternativa – ERAA’s, que acompanhando o
 avanço desta discussão e, a nova proposição para a Agroecologia, passa-se a chamar em 2000,
                              Encontro Regional de Agroecologia – ERA.

   Nossa proposta é construir um evento que possua um caráter de mútuo intercâmbio
técnico, profissional, social, político e cultural, estreitando as relações entre Universidade
    e os Atores Sociais do Campo, que trabalham o desenvolvimento sustentável sob o
   enfoque da Agroecologia e que contribuam para o avanço na construção de um novo
 modelo de desenvolvimento para a agricultura brasileira, buscando a construção de um
     conhecimento que funda o conhecimento científico dos acadêmicos e os saberes
 considerados empíricos dos camponeses. Como atores sociais do campo, identificamos
      as comunidades tradicionais geraizeiras, catingueiros, vazanteiros, quilombolas,
ribeirinhas, os movimentos sociais organizados do campo, as organizações da sociedade
   civil organizada e instâncias governamentais competentes, além dos estudantes que
   atuam de forma indireta na construção de um novo modus de trabalhar a agricultura.



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Quem vem pro ERA...
                                             Prepare sua mochila, 
                                        Na bagagem traga muita alegria
                                                É isto mesmo,
                                            você ta vindo pro ERA
                                         O Encontro da Agroecologia!

                                       A banda depois de ter passado
                                             Em Recife e Maceió
                                             Na Bahia veio parar!
                                    Com a FEAB, ABEEF e ENEBio na luta
                                            você já ouviu falar ???
                                    Mas de luta mesmo é quem vim pra cá

                                       Ainda traga em seu bodocó
                                  Caneca, colchonete, roupas e calçados
                                  Escova de dentes e sementes também
                                    Só não esqueça a toalha de banho
                                    E se der um pandeiro e um violão
                           Se preparem, vai ser uma viajem, é muita bagagem...

                                   Não se preocupem como o tanto de chão
                                  a estrada vai ta boa esse ano tem eleição
                                 agente aqui também vai é conversar mesmo
                                 sobre o Velho Chico e a sua grande ameaça
                                        O progresso da Tranposição...

                      Participem das reuniões preparatórias ou os Pré-ERA's...
            Procurem os seus DA's e CA's, organizem a saída do ônibus.... é isso ae galera!!!

           Desde 2004, temos referência ao VIII Encontro Regional de Agroecologia, FEAB, Ilhéus-BA, 2004.
Um ônibus de Cruz das Almas foi ao VIII ERA NE e trouxeram uma rica e diversa bagagem agroecológica. A
   semente foi plantada, regada e adubada junto aos muitos grupos da FEAB que já passaram por lá. Logo
  começaram as reuniões com convite para o Pré-ERA, ou encontro preparatório para ir ao ERA, em Recife
     no ano de 2006, realizado pela FEAB, ABEEF e ENEV. O IX ERA Nordeste falou de uma tecnologia a
     serviço da vida, nas da universidades, nas instituições e na atuação do profissional, uma educação de
  liberdade. Os estudantes falavam da Agroecologia de base científica afirmada em nossa academia, unida
      aos agricultores e seus saberes, aliada a politica do povo dos interesses coletivos e não privados, a
     Agroecologia Militante. Um ato de coragem foi ecoado e continua por toda eternidade. Após dois anos
fomos a Maceió, onde a FEAB, junto com o Grupo Agroecológico Craibeiras, ABEEF e ENEBio conseguiram
    fazer bonito na UFAL, além da discussão politica em todo evento o ERA foi recheado de boas praticas e
                        uma rica troca de experiencias entre os Grupos de Agroecologia.

   Este anos será realizado em Cruz das Almas, a FEAB junto ao Diretório do curso de Agroecologia , ao
Grupo AGROVIDA1, a ABEEF e ENEBio que continuam uma trajetória de luta com Federação nos espaços
 dentro da universidade, com a participação em vários espaços (ERA, EREA, CONEA, PNEB). Também na
 responsa a alguns tempos atras de realizar o III ERAA – NE, que foi em Cruz das Almas, no ano de 1994.
Naquela época a C.O. (Comissão Organizadora) escolheu o tema da Autossustentabilidade, da formação do
1 O Grupo AGROVIDA - Movimento de Apoio a Agricultura Familiar e Agroecologia é uma entidade civil, sem fins
  lucrativos, fundado em 12 de fevereiro de 2004 e tem como missão: “Desenvolver e experimentar metodologias
  participativas com professores, estudantes, agricultores (as) familiares, técnicos (as) e gestores (as) rurais, inseridos
  no contexto da Agricultura Familiar e Agroecologia que, através de práticas educativas, visam contribuir para o
  desenvolvimento rural sustentável no Estado da Bahia”.

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cidadão para uma nova sociedade solida em valores humanos e verdadeira. Essa nova sociedade estamos
construindo, em particular na nossa Universidade, junto com as entidades do movimento estudantil e na rua
e com o movimento organizado e assim colocamos o convite para todas as escolas, na construção nacional
                                     e dos estudantes de todo País.

A escola de Cruz das Almas vive momento único. É uma nova Universidade desde 2005. Herdou
 150 anos de ensino agrícola na Bahia e foi Escola de Agronomia (Ex-UFBA) agora ela compõe a
Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB), no Centro de Ciências Agrárias Ambientais e
  Biológicas. O recôncavo da Bahia margeia a Baia de Todos os Santos, é grande e possui vasto
 passado histórico importante na formação do Brasil contemporâneo, na influencia do negro e do
europeu. Com grandes manguezais e mata atlântica foi palco de muitas plantações da corte, com
 seus Engenhos que trabalhavam negros e índios e hoje vivem várias realidades, dos agricultores
familiares, das cidades, do latifúndio, dos grandes rios vejam o Paraguaçu. A UFRB já possui uma
   corrente Agroecológica, e queremos unir esses elos. Temos também bem pertinho o Curso de
  Técnico em Agroecologia, no Complexo CEAT que voltou a ser escola Técnica e fica do lado do
                   Campus. Vamos somar as forças realizar Pré-ERA lá, é isso...

Os ERA's possuem forte caráter de fortalecer as entidades FEAB/ABEEF/ENEBio, aproximando o
 movimento estudantil e agroecológico, conquistando espaço nas escolas e resistindo ao grande
avanço do capitalismo em nossa produtividade acadêmica, ainda preenchendo o vazio cultural de
            outros encontros universitários, claro que quando tudo vai bem. (hehe)

                            Conheça a FEAB e ABEEF nos blog's:

                                   http://feab.wordpress.com
                                   http://abeef.wordpress.com

  Venham participar e contribuir desse encontrão da agroecologia, onde o passado e futuro se
                           encontram e o presente é sua presença!!!


       Ficha de inscrição e outras informações disponíveis no blog:

                    http://xieranordeste.blogspot.com
O que trazer?
- Cartilha do ERA;
- Roupas para os dias do encontro,
caneca, materiais de higiene pessoal,
saco de dormir, colchonete, lençol ou
coberta leve, chapéu/boné e protetor
solar para oficinas práticas;
- Sementes, livros, trabalhos, cartazes,
cartilhas, fotos e outros materiais para
feira - Agroecológica;
- Instrumentos musicais;
- Críticas construtivas;
- Alegria;

O que NÃO trazer?
- Barraca (haverá alojamento), bebidas
alcoólicas ou substância ilícitas.               Figura: Reitoria Universidade Federal do Recôncavo da Bahia - UFRB




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Objetivo

     Proporcionar um espaço de ampla discussão entre o meio acadêmico e a
    sociedade, que faça com que estudantes, trabalhadores rurais, populações
  tradicionais, movimentos sociais e profissionais debatam, elaborem, troquem
saberes e valores articulando um intercâmbio científico, técnico, social, político e
                                    cultural.

 •   Debater o histórico, a concepção e as atualidades, a respeito da Agroecologia
     abordando as principais experiências e a relação com a Universidade;

 •   Debater a atuação da universidade na construção da Agroecologia e sua influencia
     no modelo de matriz tecnológica vigente;

 •   Articulação entre os Grupos Agroecológicos e o Movimento Estudantil Organizado,
     a fim de estreitar a relação entre os grupos com o intuito de fortalecer as
     discussões sobre Universidade e Agroecologia;

 •   Trocar experiências entre agricultores e estudantes, a respeito das técnicas
     desenvolvidas dentro e fora da Universidade visando à elaboração de um método
     científico que descreva tais experiências;

 •   Fomentar ações conjuntas entre estudantes e agricultores, que viabilizem projetos
     que rediscutam a capacitação de profissionais e o modelo de ensino das
     Universidades de Ciências Agrárias;

 •   Rediscutir junto aos agricultores as novas propostas de Assistência Técnica e
     Extensão Rural propostas pelas entidades governamentais, visando maior
     esclarecimento e proposições;

 •   Divulgar a cultura regional, valorizando a diversidade existente no Recôncavo
     Baiano, bem como, em outras regiões da área de abrangência do evento (SE-AL-
     PI-CE-RN-PE-PB);

 •   Capacitar estudantes e agricultores sobre as principais técnicas Agroecológicas
     utilizando para isso uma metodologia de trocas de experiências, painéis, mini-
     cursos com temáticas que contemplem a relação universidade-sociedade;

 •   Desenvolver um método de trabalho que garanta uma interação entre agricultores
     e estudantes visando uma maior participação no evento;

 •   Sistematizar as experiências acumuladas pelos atores do evento, objetivando a
     construção de um documento (anais), com todo o conteúdo das discussões;

 •   Construir um material didático-científico que registre as discussões realizadas
     durante o evento, na forma de anais e de registro cinematográfico;




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Programação
                Quarta-feira     Quinta-feira       Sexta-feira     Sábado               Domingo
                 21/04/10          22/04/10          23/04/10       24/04/10             25/04/10
 6:30 – 8:00                                 ALVORADA / CAFÉ DA MANHÃ
8:00 – 10:00      Chegada           Painel I       Mesa Redonda       ATO                 Plenária
10:00 – 12:00    inscrições          GD I              GD II        Público                Final
12:00 – 13:00                                        ALMOÇO
14:00 – 16:00                                       Socialização  Experiências           Avaliação
                  Abertura          Oficinas
16:00 – 18:00                                        dos GD's        Feira              Encerramento
18:00 – 19:00                                         JANTA
19:30 – 20:30                                    TEMPO TRABALHO
20:30 – 22:00       GI          Painéis paralelos Oficina do ATO   Executivas
22:00 – 00:00     Cultural          Cultural          Cultural      Cultural


   •   Chegada e Inscrições: Chegada e inscrições das delegações de estudantes e agricultores, bem
       como acomodação dos participantes nos alojamentos;

   •   Abertura: Apresentação do evento, com tempos destinados as saudações de cada entidade que
       compõe a organização do ERA, bem como dos patrocinadores e apoiadores;

   •   Grupo de Interação – GI: Apresentação do método, estrutura, temática utilizados durante o evento,
       estatuto e regimento do ERA;

   •   Painel I – “Convivência das comunidades com o semi-árido e suas identificações culturais e
       de territorialidade”;

   •   Grupo de Discussão - GD: Debater o conteúdo das explanações realizadas nos painéis principais
       visando uma reflexão coletiva sobre os temas abordados, bem como propor ações para intervenção
       dos atores na construção da Agroecologia dentro e fora da Universidade;

   •   Painéis Paralelos: criminalização dos movimentos sociais, soberania alimentar, gênero e
       sexualidade, transposição do rio são francisco, juventude, educação no campo e cultura popular;
       questão agrária, ciência e tecnologia, impactos do agronegócio no Nordeste, integração campo
       cidade, desertificação;

   •   Mesa Redonda – O papel da Universidade (formação profissional, ciências e tecnologias);

   •   Trocas de Experiências / Feira: Troca de saberes, práticas e experiências entre grupos e pessoas
       que trabalham com a Agroecologia, onde os participantes do encontro terão a oportunidade de
       conhecer as diferentes realidades dos participantes do evento, além do conhecimento acumulado
       há séculos pelas populações tradicionais existentes no Nordeste;

   •   Oficinas: Espaço recíproco de formação e capacitação, onde os participantes do encontro terão a
       oportunidade de colocar em prática os conhecimentos adquiridos;

   •   Cultural: Momento de valorização e divulgação da cultura regional proporcionando integração,
       descontração e confraternização entre todos os participantes do evento;

   •   Plenária Final: Socialização das discussões realizadas durante o evento, apresentando as
       principais propostas e elaborações que comporão o documento final do evento, além de apresentar
       as deliberações a respeito da temática do evento, junto a propostas de ações junto à sociedade;

   •   Encerramento: Leitura do documento final do evento. Com espaço destinado a avaliação do ERA,
       a fim de garantir um processo democrático e franco nas análises das atividades realizadas



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Vivemos num processo de crise civilizatória!

   Crise alimentar - não é nova e não esta finalizada, a FAO afirma que há alimentos
   suficientes para o mundo, porém ainda há milhões de famintos ou obesos, frutos do
                                 padrão de consumo;

                 Crise climática e sinais de esgotamento de recursos;

                 Crise energética, econômica, cultural, ideológica...

    Em 1929, a crise teve uma “solução” com uma guerra entre as grandes potências.
  Eramos menos de 2 bilhões de habitantes com a maioria rural. Com a reordenação da
 humanidade no planeta - reorganização do capital e migração do poder - sempre com a
      alimentação em pauta e com uma agricultura de mercado cada vez mais sem a
  participação dos agricultores, o capital começa a apontar para novos ramos, como das
industrias, seguros, ajudas alimentares, e mesmo assim hoje não consegue crescer mais
                                    que 2 ou 3% ao ano.

  ...cada vez mais esta sendo descartada a figura humana no trabalho,e sim o padrão
   inferior para o funcionarismo... desemprego estrutural...industria hoje e regida pela
geração de tecnologias descartáveis, consome muita matéria prima e produz muito lixo...
                                   fetiche do consumo..

  No Brasil, por exemplo, na década de 1960, surge o Sistema Nacional de Crédito Rural
(SNCR), onde o governo financiava as atividades agrícolas, porém, para obter o crédito, o
  agricultor deveria se comprometer em adequar seu sistema de produção aos “Pacotes
 Tecnológicos”, parte do crédito estava reservado para compra de “Insumos Modernos”, e
      órgãos de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural estavam voltados a
                            implementação dessas tecnologias.

  Nos últimos 15 anos tivemos período pós-redemocratização, revolução silenciosa, que
são as privatização e abertura econômica, característica do governo FHC, colocando para
                             o mercado o patrimônio publico.

 Já o governo Lula com a segunda revolução silenciosa, ouve um processo da retomada
   do estado, na capacidade de ser financiadores e executor de grandes obras. O PAC
 investe em infra estrutura para o capital se desenvolver, o estado social tenta apaziguar
      com politicas publicas compensatórias e controle da questão financeira do pais.
Conciliação de classes ''hehe'', atende o capital, mas sem romper as classes e categorias
    sociais. Brasil 8ª potencia mundial e o 60º no Índice de Desenvolvimento Humano.
 Reformas sempre de interesses do capital e agora nos deparamos como o processo do
   que fazer no processo eleitoral, com uma desconfiguração estrutural do que seria um
   projeto para o Brasil, mas entendemos que esta em disputa para o próximo ano, ou a
     retomada do neoliberalismo, o continuísmo do desenvolvimento conservador ou o
                     desenvolvimentismo popular que depende de nós...

             Crise sistêmica e estrutural: uma crise planetária.



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QUAIS SÃO AS SAÍDAS PARA A HUMANINDADE?
  Estamos nos autodestruindo por causa do padrão de
         produção e consumo estabelecido.
 O debate da agroecologia não se passa mais só pelo amito rural, mas com uma série de
 outros sujeitos. Nós da Agroecologia e nossa leitura desse período recente do seculo 21,
temos algumas questões fundamentais como a relíquia de nossas experiencias locais. Só
    há Agroecologia porque há experiências locais. Conseguimos avançar e diferentes
 entidades em diferentes inciativas em redes e articulações, resultando num processo de
     fortalecimento. Os Movimentos Sociais inserem a agroecologia em suas pautas.

    Estamos fora do senário político macro, somo irrelevantes na tomada das decisão
    politicas, o tempo passa, politicas são implementada se mesmo com acúmulos e
     legitimidade não conseguímos a ressonância entre nossas politicas e projetos.

Avançamos na formulação de estratégias e na sistematização de experiencias, sejam em
        aportes conceituais e ao nível de politicas publicas, como o programa da
  agrobiodiversidade, PRONAF, Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Merenda
Escolar, Regulamentação dos Orgânicos, pode ser bom mas podem haver contradições.

  Também temos retrocesso e derrotas, como a imposição da Tranposição do Rio São
Francisco, os Transgênicos que condenam a agricultura, como o milho, que compromete
     a agrobiodiversidade com uma baixa perspectiva de reversão, a hegemonia do
Agronegócio controla a terra, território, opinião pública, mercado, politicas, implementação
 dos agrotóxicos, e é contra a reforma agraria, quer uma politica inexistente de governo.
   Promove a criminalização dos movimentos sociais pelo show midiático que induz a
                opinião pública paralisando a capacidade de mobilização.
Queremos impor ao estado que seja apoiador e executor de políticas para agroecologia e
    para próxima década isso ainda é insuficiente, e sempre ficaremos para o lado da
   marginalização. Precisamos urgentemente nos reorganizar para saber qual nossa
proposta e instrumentos políticos para organizar nossas estratégias para a agroecologia.

Precisamos ter uma certa centralidade politica, coordenação para ter um direcionamento
  maior e saber das políticas emergenciais a partir da realidade, buscando formas de
    avançar. Precisamos construir novas bases sociais além da agricultura familiar e
 assentados, mas os povos urbanos, já que no Brasil muitos são urbanos (metrópoles),
            inserindo agroecologia na área da suade, educação, juventude.

 Precisamos ter uma plataforma de luta politica disputando planos políticos, e dentro de
                 nossa centralidade aperfeiçoar nosso planejamento.
  Nadamos a contra corrente para construir nossas propostas, mas alguns indicadores
evidenciam nossas propostas mesmo não sendo a hegemônica. No mundo há iniciativas
 que adotam os fundamentos agroecologia para o desenvolvimento social e econômico
  como a ciência dos lugares, com a capacidade de gerar e preservar riquezas locais.

            QUAL NOSSA ESTRATÉGIA POLÍTICAS PARA
                      AGROECOLOGIA?


                                                                                           9
A natureza dos desafios:
Agroecologia passa a ser reconhecida com enfoque científico, até a universidade ensina a
agroecologia com uma quantidade grande de pesquisadores que adotam esse paradigma,
quer dizer, tem cientistas que desenvolvem a agroecologia alem de uma crescente sócio-
politica, apesar disso tudo ser pouco comparado ao imenso acervo cientifico que fortalece
                                      o agronegócio.

Uma serie de estudos no Brasil e no mundo para pensar o desenvolvimento, constatando
   uma certa exaustão do modelo vigente e que afirma a importância da agricultura
                  familiar/camponesa e do paradigma agroecológico.

Temos necessidade de um deslocamento do debate técnico-científico para o campo
político para entender as relações sociais e as correlações de forças nos diferentes
projetos de desenvolvimento, priorizando o foco político que é onde se estrutura os
                         maiores desafios da agroecologia.

 Disseminação das práticas da agroecologia, valorizando as experiencias desenvolvidas
 em diferente inserções sociais, ambientais e culturais para produzir síntese e propostas
      politicas mais abrangentes, que evidencie para sociedade o papel positivo da
                            implementação da agroecologia;

   Entrar na disputa pela leitura da crise e discutir qual a contribuição da agroecologia;

Necessidade de um grande esforço da sistematização das experiencias, mas ainda temos
  grandes lacunas em temas essenciais, como mudanças climáticas, reforma agraria,
  direitos territoriais, mercados e suas novas estruturas e formas de comercializações.

Necessidade que o movimento da agroecologia incorpore os mais amplos seguimentos da
  sociedade brasileira para construção de uma consciência social crítica, a respeito no
           modo de vida da população relacionado à produção e consumo.

  Romper o casulo e entrar num processo de comunicação e alianças estratégicas com
outros movimentos da sociedade para defender um projeto nacional de desenvolvimento -
os diversos movimentos, ambientalistas, mulheres, sociais, estudantil não conseguem unir
                                     suas pautas;

      Desconstruir o paradigma atual do progresso das ofensivas do agronegócio;

   Desenvolver uma plataforma agregadora de organizações muito diversas com uma
    cultura de rede aberta, com diversidade e sinergia entre a diversidade de atores;

Pensar na sustentabilidade de uma rede diversa, e que se fundamente na capacidade de
    iniciativa de suas partes, produzindo convergências, agregando valor politico às
                                  expressões coletivas;


  Como desconstruir o paradigma atual de desenvolvimento e
          enfrentar as ofensivas do agronegócio?

                                                                                             10
Agroecologia
         O tema “agroecologia” tem merecido              Agroecologia, como um novo enfoque
crescente reconhecimento nos últimos anos,               científico, capaz de dar suporte a uma
tanto nos meios em que atuam os movimentos               transição a estilos de agriculturas sustentáveis
sociais, principalmente as Organizações Não-             e, portanto, contribuir para o estabelecimento
Governamentais (ONGs), como também mais                  de processos de desenvolvimento rural
recentemente no meio acadêmico. Às vezes                 sustentável. A partir dos princípios ensinados
como proposta de “novo paradigma”, outras de             pela Agroecologia passaria a ser estabelecido
forma simplista e equivocada como novo                   um novo caminho para a construção de
formato tecnológico para a produção na                   agricultura de base ecológicas ou sustentáveis.
agricultura.                                                      Esta      contestação    ao     modelo
         Desde muito tempo os homens vêm                 convencional de agricultura ganhou força e
buscando estabelecer estilos de agricultura              passou a atuar em diferentes espaços da
menos agressivos ao meio ambiente e capazes              sociedade, entre eles a Universidade. Muitas
de proteger os recursos naturais, conservar o            dessas      iniciativas   estão  vinculadas    a
meio ambiente, além de serem mais duráveis               estudantes que se organizam em Grupos de
no tempo, tentando fugir do estilo convencional          Agroecologia (GA’s) e em outras entidades do
de agricultura que passou a ser hegemônico a             Movimento Estudantil (ME), que vêem a
partir dos novos descobrimentos da química               Agroecologia como um conjunto de ciências
agrícola, da biologia e da mecânica ocorridos já         que visam à construção de uma nova
no início do século XX. Em diversos países,              sociedade.
passaram      a    surgir   estas   agriculturas
alternativas, com diferentes denominações:
orgânica, biológica, biodinâmica, permacultura
etc., cada uma delas seguindo determinados
princípios, tecnologias, normas, regras e
filosofias, segundo as correntes a que estão
aderidas. Não obstante, na maioria das vezes,
tais alternativas não conseguiram dar as
respostas para os problemas socioambientais
que foram se acumulando como resultado do
modelo convencional de desenvolvimento e de
agricultura que passaram a predominar,
particularmente, depois da II Grande Guerra.
                                                          Figura 2: Reunião Grupos de Agroecologia durante o Fórum Social Mundia em 2009,
                                                          Belém/PA – Área Prática Grupo IARA - UFRA
                                                                 Neste sentido, coloca-se cada vez mais,
                                                         a necessidade de incentivo a estes grupos para
                                                         que avancem e possam atuar na elaboração de
                                                         uma matriz tecnológica, capaz de construir a
                                                         sustentabilidade      de     nossos    sistemas
                                                         produtivos. Para isso é importante que se
                                                         incentivem eventos, discussões, estudos, e
                                                         trocas de experiências para que haja uma
                                                         maior aproximação da realidade da agricultura
                                                         familiar com a Universidade, sendo de
                                                         fundamental importância a aproximação em
                                                         forma de extensão e pesquisa da Universidade
                                                         com a agricultura familiar.
                                                                 A Universidade é responsável pelos
 Figura 1: Cientista Maluco pró-revolução verde.         futuros profissionais das diversas áreas
                                                         podendo       contribuir   com    a   extensão
           Neste ambiente de busca e construção          universitária    provocando     mudanças     na
de        novos   conhecimentos,    nasceu    a          sociedade, sobretudo quando feita com

                                                                                                                                            11
consciência e voltada para o exercício pleno do
diálogo, da troca de experiências, de vivências
compartilhadas entre academia e comunidade,
proporcionando a reflexão e a ação, na busca
da melhoria da qualidade de vida da
comunidade      e    no     efetivo    papel   da
Universidade, que é de se abrir para além de
seus muros e contribuir para o crescimento e
melhoria da qualidade de vida da sociedade na
qual se insere.
        No caso específico do Recôncavo
baiano, além das culturas comerciais
tradicionais,    como      a       cana-de-açúcar,       Figura 4: Teoria + Prática

predomina a pequena produção, orientada para                 Assim pensando, observa-se que não
a policultura alimentar (mandioca, feijão,           basta adequar os sistemas de produção para a
batata-doce, amendoim), a produção da laranja        realidade local, agregar valor a seus produtos,
e a do fumo. Todavia, a agricultura da região        descobrir nichos de mercado e desenvolver
apresenta-se em crise há várias décadas, com         atividades não-agrícolas para complementação
uma excessiva fragmentação da estrutura              de renda. É preciso, além disso, que o
fundiária,    baixo     nível     tecnológico   e    processo produtivo em uso valorize esses
organizacional      das     propriedades.      Os    saberes      acumulados       e    garantam     a
indicadores sócio-econômicos também revelam          sustentabilidade dos sistemas, com equidade
as fortes carências que afetam a população           social e de gênero.
ocupada nas atividades agrícolas.                            Tal premissa vem ganhando corpo nos
                                                     debates sobre o tema, culminando na
                                                     compreensão de que o desenvolvimento rural é
                                                     o resultado de uma série de transformações
                                                     quantitativas e qualitativas que se produzem no
                                                     meio rural no qual os efeitos convergentes
                                                     produzem, com o tempo, uma elevação do
                                                     nível de vida. Ressalte-se, contudo, que a visão
                                                     do desenvolvimento apenas sob a ótica
                                                     capitalista, que preconiza o crescimento
                                                     econômico em detrimento dos demais
                                                     segmentos (social, cultural e ambiental),
                                                     precisa ser superada e dar lugar a uma outra
                                                     que pressuponha o equilíbrio entre os mesmos.
 Figura 3: Recôncavo Baiano                                  Do ponto de vista da agricultura familiar,
                                                     do seu fortalecimento advém a base para o
        As ações implementadas em um                 estabelecimento       de     futuros     sistemas
sistema de produção agrícola e seus                  agroecológicos. A real sustentabilidade, como
desdobramentos desempenham um papel                  dimensão       completa,      está     fortemente
relevante no suprimento de alimentos e na            relacionada à aquisição de estabilidade
geração de emprego e renda para a população          ecológica, a qual pode ser obtida em sistemas
rural. No entanto, para que essas atividades         mais complexos de policultura, os mais afeitos
possibilitem a melhoria das condições                e adequados à gestão agroecológica.
socioeconômicas,    criando as      condições                Frente a este cenário, acreditamos que
objetivas para a promoção da equidade social,        um Encontro Regional de Agroecologia irá
faz-se necessário que agricultores familiares        contribuir para a articulação entre as Redes
tenham      acesso    a    tecnologias    que        Sociais e os estudantes. Objetivando a
desempenhem esse papel como também                   consolidação      de      uma     proposta     de
respeitem os saberes existentes e os                 transformação social, e um projeto que coloque
conhecimentos acumulados pelas várias                a Universidade a serviço da sociedade, criando
gerações de camponeses e camponesas.                 um espaço de discussão, reflexão e proposição
                                                     de ações que garantam estas transformações.

                                                                                                    12
Agriculturas Alternativas
         A década de 1920 constitui-se no marco      que lhes permitam boa saúde e vitalidade, isto
para o surgimento das primeiras experiências         é, devem ser tratados como uma estrutura viva
contrárias à adubação química, valorizando a         e não simplesmente como a base a partir da
utilização       de       práticas       agrícolas   qual será realizada a produção agrícola. Para
potencializadoras dos processos biológicos na        tanto, ampara-se no manejo dos solos,
agricultura. A formulação dos primeiros              fertilização e rotação de culturas, exclui o uso
princípios de agricultura alternativa foi com a      de insumos químicos.
criação      da    Agricultura      Biodinâmica,              A Agricultura Natural apresentada
Agricultura Orgânica, Agricultura Biológica          como uma das vertentes mais restritivas e
e da Agricultura Natural.                            radicais da agricultura alternativa, a Agricultura
         A agricultura orgânica traz como            Natural está ancorada na filosofia de Masanobu
princípio a redução ou exclusão do uso de            Fukuoka e Mokiti Okada, da mínima
fertilizantes químicos, agrotóxicos, indutores do    intervenção no meio natural, tendo em vista
crescimento,      aditivos     sintéticos     para   que as atividades agrícolas devem respeitar as
alimentação animal. Além disso, se apóia em          leis da natureza. Prega o princípio da
práticas de rotação de culturas, uso de              purificação, isto é, acredita-se que alimentos
leguminosas, adubação verde, esterco animal,         produzidos sem produtos químicos tóxicos
controle biológico de pragas, entre outros.          serão capazes de purificar o corpo. Opera com
         A agricultura biodinâmica entende a         o método do não-fazer, recomendam não arar,
propriedade agrícola como um organismo vivo,         não revolver, não usar fertilizantes químicos ou
em que todos os elementos estão conectados,          compostos, não gradear, não usar agrotóxico
apresentando dessa forma, um enfoque mais            ou herbicida, controlar “invasores” com
integrado da propriedade rural. No ano de 1924       métodos naturais ou cortes. De acordo com
Steiner proferiu um ciclo de conferências que        Ehlers (1999), na Austrália este método ficou
estendeu os princípios da ciência espiritual         conhecido como permacultura, cujo princípio é
antroposófica à agricultura e forneceu a base        o cultivo alternado de gramíneas e
fundamental para estruturação da agricultura         leguminosas, e a manutenção de palha como
biodinâmica. O filósofo Steiner acredita que a       cobertura do solo. Autores como Canuto (1998)
agricultura sofre influências cósmicas e que         e Paulus (1999) separam a agricultura natural
forças espirituais interagem por meio de             da permacultura apresentando-as como sendo
energias sutis em plantas, animais e homens.         constitutivas de duas correntes distintas.
Algumas das práticas e formas de cultivo                      A Permacultura foi desenvolvida no
recomendadas pela agricultura biodinâmica            começo dos anos 70 pelos australianos Bill
incluem      a   orientação     pelo    calendário   Mollison e David Holmgren, como uma síntese
biodinâmico que é indicativo das melhores            das culturas ancestrais sobreviventes com os
fases astrológicas do ano para as distintas          conhecimentos da ciência moderna. A partir de
fases das atividades agrícolas, integração da        então, passou a ser difundida na Austrália,
pecuária na agricultura, uso dos “preparados         considerando que, naquele país, a agricultura
biodinâmicos”, cercas vivas, aproveitamento de       convencional já estava em decadência
leguminosas no plantio consorciado de culturas       adiantada, mostrando sinais de degradação
mistas com cereais, dentre outras indicações.        ambiental e perda de recursos naturais
         A Agricultura Biológica surge na Suíça      irrecuperáveis. Na verdade, em situação muito
na década de 1930, com Hans Müller, inventor         similar à do Brasil de hoje. O projeto
do modelo orgâno-biológico de produção               permacultura envolve o planejamento, a
agrícola. O político Muller centrou suas             implantação e a manutenção conscientes de
preocupações nos aspectos econômicos e               ecossistemas produtivos que tenham a
políticos que envolvem a produção de                 diversidade, a estabilidade e a resistência dos
alimentos, entre eles, a autonomia de                ecossistemas naturais. Ele resulta na
produtores rurais e a comercialização da             integração harmoniosa entre as pessoas e a
produção. A agricultura biológica traz como um       paisagem, provendo alimentação, energia e
de seus princípios a idéia de que plantas e          habitação, entre outras necessidades materiais
animais devem ser colocados em condições             e não materiais de forma sustentável.


                                                                                                    13
AGROECOLOGIA em movimento!
        As tentativas teóricas de construção da      movimento maior de contestação a uma
imagem da agricultura alternativa originaram         realidade que precisa ser modificada.
diferentes interpretações e representações
quanto ao seu significado social. Na literatura
referente à temática da agricultura alternativa
percebem-se duas formas básicas de
abordagem, aquelas que entendem as ações e
as experiências em agroecologia a partir de
“correntes de agricultura alternativa” e as
análises que a explicam ou a associam à ideia
da existência de um “movimento de agricultura
alternativa”. Isto é, tem-se a dúvida se ela foi
apenas produto do ideário de um restrito grupo
de profissionais, comumente provenientes das
ciências agrárias, construindo experiências
                                                     Figura 5: Jornada de Agroecologia – Cascavel/PR.
bastante localizadas, ou se realmente seria
representativa de um movimento nascente na                   Essa percepção de que existe uma
sociedade civil. A primeira idéia constituiu o que   espécie de “crise” seria gerada a partir da
está se chamando de “correntes de agricultura        observação e da reflexão que a sociedade
alternativa” e a segunda está associada à            realiza sobre os processos de desenvolvimento
existência de um movimento no sentido estrito        em curso e seus efeitos. Nesse sentido, o
de movimento social, cujos princípios de             movimento de agricultura alternativa se
identidade coletiva, adversário e objetivo           diferenciaria das “correntes” por estar
societal se fazem presentes.                         organizado      em    torno    de    propostas
                                                     compartilhadas entre aqueles que visualizam
         As abordagens que entendem a                em seus projetos a transformação da
agricultura alternativa como “correntes”,            sociedade. Estas construções teórico-analíticas
geralmente      caracterizam      análises   mais    concebem o movimento de agricultura
restritas, pois veem as ações direcionadas à         alternativa    como    um    momento      mais
agricultura alternativa como um conjunto de          amadurecido das ações contestatórias na
experiências esparsas, oriundas de orientações       agricultura, e entendem que deveria diferenciá-
filosóficas e teóricas distintas, que levam em       lo de seu primeiro momento, ou seja, das
consideração cuidados especiais com o meio           formas e experiências construídas em oposição
ambiente      na    produção      agrícola,  sem     ao modelo de agricultura químico-mecanizado
estabelecer a conexão dessas experiências            que ocorreram antes da década de 1970.
com processos sociais mais amplos. Estas
perspectivas     analíticas,     que    concebem             Direcionando sua abordagem nesse
agricultura alternativa a partir de “experiências”   sentido, Ehlers (1999) refere-se às correntes de
isoladas que originariam “correntes” distintas,      agricultura alternativa como “movimentos
possuem diversas orientações e abarcam uma           rebeldes”, lembrando que somente a partir da
diversidade     de    propostas,     fundamentos     década de 1970 passa a existir o movimento de
teóricos e filosóficos, apresentando técnicas        “agricultura alternativa”. Assim percebe-se que
frequentemente semelhantes, mas raramente            há uma demarcação analítico-conceitual feita
coincidentes. Tais experiências dotadas por          por Ehlers, pois ao definir essas correntes
concepções de produção alternativas às               como “movimentos rebeldes”, separa-as do
convencionais podem ser segmentadas em               movimento alternativo como movimento
correntes de agricultura alternativa, compondo-      proveniente de segmentos da sociedade civil
se principalmente pela agricultura biodinâmica,      organizada, mais articulado, com propostas
orgânica, biológica, natural e permacultura.         compartilhadas a nível mais abrangente.
                                                     Considerando que o movimento da agricultura
      Por outro lado, há teóricos que                alternativa     se     constrói   diante     dos
percebem a agricultura alternativa como um           desdobramentos da problemática sócio-


                                                                                                        14
ambiental motivada e aprofundada pela difusão                             englobam não somente a reorientação do
do modelo produtivista resultante da agricultura                          processo produtivo em si, mas também
convencional, químico-mecanizada, sugere                                  mudanças nas relações sociais vigentes.
que, deveria diferenciá-lo das experiências
alternativas anteriores à ocorrência deste                                        Muitas abordagens não incluem a
processo. Entretanto, podem ser reconhecidos                              agroecologia como um elemento componente
nesta definição dois momentos distintos e duas                            das “correntes” de agricultura alternativa. A
formas       de      oposição      estruturadas                           agroecologia se diferencia das demais
diferentemente. O primeiro momento marca o                                correntes porque não consiste apenas em um
período inicial de contestação aos princípios                             conjunto de técnicas, ela tem uma perspectiva
básicos da agricultura químico-mecanizada,                                mais ampla de direcionamento do social, do
dando impulso a diversas experiências                                     econômico e do político que ultrapassa a
contrárias    a    este    padrão     produtivo,                          “técnica” em si. Nessa perspectiva, a
posteriormente, num segundo momento, certas                               agroecologia é concebida como uma área do
ideias contidas nestas correntes fariam parte                             conhecimento, uma matriz disciplinar que
juntamente com outros atores coletivos, de um                             fornece as bases científicas para a agricultura
movimento com maior abrangência e                                         alternativa, que veio reforçar, embasar e dar
articulação e melhor estruturado do ponto de                              maior credibilidade às distintas formas de
vista teórico- metodológico, denominado de                                contrapor a agricultura convencional.
movimento de agricultura alternativa.
                                                                                  A agroecologia surgiu, na concepção de
        Foi exatamente o movimento da                                     Assis e Romeiro (2002), como uma resposta às
agricultura alternativa que criou a designação                            críticas direcionadas às diversas correntes de
de agricultura convencional relacionando-a ao                             agricultura alternativa, acusadas de ser uma
padrão dominante na agricultura (EHLERS,                                  tentativa retrógrada de volta ao passado na
1999). Para criar a ideia de contraposição a                              agricultura, proporcionando assim maior
este padrão, de negação, organizou-se sob o                               sustentação teórica e metodológica aos
signo do alternativo, englobando um conjunto                              procedimentos recomendados. Nesse sentido,
de reflexões críticas, técnicas, práticas,                                não se pode identificar a agroecologia com
correntes, experiências e propostas alternativas                          alguma corrente da “agricultura ecológica” visto
para a agricultura, que divergiam das                                     que aquela tem como princípio atender as
premissas       básicas    do     modelo      de                          diversas dimensões da sustentabilidade, ou
desenvolvimento dominante.                                                seja, as dimensões ecológica, econômica,
                                                                          social, cultural, política e ética.
        Pode-se dizer que a diversidade de
propostas e posicionamentos que abrange a                                          Uma       ciência      “não     neutra”,
agricultura alternativa compreende desde a                                comprometida com a luta de classes e a
mera orientação no sentido da redução do uso                              serviço das demandas populares, já que há em
de insumos químicos na produção agrícola, até                             suas pesquisas e aplicações a claro
intervenções     que    tendem   a    produzir                            posicionamento político. Faz crítica ao modelo
transformações     mais    abrangentes,   que                             de desenvolvimento, ao agronegócio e as
                                                                          transnacionais, questionando suas tecnologias,
                                                                          e integra várias áreas do conhecimento para
                                                                          elaborar propostas para o desenvolvimento
                                                                          sustentável.     Nesse      contexto,  podemos
                                                                          identificar novos atores que estão construindo a
                                                                          agroecologia, principalmente a partir do início
                                                                          desse século, e que vão muito além dos
                                                                          conceitos e princípios das correntes de
                                                                          agricultura alternativa, passando também a ser
                                                                          uma       importante    ferramenta    para    os
                                                                          movimentos sociais.

                                                                                 Como importante ator desse novo
Figura 6: Grupos de Agroecologia, Fórum Social Mundial, Belém/PA, 2009.   cenário, A Via Campesina é um movimento

                                                                                                                        15
social internacional que coordena organizações      implementados       localmente   por    vários
camponesas        de    pequenos      e    médios   movimentos e comunidades que participam da
agricultores, trabalhadores agrícolas, mulheres     Rede. A ANA, Articulação Nacional da
rurais e comunidades. Uma das principais            Agroecologia, é a principal rede nacional de
políticas da Via Campesina é a defesa da            movimentos sociais e organizações da
soberania alimentar, que é o direito dos povos      sociedade civil voltadas a promoção da
de decidir sobre sua própria política agrícola e    agroecologia nas distintas regiões do pais,
alimentar. Prioridade para uma produção de          resultado de um processo de articulação social
alimentos sadios, de boa qualidade e                e política em 2002.
culturalmente apropriados, para o mercado
interno. É fundamental, então, manter um                    Para aumentar a correlação de forças
sistema de produção camponês diversificado          frente ao agronegócio e o neoliberalismo, é
(biodiversidade,     respeito    à     capacidade   necessário a organização dessas redes e
produtiva das terras, valor cultural, preservação   articulações para construir uma unidade de
dos recursos naturais). Desenvolve ações em         luta, tendo clareza dos objetivos estratégicos,
prol da agroecologia, como as Jornadas de           potencializando a formação política dos
Agroecologia, realizadas desde 2002 no estado       militantes dessas organizações.
Paraná e, criação das Escolas Latino                        A conclusão que podemos chegar é
Americana       de    Agroecologia,     uma    no   que, não são mais as correntes de agricultura
assentamento do Contestado/MST, município           alternativa que estão protagonizando as ações
da Lapa, Paraná e outra na Venezuela.               em torno da agroecologia, e sim organizações
                                                    mais comprometidas com a luta de classes e
        A FEAB e ABEEF (organizações do             que no início desse século passam a discutir a
movimento estudantil que compõe a Via               agroecologia como a ordem do dia.
Campesina) possuem núcleos específicos para
discussão da agroecologia e também
promovem encontros, cursos, seminários e
diversas outras atividades em torno dessa
temática.
        O Movimento Sem Terra passa a
discutir a Agroecologia como matriz tecnológica
assim como os outros movimentos que também
compões a Via Campesina passam a
reconhecer a importância desse tema.
        Novas organizações nascem no século
21 como fóruns, redes e articulações no
cenário da Agroecologia. A Rede Brasileira de
Justiça Ambiental (RBJA) e o Fórum Brasileiro
de     Soberania Alimentar        e   Nutricional
(FRBSAN), por exemplo, são articulações
formadas por representantes de movimentos
sociais, e sociedade civil organizada, sindicatos
e pesquisadores/as de todo o Brasil, com a
preocupação de animar um pensamento e uma
ação que articulem as lutas ambientais com as
lutas sociais, soberania alimentar e nutricional.
Outro exemplo é a Rede Alerta Contra o
Deserto Verde, uma ampla rede da sociedade
civil, composto de entidades, movimentos
sociais, preocupados com a venda de "créditos
de carbono", ao mesmo tempo, a Rede tenta
mostrar a viabilidade de modelos alternativas        Figura 7: Agricultora Sem Terra preocupada com as futuras gerações.
de     desenvolvimento       que    têm      sido




                                                                                                                           16
Ciência e Tecnologia:
       Atuação do movimento estudantil nas universidades2
        Nem sempre os acontecimentos durante                ou aumentar a produtividade através da
períodos históricos da humanidade foram                     tecnologia.
explicados     cientificamente,    em     vários                    Nesse processo a apropriação da
momentos foram atribuídos a divindades, e nós               ciência e tecnologia vem a servir para esse
humanos não teríamos controle sobre isso.                   objetivo. Precisa produzir para se manter no
Nem sempre foi algo tranquilo de aceitar-se. A              mercado.
fé e a ciência se chocam, isso vive na história                     Temos como exemplo a produção da
há humanidade por muito tempo.                              cana-de-açúcar, em que está acontecendo a
        Existe um marco na história com o                   substituição do/as trabalhadores/as das
advento do capitalismo, que surge sob um                    lavouras por máquinas; uma máquina substitui
modo de produção, mas também como um                        em média 500 trabalhadores/as em muito
conjunto de ideias. O debate de que não é algo              menos tempo. E as tecnologias desenvolvidas
exterior a nós que dá as respostas começa a                 por uma empresa não são reveladas para as
crescer, e sim a ideia de que nós somos                     demais empresas, surgindo assim as leis de
capazes de explicar muitas coisas. Neste                    patentes. A ciência e tecnologia passam então
momento a humanidade é arrebatada de um                     a atender a lógica do capital. As consequências
otimismo muito grande por não se sentir mais                desse modelo têm levado a uma enorme perda
obrigado a viver amordaçado algo externo a si.              da biodiversidade; a super-exploração da força
        A partir dessas descobertas, com o                  de trabalho, aumento da violência devido a
desenvolvimento tecnológico, a humanidade                   piora dos trabalhadores por conta do
teve avanços incríveis. Um exemplo é na                     desemprego, ausência de condições de vida
questão da mortalidade que havia e depois de                digna; aumento da degradação ambiental e
avanços o quanto diminuiu, aumentando a                     esgotamento dos recursos. Pois, os capitalistas
expectativa de vida. Assim as pessoas não vão               não tem projeto para a humanidade, só tem
mais viver como antes, e nem vão mais querer                projeto para manter seus lucros. Nesse sentido
viver como antes.                                           o sistema é contraditório, por não ter um
        A     emancipação       humana     está             projeto para humanidade, colocando sua
estreitamente ligada ao desenvolvimento das                 própria existência em risco.
forças produtivas, e a tecnologia é o que
proporciona o desenvolvimento humano, e a
emancipação do trabalho. É fundamental para
desenvolver as condições dignas de vida da
população, e se não tiver esses avanços o ser
humano terá que trabalhar toda vida apenas
para sobreviver.
        Porém, com o sistema capitalista que
vivemos hoje, em um determinado momento a
ciência e a tecnologia foram apropriadas pelo
sistema para que este continue desenvolvendo
a sua lógica, que é manter as taxas de lucro
crescente se apropriando da força de trabalho,
da mais valia, que é o trabalho não pago ao
trabalhador. Para o capitalista se mantes no
mercado ele estará sempre concorrendo com
                                                              Figura 8: Congresso Internacional de cientistas pró-agrotóxicos
os demais, e isso precisa vender mais que o
concorrente,     barateando     o   preço     da
mercadoria, aumentar a exploração do trabalho

2 Texto formulado para a cartilha “As Transnacionais nas universidade: a educação contra o povo” a partir da relatoria
  do debate ocorrido no espaço de formação dobre Ciência & Tecnologia na PNEB (Plenária Nacional de Entidades de
  Base) FEAB em Montes Claros/MG em abril de 2009.

                                                                                                                                17
E para dentro da Universidade?                                                    com modelos antigos.
                                                                                            Verificamos que nessa batalha os
        A Universidade é um dos espaços de                                          melhores instrumentos que temos na trincheira
produção da ciência e tecnologia. Na divisão                                        pra popularização da universidade e contra a
social do trabalho não é papel do Brasil pensar,                                    hegemonia são os Grupo de Agroecologia,
mesmo assim o Brasil ainda as Universidades                                         Núcleos de Apoio à Reforma Agrária e alianças
são espaços de pensar ciência e tecnologia,                                         com movimentos sociais.
talvez muito mais de reproduzir essa ideologia.                                             Por isso devemos fortalecer esses
Assim é nítida nas universidades a presença                                         direcionamentos a ponto de ganharmos corpo
das transnacionais, na bolsas pagas para                                            para     compormos       uma    frente     contra-
estudantes etc. E onde está o espaço para                                           hegemônica,        que     é   uma      trincheira
quem não quer trabalhar para o projeto das                                          importantíssima para manter a chama da
transnacionais?                                                                     mudança acesa.
        E com tantas tecnologias como ainda                                                 Se     fossemos      debater    “Ensino”,
existem pessoas sem as condições mínimas de                                         isoladamente, iríamos nos contradizer com
alimentação? Como ainda existem tantas                                              nossa concepção por não termos condições de
doenças? É possível a ciência ser neutra?                                           debater,       assim       como      ressaltamos
        É possível ter esse espaços nas                                             anteriormente, separadamente do debate
universidades para além das transnacionais,                                         amplo de educação, como faz o MEC. Temos
onde se possa atuar de outra forma? Quais são                                       hoje um ensino bancário que não liberta o
esses espaços e como atuamos? Qual o papel                                          estudante, uma pesquisa direcionada pelas
da universidade na produção de ciência e                                            transnacionais e uma extensão assistencialista.
tecnologia? Como podemos atuar cercados                                                     Fica difícil apontarmos soluções diante
pelo tripé Ensino, Pesquisa e Extensão? Se                                          de uma estrutura sistematicamente feita para
perguntarmos a um cubano como funciona a                                            não funcionar diante diante dos anseios
política de extensão nas suas universidades ele                                     populares, por isso nossa tarefa se coloca em
provavelmente não saberá responder. O                                               conduzir este debate para nosso campo de
pressuposto da extensão é que haja um centro                                        atuação, a organização militante que porá as
pesquisador que estenda seus resultados a um                                        fórmulas tradicionais em cheque diante da
plano externo, mas como lá as universidades                                         mobilização e das demandas populares quando
não tem “muros” não existe extensão, apenas                                         aproximamos,        de   fato,  o    povo     das
educação,       e    tudo    se     envolvendo                                      universidades.
dialeticamente, teórica e praticamente nesse                                                Para esse período de mobilizações
processo em que o povo é o centro. Porém no                                         devemos ressaltar nosso protagonismo na
Brasil temos uma universidade alicerçada no                                         organização das lutas contra a fundações de
tripé Ensino, Pesquisa e Extensão. Dá para                                          Apoio às Universidades e denúncia de gastos
dizer se trata de um avanço ou não?                                                 com pesquisas privadas.
        Acreditamos que não é o caso, e não                                                 Para pesquisa devemos contrapor a
devemos comparar com Cuba, mas deveremos                                            fórmula excludente de saberes cunhada pela
tê-la como exemplo. Como esse tripé como                                            academia. Nesse âmbito aproximaremos as
devemos disputar uma extensão, ainda que                                            pautas populares ao passo que destacamos as
                                                                                    formas tradicionais de fazer ciência popular.
                                                                                            Algumas universidades apresentam
                                                                                    mais espaço para pesquisa direcionada para o
                                                                                    movimentos sociais e outras menos. Isso está
                                                                                    relacionado com professores que apoiam e
                                                                                    com a direção da universidade. Mesmo onde
                                                                                    existem iniciativas de agroecologia por parte
                                                                                    das universidade, e colocado como algo não
                                                                                    antagônico ao agronegócio. As transnacionais
                                                                                    entram nas universidades com um debate de
                                                                                    consciência ambiental, de contribuição com a
                                                                                    pesquisa e abertura de mercado de trabalho.

 Figura 9: Encontro Nacional de Grupos de Agroecologia – ENGA – Curitiba/PR, 2009




                                                                                                                                   18
E agora?                             através do estudo conectando nos com a
                                                                  organização e um objetivo de luta, sem
                                                                  esquecer que o momento de se forjar uma
                                                                  educação coletivo nas lutas é o memento de
                                                                  incorporar novos valores fraternos, novas
                                                                  relações de gênero, culturais e sociais; assim
                                                                  traremos novas relações sociais e concretas
                                                                  teorias.
                                                                          Nesses casos temos que temperar
                                                                  muito bem nossas formas de organização com
                                                                  certa inserção nas instituições, concelhos e
                                                                  assembleias, mas sempre com o objetivo de
                                                                  ampliar as lutas. Essa balança só se dará com
                                                                  a experimentação de cada organização nas
                                                                  lutas. Além disso, nunca poderemos perder de
 Figura 10: Ocupação Reitoria em Cruz das Almas/BA, UFRB, 2008.   vista a intenção de massificar as lutas.

        Para seguirmos em marcha na
construção de uma outra sociedade é
necessário irmos acumulando experiências
organizativas dentro do sistema onde atuamos
neste momento. As experiências organizativas
se dão no momento onde forjamos na luta um
caráter de educação coletiva e com
perspectivas mais amplas. Nessa tarefa
devemos combater o formato moderno e
individualista regido pelo jargão “faça sua
parte”, propondo uma análise crítica, dialética e
coletiva.
        O capitalismo não domina a sociedade
absolutamente. A realidade é dialética. O
modelo domina, é hegemônico, mas não
domina exatamente como ele quer. Vamos
tendo nossas conquistas dentro do próprio
sistema e acumulando para a sua superação,
mas somente com duras lutas e mobilizações.

A opinião dos estudantes ao longo da história
ganhou um grande respaldo da sociedade, pois
por diversos motivos, inclusive excludentes,
                                                                   Figura 11: ATO público FEAB e ABEEF, Piracicaba/SP, 2009.
adquiriu uma condição privilegiada com relação
ao acesso a informação. Por isso, mesmo que                               E com esse espírito que nós devemos
não sejamos numerosos temos que aproveitar                        encarar essa tarefa. Sabemos que não é fácil
esse fator para colocar em xeque a atuação                        enfrentar aqueles que são os donos do poder
das universidade.                                                 dentro do nosso palco de atuação, que é a
         Quanto aos espaços institucionais                        universidade, mas acima de tudo sabemos que
devemos ter muita cautela, eles não devem ser                     não há transformação sem luta. O nosso papel,
“o fim” da nossa luta, mas sim um espaço para                     enquanto movimento estudantil combativo, é
massificação das lutas. Devemos estar em                          abraçar esse compromisso de não calar diante
todos os ambientes e levar em mente que uma                       dessa situação e de enxergar que somos nós
experiência na luta concreta que extrapola a                      que podemos criar esse contraponto que,
instituição é sempre mais educativa para as                       passo a passo, pode permitir o desmonte do
massas, como dizia Lenin.                                         controle ideológico hegemônico que hoje se
         Nesse processo coletivo de organização                   instala dentro da universidade. A tarefa não é
temos por tarefa intensificar nossa formação                      fácil, mas é necessária.

                                                                                                                               19
Experiência em Agroecologia: Agricultura Familiar no Semi-Árido.
                                                                                                 Alda Cunha3

        A concentração de água no semi-árido é inserta, variando de ano para ano. Em alguns
anos a terra é irrigada, a produção e reservatórios são enchidos, porém, em outro anos a água é
escassa, os roçados não produzem. Com a necessidade de sobrevivência, algumas plantas
típicas da região se adaptaram com a falta de chuva, e algumas delas têm reserva para períodos
da seca.

       Por a região ser mais seca, é muito difícil do solo reter água da chuva, e geralmente as
que ficam retidas se tornam salgadas com a diminuição do fluxo da água. É normal o escoamento
superficial e a erosão da terra pelo impedimento de absorção dessas.

       Esta situação levou as famílias à procura de uma solução para o período de seca.
Armazenar água das chuvas retardou um pouco a sede, mas não é suficiente para todos os usos
necessários. Além do mais, não há filtração adequada para o consumo, sendo contaminada muito
frequentemente, pelo uso de várias comunidades e animais na mesma água.

        Então como suprir a necessidade suficiente de água, assegurando qualidade para o
consumo das famílias produtoras? Uma saída seria a construção de infra-estrutura para o
armazenamento de água, afastando as famílias e as comunidades da seca. Porém as políticas
públicas preferem suprir as necessidades do semi-árido com a distribuição de água por carros
pipas e cestas básicas, manobras que além de insuficientes são pouco eficazes por serem
limitados e não alcançando a maior parte da população.

       O pólo sindical e das organizações da agricultura familiar da Borborema em parceria com
a AS-PTA, vem estimulando e aprimorando as experiências desenvolvidas pelas famílias na
região. A formação de agricultor para agricultor através de visitas de intercâmbio, foi o caminho
encontrado e que levou muitas famílias a fortalecerem as experiências de captação
armazenamento e um bom manejo de água em suas propriedades.

        Experiência no semi-árido: maneira de armazenamento quando o seu Zé de Pedro e Dona
Maria do Carmo chegaram a suas terras, perceberam que ao cair da chuva, as águas desciam
rapidamente pelo roçado. Para um melhor aproveitamento eles decidiram impedir o escoamento
total da água plantando faixas de capim e implantando barreiras de pedras, diminuindo assim a
velocidade da água. O capim que começou a crescer pode também alimentar os animais. A partir
disso em 2000 a família constitui com seus próprios recursos uma barragem subterrâneo, que foi
pensada para segurar a terra e a água que descia. Hoje no local se cultiva plantas para a
alimentação da família e para seu sustento.

         Desta mesma forma fez o senhor João Miranda e Dona Terezinha, onde antes só existia
um deserto, a terra era seca e rachada, a família fez brotar esperança. Além de construírem
leirões atravessados para melhor aproveitamento de água, constituíram barreiras de pedras para
filtrar a água e segurar a terra. Para seu Inácio Tato, a barragem subterrânea possui inúmeras
vantagens em relação às outras barragens com espelho d’água. A grande diferença, é que ela fica
cheia, pios a água não aparecendo, diminui-se o efeito ao vento e do solo, evitando evaporação.

       Zé Pedro e Maria do Carmo além bom manejo da água e solo na propriedade, se
preocupavam com outra água. Construiu uma cisterna de placas, que é cuidada e limpa
diariamente por dona Maria e sua filha, com capacidade de armazenar 16 mil litros de água, por
também recolher a água da chuva.


3 Graduanda de Tecnologia em Agroecologia da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia - UFRB

                                                                                                         20
Através das cisternas de placas, os moradores da seca, obtiveram água limpa para seu
consumo, além disso, fazem uso deste em casa, para os animais, e para o alto sustento dessas
famílias que irrigam suas hortaliças, frutos e verduras, para poderem vender-las nas feiras de rua
ou feiras agroecológicas.

       Os irmãos Maciel, observaram que a folha da orquídea pode funcionar como uma bica,
então colocou um tonel debaixo pra reservar água. Uma só chuva já da pra encher o tonel, e a
água é aproveitada em casa.

       A barragem subterrânea é construída em rios ou riachos abertos que ficam vazios no
verão. Abre-se uma valeta, até encontrar um chão duro. Depois com lona ou barro batido, fecha-
se a valeta para que não passe água. Assim forma-se um lençol de água podendo plantar no local
ou até abrir poços para usar essa água no consumo familiar ou das plantas.

       Seu Ramiro, que antes trabalhava de meia ou alugada, hoje tem sua independência.
Planta suas verduras e hortaliças, cuida da produção e sustenta toda família, graças a essa
barragem subterrânea que descobrir em uma visita de intercâmbio.

        A mandala, com um poço com 1 metro e meio de fundura, em forma de funil, serve para
irrigação, criar peixes, marrecos e galinhas, um sistema integrado. O farelo de milho alimenta o
marreco, e as sobras servem de comida para as galinhas, as fezes dos marrecos servem de
ração para engorda dos peixes e a água irriga as plantas. Tudo isso melhora as condições de
vida.

       Organização da comunidade: as famílias, igrejas, movimentos sociais e sindicais e as
organizações das comunidades apostam nas práticas tradicionais de organizações através das
práticas coletivas. Mas as políticas públicas governamentais em vez de fortalecerem estas
dinâmicas locais, contribuem para desestrutura-las na medida que negariam este espaço de
organização, e incentivam a criação de associações legais para gerar projetos governamentais
sem a devida participação das famílias na proposição de suas ações de gestão. Muitas
comunidades resistiram e foram fortalecidas com o trabalho das ações de convivência com o
semi-árido desenvolvido na região.

        Uma solução imediata foi a construção das cisternas de placas, mas os recursos tornaram-
se mínimos diante de tantas famílias. Foi criado então, neste caso, um fundo rotativo, com
participação inicial de 30 a 90 famílias que necessitavam do benefício. Foi decidido que cada
família pagaria 20 reais por mês. Passaram então a sortear cisternas por mês, e em 20 meses
foram construídas 20 cisternas, contemplando todos os participantes do primeiro grupo. O
sucesso da experiência logo mobilizou outras famílias da comunidade, e em 4 anos a comunidade
que recebeu recursos para 35, chegaram a construir mais de 77 cisternas com a arrecadação
local totalizando 112 unidades. Ou seja, triplicou o recurso inicial.

       No semi árido é possível viver bem. O problema maior não estar na falta de água, pois
sentem anos de muita chuva. Nos anos que chove pouco, ainda é possível juntar água, bons
exemplos foram mostrados pelos agricultores em seus depoimentos. O maior problema é a falta
de uma política que de condições às famílias de estruturar melhor suas propriedades, para captar
e armazenar a água da chuva e dela tirar seu sustento. Como a água parte de casa, as famílias
despertam crença em um novo jeito de relacionar-se com a natureza para melhorar o sistema de
produção.




                                                                                               21
CANCIONEIRO

                Sobradinho                                           Capim Guiné
               Sá e Guarabyra                                 Raul Seixas / Wilson Aragão

O homem chega, já desfaz a natureza               Plantei um sítio
                                                  No sertão de Piritiba
Tira gente, põe represa, diz que tudo vai mudar   Dois pés de guataiba
O São Francisco lá pra cima da Bahia              Caju, manga e cajá
                                                  Peguei na enxada
Diz que dia menos dia vai subir bem devagar       Como pega um catingueiro
E passo a passo vai cumprindo a profecia do       Fiz acero, botei fogo
beato que dizia que o Sertão ia alagar            "Vá ver como é que tá"
                                                  Tem abacate, jenipapo
O sertão vai virar mar, dá no coração             E bananeira
O medo que algum dia o mar também vire            Milho verde, macaxeira
sertão                                            Como diz no Ceará
                                                  Cebola, coentro
Adeus Remanso, Casa Nova, Sento-Sé                Andu, feijão-de-corda
Adeus Pilão Arcado vem o rio te engolir           Vinte porco na engorda
                                                  Até o gado no currá
Debaixo d'água lá se vai a vida inteira           Com muita raça
Por cima da cachoeira o gaiola vai, vai subir     Fiz tudo aqui sozinho
Vai ter barragem no salto do Sobradinho           Nem um pé de passarinho
                                                  Veio a terra semeá
E o povo vai-se embora com medo de se             Agora veja
afogar.                                           Cumpadi, a safadeza
Remanso, Casa Nova, Sento-Sé                      Cumeçô a marvadeza
                                                  Todo bicho vem prá cá
Pilão Arcado, Sobradinho                          Num planto capim-guiné
Adeus, Adeus ...                                  Pra boi abaná rabo
                                                  Eu tô virado no diabo
                                                  Eu tô retado cum você
                                                  Tá vendo tudo
                                                  E fica aí parado
                Asa Branca                        Cum cara de viado
      Luiz Gonzaga / Humberto Teixeira            Que viu caxinguelê
                                                  Suçuarana só fez perversidade
                                                  Pardal foi pra cidade
Quando oiei a terra ardendo                       Piruá minha saqüé
                                                  Qüé! Qüé!
Qual a fogueira de São João                       Dona raposa
Eu preguntei a Deus do céu,ai                     Só vive na mardade
Por que tamanha judiação                          Me faça a caridade
                                                  Se vire e dê no pé
Que braseiro, que fornaia                         Sagüi trepado
Nem um pé de prantação                            No pé da goiabeira
Por farta d'água perdi meu gado                   Sariguê na macaxeira
                                                  Tem inté tamanduá...
Morreu de sede meu alazão                         Minhas galinha
Inté mesmo a asa branca                           Já num fica mais parada
                                                  E o galo de madrugada
Bateu asas do sertão                              Tem medo de cantá
"Intonce" eu disse adeus Rosinha                  Num planto capim-guiné
Guarda contigo meu coração                        Pra boi abaná rabo
                                                  Eu tô virado no diabo
Hoje longe muitas légua                           Eu tô retado cum você
Numa triste solidão                               Tá vendo tudo
Espero a chuva cair de novo                       E fica aí parado
                                                  Cum cara de viado
Pra mim vortar pro meu sertão                     Que viu caxinguelê
Quando o verde dos teus óio                       Num planto capim-guiné
                                                  Pra boi abaná rabo
Se espanhar na prantação                          Eu tô virado no diabo
Eu te asseguro não chore não, viu                 Eu tô retado cum você
Que eu vortarei, viu                              Tá vendo tudo
                                                  E fica aí parado
Meu coração                                       Cum cara de viado
                                                  Que viu caxinguelê




                                                                                            22
Prá se bater
             A Vida do Viajante
                                       Com poder lá do sertão
       Luiz Gonzaga e Hervê Cordovil
                                       Mas lampião disse
                                       Que contra o flagelo
Minha vida é andar
                                       Tem que lutar
Por esse país
                                       Comparabelo na mão...
Pra ver se um dia
                                       É Lamp, é Lamp, é Lamp
Descanso feliz
                                       É Lampião
Guardando as recordações
                                       Meu candeeiro encantado...
Das terras por onde passei
                                       Falta o cristão
Andando pelos sertões
                                       Aprender com São Francisco
E dos amigos que lá deixei.
                                       Falta tratar
Chuva e sol
                                       O nordeste como o sul
Poeira e carvão
                                       Falta outra vez
Longe de casa
                                       Lampião, trovão, corisco
Sigo o roteiro
                                       Falta feijão
Mais uma estação
                                       Invés de mandacaru
E a saudade no coração
                                       Falei!...
Minha vida é andar...
                                       Falta a nação
Mar e terra
                                       Acender seu candeeiro
Inverno e verão
                                       Faltam chegar
Mostra o sorriso
                                       Mais Gonzagas lá de Exú
Mostra a alegria
                                       Falta o Brasil
Mas eu mesmo não
                                       De Jackson do Pandeiro
E a alegria no coração
                                       Maculêlê, Carimbó, Maracatu...
Minha vida é andar...
                                                 A Massa - Raimundo Sodré
        Candeeiro Encantado - Lenine
                                       A dor da gente é dor de menino acanhado
Lá no sertão                           Menino-bezerro pisado no curral do mundo a penar
Cabra macho não ajoelha                Que salta aos olhos igual a um gemido calado
Nem faz parelha                        A sombra do mal-assombrado é a dor de nem poder
Com quem é de traição                  chorar
                                       Moinho de homens que nem jerimuns amassados
Puxa o facão, risca o chão
                                       Mansos meninos domados, massa de medos iguais
Que sai centelha                       Amassando a massa a mão que amassa a comida
Porque tem vez                         Esculpe, modela e castiga a massa dos homens
Que só mesmo a lei do cão...           normais
É Lamp, é Lamp, é Lamp
É Lampião                              Quando eu lembro da massa da mandioca mãe, da
Meu candeeiro encantado                massa
Meu candeeiro encantado...             When I remember of "massa" of manioc
Enquanto a faca não sai                Nunca mais me fizeram aquela presença, mãe
Toda vermelha                          Da massa que planta a mandioca, mãe
                                       A massa que eu falo é a que passa fome, mãe
A cabroeira
                                       A massa que planta a mandioca, mãe
Não dá sossego não                     Quand je rappele de la masse du manioc, mére
Revira bucho                           Quando eu lembro da massa da mandioca
Estripa corno, corta orelha            Lelé meu amor lelé no cabo da minha enxada não
Quem nem já fez                        conheço "coroné"
Virgulino, o Capitão...                Eu quero mas não quero (camarão). Minha mulher
É Lamp, é Lamp, é Lamp                 na função (camarão)
É Lampião                              Que está livre de um abraço, mas não está de um
Meu candeeiro encantado                beliscão
Meu candeeiro encantado...             Torna a repetir meu amor: ai, ai, ai!
                                       É que o guarda civil não quer a roupa no quarador
Já foi-se o tempo
                                       Meu Deus onde vai parar, parar essa massa
Do fuzil papo amarelo

                                                                                      23
Cio da Terra
                                                          Xote Ecológico
     Chico Buarque e Milton nascimento
                                                           Luíz Gonzaga
Debulhar o trigo
                                         Não posso respirar, não posso mais nadar
Recolher cada bago do trigo
                                         A terra está morrendo, não dá mais pra plantar
Forjar no trigo o milagre do pão
                                         Se planta não nasce se nasce não dá
E se fartar de pão
                                         Até pinga da boa é difícil de encontrar
Decepar a cana
                                         Cadê a flor que estava aqui?
Recolher a garapa da cana
                                         Poluição comeu.
Roubar da cana a doçura do mel
                                         E o peixe que é do mar?
Se lambuzar de mel
                                         Poluição comeu
Afagar a terra
                                         E o verde onde que está ?
Conhecer os desejos da terra
                                         Poluição comeu
Cio da terra, a propícia estação
                                         Nem o Chico Mendes sobreviveu
E fecundar o chão


                                                       Jumento Celestino
       Foguete De Reis (ou A Guerra)
                                                      Mamonas Assassinas
         Cordel Do Fogo Encantado
                                         (De quem é esse jegue?
No derradeiro luar                       De quem é esse jegue?
O sol saiu                               De quem é esse jegueee... Ô rapaz!
Um trovão avermelhado                    Não é jegue não, é jumentio!)
O sol saiu                               Tava ruim lá na Bahia, profissão de bóia-fria
Solta fogo do passado                    Trabalhando noite e dia, num era isso que eu queria
O sol saiu                               Eu vim-me embora pra "Sum Paulo",
No peito de quem tá vivo                 Eu vim no lombo dum jumento com pouco
Salva                                    conhecimento
Eu quero ver rodar                       Enfrentando chuva e vento e dando uns peido
                                         fedorento (vish)
A planta que vingará
                                         Até minha bunda fez um calo
O sol saiu                               Chegando na capital, uns puta predião legal
O medo de lampião                        As mina pagando um pau, mas meu jumento tava
O sol saiu                               mal
As dores de Iemanjá                      Precisando reformar
O sol saiu                               Fiz a pintura, importei quatro ferradura
E a lua quilariou                        Troquei até dentadura e pra completar a belezura
E eu vi o meu amor                       Eu instalei um Road-Star!
Dentro do canaviá                        Descendo com o jumento na mó vula
E haja guerra e haja guerra              Ultrapassei farol vermelho e dei de frente com uma
                                         mula
Haja guerra no ar
                                         Saí avuando, parecia um foguete
Boa noite senhor e senhora               Só não estourei meu côco pois tava de capacete
Eu cheguei agora                         Me alevantei, o dono da mula gritando
Me preste atenção                        O povo em volta tudo olhando e ninguém pra me
Nesse mundo de fogo e de guerra          socorrer
O santo da terra                         Fugi mancando e a multidão se amontoando
Tem calo na mão                          Em coro tudo gritando: "Baiano, cê vai morreêeê !"
                                         Depois desse sofrimento, a maior desilusão
                                         Pra aumentar o meu lamento, foi-se embora meu
                                         jumento
                                         E me deixou c'as prestação
                                         E hoje eu tô arrependido de ter feito imigração
                                         Volto pra casa fudido, com um monte de apelido
                                         O mais bonito é cabeção!




                                                                                         24
Sociedade Alternativa              Pra Não Dizer Que Não Falei Das Flores
                 Raul Seixas                               Geraldo Vandré

Viva! Viva! Viva A Sociedade Alternativa     Caminhando e cantando
                                             E seguindo a canção
Se eu quero e você quer                      Somos todos iguais
Tomar banho de chapéu                        Braços dados ou não
                                             Nas escolas, nas ruas
Ou esperar Papai Noel
                                             Campos, construções
Ou discutir Carlos Gardel                    Caminhando e cantando
Então vá!                                    E seguindo a canção...
Faz o que tu queres                          Vem, vamos embora
Pois é tudo                                  Que esperar não é saber
Da Lei! Da Lei!                              Quem sabe faz a hora
Viva! Viva!Viva A Sociedade Alternativa...   Não espera acontecer...(2x)
"-Faz o que tu queres                        Pelos campos há fome
Há de ser tudo da Lei"                       Em grandes plantações
Viva! Viva!                                  Pelas ruas marchando
                                             Indecisos cordões
Viva A Sociedade Alternativa
                                             Ainda fazem da flor
"-Todo homem, toda mulher                    Seu mais forte refrão
É uma estrêla"                               E acreditam nas flores
Viva! Viva!                                  Vencendo o canhão...
Viva A Sociedade Alternativa                 Vem, vamos embora
(Viva! Viva!)                                Que esperar não é saber
Viva! Viva!                                  Quem sabe faz a hora
Viva A Sociedade Alternativa                 Não espera acontecer...(2x)
Han!...                                      Há soldados armados
Mas se eu quero e você quer                  Amados ou não
                                             Quase todos perdidos
Tomar banho de chapéu
                                             De armas na mão
Ou discutir Carlos Gardel                    Nos quartéis lhes ensinam
Ou esperar Papai Noel                        Uma antiga lição:
Então vá!                                    De morrer pela pátria
Faz o que tu queres                          E viver sem razão...
Pois é tudo                                  Vem, vamos embora
Da Lei! Da Lei!                              Que esperar não é saber
Viva! Viva! Viva A Sociedade Alternativa     Quem sabe faz a hora
Viva! Viva!                                  Não espera acontecer...(2x)
Viva A Sociedade Alternativa...              Nas escolas, nas ruas
                                             Campos, construções
"-O número 666
                                             Somos todos soldados
Chama-se Aleister Crowley"                   Armados ou não
Viva! Viva!                                  Caminhando e cantando
Viva! A Sociedade Alternativa                E seguindo a canção
"-Faz o que tu queres                        Somos todos iguais
Há de ser tudo da lei"                       Braços dados ou não...
Viva! Viva!                                  Os amores na mente
Viva! A Sociedade Alternativa                As flores no chão
"-A Lei de Thelema"                          A certeza na frente
Viva! Viva!                                  A história na mão
                                             Caminhando e cantando
Viva A Sociedade Alternativa
                                             E seguindo a canção
"-A Lei do forte                             Aprendendo e ensinando
Essa é a nossa lei                           Uma nova lição...
E a alegria do mundo"                        Vem, vamos embora
Viva! Viva!                                  Que esperar não é saber
Viva A Sociedade Alternativa                 Quem sabe faz a hora
(Viva! Viva! Viva!)...                       Não espera acontecer...(4x)


                                                                                        25
Stab                                                    Cidadão
                      Marcelo D2                                             Edson e Hudson

   Eu me apresento em alto e bom som, para que todos           Tá vendo aquele edifício, moço?
  possam ouvir.Cara sagaz e cascudo, direto do Andaraí.        Ajudei a levantar
Eu vou do M para o A,para o R, para o C, para o E, para o
  L, para o O, espaço, D, 2:sempre representando o hip-        Foi um tempo de aflição, era quatro condução
  hop. Não tem Faustão nem Gugu eu sou o primeiro do           Duas pra ir, duas pra voltar
Ibope. Revolução eu vou fazer de maneira diferente: tiro o     Hoje, depois dele pronto
    ódio do coração e tento usar mais a mente. Botam           Olho pra cima e fico tonto
  barreiras no caminho mas sou persistente. Posso cair,
  mas me levanto e sigo em frente. Seguro a bronca, dou
                                                               Mas me vem um cidadão
um 2 e mantenho a calma. Se eu vacilar, um filho da puta       Que me diz desconfiado:
                    rouba a minha alma.                        Cê tá ai admirado, ou tá querendo roubar?
  Entra Fernando e sai Fernando e quem paga é o povo,          Meu domingo está perdido
 que pela falta de cultura vota nele de novo. E paga caro,     Vou pra casa entristecido
 com corpo e calma, e entrega nas mão de um pastor, pra
ver se salva. Com a barriga vazia não conseguem pensar.        Dá vontade de beber
 Eu peço proteção a Deus e a Oxalá. De infantaria que eu       E pra aumentar meu tédio
 sou e to na linha de frente. Rio de Janeiro, fim de século,   Eu nem posso olhar pro prédio
                     a chapa tá quente!                        Que eu ajudei a fazer
Vários irmãos se recolhem, vão em frente. Vários também
                                                               Tá vendo aquele colégio, moço?
escravizam sua mente. Eu sei bem, quebro a corrente, e         Eu também trabalhei lá
          onde passo planto a minha semente.                   Lá eu quase me arrebento
  Gafanhotos nunca tomam de quem tem, predadores               Fiz a massa, pus cimento
 senhores que mentem. Esperem sentados a rendição,             Ajudei a rebocar
          nossa vitória não será por acidente.
                                                               Minha filha inocente
   Voltar rimando na batida cumpadi, é só prá quem pode.       Veio pra mim toda contente:
Corpo fechado, rima acesa, cumpadi, ninguém me fode. O         Pai, vou me matricular
bumbo bate forte, só escapa quem tem sorte. Misturo hip-       Mas me diz um cidadão:
        hop e samba com sangue da zona norte. Tão
     impressionante quanto o b-boy rodando, não deixo
                                                               Criança de pé no chão aqui não pode estudar
  queimarem o meu filme, eu tou sempre me valorizando.         Essa dor doeu mais forte
Revolução? Quem sabe faz na hora e fica antenado. Nem          Nem sei porque deixei o norte
tudo o que reluz é ouro, nem televisionado. Eu tou de aqui     Então me pus a dizer
de passagem, mas não vim a passeio. De ciclos em ciclos        Lá a seca castigava
   percorro o meu caminho sem receios. O meu discurso
 tem recheio. Acerto em cheio e creio que o nosso destino      mas o pouco que eu plantava
 final é estar em paz no seio do universo. Campo de visão      tinha direito a colher
     aberto. Minha serenidade eu conservo com versos.          Tá vendo aquela igreja, moço?
Converso com meus netos, como preto velho que sou, sei         Onde o padre diz amém
   daonde vim e sei pra onde vou. Na moral! Com papel e
  caneta te forneço o material prá feitura do seu alvará de
                                                               Pus o sino e o badalo
  soltura espiritual. Não cesse suas preces. Pensamentos       Enchi minha mão de calo
     negativos são como fezes: infestam todo o lugar, à        Lá eu trabalhei também
  procura de alguém que os considere, que os preze. Por        Mas ali valeu a pena
 isso delete informações desse naipe do seu leque. E siga      Tem quermesse, tem novena
             para o alto, ao som hipnótico do stab!
 Eu levo a vida e não sou levado por ela. Na luta, um bom      E o padre me deixa entrar
   guerreiro nunca amarela. Pra "mim" poder crescer, me        Foi lá que Cristo me disse:
    deixe enlouquecer, só você sabe o que é melhor para        Rapaz, deixe de tolice
 você. Eu ergo o peito e vou em frente na parada, não sou      não se deixe amedrontar
      controlado e durmo com alma lavada. Sigo o meu
   caminho e tranco ele sozinho. Eu mato a cobra e ainda
                                                               fui eu quem criou a terra
    dou bico no ninho. Vários irmão se recolhem, vão em        enchi os rios e fiz as serras
frente. Vários também escravizam sua mente. Eu sei bem,        não deixei nada faltar
quebro a corrente, e onde passo planto a minha semente.        hoje o homem criou asas
                                                               E na maioria das casas
  Gafanhotos nunca tomam de quem tem predadores,
 senhores que mentem. Esperem sentados a rendição.             Eu também não posso entrar
        Nossa vitória não será por acidente.
Represento o que sou, com quem ando, onde vou. Traço
           bem meu caminho, Hip Hop Rio.



                                                                                                          26
Presente De Um Beija Flor                                    Árvore
                  Natiruts                                         Edson Gomes

Beija-flor que trouxe meu amor                    Vem me regar mãe
Voou e foi embora                                 Vem me regar
Olha só como é lindo meu amor                     Vem me regar mãe, êa
Estou feliz agora                                 Vem em regar
Veja só a névoa branca que sai de trás do         Todo santo dia
bambuzal                                          Pois todo dia é santo
Será que ela me faz bem ou será que me faz        E eu sou
mal                                               Uma árvore bonita
Eu vou surfar no céu azul de nuvens doidas        Que precisa ter seus cuidados
Da capital do meu país                            Me regar mãe
Pra ver se esqueço da pobreza e violência         Vem me regar
Que deixa o meu povo infeliz                      Vem me regar mãe, êa
Beija-flor que trouxe meu amor                    Vem em regar
Voou e foi embora                                 E ando sobre a terra
Olha só como é lindo meu amor                     E vivo sob o sol
Estou feliz agora                                 E as, e as minhas raízes
E a menina que um dia por acaso veio me dizer     Eu balanço
Que não gostava de meninos tão largados           Eu balanço
Que tocam reggae e MPB                            Eu balanço
Mas isso é coisa tão banal perto da beleza do     Me regar mãe
Planalto Central                                  Vem me regar
E das pessoas que fazem do Cerrado                Vem me regar mãe, êa
O habitat quase ideal                             Vem em regar
Beija-flor que trouxe meu amor
Voou e foi embora
Olha só como é lindo meu amor
                                                                Forró com Reggae
Estou feliz agora
                                                                    Estakazero
Agradeço por está aqui
Manisfestar a emoção
                                                  Não sei de nada sou um eterno aprendiz
E coloca minhas idéias, sentimentos               O som que agrada amigo é você quem diz
Em forma de canção                                E eu assumo agora tudo que fiz fiz só
Agradeço por poder cantar                         E esse som é diferente eu sei eu não fiz nada amigo
E ver você ouvir                                  só inovei
E tentar entender essa mensagem                   Estakazero amigo esse é meu forte
Que eu quero transmitir                           Meu Bob Marley se chamava Luiz não era rei do
Beija-flor que trouxe meu amor                    reggae e sim do baião
Voou e foi embora                                 Minha Jamaica é o nordeste o sertão
Olha só como é lindo meu amor                     É o som da terra
                                                  Regue o pé da serra que nasce o forró
Estou feliz agora
                                                  Forró pesado xote colado e a menina na ponta do
Fim de ano vou embora de Brasília que é pra       pé
eu ver o mar                                      È cantica reggae forró com reggae é o que faz a
Mas diz pra mãe lá pro final de fevereiro é que   poeira subir
eu vou voltar                                     Forró pesado xote colado e a menina na ponta do
Que é pra surfar no céu azul de nuvens doidas     pé
Da capital do meu país                            È cantica reggae forró com reggae venha se
Pra ver se esqueço da pobreza e violência         entregue e vamos fugir.
Que deixa o meu povo infeliz
Beija-flor que trouxe meu amor
Voou e foi embora
Olha só como é lindo meu amor
Estou feliz agora


                                                                                                  27
É fogo
                   Lenine
                                                                Não é Sério
                                                                 Negra Li
Éramos uma pá de apocalípticos,
De meros hippies, com um falso alarme...
                                              Eu vejo na TV o que eles falam sobre o jovem não é
Economistas, médicos, políticos               sério
Apenas nos tratavam com escárnio.             O jovem no Brasil nunca é levado a sério
Nossas visões se revelaram válidas,           Sempre quis falar
E eles se calaram mas é tarde.                Nunca tive chance
As noites tão ficando meio cálidas...         Tudo que eu queria
E um mato grosso em chamas longe arde         Estava fora do meu alcance
O verde em cinzas se converte logo, logo...   Sim, já
É fogo! é fogo!                               Já faz um tempo
Éramos uns poetas loucos, místicos            Mas eu gosto de lembrar
                                              Cada um, cada um
Éramos tudo o que não era são;
                                              Cada lugar, um lugar
Agora são com dados estatísticos              Eu sei como é difícil
Os cientistas que nos dão razão.              Eu sei como é difícil acreditar
De que valeu, em suma, a suma lógica          Mas essa porra um dia vai mudar
Do máximo consumo de hoje em dia,             Se não mudar, prá onde vou...
Duma bárbara marcha tecnológica               Não cansado de tentar de novo
E da fé cega na tecnologia?                   Passa a bola, eu jogo o jogo
Há só um sentimento que é de dó e de
Malogro...                                    Eu vejo na TV o que eles falam sobre o jovem não é
É fogo... é fogo...                           sério
                                              O jovem no Brasil nunca é levado a sério
Doce morada bela, rica e única,
                                              A polícia diz que já causei muito distúrbio
Dilapidada só como se fôsseis                 O repórter quer saber porque eu me drogo
A mina da fortuna econômica,                  O que é que eu uso
A fonte eterna de energias fósseis,           Eu também senti a dor
O que será, com mais alguns graus celsius,    E disso tudo eu fiz a rima
De um rio, uma baía ou um recife,             Agora tô por conta
Ou um ilhéu ao léu clamando aos céus, se os   Pode crer que eu tô no clima
Mares subirem muito, em tenerife?             Eu tô no clima.... segue a rima
E dos sem-água, o que será de cada súplica,   Revolução na sua vida você pode você faz
De cada rogo                                  Quem sabe mesmo é quem sabe mais
                                              Revolução na sua mente você pode você faz
É fogo... é fogo...
                                              Quem sabe mesmo é quem sabe mais
Em tanta parte, do ártico à antártida         Revolução na sua vida você pode você faz
Deixamos nossa marca no planeta:              Quem sabe mesmo é quem sabe mais
Aliviemos já a pior parte da                  Também sou rimador, também sou da banca
Tragédia anunciada com trombeta.              Aperta muito forte que fica tudo a pampa
O estrago vai ser pago pela gente toda;       Eu to no clima! Eu to no clima ! Eu to no clima
É foda! é fogo!...                            Segue a Rima!
É a vida em jogo!                             (repete tudo)
                                              Sempre quis falar....
                                              "O que eu consigo ver é só um terço do problema
                                              É o Sistema que tem que mudar
                                              Não se pode parar de lutar
                                              Se não não muda
                                              A Juventude tem que estar a fim
                                              Tem que se unir
                                              O abuso do trabalho infantil, a ignorância
                                              Só faz diminuir a esperança
                                              Na TV o que eles falam sobre o jovem não é sério
                                              entao Deixa ele viver. É o que Liga"




                                                                                             28
Não quero flores jogadas
            Em meu peito
      Quero a força das águas
        Que fogem do leito.
       Quero a magia da vida
        Que corre nas mãos.
      Quero o sangue jorrado 
            Dos mártires
      Assassinados por quem
       Não aprendeu a lição.
       A lição da vida é amar,
  Sonhar com o mundo de utopia
   Onde o povo fique nos tópicos,
 Não jogados nos becos, nos guetos.
 Sonho a vida brotando das frestas
Como orquídeas, bromélias do campo.
 Quero a vida brotando das frestas
 Das lacunas que o sistema deixou,
      Perfumando cada palmo
        Deste sonhado chão
    Que um dia há ser habitado
     Por um mundo de irmãos



         Amauri Adolfo
    agricultor agroecológico
              poeta
     Do Livro Redemoinho




                                      29
ANEXOS




         30
A questão de gênero no desenvolvimento agroecológico
                                                                                Maria Emília Lisboa Pacheco4

        As mulheres adquiriram historicamente um vasto saber dos sistemas agroecológicos.
Desempenham importante papel como administradoras dos fluxos de biomassa, conservação da
biodiversidade e domesticação das plantas, demonstrando em muitas regiões do mundo um significativo
conhecimento sobre as espécies de recursos genéticos e fitogenéticos, e assegurando por meio de sua
atividade produtiva as bases para a segurança alimentar.

        Nas últimas décadas, esse reconhecimento passou a manifestar-se em fóruns e acordos
internacionais. A Convenção da Diversidade Biológica, por exemplo, menciona o “papel fundamental da
mulher na conservação e na utilização sustentável da diversidade biológica, afirmando a necessidade de
sua plena participação em todos os níveis de formulação e execução de políticas para a conservação da
diversidade biológica”.5

        Esse papel é tão mais importante quando consideramos que a conservação e o uso da
biodiversidade constituem-se como ponto-chave para a defesa da agricultura e do agroextrativismo familiar,
bem como, simultaneamente, que a biodiversidade é protegida pela diversidade cultural.

       As influências sobre o pensamento agroecológico estão ancoradas nas ciências agrícolas, no
movimento ambientalista, na ecologia, na antropologia, nos estudos sobre desenvolvimento. Só nos últimos
anos, porém, a perspectiva de gênero vem sendo associada ao debate agroecológico.

        O conceito de relações sociais de gênero, uma conquista das lutas feministas, trouxe várias
contribuições para a explicação teórica da opressão das mulheres:

•    as identidades e os papéis masculinos e femininos caracterizam-se como construção histórica e social,
     sujeita, portanto, à mudança. Essa construção tem uma base material e não apenas ideológica, que se
     expressa na divisão sexual do trabalho;
•    as relações de gênero são hierárquicas e de poder dos homens sobre as mulheres; por meio dessas
     relações começamos a apreender o mundo;.
•    as relações de gênero estruturam o conjunto das relações socais; os universos do trabalho, da cultura
     e da política se organizam a partir dos papéis masculinos e femininos;
•    gênero contribui para superar as dicotomias entre produção e reprodução, entre privado e público e
     mostra como mulheres e homens estão ao mesmo tempo em todas essas esferas.6

        Aplicadas ao campo, as análises de gênero têm mostrado a subordinação e a subvalorização do
trabalho das mulheres. Têm revelado também que as relações entre homens e mulheres no âmbito familiar
e a forma como a família é constituída e reproduzida são tão importantes quanto as relações de classe,
quando se trata de explicar as diferenças sociais do campesinato, assim como sua reprodução social.

         Incorporar a perspectiva de gênero, articulada com uma concepção agroecológica apoiada na
agricultura e no agroextrativismo familiares, requer um triplo desafio: revisão de nossas categorias de
análise, revisão de nossas práticas político-educativas e aprofundamento das críticas às propostas de
políticas públicas para a proposição de alternativas.

        Há elos a estabelecer entre os debates sobre sustentabilidade e as relações sociais de gênero.
Ambas as noções colocam-se contra uma visão produtivista e economicista. Por um lado, a noção de
sustentabilidade remete ao campo das lutas sociais, de novas relações entre sociedade e natureza, numa
perspectiva democrática, para a contestação da exploração de classe e da injustiça social e ambiental. Por
outro lado, a crítica ao paradigma dominante da economia, feita pelo pensamento feminista, quer insistir na
perspectiva segundo a qual um exame do desenvolvimento sustentável deve levar em conta as dimensões
sociais e de gênero, e integrar nesse conceito uma distribuição justa dos recursos materiais, conhecimentos
e poder, um sistema de valoração econômica adequado e a sustentabilidade do meio ambiente.
        Problematizar diagnósticos e propor mudanças, eis aí uma grande tarefa. A Agenda 21, em seu

4   Antropóloga, Diretora da Fase – Solidariedade e Educação.
5 Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo. Convenção da Biodiversidade. São Paulo: Sema, 1997, p.14.
6 Faria, Nalu e Nobre, Miriam. Gênero e desigualdade. Cadernos Sempreviva. São Paulo: SOF, 1997, p.31-32.

                                                                                                            31
Capítulo 24, preconiza a necessidade de desenvolvimento de bancos de dados, sistemas de informação,
pesquisas participantes orientadas para ação e análises de políticas sensíveis de gênero, indicando, entre
outros, os seguintes aspectos: (i) conhecimento e experiência por parte da mulher no manejo e na
conservação dos recursos naturais; (ii) impacto da degradação ambiental sobre a mulher, em particular
secas, desertificação e produtos químicos tóxicos; (iii) integração do valor do trabalho não remunerado,
incluído o que se chama atualmente doméstico, nos mecanismos de contabilização dos recursos, a fim de
representar melhor o verdadeiro valor da contribuição da mulher à economia.7

       Efetuar uma releitura de metodologias existentes, como o Diagnóstico Rural Rápido Participativo,
com abordagem de gênero e realizar estudos etnográficos são algumas possibilidades. Há grande carência
de estudos básicos a respeito do conhecimento, das experiências e da posição das mulheres no manejo
dos agroecossistemas, com perspectiva agroecológica, nos vários biomas no Brasil.

         A problematização dos diagnósticos, todavia supõe também a revisão de categorias de análise
adotadas nas estatísticas censitárias. A condição de “membro não remunerado da família” expressa uma
desigualdade de gênero e mascara o significado da inserção produtiva das mulheres. Embora elas
participem de numerosas atividades agrícolas e extrativas em dupla ou tripla jornada, a invisibilidade de seu
trabalho permanece. Quando mulheres e crianças realizam o mesmo trabalho que o homem, é comum
dizer-se que estão “ajudando”. Desde 1991 os movimentos de mulheres lançaram campanha por seu
reconhecimento como trabalhadoras rurais.

        O paradigma dominante na economia reforça duplamente essas desigualdades. Ignora o trabalho
reprodutivo não pago, tornando invisível a maior parte da produção feminina, e ignora a divisão sexual do
trabalho. Como contra-face da invisibilidade do trabalho da mulher estão as políticas cegas de gênero8 ou
estratégias cegas de gênero, isto é, que não se apóiam nas relações sociais de gênero e tendem a excluir
as mulheres. Elas ainda representam apenas 12,6% dos beneficiários diretos da Reforma Agrária. Só no
ano 2000, como resultado da luta dos movimentos das mulheres, o Incra anunciou a modificação de suas
normas, facilitando o acesso das mulheres a terra e à titulação.

        A mudança, no entanto, terá vigência em um contexto totalmente adverso, pois estão em marcha
um processo de contra-reforma agrária, a chamada Reforma Agrária de Mercado, por meio de programas
financiados pelo Banco Mundial, e, com ele, discriminação mais ampla das mulheres, como já mostram
alguns estudos. Uma pequena parcela de mulheres, cerca de 6%, tem acesso ao crédito rural no Brasil.
Recentemente também a luta por crédito por parte dos grupos e movimentos de mulheres resultou na
criação, em 2002, de uma linha de crédito destinada às mulheres (Portaria n° 121 do Incra, de 22/05/2001).
Serão necessárias análises futuras para verificar a implementação dessas definições e seu sentido para as
mulheres.

        Ainda prevalece, contudo, a inadequação da política de crédito para a valorização e o fortalecimento
dos sistemas agrícolas tradicionais de forma integrada. A lógica dos créditos não se baseia no sistema de
produção com seus vários componentes, o que tanto põe em risco a conservação da biodiversidade e da
sociodiversidade como reforça as desigualdades de gênero. Em várias regiões do país, constata-se também
que as mulheres em geral ou são excluídas, ou têm participação minoritária e eventual nos cursos voltados
para a capacitação e o aprofundamento de conhecimentos técnicos da produção agrícola ou
agrossilvopastoril. O acesso limitado das mulheres a esse recurso constitui restrição para a igualdade de
oportunidades entre os gêneros.

       Uma perspectiva de trabalho baseada na sustentabilidade e igualdade de gênero terão que garantir
o empoderamento das mulheres, reconhecendo seu papel como produtoras de bens e gestoras do meio
ambiente. Simultaneamente, terá que lhes assegurar apoio organizativo, controle sobre recursos produtivos
— como terra e crédito — e capacitação técnica.




7   Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara dos Deputados. Agenda 21. Brasília:
    Centro de Documentação e Informação, 1995, p. 366.
8   Imagem que tomei emprestada da autora Naila Keeber.


                                                                                                               32
Assentamentos e outras formas de
                          apropriação da terra e agroecologia
                                                                               Carlos Eduardo Mazzetto Silva9

        A abordagem agroecológica propõe mudanças profundas nos sistemas e nas formas de produção.
Na base dessa mudança está a filosofia de se produzir de acordo com as leis e as dinâmicas que regem os
ecossistemas – uma produção com e não contra a natureza. Propõe, portanto, novas formas de apropriação
dos recursos naturais, que se devem materializar em estratégias e tecnologias condizentes com a filosofia-
base. Entretanto, três fatores fundamentais devem ser contemplados nessa problemática:
        • a eqüidade enquanto indicador fundamental da sustentabilidade dos agroecossistemas;
        • a diversidade e a compatibilidade cultural como base de construção de agroecossistemas
            biodiversificados e includentes e de uma pedagogia de troca de saberes;
        • a relação entre território disponível e capacidade de suporte dos ecossistemas e a organização
            espacial/territorial necessária ao desenvolvimento de sistemas agroecológicos de produção.

        Esses três fatores nos levam a:
        • reafirmar o repúdio ao latifúndio (produtivo ou improdutivo) e a necessidade de reforma agrária
            no Brasil, para que o critério da eqüidade possa concretizar-se, numa dimensão maior de busca
            de justiça e paz social; essa posição implica defender e apoiar a campanha pelo limite do
            tamanho da propriedade da terra (35 módulos) deflagrada pelo Fórum Nacional pela Reforma
            Agrária e o mecanismo da desapropriação como instrumento insubstituível de justiça agrária;
        • pensar essa reforma agrária no contexto de um processo mais amplo de reorganização
            territorial do Brasil que propicie a articulação entre políticas fundiárias/agrárias e de gestão
            ambiental;
        • formular e implementar modelos de assentamentos rurais baseados no conhecimento e análise
            da capacidade de suporte dos ecossistemas (potencialidades e limitações) e no respeito às
            formas tradicionais de apropriação dos recursos.

          As Reservas Extrativistas – Resex,10 são, talvez, o exemplo mais didático para se perceber como é
possível a articulação desses fatores. Elas procuram democratizar, regularizar e definir um determinado
território no qual a produção agroextrativista possa ocorrer de forma sustentável de acordo com as formas
tradicionais de exploração dos recursos, autogerida pela comunidade, mas submetida a um plano de uso
que normatize as formas de utilização desse território. Vale lembrar que as Resex hoje não se restringem à
Floresta Amazônica (produtos da floresta, pesca e agricultura de subsistência), mas se estendem às matas
de cocais (babaçu, pesca e agricultura de subsistência), a ecossistemas marítimos (pescadores e coletores
de caranguejo e frutos do mar) e vêm sendo pensadas para ecossistemas fluviais (populações ribeirinhas e
barranqueiras) que articulam pesca, agricultura de vazante e criação de gado. Os assentamentos
agroextrativistas do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra procuram também imitar
algumas virtudes das Resex, com algumas diferenças: nesse caso, os assentados serão titulados como
proprietários, enquanto nas Resex a terra será sempre do Estado, que fornece apenas concessão de uso às
populações.

          Outras formas tradicionais de uso também procuram seguir princípios equivalentes, como os
faxinais no Paraná (ecossistema das matas de araucária), a dos geraizeiros nos cerrados (agricultura
familiar nas encostas e fundos de vale; extrativismo e solta do gado em comum nas chapadas) e mesmo a
dos nordestino-sertanejos na caatinga (roçado familiar e solta de caprinos em comum na caatinga). Todas
essas formas de uso originaram-se de modelos que combinavam (ou ainda combinam) democraticamente
áreas de exploração familiar e de uso comum. Em geral, essas formas conseguiram, ao longo de muitas
décadas e, às vezes, séculos, garantir segurança alimentar, preservação da biodiversidade e
sustentabilidade dos agroecossistemas. Consolidaram-se mediante o aprendizado permanente de
convivência com os ambientes e de ajuste a seus limites e potencialidades. São, portanto, modelos
territorial-produtivos que aplicaram e aplicam na prática os princípios agroecológicos, antes de essa ciência
se organizar e consolidar do ponto de vista teórico e científico. Esses modelos vêm, certamente, sofrendo
forte pressão oriunda do processo de modernização agrícola dos últimos 40 anos, ao longo dos quais
9  Engenheiro agrônomo, doutorando em Ordenamento Territorial e Ambiental (Geografia/UFF), consultor em
   Agroecologia/Reforma Agrária/Agricultura Familiar.
10 Categoria de unidade de conservação de uso sustentável prevista no Sistema Nacional de Unidades de
   Conservação – Snuc (Lei nº 9.985/2000).


                                                                                                          33
grande parte das áreas de uso comum foram griladas e roubadas dessas populações no contexto de
projetos e programas governamentais de desenvolvimento que favoreceram a expansão de grandes
empresas rurais – a contra-reforma agrária. É evidente também o fato de que, em muitos locais, a pressão
sobre a terra aumentou sobremaneira, fruto do próprio crescimento populacional e da excessiva divisão das
propriedades. Apesar disso, esses modelos tradicionais não deverão ser portadores de formas de
organização territorial-fundiária-produtiva capazes de potencializar as propostas contidas na abordagem
agroecológica? A combinação de sua lógica espacial, produtiva e ecológica com o conhecimento
agroecológico atual não poderá servir de base para a formulação de modelos sustentáveis de
assentamentos rurais? Do ponto de vista da organização espacial, esses modelos não nos levariam a
questionar a restrição do universo da agricultura familiar brasileira à pequena propriedade privada
“geométrica”?11 Nessa perspectiva, além da agroecologia estrito senso, não serão necessárias outras
abordagens, como a etnoecologia, a geografia ambiental e o manejo dos ecossistemas naturais (terrestres,
marítimos e fluviais)?

        Se as respostas forem positivas, mudanças profundas deverão ocorrer nas políticas agrárias e
ambientais, no sentido de sua integração, e nos critérios técnicos em que se baseia hoje a atuação de
órgãos como o Incra, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais – Ibama e a Agência
Nacional de Águas – ANA, para não especificar também os órgãos dos níveis estadual e municipal. Nessa
perspectiva, a articulação das políticas agrária, de recursos hídricos (gestão participativa das bacias
hidrográficas) e das unidades de conservação não deveria ser priorizada? Afinal, são todas políticas de
regulação de uso do território, e o território é um só.

        Há exemplos concretos que ilustram o desencontro das legislações ambiental e agrária, ou da
primeira com políticas de apoio à agricultura familiar sustentável, como:
         • impedimentos legais para o uso sustentável das áreas de preservação permanente, que são,
            em muitos locais, as áreas preferenciais da agricultura familiar;
         • não existência de proteção às chapadas dos cerrados – áreas de recarga desse bioma –,
            utilizadas historicamente pelos camponeses como área de extrativismo e solta de gado, e hoje
            ocupadas com monoculturas;
         • não regulamentação do pré-requisito do uso racional dos recursos naturais para o cumprimento
            da função social da propriedade, restringindo o universo da reforma agrária ao latifúndio
            improdutivo (terras mais pobres e mais cobertas por vegetação), deixando o latifúndio produtivo
            (o mais predatório) incólume.

         Deve ser ressaltado aqui o fato de que, no caso dos novos assentamentos rurais, muitas vezes não
há nem o componente da tradição estabelecido, nem identidade com a terra construída. Todo o desenho do
assentamento e a construção de seu modelo devem, portanto, fazer parte, desde o início, de um processo
participativo e interativo, em que a ampliação do conhecimento agroecológico ande lado a lado com o
processo socioorganizativo da comunidade, propiciando a construção simultânea das identidades
socioculturais e territoriais.
         A sustentabilidade se constrói mediante o enraizamento e a territorialidade das populações

         Importante salientar que, apesar dessas argumentações, devemos defender a pluralidade nos
modelos de assentamentos rurais, pois, além dos ecossistemas e da cultura, há fatores como localização
geográfica, perfil dos assentados, preço da terra, oportunidades econômicas e mercado consumidor que
podem induzir modelos de assentamento mais voltados, por exemplo, para a horticultura orgânica intensiva
(áreas de cinturão verde), artesanato, ecoturismo ou para sua combinação. Os modelos sustentáveis de
assentamentos podem ter vários formatos e funções, cumprindo papéis complementares no processo de
inclusão social, segurança alimentar,       desconcentração populacional e territorial, diversificação e
estabilidade econômica e equilíbrio ambiental. Para construir o desenho desse assentamentos, é necessária
a introdução dos instrumentos técnicos da estratificação ambiental das áreas e de seu zoneamento
agroecológico para fins de assentamento. O zoneamento agroecológico é uma projeção básica de
ocupação do espaço e organização territorial baseada na estratificação ambiental (identificação e
mapeamento dos ambientes fundamentais que compõem a área). Esse zoneamento deve definir num mapa
as áreas: a) de proteção ambiental – reserva legal, áreas de preservação permanente, corredores
ecológicos; b) próprias para o cultivo mais intensivo – agricultura, pastagens plantadas; c) para uso mais
extensivo e restrito – extrativismo, manejo visando a uso múltiplo, pastagem natural, etc. E pode destacar
também das áreas de uso comum àquelas mais próprias para uso familiar, apontando as possibilidades de
futura organização territorial do assentamento (anteprojeto de parcelamento).

11 No contexto da reforma agrária, essa visão materializa-se na implementação do chamado “quadrado burro”.


                                                                                                             34
Recursos hídricos no semi-árido:
                     um desafio para a sustentabilidade
                                                                                    Jean Marc von der Weid12

        Já se diz que a água vai ser o insumo estratégico neste século, tal como o petróleo o foi no
século XX, e o carvão no século XIX. Essa percepção deriva do fato de que esse recurso básico
para a sobrevivência humana começa a escassear e não apenas nas zonas áridas e semi-áridas.
Frente à tendência à escassez, a reação das sociedades capitalistas é a de colocar preço na
água, tornando seu uso condicionado à capacidade de pagamento de cada usuário. Os usos da
água são múltiplos, desde os individuais até os industriais e agrícolas. Na distribuição dos
diferentes tipos de consumo, entretanto, a agricultura é a maior consumidora de água e também a
maior fonte de poluição dos recursos hídricos. Além do problema da quantidade, a qualidade da
água consumida também é preocupante. A má qualidade da água consumida é a maior
responsável pelas doenças endêmicas mais comuns nos países em desenvolvimento, em
particular nas zonas rurais.

        Nas regiões semi-áridas o problema da água é, obviamente, mais relevante e antigo do
que nas outras. No entanto, a “falta de água” deve ser qualificada se quisermos entender o
problema. Falta água para que tipo de uso? Quando falta água? Por que falta água? Essas são
questões que precisam ser respondidas desde logo. Nas zonas rurais do semi-árido nordestino a
água é necessária para o consumo doméstico (beber, cozinhar, lavar louça e roupas, banho,
outros); para consumo dos animais criados nos quintais (diversos); para as hortas de vários tipos,
jardins e fruteiras; para a agricultura e as criações maiores e diversos outros usos.

        Nas cidades, onde a demanda é centralizada em espaços restritos, o Estado cria infra-
estruturas para concentrar a oferta, canalizando rios ou construindo grandes reservatórios em que
a água é tratada para garantir qualidade em seu consumo. O crescimento desordenado e
acelerado de muitas cidades de grande e médio porte provocou forte pressão sobre os recursos
hídricos e vem dando lugar a projetos mirabolantes, tais como a transposição do São Francisco ou
do Tocantins.

        As soluções de centralização da oferta de água nas zonas rurais com grandes obras de
infra-estrutura predominaram na história do Nordeste sem nunca ter resolvido o problema. Não se
trata apenas de quem se apropria das grandes obras, mas da inadequação da solução para
resolver o problema.

        As experiências das ONGs e organizações de agricultores vêm optando por uma estratégia
que se dirige à busca de soluções diferenciadas para os diferentes tipos de demanda de água nas
propriedades rurais. Algumas são soluções de manejo de recursos para economizar a água
disponível, e outras são infra-estruturas baratas para captação e conservação de água para
diferentes fins.

        Essas perguntas nos deixa a refletir: essa estratégia responde aos problemas dos
agricultores? Há soluções técnicas adequadas a todos os tipos de demandas de água dos
agricultores e suas famílias? O que é necessário para levar essas soluções a todos os
agricultores? O que as experiências dos participantes informam para responder a essas
perguntas?




12 Economista, mestre em Desenvolvimento Agrícola, fundador da ONG Assessoria e Serviços a Projetos em
   Agricultura Alternativa – AS-PTA, onde atua como Coordenador do Programa de Políticas Públicas.


                                                                                                         35
Crítica ao modelo atual de desenvolvimento agrícola e à
                  transição agroecológica no semi-árido
                                                                                       Eduardo Martins Barbosa13

        O semi-árido brasileiro é marcado pela singularidade de ser a única região semi-árida
tropical do planeta, pela diversidade ecológica decorrente de seus diversos ambientes naturais,
pela complexidade social originária do processo de colonização e pelo desafio do
desenvolvimento, devido à persistente situação de miséria e pobreza da maioria da população,
especialmente aquela que vive nos espaços rurais.

        É uma das maiores regiões semi-áridas do planeta em extensão geográfica e em
população. São 858.000 km2, mas o polígono das secas é estimado em 1.083.790 km2. Segundo
o Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA, em 2001, o semi-árido abrigava pouco mais de
21 milhões de pessoas em 1.031 municípios situados no Norte de Minas Gerais, nos sertões da
Bahia, Paraíba, de Sergipe, Alagoas, Pernambuco, do Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí. Outras
fontes incluem o Norte do Espírito Santo e uma parte do Sudeste do Maranhão na região semi-
árida. As áreas dos Tabuleiros Costeiros do Ceará, Rio Grande do Norte e parte da Paraíba,
embora não sejam consideradas pertencentes aos domínios do semi-árido, sofrem os efeitos do
regime de chuvas da região e se enquadram no polígono das secas.

       Os clássicos estudos de Guimarães Duque registram essa diversidade, com a identificação
e caracterização das seguintes regiões naturais: Seridó, Sertão, Caatinga, Cariris Velhos,
Curimataú, Carrasco, Agreste e Serras. A Embrapa, em seu Zoneamento Agroecológico do
Nordeste, publicado em 1993, caracteriza o total de 172 unidades geoambientais em 20 unidades
de paisagem, bem como oito tipos e 16 subtipos de sistemas de produção. Desse conjunto, uma
boa parte está presente na região semi-árida. Portanto, longe de se caracterizar como um espaço
homogêneo, o semi-árido pode ser apresentado como um “grande mosaico”.

        Em termos climáticos, destacam-se as temperaturas médias elevadas e precipitações
médias anuais inferiores a 800mm, extremamente concentradas, gerando os períodos de chuvas
e estiagens. Cerca de 50% dos terrenos são de origem cristalina, e os outros 50% são terrenos
sedimentares, sendo os primeiros de baixa capacidade, e os segundos de alta capacidade de
acumulação de águas subterrâneas. A vegetação predominante é a caatinga, mas são observadas
outras formações florestais nos microclimas existentes na região.

        A ocupação do semi-árido nordestino pelos colonizadores vinculou-se historicamente à
atividade pecuária, base econômica da região por alguns séculos. O sistema de grandes
fazendas, originárias das sesmarias, é a forma típica de ocupação do território. Formada pelo
“coronel” e seus familiares mais próximos, e contando com as famílias trabalhadoras vivendo
agregadas ao núcleo familiar proprietário das terras, a fazenda era uma unidade econômica e
social marcada por complexas relações de dominação e compadrio. A criação de gado e a
indústria da charqueada constituíram o apogeu desse sistema. Além disso, a criação tanto de
gado como de caprinos e ovinos estava voltada para a alimentação da população local e para o
aproveitamento do couro nas necessidades da fazenda. As famílias trabalhadoras desenvolviam
uma pequena agricultura diversificada composta de cultivos alimentares e de uso doméstico e a
criação de porcos e aves, também voltada para o consumo da população local. Essas atividades
eram praticadas no interior das fazendas de gado ou nas posses situadas nas terras devolutas. A
hegemonia da pecuária sobre a agricultura se expressa na lei “cerca quem planta”, geradora do
sistema de roçados cercados para o cultivo agrícola e da criação solta, ferrada a fogo, com a
marca identificadora do proprietário.



13 Engenheiro agrônomo e consultor da Serviços Técnicos Associados S.A. Ltda – Seta.


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Centrada inicialmente na pecuária, a expansão da agricultura no semi-árido deveu-se ao
cultivo em larga escala do algodão-mocó, que se integrou à criação formando o binômio
gado/algodão. Os sistemas de produção incluíam ainda culturas alimentares e outras culturas de
expressão regional como a mamona, o sisal e o extrativismo da carnaúba, da oiticica e do caju. A
florescente agroindústria algodoeira e dos demais produtos cultivados ou extrativistas, mesmo
passando por momentos críticos, foi à base econômica do semi-árido desde a década de 1930,
até meados da década de 1980, quando o sistema praticamente entrou em colapso, devido a um
conjunto de problemas sociais, ambientais, tecnológicos e comerciais, que não foram
solucionados pelo setor produtivo e pelas instituições públicas atuantes no semi-árido.

        A dinâmica de modernização tecnológica da agricultura nacional empreendida pelos
governos militares foi bastante desigual nas grandes regiões brasileiras. No semi-árido expressou-
se de maneira localizada, por meio dos projetos de irrigação do Departamento Nacional de Obras
Contra as Secas – DNOCS, na forma de enclaves, não se verificando disseminação generalizada
do pacote tecnológico químico-mecânico nem a constituição dos complexos agroindustriais, na
proporção verificada em outras regiões. Isso, entretanto, não significa a inexistência de profundas
transformações no espaço rural do semi-árido. Essas se deram muito mais pelas transformações
nas relações sociais de produção da região, em especial na relação de parceria entre os grandes
proprietários fundiários e as famílias de agricultores, que moravam e trabalhavam nas grandes
fazendas. A quebra dessa relação de parceria e, principalmente, da condição de moradia foi uma
medida preventiva do segmento patronal, contra a reivindicação de direitos trabalhistas e a luta
pela reforma agrária, fundamentadas no “bem de raiz”, proporcionado pelo cultivo do algodão-
mocó pelos parceiros-moradores. Essas medidas geraram uma situação de conflito social
generalizado.

        O Estado militarizado, aliado às oligarquias rurais locais, procurou controlar essa situação
e modernizar a economia do semi-árido, combinando diversas medidas, destacando-se a
repressão à crescente organização dos trabalhadores rurais, a política assistencialista, por
intermédio do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural – Funrural, e o generoso financiamento
da “pecuarização” e/ou “reflorestamento”, mediante incentivos fiscais, crédito subsidiado e
trabalho das frentes produtivas nos períodos de seca. Um dos resultados dessa política foi o
“desenraizamento” das famílias rurais, gerando intenso fluxo migratório para outras regiões do
país. Além dessas dinâmicas demográficas e territoriais e do enriquecimento ilícito de muitos,
esse processo resultou na montagem de significativa infra-estrutura produtiva nas grandes
propriedades do sertão, representada pelos açudes, estábulos, silos e cercamento das terras. Por
outro lado, a formação de pastagem nativa e exótica provocou o desmatamento e o uso de
herbicida em proporções mais elevadas. Também do ponto de vista econômico essa opção
configurou-se em fracasso, comprometendo ainda mais as dinâmicas econômicas locais já
ressentidas da progressiva desestruturação da agroindústria algodoeira e dos produtos regionais
e extrativistas.

       Outro resultado observado foi à desarticulação entre as dinâmicas dos demais espaços
agrários subsidiários e a hegemônica dinâmica pecuária/algodoeira do sertão. Nas serras e
agrestes, constituíram-se pólos hortifrutigranjeiros orientados para o abastecimento das grandes
cidades e pólos alcooleiros. Na região subcosteira foram formados pólos de produção de caju,
coco e cana para a produção de álcool, além daqueles dedicados à avicultura e à pecuária leiteira,
possibilitando o direcionamento da economia dessas regiões para as grandes cidades e para o
mercado externo.

       No bojo do processo de redemocratização da década de 1980 e da fase neoliberal da
década de 1990, aprofundam-se no semi-árido a diferenciação e a desarticulação interna entre os
enclaves de agricultura irrigada e os amplos territórios de predomínio da agricultura de sequeiro.
Ampliando-se o foco sobre o cenário, podem-se observar a progressiva decadência produtiva e
econômica dos perímetros irrigados, resultado do esgotamento do padrão tecnológico,
organizativo e gerencial adotado pelo DNOCS, e o dinamismo econômico dos novos pólos de

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desenvolvimento da agricultura irrigada, centrados na fruticultura de exportação, mediados por
poderosos grupos empresariais, com integração dos agricultores de menor porte e com forte apoio
estatal. Esses pólos, entretanto, reproduzem os processos de degradação ambiental, de
exploração da força de trabalho integrada e de exclusão socioeconômica de parcelas significativas
da população local, observados nas áreas mais antigas.

        Por outro lado, nos territórios de predomínio da agricultura de sequeiro, três dinâmicas
podem ser identificadas: a dos sertões, a dos agrestes e serras e a da região subcosteira. Nesta
última observa-se a crescente queda de produtividade da cajucultura e dos coqueirais, com
incidência crescente de pragas e doenças. Nos agrestes e serras, a degradação dos solos e a
contaminação por agrotóxicos são os problemas mais relevantes. É no sertão, entretanto, que
residem os maiores desafios, pois a desestruturação socioprodutiva descrita ainda não foi
superada, em decorrência dos fracos resultados em termos da revitalização da cultura do algodão
e dos produtos regionais e extrativistas, bem como do insuficiente desenvolvimento e difusão de
alternativas de renda. Essa difícil situação geral, entretanto, é pontuada por numerosas situações
localizadas que se diferenciam pela emergência de processos de reestruturação produtiva, por
meio da incorporação da agricultura irrigada de pequena escala aos sistemas existentes, bem
como pela própria modernização de atividades tradicionais, em especial da ovinocaprinocultura e
da bovinocultura leiteira.

       Esse complexo quadro de ocupação do território do semi-árido também gerou grande
diferenciação nos empreendimentos agrícolas da região. Convivem nos mesmos espaços
empresas agrícolas modernizadas, empresas tradicionais pouco tecnificadas, latifúndios
improdutivos, agricultores familiares modernizados e tradicionais. Estes dois últimos comportam
formas variadas de acesso a terra, que definem diversas categorias sociais. No geral, a pressão
da agricultura familiar sobre a terra é cada vez maior e combina-se com o empobrecimento
generalizado, provocando fluxos migratórios, principalmente nos anos de ocorrência de seca.

        Desde a ocupação inicial até as dinâmicas mais recentes, vêm-se acumulando impactos
socioambientais negativos no semi-árido. Os mais amplos são, sem dúvida, a degradação da
vegetação e dos solos, observando-se crescente processo de desertificação em diversas regiões.
Segundo o Instituto Desert, esse processo vem comprometendo de forma “muito grave” uma área
de 98.595km2 e de forma “grave” 81.870km2, totalizando 181.000km2. Nas áreas de agricultura
irrigada, os problemas de contaminação por agrotóxicos e salinização das terras são os mais
relevantes. As grandes barragens geraram impactos muitos fortes sobre o ambiente e as
populações locais, que pouco se beneficiaram dos altos investimentos realizados pelo Estado. De
modo geral, prevaleceu a chamada “solução hidráulica” e não se desenvolveu a cultura de
convivência com o semi-árido. As linhas mestras do modelo de desenvolvimento concentrador e
excludente, historicamente estabelecidas, continuam vigorando, sendo determinantes na
configuração do quadro de miséria e pobreza vigente no semi-árido brasileiro.

                         A TRANSIÇÃO PARA A AGROECOLOGIA

        Nesse contexto geral, a agroecologia tem servido de base para a construção de uma
cultura de convivência no semi-árido, possibilitando o renascimento e o rejuvenescimento de
vertentes de conhecimento e de proposições tecnológicas, que tinham sido ceifadas pela
concepção químico-mecânico, estabelecidas em universidades, centros de pesquisa, instituições
de crédito e empresas de assistência técnica e extensão rural.
        As dinâmicas de promoção da agroecologia originam-se das iniciativas de estudantes e
profissionais da área agronômica e ambiental que recuperam os postulados de Guimarães Duque,
Vasconcelos Sobrinho e outros estudiosos e entusiastas do semi-árido e da região nordestina em
geral. A agroecologia permite revisitar e atualizar essa linha de pensamento, desenvolvendo-a na
perspectiva da construção de uma cultura de convivência com o semi-árido, fundamentada na
interação entre os conhecimentos e as técnicas geradas pela vivência da população local com seu
meio e aqueles originários dos processos de pesquisa científica da atualidade.

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A partir de meados da década de 1980 essas iniciativas das ONGs no campo da tecnologia
alternativa começam a articular-se com as organizações dos trabalhadores rurais e com as
estruturas de base das igrejas, gerando um movimento crescente, voltado para a construção de
um novo modelo de desenvolvimento agrícola para o semi-árido. Esse trabalho desenvolve-se por
meio da estruturação de centros e de redes de tecnologia alternativa, construindo-se pontos de
contato com as universidades e outras instituições de pesquisa e extensão rural. A estratégia
seguinte orienta-se para a ação local, em municípios selecionados, tendo como base a
metodologia do diagnóstico rápido e participativo dos agroecossistemas e de elaboração de
planos de desenvolvimento agroecológicos para comunidades rurais, em algumas situações com
abrangência municipal. Esses trabalhos envolvem um significativo conjunto de temas técnicos,
tendo alguns deles passado a ser o elemento de constituição de redes temáticas, com destaque
para as sementes, a apicultura e a água. Essas ações evoluíram e se disseminaram para muitas
áreas do semi-árido, constituindo-se em estratégias de ação que podem ser assim classificadas:

        A primeira delas pode ser caracterizada como Ação de Pesquisa, Desenvolvimento e
Difusão Ampla de uma Tecnologia Específica. Iniciou-se com o desenvolvimento de uma
tecnologia específica, de amplo alcance, de fácil reprodução e adaptação, que responde a uma
necessidade fundamental da população. A referência dessa estratégia é o trabalho em torno da
cisterna de placas, que começou com a sistematização da experiência de um pedreiro, passou
pela adaptação e melhoramento do método de construção e pelo desenvolvimento da metodologia
de treinamento e de financiamento pelas ONGs, sendo incluído em programas de ação de
prefeituras e estados, e chegando até a formulação atual do Programa de Formação e
Mobilização Social para a Convivência com o Semi-Árido – Um Milhão de Cisternas – P1MC. Essa
estratégia ampliada só foi possível devido à simultânea estruturação da Articulação do Semi-Árido
– ASA, que atualmente envolve 613 diferentes organizações da sociedade civil.

        A segunda estratégia que pode ser identificada é a Ação de Pesquisa, Desenvolvimento e
Difusão Local de uma Base Tecnológica Agroecológica. Diversas entidades situadas no semi-árido
adotam essa estratégia, de forma mais ou menos elaborada. Normalmente há significativo
investimento no desenvolvimento de tecnologias agroecológicas, com formação de grupos de
interesse e difusão em escala local. Trabalha-se com a complexidade dos sistemas de produção
local, vinculando-se às organizações dos agricultores familiares.

        Trabalhando ou não com a agroecologia, a Ação de Resgate, Valorização, Fortalecimento
e Inclusão de Segmentos e Grupos Sociais é outra estratégia presente nas intervenções no semi-
árido, principalmente em relação a mulheres e jovens. Ações de natureza educacional, artística,
cultural, de geração de trabalho e renda, de apoio jurídico, etc. caracterizam as organizações
desse campo. Também não direcionada especificamente para a transição agroecológica, verifica-
se estratégia focada na Ação de Fortalecimento da Cidadania e Democratização das Políticas
Públicas, que tem na capacitação das lideranças populares para a gestão social do
desenvolvimento local um de seus principais focos de trabalho. Quando essa estratégia aponta
para a discussão da Agenda 21, abre-se um grande campo para o debate do modelo agrícola e da
necessidade de uma agricultura sustentável.

        Nesse mesmo sentido, apresenta-se a estratégia de Desenvolvimento Local, que tanto
pode ser uma iniciativa das organizações populares, das ONGs ou de instituições públicas
estatais. São exemplos desse trabalho o Programa de Desenvolvimento Local Sustentável –
PDLS do movimento sindical, as ONGs participantes da Rede Desenvolvimento Local Integrado e
Sustentável – Dlis, os programas públicos desenvolvidos por instituições como o Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento – PNUD, Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – Sebrae,
Banco do Nordeste, Conselho da Comunidade Solidária, etc. Aqui, a transição agroecológica,
normalmente via agricultura orgânica, também começa a ganhar algum espaço, principalmente
pela discussão da Agenda 21.



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Além dessas estratégias mais gerais, têm-se dinâmicas específicas que estão contribuindo
significativamente para o avanço da agroecologia. A constituição de associações de consumidores
e produtores orgânicos, visando ao planejamento da produção e à comercialização direta tem sido
um caminho bastante promissor. Associações de produtores orgânicos voltadas para a venda em
feiras agroecológicas ou mesmo para redes de supermercados têm mostrado a viabilidade técnica
e econômica da proposta, reforçando a transição agroecológica no semi-árido. Algumas poucas
grandes empresas rurais também começam a investir na produção orgânica, a exemplo do caju,
mostrando que a agricultura familiar não é a única interessada nesse assunto.

       Em síntese, pode-se concluir que, de forma semelhante ao que ocorre em outras regiões
do Brasil, no semi-árido também estão se constituindo diversas dinâmicas de promoção da
agroecologia, com vários atores envolvidos. De modo geral, elas ainda são incipientes, restritas e
pouco articuladas, sendo necessário um grande esforço de integração, expansão e consolidação,
para que se possa avançar na transição agroecológica no semi-árido brasileiro.

        As dinâmicas de promoção da agroecologia no semi-árido estão referenciadas no conjunto
das experiências que podem ser analisadas a partir de grandes temas e questões, identificando-
se em cada um os acúmulos e os pontos de estrangulamento, de modo a se ter um painel do nível
de construção da proposta agroecológica no semi-árido. Esse esforço de análise é apresentado a
seguir.

        O acesso a terra continua sendo ponto de estrangulamento para milhares de famílias de
agricultores do semi-árido. De modo geral, duas situações bem diferenciadas podem ser
observadas. Nas áreas sertanejas e subcosteiras, a presença das grandes propriedades,
passíveis de desapropriação, aponta para a necessidade de ampliação do número de
assentamentos federais, capaz de absorver parcela significativa dos “sem terra” dessas regiões.
Por outro lado, nas unidades geoambientais dos agrestes e serras, a resolução da questão
fundiária passa por outros mecanismos, tais como a reorganização e o crédito fundiários. Embora
muito aquém das necessidades, a política de assentamento do governo federal e de alguns
governos estaduais vem criando uma realidade diferenciada para um conjunto de famílias rurais,
e, em alguns municípios e microrregiões do semi-árido, as transformações na estrutura fundiária
são relevantes. Entretanto, um ponto extremamente preocupante é a recorrente dificuldade de os
assentamentos situados no semi-árido viabilizarem-se produtiva e economicamente, observando-
se níveis de pobreza semelhantes aos da situação rural das áreas em que estão inseridos. Vale
ressaltar que um número significativo desses assentamentos dispõe de infra-estrutura básica, teve
acesso aos créditos da reforma agrária para a estruturação das atividades produtivas, e alguns
também foram beneficiados com programas de alfabetização e de assistência técnica, embora
com as descontinuidades típicas das ações governamentais nesse campo.

        No semi-árido o recurso natural crítico é a água. Seu uso indevido na agricultura irrigada, a
precariedade do gerenciamento e a poluição das fontes de armazenamento são problemas
crescentes ainda pouco trabalhados. A degradação dos recursos vegetais e do solo é um forte
impacto ambiental negativo dos sistemas de produção “tradicionais” e “modernizados” existentes
no semi-árido nordestino. Em algumas áreas essa degradação está evoluindo para a
desertificação, com risco do comprometimento definitivo da sustentabilidade da agricultura. A
gravidade da situação e as respostas positivas que os sistemas agroecológicos de produção vêm
apresentando criam ambiente favorável para a difusão ampliada das soluções.

         O desafio de conhecer a singularidade e a diversidade do trópico semi-árido requer
significativo investimento em pesquisa, o que está muito longe do que se tem atualmente. A
condição de região com índices de desenvolvimento muito abaixo da média nacional e o pouco
investimento na produção de conhecimento sobre a realidade regional são fatores que se
alimentam mutuamente, reforçando o círculo vicioso de pouca pesquisa, baixo desenvolvimento e
vice-versa. Essa situação geral da pesquisa na região agrava-se quando se analisa a base
científica para a transição agroecológica no semi-árido. Entretanto, nesse campo específico, os

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esforços das ONGs, articulados com as organizações dos agricultores familiares e com a
colaboração de alguns poucos pesquisadores das instituições públicas, possibilitaram a geração
de um conjunto mínimo de técnicas, capaz de responder aos problemas básicos dos sistemas de
produção da maioria dos agricultores familiares do semi-árido. Nesse sentido destacam-se as
técnicas de recuperação e conservação dos solos; a captação, o armazenamento e a utilização da
água na propriedade, o manejo da vegetação, em especial da caatinga, mediante os sistemas
agropastoris, silvopastoris ou agrossilvopastoris, a criação de bovinos, ovinos, caprinos, suínos e
aves caipiras, a agroindustrialização familiar ou comunitária de diversos produtos e muitas outras
tecnologias apropriadas às condições da agricultura familiar no semi-árido. O principal ponto de
estrangulamento está na insuficiência e na ineficiência do sistema público estatal de assistência
técnica e extensão rural, bem como em sua fragilidade e insuficiente articulação, com as
instituições de pesquisa e com o setor público não estatal formado por ONGs, cooperativas de
trabalho e empresas prestadoras de serviços. Este último setor, por sua vez, articula-se em redes
diversas, mas não conseguiu estabelecer-se como um sistema organicamente estruturado, e seu
funcionamento depende, por um lado, dos recursos da cooperação internacional e, por outro, dos
programas governamentais, havendo raríssimos mecanismos de auto-sustentação em prática.
Mesmo sujeito a esses condicionantes, o setor tem desempenhado um importante papel na
geração do conhecimento agroecológico no semi-árido e tem sido o maior responsável por sua
difusão junto aos agricultores familiares.

       A dimensão econômica tem-se configurado num dos principais pontos críticos do processo
de transição agroecológica no semi-árido. Submetidos à condição de miséria, pobreza ou
descapitalização, cujas causas já foram expostas, os agricultores familiares e as organizações
atuantes no semi-árido enfrentam o grande desafio de conciliar os investimentos necessários à
recuperação dos recursos naturais e o manejo agroecológico de seus sistemas de produção, com
a geração de produtos para o autoconsumo e de uma renda mínima, capaz de viabilizar o
consumo dos demais itens que compõem a cesta familiar de produtos e serviços – o que vem
sendo feito de forma bastante coerente e conseqüente por agricultores familiares, suas
organizações representativas e pelas entidades de apoio. O ponto de partida é o trabalho em
torno do tema segurança alimentar, que se dá por meio das casas de sementes, da diversificação
dos roçados e quintais, das cisternas de placa, das pequenas barragens subterrâneas, dos
cacimbões, dos barreiros-trincheira, das hortas, dos pomares, da apicultura e da criação de
pequenos animais.

        No semi-árido a prioridade econômica da maioria dos agricultores familiares é a
regularidade da produção de alimentos nas condições de alta irregularidade do regime de chuvas.
Isso pode ser obtido com pequenos investimentos financeiros orientados fundamentalmente para
a capacitação e o acompanhamento sistemático de todos os que formam o núcleo familiar e para
as pequenas obras de infra-estrutura produtiva e reprodutiva, voltadas para a melhoria da
qualidade de vida da família. Essa estratégia básica, incluindo as melhores formas de
financiamento, está técnica e metodologicamente muito bem elaborada, testada e implementada
em diversas situações agrossocioambientais do semi-árido e pode ser considerada o maior
patrimônio do conjunto das organizações envolvidas nesses trabalhos.

        Essa forte perspectiva de autoconsumo presente em parcelas significativas da agricultura
familiar não está dissociada de uma perspectiva mercantil, que vai desde a venda parcial da
própria força de trabalho, realizada pelos segmentos mais empobrecidos, até a inserção no
mercado internacional, a exemplo de alguns grupos de produtores de frutas frescas e castanha-
de-caju. Considerando as diversas formas de inserção no mercado, viabilizadoras da renda
monetária bruta dos agricultores familiares, pode-se observar que o conjunto diversificado de
produtos trabalhados nos processos de transição agroecológica traz mais oportunidades de
comercialização, e certos produtos passam a ser uma “atividade de renda” em função dos
volumes de produção alcançados. Analisando um pouco mais detalhadamente esse aspecto
econômico, podem-se observar dinâmicas distintas. Uma primeira diz respeito à revitalização de
atividades tradicionais de mercado, como o algodão, o sisal, a castanha-de-caju, a cera de

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carnaúba, o artesanato e o próprio café. Outras podem ser consideradas atividades tradicionais
em processo de mercantilização ampliada, como é o caso do mel, dos ovinos e caprinos e de
frutas regionais, cajá, cajarana, umbu, goiaba, graviola e ata, por exemplo. Uma terceira dinâmica
está mais relacionada a produtos de introdução mais recente, como as hortaliças e algumas
frutas, entre elas o melão, o abacaxi, a acerola e a uva. Por fim, existem produtos em fase de
introdução na região, a exemplo do nim e do carmim de cochonilha, que formam mercados
especiais.

         Em todas essas atividades existem agricultores e entidades de apoio trabalhando em
processos de transição para a agroecologia, a maioria com bons resultados produtivos e até com
certificação orgânica. Entretanto alguns produtos, a exemplo do algodão e do mel, apresentam
significativos estrangulamentos comerciais, resultado de dificuldades de venda em pequena
escala ou do escoamento da produção mais elevada e de preços não compensadores. Em outras
situações o mercado é franco comprador dos produtos orgânicos, mas a transição agroecológica
está restrita a um pequeno número de agricultores, com taxa de expansão muito lenta; é o caso
da castanha-de-caju. Observam-se também casos de integração de produtores de hortaliças
orgânicas a redes de supermercados. Por outro lado, agricultores produzindo “novos produtos de
mercado” , como a semente de nim e carmim de cochonilha, têm aproveitado esse diferencial
tecnológico para faturar renda expressiva com pouco trabalho. A venda de cestas padronizadas e
a venda direta para consumidores cadastrados ou para a vizinhança, bem como as feiras de
produtos da agricultura familiar e/ou de produtos agroecológicos, são estratégias comerciais em
processo de expansão nas grandes e pequenas cidades do semi-árido, mostrando a importância
dos mercados locais, principalmente para os produtos alimentícios e medicinais. Em muitos casos,
o diferencial de renda é decorrente do máximo aproveitamento de todos os produtos de origem
vegetal e animal, por meio da agroindustrialização descentralizada. Em algumas situações,
estruturas mais centralizadas, combinadas ou não com estruturas descentralizadas, têm
propiciado o melhor aproveitamento da produção e a comercialização mais vantajosa,
especialmente quando se trata de exportação.

        Em síntese, podemos concluir que, do ponto de vista econômico, sob a lógica de
combinação de autoconsumo e mercantilização, característica da maioria dos tipos de agricultura
familiar do semi-árido, a transição agroecológica tem conseguido demonstrar sua viabilidade,
principalmente no campo da segurança alimentar, registrando também avanços nos aspectos
comerciais, proporcionando incrementos na renda monetária das unidades produtivas. Observam-
se, entretanto, muitas deficiências e insuficiências nos aspectos de organização da produção e da
comercialização. Isso sugere que os investimentos das organizações dos agricultores e das
entidades de apoio nesse campo são fundamentais em termos da viabilidade econômica da
transição agroecológica em escala mais ampla no semi-árido.

       No início da discussão sobre a transição agroecológica no semi-árido, a disputa no campo
ideológico era marcada pela tentativa de desqualificação dos agricultores e profissionais
envolvidos no trabalho, mediante sua classificação como utópicos, românticos, atrasados ou
malucos. A crescente crise dos padrões tradicional e convencional, e os resultados positivos
alcançados pela agroecologia no semi-árido, no contexto da ampliação da consciência ambiental
do conjunto da população, vêm propiciando inversão de valores expressa na valorização e na
demanda crescente de produtos naturais. Essa mudança de tendência ocorre de forma mais
generalizada e consistente nas populações urbanas de maior renda e escolaridade e em meio às
pessoas participantes de organizações sociais de diversos tipos. Entretanto, esse reconhecimento
da importância do meio ambiente e dos produtos naturais ainda não está diretamente relacionado
com o papel potencial da agricultura familiar do semi-árido na sociedade. Devido à condição de
miséria e pobreza da maioria da população rural do semi-árido, ainda predomina na população
urbana a visão estigmatizada desse segmento social. Também é comum a autovisão negativa por
parte dos agricultores familiares, principalmente em meio à população mais jovem. Desse modo,
os esforços recentes de valorização da agricultura familiar empreendidos pelas organizações de
representação e entidades de apoio são fundamentais. Os resultados iniciais, ainda

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numericamente pouco expressivos, são de grande importância para a construção da cidadania no
campo.

        Nesse contexto, o trabalho mais relevante tem sido empreendido pelas mulheres
trabalhadoras rurais. A construção de suas identidades a partir da reflexão das relações de gênero
na unidade familiar, em suas organizações e na sociedade tem avançado de maneira ampla e
consistente, reconhecendo-se, entretanto, o longo caminho a se percorrer. A ação mais recente,
mas ainda menos estruturada, está sendo desenvolvida junto à juventude rural. Nesse caso tem-
se o duplo desafio de sensibilizar seus membros para a valorização de sua condição de jovem
agricultor (a) e, ao mesmo tempo, criar as condições de trabalho e renda capazes de garantir sua
permanência no campo. Observa-se também um incipiente trabalho relacionado às questões
étnicas no conjunto da agricultura familiar do semi-árido. A auto-identificação de comunidades
indígenas e negras, o resgate de suas identidades, o reconhecimento de seus direitos pela
sociedade e pelo Estado são passos importantes na valorização da diversidade da população que
vive e trabalha no semi-árido brasileiro.

        A análise dos avanços e dos pontos de estrangulamento da dimensão político-organizativo
na construção da transição agroecológica passa inicialmente pela identificação dos principais
atores interessadas em um novo modelo de desenvolvimento rural, para o Brasil e para o semi-
árido em particular. Nesse sentido, considera-se a seguinte base organizativa: movimento sindical
dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, movimento dos sem terra, movimento associativo e
cooperativo, ONGs, instituições vinculadas às igrejas e partidos políticos progressistas. Parte-se
também da idéia de que a transformação da consciência social agroecológica em força política
depende do nível de organização do “bloco agroecológico” no interior desse conjunto. De início
vale observar que possivelmente nessa dimensão residem as maiores fragilidades para a
transição agroecológica no semi-árido. Esta síntese está relacionada com a análise de cada
segmento, conforme se segue:

       Do ponto de vista quantitativo e territorial, o Movimento Sindical dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais – MSTTR é sem dúvida a estrutura organizativa mais forte no semi-árido.
Entretanto, sua estratégia central, a construção do Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural
Sustentável – PADRS, de âmbito nacional, implementada pelas ações de massa, como o Grito da
Terra Brasil e a Marcha das Margaridas e por ações mais permanentes por meio do PDLS, não
tem a agroecologia como referência teórica para sua construção. Diversos sindicatos e algumas
regionais, pólos sindicais e federações, contudo, já incorporaram, em graus variados, a
agroecologia e a convivência com o semi-árido como elementos centrais na construção do
PADRS. Ainda no campo sindical, vale ressaltar que a entrada da Central Única dos
Trabalhadores – CUT, por intermédio da Agência de Desenvolvimento Solidário – ADS, no debate
e na construção de um novo modelo de desenvolvimento, mesmo sem vinculação direta com a
agroecologia, é um elemento favorável para o trabalho desse tema no semi-árido.

        Outro importante ator nacional atuante no semi-árido é o Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra – MST. Até pouco tempo atrás, essa organização não poderia ser relacionada
no campo da agroecologia, mas parece estar havendo um redirecionamento em função de
questões mais gerais. No semi-árido, a tentativa inicial de modernização tecnológica químico-
mecânica dos assentamentos mediante projetos de financiamento, aliada à organização coletivista
da produção, mostrou-se bastante inadequada. Não foi possível obter informações confiáveis
sobre até que ponto a agroecologia e a convivência no semi-árido têm sido trabalhadas pelo MST
para reverter essas dificuldades. De modo geral, poucos assentamentos localizados no semi-
árido, vinculados ao MST e/ou ao MSTTR, têm conseguido avançar nas dimensões produtiva,
ambiental e comercial, o que gerou a formulação de uma ação específica do governo federal, o
Projeto Dom Helder Câmara, que aponta a agroecologia como base técnica para o semi-árido.

       A transição agroecológica nessa região vai exigir uma organização de base muito ampla,
representada pelas associações comunitárias e de produtores. Também não foi possível trabalhar

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com informações seguras nesse campo, mas é corrente a análise apontando a vinculação e a
dependência da maioria dessas organizações aos programas governamentais, desde sua criação.
Por outro lado, são muitas as organizações desse tipo que dão suporte ao trabalho com
agroecologia junto às famílias dos agricultores familiares, e sem dúvida elas têm desempenhado
papel fundamental na expansão da agroecologia no semi-árido. Um dos pontos de
estrangulamento desse trabalho é a relativa dispersão e desarticulação entre essas formas
organizativas e o MSTTR. Além do movimento associativista, deve-se também considerar o
cooperativista, que, no geral, tem histórico bastante negativista, ainda que exista uma dinâmica de
renovação, com criação de novas e pequenas cooperativas de agricultores familiares, incluindo
algumas de crédito. A interiorização da agroecologia nessas estruturas organizativas pode ser
observada, sendo necessário avançar nesse campo, até para viabilizar o crédito para a transição
agroecológica. Analisando-se o papel das ONGs e da estrutura das igrejas em termos Políticos-
organizativos, pode-se observar a importância da articulação entre esses dois atores na
constituição da ASA e na implementação do P1MC, o que pode resultar numa forte organização
mais permanente, abrangendo todo o semi-árido. Em relação aos partidos políticos progressistas,
tem-se ainda um distanciamento em relação ao que está sendo construído, embora exista certa
valorização dessa experiência. Em alguns temas, como a transposição de bacias, há sinais de
posicionamentos diferenciados entre os partidos e as demais organizações atuantes na questão
dos recursos hídricos.

        A transformação das diversas experiências agroecológicas em políticas públicas para a
agricultura familiar tem sido uma batalha constante de todas as organizações da sociedade civil
atuantes no semi-árido. Do ponto de vista mais geral, as ações relacionadas com captação,
armazenamento e uso da água, em especial a cisterna de placas, têm sensibilizado os gestores
públicos em todos os níveis administrativos, resultando em parcerias efetivas para a elaboração e
implementação de programas com recursos públicos.

         As propostas de transformação dos sistemas produtivos têm apresentado mais
dificuldades, mas algumas delas, como a apicultura, as casas de sementes, o manejo da caatinga
e a criação de ovinos e caprinos e de aves, o algodão orgânico, o processamento da produção,
etc., também têm sido incorporadas por um pequeno número de prefeituras e programas de
financiamento, a exemplo do Programa de Financiamento à Conservação e Controle do Meio
Ambiente do Banco do Nordeste – FNE Verde. Propostas mais ousadas, como a agroflorestação,
ainda estão restritas às dinâmicas da própria sociedade civil. Os serviços de assistência técnica
para a transição agroecológica e de apoio à comercialização também têm sido objeto de poucas
iniciativas em termos de políticas públicas. Se no geral os avanços foram poucos, alguns bons
resultados nas ações específicas vêm sendo alcançados, os que permite construir um banco de
idéias e projetos para a expansão das políticas públicas baseadas na agroecologia.

        Apontar tendências, a partir de um conjunto de experiências pontuais parcialmente
conectadas, é certamente uma temeridade, mas a importância e a pertinência do debate justificam
os risco dessa empreitada com sabor de futurologia. O desafio consiste em fazer uma prospeção
sobre para qual padrão de organização técnica, fundiária e socioeconômica tende esse conjunto
de experiências em desenvolvimento no semi-árido.

       Considerando as imensas desigualdades existentes na atualidade, de modo geral, a
tendência para o semi-árido é a de coexistência, por um largo tempo, de quatro padrões
tecnológicos: o tradicional, o químico-mecânico, o biotecnológico/transgênico e o agroecológico.

        A falta de perspectiva de futuro para quem adota o padrão tradicional e as dificuldades de
estabelecimento do padrão químico-mecânico na complexa realidade socioambiental do semi-
árido sinaliza que esses dois padrões tendem ao declínio progressivo, estando a velocidade e a
orientação dessas mudanças relacionadas com a capacidade de ação do “bloco agroecológico”.
Considerando os processos desencadeados por esse bloco, expressos nos resultados positivos
das referências agroecológicas já estabelecidas e no crescente envolvimento das organizações

                                                                                                44
sindicais, associativas e cooperativas e das entidades de apoio com a difusão dessas
experiências, pode-se conjecturar que o padrão agroecológico, articulado a uma mecanização
mais criteriosa, será a base tecnológica de um significativo contingente da agricultura familiar e
possivelmente de parcela da própria agricultura patronal.

        Quanto ao padrão fundiário que está sendo construído, considerando os avanços e
percalços da reforma agrária no semi-árido até o momento, podem-se antever as seguintes
tendências: diminuição do número de unidades familiares entre um e quatro módulos fiscais de
cada região e expansão do número de propriedades abaixo de um módulo fiscal, pois a
subdivisão por herança é um processo de difícil estancamento nas próximas décadas. Mesclados
a essas pequenas unidades familiares, os assentamentos de maior porte, originários da
desapropriação das grandes fazendas pelo governo federal, devem ter seu número aumentado,
principalmente nas áreas sertanejas mais secas. Além disso, pode-se antever um significativo
incremento de assentamentos de menor porte, viabilizados por programas estaduais de reforma
agrária e de crédito fundiário. Eles permitirão o acesso a terra aos atuais sem terra, moradores em
regiões que dispõem de poucas áreas passíveis de desapropriação. Vale lembrar que muitos
deles são integrantes das várias associações comunitárias existentes, fruto do crescente
processo de organização social da população rural, com todas as dificuldades e distorções
observadas. Registre-se também que parte da população urbana dos numerosos pequenos
municípios espalhados pelo semi-árido, ainda vinculada às atividades agrícolas, será beneficiária
desse processo e também deverá estar inserida na estrutura fundiária de forma mais segura,
superando a precariedade atual em termos de posse e uso da terra. Em síntese, a tendência geral
de democratização do acesso a terra deve consolidar-se, podendo o ritmo e a velocidade do
processo acelerarem-se, em função do perfil dos próximos governantes.

        Analisando os aspectos socioeconômicos que estão sendo geridas pelas experiências do
bloco da agricultura sustentável, podem-se perceber dois caminhos. Um deles está apostando na
difusão desse padrão tecnológico para todas as formas de organização socioeconômicas, sem
distinção entre agricultura patronal e agricultura familiar. O outro caminho, referenciado no
desenvolvimento rural solidário e sustentável, aponta para a articulação entre agricultura familiar,
agroecologia e socioeconômica solidária como base para a convivência no semi-árido. Seguindo
os passos do poeta, é nesse segundo caminho, construído no próprio caminhar, que residem às
esperanças de construção de um novo padrão de organização social e técnica da agricultura do
semi-árido. Caminhemos.




                                                      A FEAB É...
                                                      … DE LUTA
                                                                                                 45

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  • 1. Comissão Organizadora do XI Encontro Regional de Agroecologia Nordeste XI Encontro Regional de Agroecologia Nordeste XI ERA NE “Agroecologia: livro pra comida, prato para educação” Cruz das Almas, março de 2010 1
  • 2. Canção da Terra Tudo aconteceu num outro dia Hora da Ave Maria O universo viu gerar No princípio o verbo se fez fogo, Nem atlas tinha globo Mas tinha nome o lugar Era Terra, terra... E fez o criador a natureza Fez os campos fez floresta, Fez os bichos, fez o mar Fez por fim, então a rebeldia Que nos da a garantia Que nos leva a lutar Pela Terra, terra... Madre Terra nossa esperança, Onde a vida da seus frutos O teu filho vem cantar Ser o teu sonho por inteiro, Sou sem terra sou guerreiro Com a missão de semear A terra, terra... Mas apesar de tudo O latifúndio e feito inço Que precisa acabar Romper as cercas da ignorância Que produz a intolerância Terra é de quem plantar A terra, terra... 2
  • 3. O que é o ERA? Cruz das Almas – Bahia – UFRB 21 a 25 de abril de 2010 O ERA será um evento de caráter regional abrangendo os estados do Nordeste, realizado pela FEAB com o apoio da ABEEF e ENEBio, para estudo, prática e capacitação para agroecologia, destinado a participação de agricultores, populações tradicionais, estudantes, profissionais de diversas áreas do conhecimento, movimentos sociais, sindicatos de trabalhadores rurais-STR´s, e Organizações Não Governamentais - ONG´s. Estima-se a participação de 300 (trezentas) pessoas sendo 200 (duzentos) estudantes e 100 (cem) camponeses. Um espaço de ampla discussão entre o meio acadêmico e a sociedade, que faça com que estudantes, trabalhadores rurais, populações tradicionais, movimentos sociais e profissionais debatam, elaborem, troquem saberes e valores articulando um intercâmbio científico, técnico, social, político e cultural. A partir dos anos 70, os estudantes de Agronomia começaram a sentir a necessidade de desenvolver esforços para entender o modelo de desenvolvimento agropecuário que estava se implantando no país, conhecido como “Revolução Verde”, buscando analisar suas consequências e sua influência na qualidade do ensino da Agronomia. Com isso, a FEAB a quase duas décadas vem realizando eventos que debatam o modelo agrário e agrícola no mundo, e em especial no Brasil, construindo uma alternativa ao modo convencional de produção. Estes eventos foram iniciados durante o início da década de 80, quando se realizaram os Encontros Brasileiros de Agricultura Alternativa – EBAA’s, que foram fundamentais para a consolidação de um novo método de trabalhar a natureza, que fica conhecido como “Agricultura Alternativa”. No início da década de 90, a FEAB fez com que estes eventos tomassem um caráter regional propondo a realização dos Encontros Regionais de Agricultura Alternativa – ERAA’s, que acompanhando o avanço desta discussão e, a nova proposição para a Agroecologia, passa-se a chamar em 2000, Encontro Regional de Agroecologia – ERA. Nossa proposta é construir um evento que possua um caráter de mútuo intercâmbio técnico, profissional, social, político e cultural, estreitando as relações entre Universidade e os Atores Sociais do Campo, que trabalham o desenvolvimento sustentável sob o enfoque da Agroecologia e que contribuam para o avanço na construção de um novo modelo de desenvolvimento para a agricultura brasileira, buscando a construção de um conhecimento que funda o conhecimento científico dos acadêmicos e os saberes considerados empíricos dos camponeses. Como atores sociais do campo, identificamos as comunidades tradicionais geraizeiras, catingueiros, vazanteiros, quilombolas, ribeirinhas, os movimentos sociais organizados do campo, as organizações da sociedade civil organizada e instâncias governamentais competentes, além dos estudantes que atuam de forma indireta na construção de um novo modus de trabalhar a agricultura. 3
  • 4. Quem vem pro ERA... Prepare sua mochila,  Na bagagem traga muita alegria É isto mesmo, você ta vindo pro ERA O Encontro da Agroecologia! A banda depois de ter passado Em Recife e Maceió Na Bahia veio parar! Com a FEAB, ABEEF e ENEBio na luta você já ouviu falar ??? Mas de luta mesmo é quem vim pra cá Ainda traga em seu bodocó Caneca, colchonete, roupas e calçados Escova de dentes e sementes também Só não esqueça a toalha de banho E se der um pandeiro e um violão Se preparem, vai ser uma viajem, é muita bagagem... Não se preocupem como o tanto de chão a estrada vai ta boa esse ano tem eleição agente aqui também vai é conversar mesmo sobre o Velho Chico e a sua grande ameaça O progresso da Tranposição... Participem das reuniões preparatórias ou os Pré-ERA's... Procurem os seus DA's e CA's, organizem a saída do ônibus.... é isso ae galera!!! Desde 2004, temos referência ao VIII Encontro Regional de Agroecologia, FEAB, Ilhéus-BA, 2004. Um ônibus de Cruz das Almas foi ao VIII ERA NE e trouxeram uma rica e diversa bagagem agroecológica. A semente foi plantada, regada e adubada junto aos muitos grupos da FEAB que já passaram por lá. Logo começaram as reuniões com convite para o Pré-ERA, ou encontro preparatório para ir ao ERA, em Recife no ano de 2006, realizado pela FEAB, ABEEF e ENEV. O IX ERA Nordeste falou de uma tecnologia a serviço da vida, nas da universidades, nas instituições e na atuação do profissional, uma educação de liberdade. Os estudantes falavam da Agroecologia de base científica afirmada em nossa academia, unida aos agricultores e seus saberes, aliada a politica do povo dos interesses coletivos e não privados, a Agroecologia Militante. Um ato de coragem foi ecoado e continua por toda eternidade. Após dois anos fomos a Maceió, onde a FEAB, junto com o Grupo Agroecológico Craibeiras, ABEEF e ENEBio conseguiram fazer bonito na UFAL, além da discussão politica em todo evento o ERA foi recheado de boas praticas e uma rica troca de experiencias entre os Grupos de Agroecologia. Este anos será realizado em Cruz das Almas, a FEAB junto ao Diretório do curso de Agroecologia , ao Grupo AGROVIDA1, a ABEEF e ENEBio que continuam uma trajetória de luta com Federação nos espaços dentro da universidade, com a participação em vários espaços (ERA, EREA, CONEA, PNEB). Também na responsa a alguns tempos atras de realizar o III ERAA – NE, que foi em Cruz das Almas, no ano de 1994. Naquela época a C.O. (Comissão Organizadora) escolheu o tema da Autossustentabilidade, da formação do 1 O Grupo AGROVIDA - Movimento de Apoio a Agricultura Familiar e Agroecologia é uma entidade civil, sem fins lucrativos, fundado em 12 de fevereiro de 2004 e tem como missão: “Desenvolver e experimentar metodologias participativas com professores, estudantes, agricultores (as) familiares, técnicos (as) e gestores (as) rurais, inseridos no contexto da Agricultura Familiar e Agroecologia que, através de práticas educativas, visam contribuir para o desenvolvimento rural sustentável no Estado da Bahia”. 4
  • 5. cidadão para uma nova sociedade solida em valores humanos e verdadeira. Essa nova sociedade estamos construindo, em particular na nossa Universidade, junto com as entidades do movimento estudantil e na rua e com o movimento organizado e assim colocamos o convite para todas as escolas, na construção nacional e dos estudantes de todo País. A escola de Cruz das Almas vive momento único. É uma nova Universidade desde 2005. Herdou 150 anos de ensino agrícola na Bahia e foi Escola de Agronomia (Ex-UFBA) agora ela compõe a Universidade Federal do Recôncavo Baiano (UFRB), no Centro de Ciências Agrárias Ambientais e Biológicas. O recôncavo da Bahia margeia a Baia de Todos os Santos, é grande e possui vasto passado histórico importante na formação do Brasil contemporâneo, na influencia do negro e do europeu. Com grandes manguezais e mata atlântica foi palco de muitas plantações da corte, com seus Engenhos que trabalhavam negros e índios e hoje vivem várias realidades, dos agricultores familiares, das cidades, do latifúndio, dos grandes rios vejam o Paraguaçu. A UFRB já possui uma corrente Agroecológica, e queremos unir esses elos. Temos também bem pertinho o Curso de Técnico em Agroecologia, no Complexo CEAT que voltou a ser escola Técnica e fica do lado do Campus. Vamos somar as forças realizar Pré-ERA lá, é isso... Os ERA's possuem forte caráter de fortalecer as entidades FEAB/ABEEF/ENEBio, aproximando o movimento estudantil e agroecológico, conquistando espaço nas escolas e resistindo ao grande avanço do capitalismo em nossa produtividade acadêmica, ainda preenchendo o vazio cultural de outros encontros universitários, claro que quando tudo vai bem. (hehe) Conheça a FEAB e ABEEF nos blog's: http://feab.wordpress.com http://abeef.wordpress.com Venham participar e contribuir desse encontrão da agroecologia, onde o passado e futuro se encontram e o presente é sua presença!!! Ficha de inscrição e outras informações disponíveis no blog: http://xieranordeste.blogspot.com O que trazer? - Cartilha do ERA; - Roupas para os dias do encontro, caneca, materiais de higiene pessoal, saco de dormir, colchonete, lençol ou coberta leve, chapéu/boné e protetor solar para oficinas práticas; - Sementes, livros, trabalhos, cartazes, cartilhas, fotos e outros materiais para feira - Agroecológica; - Instrumentos musicais; - Críticas construtivas; - Alegria; O que NÃO trazer? - Barraca (haverá alojamento), bebidas alcoólicas ou substância ilícitas. Figura: Reitoria Universidade Federal do Recôncavo da Bahia - UFRB 5
  • 6. Objetivo Proporcionar um espaço de ampla discussão entre o meio acadêmico e a sociedade, que faça com que estudantes, trabalhadores rurais, populações tradicionais, movimentos sociais e profissionais debatam, elaborem, troquem saberes e valores articulando um intercâmbio científico, técnico, social, político e cultural. • Debater o histórico, a concepção e as atualidades, a respeito da Agroecologia abordando as principais experiências e a relação com a Universidade; • Debater a atuação da universidade na construção da Agroecologia e sua influencia no modelo de matriz tecnológica vigente; • Articulação entre os Grupos Agroecológicos e o Movimento Estudantil Organizado, a fim de estreitar a relação entre os grupos com o intuito de fortalecer as discussões sobre Universidade e Agroecologia; • Trocar experiências entre agricultores e estudantes, a respeito das técnicas desenvolvidas dentro e fora da Universidade visando à elaboração de um método científico que descreva tais experiências; • Fomentar ações conjuntas entre estudantes e agricultores, que viabilizem projetos que rediscutam a capacitação de profissionais e o modelo de ensino das Universidades de Ciências Agrárias; • Rediscutir junto aos agricultores as novas propostas de Assistência Técnica e Extensão Rural propostas pelas entidades governamentais, visando maior esclarecimento e proposições; • Divulgar a cultura regional, valorizando a diversidade existente no Recôncavo Baiano, bem como, em outras regiões da área de abrangência do evento (SE-AL- PI-CE-RN-PE-PB); • Capacitar estudantes e agricultores sobre as principais técnicas Agroecológicas utilizando para isso uma metodologia de trocas de experiências, painéis, mini- cursos com temáticas que contemplem a relação universidade-sociedade; • Desenvolver um método de trabalho que garanta uma interação entre agricultores e estudantes visando uma maior participação no evento; • Sistematizar as experiências acumuladas pelos atores do evento, objetivando a construção de um documento (anais), com todo o conteúdo das discussões; • Construir um material didático-científico que registre as discussões realizadas durante o evento, na forma de anais e de registro cinematográfico; 6
  • 7. Programação Quarta-feira Quinta-feira Sexta-feira Sábado Domingo 21/04/10 22/04/10 23/04/10 24/04/10 25/04/10 6:30 – 8:00 ALVORADA / CAFÉ DA MANHÃ 8:00 – 10:00 Chegada Painel I Mesa Redonda ATO Plenária 10:00 – 12:00 inscrições GD I GD II Público Final 12:00 – 13:00 ALMOÇO 14:00 – 16:00 Socialização Experiências Avaliação Abertura Oficinas 16:00 – 18:00 dos GD's Feira Encerramento 18:00 – 19:00 JANTA 19:30 – 20:30 TEMPO TRABALHO 20:30 – 22:00 GI Painéis paralelos Oficina do ATO Executivas 22:00 – 00:00 Cultural Cultural Cultural Cultural • Chegada e Inscrições: Chegada e inscrições das delegações de estudantes e agricultores, bem como acomodação dos participantes nos alojamentos; • Abertura: Apresentação do evento, com tempos destinados as saudações de cada entidade que compõe a organização do ERA, bem como dos patrocinadores e apoiadores; • Grupo de Interação – GI: Apresentação do método, estrutura, temática utilizados durante o evento, estatuto e regimento do ERA; • Painel I – “Convivência das comunidades com o semi-árido e suas identificações culturais e de territorialidade”; • Grupo de Discussão - GD: Debater o conteúdo das explanações realizadas nos painéis principais visando uma reflexão coletiva sobre os temas abordados, bem como propor ações para intervenção dos atores na construção da Agroecologia dentro e fora da Universidade; • Painéis Paralelos: criminalização dos movimentos sociais, soberania alimentar, gênero e sexualidade, transposição do rio são francisco, juventude, educação no campo e cultura popular; questão agrária, ciência e tecnologia, impactos do agronegócio no Nordeste, integração campo cidade, desertificação; • Mesa Redonda – O papel da Universidade (formação profissional, ciências e tecnologias); • Trocas de Experiências / Feira: Troca de saberes, práticas e experiências entre grupos e pessoas que trabalham com a Agroecologia, onde os participantes do encontro terão a oportunidade de conhecer as diferentes realidades dos participantes do evento, além do conhecimento acumulado há séculos pelas populações tradicionais existentes no Nordeste; • Oficinas: Espaço recíproco de formação e capacitação, onde os participantes do encontro terão a oportunidade de colocar em prática os conhecimentos adquiridos; • Cultural: Momento de valorização e divulgação da cultura regional proporcionando integração, descontração e confraternização entre todos os participantes do evento; • Plenária Final: Socialização das discussões realizadas durante o evento, apresentando as principais propostas e elaborações que comporão o documento final do evento, além de apresentar as deliberações a respeito da temática do evento, junto a propostas de ações junto à sociedade; • Encerramento: Leitura do documento final do evento. Com espaço destinado a avaliação do ERA, a fim de garantir um processo democrático e franco nas análises das atividades realizadas 7
  • 8. Vivemos num processo de crise civilizatória! Crise alimentar - não é nova e não esta finalizada, a FAO afirma que há alimentos suficientes para o mundo, porém ainda há milhões de famintos ou obesos, frutos do padrão de consumo; Crise climática e sinais de esgotamento de recursos; Crise energética, econômica, cultural, ideológica... Em 1929, a crise teve uma “solução” com uma guerra entre as grandes potências. Eramos menos de 2 bilhões de habitantes com a maioria rural. Com a reordenação da humanidade no planeta - reorganização do capital e migração do poder - sempre com a alimentação em pauta e com uma agricultura de mercado cada vez mais sem a participação dos agricultores, o capital começa a apontar para novos ramos, como das industrias, seguros, ajudas alimentares, e mesmo assim hoje não consegue crescer mais que 2 ou 3% ao ano. ...cada vez mais esta sendo descartada a figura humana no trabalho,e sim o padrão inferior para o funcionarismo... desemprego estrutural...industria hoje e regida pela geração de tecnologias descartáveis, consome muita matéria prima e produz muito lixo... fetiche do consumo.. No Brasil, por exemplo, na década de 1960, surge o Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR), onde o governo financiava as atividades agrícolas, porém, para obter o crédito, o agricultor deveria se comprometer em adequar seu sistema de produção aos “Pacotes Tecnológicos”, parte do crédito estava reservado para compra de “Insumos Modernos”, e órgãos de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural estavam voltados a implementação dessas tecnologias. Nos últimos 15 anos tivemos período pós-redemocratização, revolução silenciosa, que são as privatização e abertura econômica, característica do governo FHC, colocando para o mercado o patrimônio publico. Já o governo Lula com a segunda revolução silenciosa, ouve um processo da retomada do estado, na capacidade de ser financiadores e executor de grandes obras. O PAC investe em infra estrutura para o capital se desenvolver, o estado social tenta apaziguar com politicas publicas compensatórias e controle da questão financeira do pais. Conciliação de classes ''hehe'', atende o capital, mas sem romper as classes e categorias sociais. Brasil 8ª potencia mundial e o 60º no Índice de Desenvolvimento Humano. Reformas sempre de interesses do capital e agora nos deparamos como o processo do que fazer no processo eleitoral, com uma desconfiguração estrutural do que seria um projeto para o Brasil, mas entendemos que esta em disputa para o próximo ano, ou a retomada do neoliberalismo, o continuísmo do desenvolvimento conservador ou o desenvolvimentismo popular que depende de nós... Crise sistêmica e estrutural: uma crise planetária. 8
  • 9. QUAIS SÃO AS SAÍDAS PARA A HUMANINDADE? Estamos nos autodestruindo por causa do padrão de produção e consumo estabelecido. O debate da agroecologia não se passa mais só pelo amito rural, mas com uma série de outros sujeitos. Nós da Agroecologia e nossa leitura desse período recente do seculo 21, temos algumas questões fundamentais como a relíquia de nossas experiencias locais. Só há Agroecologia porque há experiências locais. Conseguimos avançar e diferentes entidades em diferentes inciativas em redes e articulações, resultando num processo de fortalecimento. Os Movimentos Sociais inserem a agroecologia em suas pautas. Estamos fora do senário político macro, somo irrelevantes na tomada das decisão politicas, o tempo passa, politicas são implementada se mesmo com acúmulos e legitimidade não conseguímos a ressonância entre nossas politicas e projetos. Avançamos na formulação de estratégias e na sistematização de experiencias, sejam em aportes conceituais e ao nível de politicas publicas, como o programa da agrobiodiversidade, PRONAF, Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Merenda Escolar, Regulamentação dos Orgânicos, pode ser bom mas podem haver contradições. Também temos retrocesso e derrotas, como a imposição da Tranposição do Rio São Francisco, os Transgênicos que condenam a agricultura, como o milho, que compromete a agrobiodiversidade com uma baixa perspectiva de reversão, a hegemonia do Agronegócio controla a terra, território, opinião pública, mercado, politicas, implementação dos agrotóxicos, e é contra a reforma agraria, quer uma politica inexistente de governo. Promove a criminalização dos movimentos sociais pelo show midiático que induz a opinião pública paralisando a capacidade de mobilização. Queremos impor ao estado que seja apoiador e executor de políticas para agroecologia e para próxima década isso ainda é insuficiente, e sempre ficaremos para o lado da marginalização. Precisamos urgentemente nos reorganizar para saber qual nossa proposta e instrumentos políticos para organizar nossas estratégias para a agroecologia. Precisamos ter uma certa centralidade politica, coordenação para ter um direcionamento maior e saber das políticas emergenciais a partir da realidade, buscando formas de avançar. Precisamos construir novas bases sociais além da agricultura familiar e assentados, mas os povos urbanos, já que no Brasil muitos são urbanos (metrópoles), inserindo agroecologia na área da suade, educação, juventude. Precisamos ter uma plataforma de luta politica disputando planos políticos, e dentro de nossa centralidade aperfeiçoar nosso planejamento. Nadamos a contra corrente para construir nossas propostas, mas alguns indicadores evidenciam nossas propostas mesmo não sendo a hegemônica. No mundo há iniciativas que adotam os fundamentos agroecologia para o desenvolvimento social e econômico como a ciência dos lugares, com a capacidade de gerar e preservar riquezas locais. QUAL NOSSA ESTRATÉGIA POLÍTICAS PARA AGROECOLOGIA? 9
  • 10. A natureza dos desafios: Agroecologia passa a ser reconhecida com enfoque científico, até a universidade ensina a agroecologia com uma quantidade grande de pesquisadores que adotam esse paradigma, quer dizer, tem cientistas que desenvolvem a agroecologia alem de uma crescente sócio- politica, apesar disso tudo ser pouco comparado ao imenso acervo cientifico que fortalece o agronegócio. Uma serie de estudos no Brasil e no mundo para pensar o desenvolvimento, constatando uma certa exaustão do modelo vigente e que afirma a importância da agricultura familiar/camponesa e do paradigma agroecológico. Temos necessidade de um deslocamento do debate técnico-científico para o campo político para entender as relações sociais e as correlações de forças nos diferentes projetos de desenvolvimento, priorizando o foco político que é onde se estrutura os maiores desafios da agroecologia. Disseminação das práticas da agroecologia, valorizando as experiencias desenvolvidas em diferente inserções sociais, ambientais e culturais para produzir síntese e propostas politicas mais abrangentes, que evidencie para sociedade o papel positivo da implementação da agroecologia; Entrar na disputa pela leitura da crise e discutir qual a contribuição da agroecologia; Necessidade de um grande esforço da sistematização das experiencias, mas ainda temos grandes lacunas em temas essenciais, como mudanças climáticas, reforma agraria, direitos territoriais, mercados e suas novas estruturas e formas de comercializações. Necessidade que o movimento da agroecologia incorpore os mais amplos seguimentos da sociedade brasileira para construção de uma consciência social crítica, a respeito no modo de vida da população relacionado à produção e consumo. Romper o casulo e entrar num processo de comunicação e alianças estratégicas com outros movimentos da sociedade para defender um projeto nacional de desenvolvimento - os diversos movimentos, ambientalistas, mulheres, sociais, estudantil não conseguem unir suas pautas; Desconstruir o paradigma atual do progresso das ofensivas do agronegócio; Desenvolver uma plataforma agregadora de organizações muito diversas com uma cultura de rede aberta, com diversidade e sinergia entre a diversidade de atores; Pensar na sustentabilidade de uma rede diversa, e que se fundamente na capacidade de iniciativa de suas partes, produzindo convergências, agregando valor politico às expressões coletivas; Como desconstruir o paradigma atual de desenvolvimento e enfrentar as ofensivas do agronegócio? 10
  • 11. Agroecologia O tema “agroecologia” tem merecido Agroecologia, como um novo enfoque crescente reconhecimento nos últimos anos, científico, capaz de dar suporte a uma tanto nos meios em que atuam os movimentos transição a estilos de agriculturas sustentáveis sociais, principalmente as Organizações Não- e, portanto, contribuir para o estabelecimento Governamentais (ONGs), como também mais de processos de desenvolvimento rural recentemente no meio acadêmico. Às vezes sustentável. A partir dos princípios ensinados como proposta de “novo paradigma”, outras de pela Agroecologia passaria a ser estabelecido forma simplista e equivocada como novo um novo caminho para a construção de formato tecnológico para a produção na agricultura de base ecológicas ou sustentáveis. agricultura. Esta contestação ao modelo Desde muito tempo os homens vêm convencional de agricultura ganhou força e buscando estabelecer estilos de agricultura passou a atuar em diferentes espaços da menos agressivos ao meio ambiente e capazes sociedade, entre eles a Universidade. Muitas de proteger os recursos naturais, conservar o dessas iniciativas estão vinculadas a meio ambiente, além de serem mais duráveis estudantes que se organizam em Grupos de no tempo, tentando fugir do estilo convencional Agroecologia (GA’s) e em outras entidades do de agricultura que passou a ser hegemônico a Movimento Estudantil (ME), que vêem a partir dos novos descobrimentos da química Agroecologia como um conjunto de ciências agrícola, da biologia e da mecânica ocorridos já que visam à construção de uma nova no início do século XX. Em diversos países, sociedade. passaram a surgir estas agriculturas alternativas, com diferentes denominações: orgânica, biológica, biodinâmica, permacultura etc., cada uma delas seguindo determinados princípios, tecnologias, normas, regras e filosofias, segundo as correntes a que estão aderidas. Não obstante, na maioria das vezes, tais alternativas não conseguiram dar as respostas para os problemas socioambientais que foram se acumulando como resultado do modelo convencional de desenvolvimento e de agricultura que passaram a predominar, particularmente, depois da II Grande Guerra. Figura 2: Reunião Grupos de Agroecologia durante o Fórum Social Mundia em 2009, Belém/PA – Área Prática Grupo IARA - UFRA Neste sentido, coloca-se cada vez mais, a necessidade de incentivo a estes grupos para que avancem e possam atuar na elaboração de uma matriz tecnológica, capaz de construir a sustentabilidade de nossos sistemas produtivos. Para isso é importante que se incentivem eventos, discussões, estudos, e trocas de experiências para que haja uma maior aproximação da realidade da agricultura familiar com a Universidade, sendo de fundamental importância a aproximação em forma de extensão e pesquisa da Universidade com a agricultura familiar. A Universidade é responsável pelos Figura 1: Cientista Maluco pró-revolução verde. futuros profissionais das diversas áreas podendo contribuir com a extensão Neste ambiente de busca e construção universitária provocando mudanças na de novos conhecimentos, nasceu a sociedade, sobretudo quando feita com 11
  • 12. consciência e voltada para o exercício pleno do diálogo, da troca de experiências, de vivências compartilhadas entre academia e comunidade, proporcionando a reflexão e a ação, na busca da melhoria da qualidade de vida da comunidade e no efetivo papel da Universidade, que é de se abrir para além de seus muros e contribuir para o crescimento e melhoria da qualidade de vida da sociedade na qual se insere. No caso específico do Recôncavo baiano, além das culturas comerciais tradicionais, como a cana-de-açúcar, Figura 4: Teoria + Prática predomina a pequena produção, orientada para Assim pensando, observa-se que não a policultura alimentar (mandioca, feijão, basta adequar os sistemas de produção para a batata-doce, amendoim), a produção da laranja realidade local, agregar valor a seus produtos, e a do fumo. Todavia, a agricultura da região descobrir nichos de mercado e desenvolver apresenta-se em crise há várias décadas, com atividades não-agrícolas para complementação uma excessiva fragmentação da estrutura de renda. É preciso, além disso, que o fundiária, baixo nível tecnológico e processo produtivo em uso valorize esses organizacional das propriedades. Os saberes acumulados e garantam a indicadores sócio-econômicos também revelam sustentabilidade dos sistemas, com equidade as fortes carências que afetam a população social e de gênero. ocupada nas atividades agrícolas. Tal premissa vem ganhando corpo nos debates sobre o tema, culminando na compreensão de que o desenvolvimento rural é o resultado de uma série de transformações quantitativas e qualitativas que se produzem no meio rural no qual os efeitos convergentes produzem, com o tempo, uma elevação do nível de vida. Ressalte-se, contudo, que a visão do desenvolvimento apenas sob a ótica capitalista, que preconiza o crescimento econômico em detrimento dos demais segmentos (social, cultural e ambiental), precisa ser superada e dar lugar a uma outra que pressuponha o equilíbrio entre os mesmos. Figura 3: Recôncavo Baiano Do ponto de vista da agricultura familiar, do seu fortalecimento advém a base para o As ações implementadas em um estabelecimento de futuros sistemas sistema de produção agrícola e seus agroecológicos. A real sustentabilidade, como desdobramentos desempenham um papel dimensão completa, está fortemente relevante no suprimento de alimentos e na relacionada à aquisição de estabilidade geração de emprego e renda para a população ecológica, a qual pode ser obtida em sistemas rural. No entanto, para que essas atividades mais complexos de policultura, os mais afeitos possibilitem a melhoria das condições e adequados à gestão agroecológica. socioeconômicas, criando as condições Frente a este cenário, acreditamos que objetivas para a promoção da equidade social, um Encontro Regional de Agroecologia irá faz-se necessário que agricultores familiares contribuir para a articulação entre as Redes tenham acesso a tecnologias que Sociais e os estudantes. Objetivando a desempenhem esse papel como também consolidação de uma proposta de respeitem os saberes existentes e os transformação social, e um projeto que coloque conhecimentos acumulados pelas várias a Universidade a serviço da sociedade, criando gerações de camponeses e camponesas. um espaço de discussão, reflexão e proposição de ações que garantam estas transformações. 12
  • 13. Agriculturas Alternativas A década de 1920 constitui-se no marco que lhes permitam boa saúde e vitalidade, isto para o surgimento das primeiras experiências é, devem ser tratados como uma estrutura viva contrárias à adubação química, valorizando a e não simplesmente como a base a partir da utilização de práticas agrícolas qual será realizada a produção agrícola. Para potencializadoras dos processos biológicos na tanto, ampara-se no manejo dos solos, agricultura. A formulação dos primeiros fertilização e rotação de culturas, exclui o uso princípios de agricultura alternativa foi com a de insumos químicos. criação da Agricultura Biodinâmica, A Agricultura Natural apresentada Agricultura Orgânica, Agricultura Biológica como uma das vertentes mais restritivas e e da Agricultura Natural. radicais da agricultura alternativa, a Agricultura A agricultura orgânica traz como Natural está ancorada na filosofia de Masanobu princípio a redução ou exclusão do uso de Fukuoka e Mokiti Okada, da mínima fertilizantes químicos, agrotóxicos, indutores do intervenção no meio natural, tendo em vista crescimento, aditivos sintéticos para que as atividades agrícolas devem respeitar as alimentação animal. Além disso, se apóia em leis da natureza. Prega o princípio da práticas de rotação de culturas, uso de purificação, isto é, acredita-se que alimentos leguminosas, adubação verde, esterco animal, produzidos sem produtos químicos tóxicos controle biológico de pragas, entre outros. serão capazes de purificar o corpo. Opera com A agricultura biodinâmica entende a o método do não-fazer, recomendam não arar, propriedade agrícola como um organismo vivo, não revolver, não usar fertilizantes químicos ou em que todos os elementos estão conectados, compostos, não gradear, não usar agrotóxico apresentando dessa forma, um enfoque mais ou herbicida, controlar “invasores” com integrado da propriedade rural. No ano de 1924 métodos naturais ou cortes. De acordo com Steiner proferiu um ciclo de conferências que Ehlers (1999), na Austrália este método ficou estendeu os princípios da ciência espiritual conhecido como permacultura, cujo princípio é antroposófica à agricultura e forneceu a base o cultivo alternado de gramíneas e fundamental para estruturação da agricultura leguminosas, e a manutenção de palha como biodinâmica. O filósofo Steiner acredita que a cobertura do solo. Autores como Canuto (1998) agricultura sofre influências cósmicas e que e Paulus (1999) separam a agricultura natural forças espirituais interagem por meio de da permacultura apresentando-as como sendo energias sutis em plantas, animais e homens. constitutivas de duas correntes distintas. Algumas das práticas e formas de cultivo A Permacultura foi desenvolvida no recomendadas pela agricultura biodinâmica começo dos anos 70 pelos australianos Bill incluem a orientação pelo calendário Mollison e David Holmgren, como uma síntese biodinâmico que é indicativo das melhores das culturas ancestrais sobreviventes com os fases astrológicas do ano para as distintas conhecimentos da ciência moderna. A partir de fases das atividades agrícolas, integração da então, passou a ser difundida na Austrália, pecuária na agricultura, uso dos “preparados considerando que, naquele país, a agricultura biodinâmicos”, cercas vivas, aproveitamento de convencional já estava em decadência leguminosas no plantio consorciado de culturas adiantada, mostrando sinais de degradação mistas com cereais, dentre outras indicações. ambiental e perda de recursos naturais A Agricultura Biológica surge na Suíça irrecuperáveis. Na verdade, em situação muito na década de 1930, com Hans Müller, inventor similar à do Brasil de hoje. O projeto do modelo orgâno-biológico de produção permacultura envolve o planejamento, a agrícola. O político Muller centrou suas implantação e a manutenção conscientes de preocupações nos aspectos econômicos e ecossistemas produtivos que tenham a políticos que envolvem a produção de diversidade, a estabilidade e a resistência dos alimentos, entre eles, a autonomia de ecossistemas naturais. Ele resulta na produtores rurais e a comercialização da integração harmoniosa entre as pessoas e a produção. A agricultura biológica traz como um paisagem, provendo alimentação, energia e de seus princípios a idéia de que plantas e habitação, entre outras necessidades materiais animais devem ser colocados em condições e não materiais de forma sustentável. 13
  • 14. AGROECOLOGIA em movimento! As tentativas teóricas de construção da movimento maior de contestação a uma imagem da agricultura alternativa originaram realidade que precisa ser modificada. diferentes interpretações e representações quanto ao seu significado social. Na literatura referente à temática da agricultura alternativa percebem-se duas formas básicas de abordagem, aquelas que entendem as ações e as experiências em agroecologia a partir de “correntes de agricultura alternativa” e as análises que a explicam ou a associam à ideia da existência de um “movimento de agricultura alternativa”. Isto é, tem-se a dúvida se ela foi apenas produto do ideário de um restrito grupo de profissionais, comumente provenientes das ciências agrárias, construindo experiências Figura 5: Jornada de Agroecologia – Cascavel/PR. bastante localizadas, ou se realmente seria representativa de um movimento nascente na Essa percepção de que existe uma sociedade civil. A primeira idéia constituiu o que espécie de “crise” seria gerada a partir da está se chamando de “correntes de agricultura observação e da reflexão que a sociedade alternativa” e a segunda está associada à realiza sobre os processos de desenvolvimento existência de um movimento no sentido estrito em curso e seus efeitos. Nesse sentido, o de movimento social, cujos princípios de movimento de agricultura alternativa se identidade coletiva, adversário e objetivo diferenciaria das “correntes” por estar societal se fazem presentes. organizado em torno de propostas compartilhadas entre aqueles que visualizam As abordagens que entendem a em seus projetos a transformação da agricultura alternativa como “correntes”, sociedade. Estas construções teórico-analíticas geralmente caracterizam análises mais concebem o movimento de agricultura restritas, pois veem as ações direcionadas à alternativa como um momento mais agricultura alternativa como um conjunto de amadurecido das ações contestatórias na experiências esparsas, oriundas de orientações agricultura, e entendem que deveria diferenciá- filosóficas e teóricas distintas, que levam em lo de seu primeiro momento, ou seja, das consideração cuidados especiais com o meio formas e experiências construídas em oposição ambiente na produção agrícola, sem ao modelo de agricultura químico-mecanizado estabelecer a conexão dessas experiências que ocorreram antes da década de 1970. com processos sociais mais amplos. Estas perspectivas analíticas, que concebem Direcionando sua abordagem nesse agricultura alternativa a partir de “experiências” sentido, Ehlers (1999) refere-se às correntes de isoladas que originariam “correntes” distintas, agricultura alternativa como “movimentos possuem diversas orientações e abarcam uma rebeldes”, lembrando que somente a partir da diversidade de propostas, fundamentos década de 1970 passa a existir o movimento de teóricos e filosóficos, apresentando técnicas “agricultura alternativa”. Assim percebe-se que frequentemente semelhantes, mas raramente há uma demarcação analítico-conceitual feita coincidentes. Tais experiências dotadas por por Ehlers, pois ao definir essas correntes concepções de produção alternativas às como “movimentos rebeldes”, separa-as do convencionais podem ser segmentadas em movimento alternativo como movimento correntes de agricultura alternativa, compondo- proveniente de segmentos da sociedade civil se principalmente pela agricultura biodinâmica, organizada, mais articulado, com propostas orgânica, biológica, natural e permacultura. compartilhadas a nível mais abrangente. Considerando que o movimento da agricultura Por outro lado, há teóricos que alternativa se constrói diante dos percebem a agricultura alternativa como um desdobramentos da problemática sócio- 14
  • 15. ambiental motivada e aprofundada pela difusão englobam não somente a reorientação do do modelo produtivista resultante da agricultura processo produtivo em si, mas também convencional, químico-mecanizada, sugere mudanças nas relações sociais vigentes. que, deveria diferenciá-lo das experiências alternativas anteriores à ocorrência deste Muitas abordagens não incluem a processo. Entretanto, podem ser reconhecidos agroecologia como um elemento componente nesta definição dois momentos distintos e duas das “correntes” de agricultura alternativa. A formas de oposição estruturadas agroecologia se diferencia das demais diferentemente. O primeiro momento marca o correntes porque não consiste apenas em um período inicial de contestação aos princípios conjunto de técnicas, ela tem uma perspectiva básicos da agricultura químico-mecanizada, mais ampla de direcionamento do social, do dando impulso a diversas experiências econômico e do político que ultrapassa a contrárias a este padrão produtivo, “técnica” em si. Nessa perspectiva, a posteriormente, num segundo momento, certas agroecologia é concebida como uma área do ideias contidas nestas correntes fariam parte conhecimento, uma matriz disciplinar que juntamente com outros atores coletivos, de um fornece as bases científicas para a agricultura movimento com maior abrangência e alternativa, que veio reforçar, embasar e dar articulação e melhor estruturado do ponto de maior credibilidade às distintas formas de vista teórico- metodológico, denominado de contrapor a agricultura convencional. movimento de agricultura alternativa. A agroecologia surgiu, na concepção de Foi exatamente o movimento da Assis e Romeiro (2002), como uma resposta às agricultura alternativa que criou a designação críticas direcionadas às diversas correntes de de agricultura convencional relacionando-a ao agricultura alternativa, acusadas de ser uma padrão dominante na agricultura (EHLERS, tentativa retrógrada de volta ao passado na 1999). Para criar a ideia de contraposição a agricultura, proporcionando assim maior este padrão, de negação, organizou-se sob o sustentação teórica e metodológica aos signo do alternativo, englobando um conjunto procedimentos recomendados. Nesse sentido, de reflexões críticas, técnicas, práticas, não se pode identificar a agroecologia com correntes, experiências e propostas alternativas alguma corrente da “agricultura ecológica” visto para a agricultura, que divergiam das que aquela tem como princípio atender as premissas básicas do modelo de diversas dimensões da sustentabilidade, ou desenvolvimento dominante. seja, as dimensões ecológica, econômica, social, cultural, política e ética. Pode-se dizer que a diversidade de propostas e posicionamentos que abrange a Uma ciência “não neutra”, agricultura alternativa compreende desde a comprometida com a luta de classes e a mera orientação no sentido da redução do uso serviço das demandas populares, já que há em de insumos químicos na produção agrícola, até suas pesquisas e aplicações a claro intervenções que tendem a produzir posicionamento político. Faz crítica ao modelo transformações mais abrangentes, que de desenvolvimento, ao agronegócio e as transnacionais, questionando suas tecnologias, e integra várias áreas do conhecimento para elaborar propostas para o desenvolvimento sustentável. Nesse contexto, podemos identificar novos atores que estão construindo a agroecologia, principalmente a partir do início desse século, e que vão muito além dos conceitos e princípios das correntes de agricultura alternativa, passando também a ser uma importante ferramenta para os movimentos sociais. Como importante ator desse novo Figura 6: Grupos de Agroecologia, Fórum Social Mundial, Belém/PA, 2009. cenário, A Via Campesina é um movimento 15
  • 16. social internacional que coordena organizações implementados localmente por vários camponesas de pequenos e médios movimentos e comunidades que participam da agricultores, trabalhadores agrícolas, mulheres Rede. A ANA, Articulação Nacional da rurais e comunidades. Uma das principais Agroecologia, é a principal rede nacional de políticas da Via Campesina é a defesa da movimentos sociais e organizações da soberania alimentar, que é o direito dos povos sociedade civil voltadas a promoção da de decidir sobre sua própria política agrícola e agroecologia nas distintas regiões do pais, alimentar. Prioridade para uma produção de resultado de um processo de articulação social alimentos sadios, de boa qualidade e e política em 2002. culturalmente apropriados, para o mercado interno. É fundamental, então, manter um Para aumentar a correlação de forças sistema de produção camponês diversificado frente ao agronegócio e o neoliberalismo, é (biodiversidade, respeito à capacidade necessário a organização dessas redes e produtiva das terras, valor cultural, preservação articulações para construir uma unidade de dos recursos naturais). Desenvolve ações em luta, tendo clareza dos objetivos estratégicos, prol da agroecologia, como as Jornadas de potencializando a formação política dos Agroecologia, realizadas desde 2002 no estado militantes dessas organizações. Paraná e, criação das Escolas Latino A conclusão que podemos chegar é Americana de Agroecologia, uma no que, não são mais as correntes de agricultura assentamento do Contestado/MST, município alternativa que estão protagonizando as ações da Lapa, Paraná e outra na Venezuela. em torno da agroecologia, e sim organizações mais comprometidas com a luta de classes e A FEAB e ABEEF (organizações do que no início desse século passam a discutir a movimento estudantil que compõe a Via agroecologia como a ordem do dia. Campesina) possuem núcleos específicos para discussão da agroecologia e também promovem encontros, cursos, seminários e diversas outras atividades em torno dessa temática. O Movimento Sem Terra passa a discutir a Agroecologia como matriz tecnológica assim como os outros movimentos que também compões a Via Campesina passam a reconhecer a importância desse tema. Novas organizações nascem no século 21 como fóruns, redes e articulações no cenário da Agroecologia. A Rede Brasileira de Justiça Ambiental (RBJA) e o Fórum Brasileiro de Soberania Alimentar e Nutricional (FRBSAN), por exemplo, são articulações formadas por representantes de movimentos sociais, e sociedade civil organizada, sindicatos e pesquisadores/as de todo o Brasil, com a preocupação de animar um pensamento e uma ação que articulem as lutas ambientais com as lutas sociais, soberania alimentar e nutricional. Outro exemplo é a Rede Alerta Contra o Deserto Verde, uma ampla rede da sociedade civil, composto de entidades, movimentos sociais, preocupados com a venda de "créditos de carbono", ao mesmo tempo, a Rede tenta mostrar a viabilidade de modelos alternativas Figura 7: Agricultora Sem Terra preocupada com as futuras gerações. de desenvolvimento que têm sido 16
  • 17. Ciência e Tecnologia: Atuação do movimento estudantil nas universidades2 Nem sempre os acontecimentos durante ou aumentar a produtividade através da períodos históricos da humanidade foram tecnologia. explicados cientificamente, em vários Nesse processo a apropriação da momentos foram atribuídos a divindades, e nós ciência e tecnologia vem a servir para esse humanos não teríamos controle sobre isso. objetivo. Precisa produzir para se manter no Nem sempre foi algo tranquilo de aceitar-se. A mercado. fé e a ciência se chocam, isso vive na história Temos como exemplo a produção da há humanidade por muito tempo. cana-de-açúcar, em que está acontecendo a Existe um marco na história com o substituição do/as trabalhadores/as das advento do capitalismo, que surge sob um lavouras por máquinas; uma máquina substitui modo de produção, mas também como um em média 500 trabalhadores/as em muito conjunto de ideias. O debate de que não é algo menos tempo. E as tecnologias desenvolvidas exterior a nós que dá as respostas começa a por uma empresa não são reveladas para as crescer, e sim a ideia de que nós somos demais empresas, surgindo assim as leis de capazes de explicar muitas coisas. Neste patentes. A ciência e tecnologia passam então momento a humanidade é arrebatada de um a atender a lógica do capital. As consequências otimismo muito grande por não se sentir mais desse modelo têm levado a uma enorme perda obrigado a viver amordaçado algo externo a si. da biodiversidade; a super-exploração da força A partir dessas descobertas, com o de trabalho, aumento da violência devido a desenvolvimento tecnológico, a humanidade piora dos trabalhadores por conta do teve avanços incríveis. Um exemplo é na desemprego, ausência de condições de vida questão da mortalidade que havia e depois de digna; aumento da degradação ambiental e avanços o quanto diminuiu, aumentando a esgotamento dos recursos. Pois, os capitalistas expectativa de vida. Assim as pessoas não vão não tem projeto para a humanidade, só tem mais viver como antes, e nem vão mais querer projeto para manter seus lucros. Nesse sentido viver como antes. o sistema é contraditório, por não ter um A emancipação humana está projeto para humanidade, colocando sua estreitamente ligada ao desenvolvimento das própria existência em risco. forças produtivas, e a tecnologia é o que proporciona o desenvolvimento humano, e a emancipação do trabalho. É fundamental para desenvolver as condições dignas de vida da população, e se não tiver esses avanços o ser humano terá que trabalhar toda vida apenas para sobreviver. Porém, com o sistema capitalista que vivemos hoje, em um determinado momento a ciência e a tecnologia foram apropriadas pelo sistema para que este continue desenvolvendo a sua lógica, que é manter as taxas de lucro crescente se apropriando da força de trabalho, da mais valia, que é o trabalho não pago ao trabalhador. Para o capitalista se mantes no mercado ele estará sempre concorrendo com Figura 8: Congresso Internacional de cientistas pró-agrotóxicos os demais, e isso precisa vender mais que o concorrente, barateando o preço da mercadoria, aumentar a exploração do trabalho 2 Texto formulado para a cartilha “As Transnacionais nas universidade: a educação contra o povo” a partir da relatoria do debate ocorrido no espaço de formação dobre Ciência & Tecnologia na PNEB (Plenária Nacional de Entidades de Base) FEAB em Montes Claros/MG em abril de 2009. 17
  • 18. E para dentro da Universidade? com modelos antigos. Verificamos que nessa batalha os A Universidade é um dos espaços de melhores instrumentos que temos na trincheira produção da ciência e tecnologia. Na divisão pra popularização da universidade e contra a social do trabalho não é papel do Brasil pensar, hegemonia são os Grupo de Agroecologia, mesmo assim o Brasil ainda as Universidades Núcleos de Apoio à Reforma Agrária e alianças são espaços de pensar ciência e tecnologia, com movimentos sociais. talvez muito mais de reproduzir essa ideologia. Por isso devemos fortalecer esses Assim é nítida nas universidades a presença direcionamentos a ponto de ganharmos corpo das transnacionais, na bolsas pagas para para compormos uma frente contra- estudantes etc. E onde está o espaço para hegemônica, que é uma trincheira quem não quer trabalhar para o projeto das importantíssima para manter a chama da transnacionais? mudança acesa. E com tantas tecnologias como ainda Se fossemos debater “Ensino”, existem pessoas sem as condições mínimas de isoladamente, iríamos nos contradizer com alimentação? Como ainda existem tantas nossa concepção por não termos condições de doenças? É possível a ciência ser neutra? debater, assim como ressaltamos É possível ter esse espaços nas anteriormente, separadamente do debate universidades para além das transnacionais, amplo de educação, como faz o MEC. Temos onde se possa atuar de outra forma? Quais são hoje um ensino bancário que não liberta o esses espaços e como atuamos? Qual o papel estudante, uma pesquisa direcionada pelas da universidade na produção de ciência e transnacionais e uma extensão assistencialista. tecnologia? Como podemos atuar cercados Fica difícil apontarmos soluções diante pelo tripé Ensino, Pesquisa e Extensão? Se de uma estrutura sistematicamente feita para perguntarmos a um cubano como funciona a não funcionar diante diante dos anseios política de extensão nas suas universidades ele populares, por isso nossa tarefa se coloca em provavelmente não saberá responder. O conduzir este debate para nosso campo de pressuposto da extensão é que haja um centro atuação, a organização militante que porá as pesquisador que estenda seus resultados a um fórmulas tradicionais em cheque diante da plano externo, mas como lá as universidades mobilização e das demandas populares quando não tem “muros” não existe extensão, apenas aproximamos, de fato, o povo das educação, e tudo se envolvendo universidades. dialeticamente, teórica e praticamente nesse Para esse período de mobilizações processo em que o povo é o centro. Porém no devemos ressaltar nosso protagonismo na Brasil temos uma universidade alicerçada no organização das lutas contra a fundações de tripé Ensino, Pesquisa e Extensão. Dá para Apoio às Universidades e denúncia de gastos dizer se trata de um avanço ou não? com pesquisas privadas. Acreditamos que não é o caso, e não Para pesquisa devemos contrapor a devemos comparar com Cuba, mas deveremos fórmula excludente de saberes cunhada pela tê-la como exemplo. Como esse tripé como academia. Nesse âmbito aproximaremos as devemos disputar uma extensão, ainda que pautas populares ao passo que destacamos as formas tradicionais de fazer ciência popular. Algumas universidades apresentam mais espaço para pesquisa direcionada para o movimentos sociais e outras menos. Isso está relacionado com professores que apoiam e com a direção da universidade. Mesmo onde existem iniciativas de agroecologia por parte das universidade, e colocado como algo não antagônico ao agronegócio. As transnacionais entram nas universidades com um debate de consciência ambiental, de contribuição com a pesquisa e abertura de mercado de trabalho. Figura 9: Encontro Nacional de Grupos de Agroecologia – ENGA – Curitiba/PR, 2009 18
  • 19. E agora? através do estudo conectando nos com a organização e um objetivo de luta, sem esquecer que o momento de se forjar uma educação coletivo nas lutas é o memento de incorporar novos valores fraternos, novas relações de gênero, culturais e sociais; assim traremos novas relações sociais e concretas teorias. Nesses casos temos que temperar muito bem nossas formas de organização com certa inserção nas instituições, concelhos e assembleias, mas sempre com o objetivo de ampliar as lutas. Essa balança só se dará com a experimentação de cada organização nas lutas. Além disso, nunca poderemos perder de Figura 10: Ocupação Reitoria em Cruz das Almas/BA, UFRB, 2008. vista a intenção de massificar as lutas. Para seguirmos em marcha na construção de uma outra sociedade é necessário irmos acumulando experiências organizativas dentro do sistema onde atuamos neste momento. As experiências organizativas se dão no momento onde forjamos na luta um caráter de educação coletiva e com perspectivas mais amplas. Nessa tarefa devemos combater o formato moderno e individualista regido pelo jargão “faça sua parte”, propondo uma análise crítica, dialética e coletiva. O capitalismo não domina a sociedade absolutamente. A realidade é dialética. O modelo domina, é hegemônico, mas não domina exatamente como ele quer. Vamos tendo nossas conquistas dentro do próprio sistema e acumulando para a sua superação, mas somente com duras lutas e mobilizações. A opinião dos estudantes ao longo da história ganhou um grande respaldo da sociedade, pois por diversos motivos, inclusive excludentes, Figura 11: ATO público FEAB e ABEEF, Piracicaba/SP, 2009. adquiriu uma condição privilegiada com relação ao acesso a informação. Por isso, mesmo que E com esse espírito que nós devemos não sejamos numerosos temos que aproveitar encarar essa tarefa. Sabemos que não é fácil esse fator para colocar em xeque a atuação enfrentar aqueles que são os donos do poder das universidade. dentro do nosso palco de atuação, que é a Quanto aos espaços institucionais universidade, mas acima de tudo sabemos que devemos ter muita cautela, eles não devem ser não há transformação sem luta. O nosso papel, “o fim” da nossa luta, mas sim um espaço para enquanto movimento estudantil combativo, é massificação das lutas. Devemos estar em abraçar esse compromisso de não calar diante todos os ambientes e levar em mente que uma dessa situação e de enxergar que somos nós experiência na luta concreta que extrapola a que podemos criar esse contraponto que, instituição é sempre mais educativa para as passo a passo, pode permitir o desmonte do massas, como dizia Lenin. controle ideológico hegemônico que hoje se Nesse processo coletivo de organização instala dentro da universidade. A tarefa não é temos por tarefa intensificar nossa formação fácil, mas é necessária. 19
  • 20. Experiência em Agroecologia: Agricultura Familiar no Semi-Árido. Alda Cunha3 A concentração de água no semi-árido é inserta, variando de ano para ano. Em alguns anos a terra é irrigada, a produção e reservatórios são enchidos, porém, em outro anos a água é escassa, os roçados não produzem. Com a necessidade de sobrevivência, algumas plantas típicas da região se adaptaram com a falta de chuva, e algumas delas têm reserva para períodos da seca. Por a região ser mais seca, é muito difícil do solo reter água da chuva, e geralmente as que ficam retidas se tornam salgadas com a diminuição do fluxo da água. É normal o escoamento superficial e a erosão da terra pelo impedimento de absorção dessas. Esta situação levou as famílias à procura de uma solução para o período de seca. Armazenar água das chuvas retardou um pouco a sede, mas não é suficiente para todos os usos necessários. Além do mais, não há filtração adequada para o consumo, sendo contaminada muito frequentemente, pelo uso de várias comunidades e animais na mesma água. Então como suprir a necessidade suficiente de água, assegurando qualidade para o consumo das famílias produtoras? Uma saída seria a construção de infra-estrutura para o armazenamento de água, afastando as famílias e as comunidades da seca. Porém as políticas públicas preferem suprir as necessidades do semi-árido com a distribuição de água por carros pipas e cestas básicas, manobras que além de insuficientes são pouco eficazes por serem limitados e não alcançando a maior parte da população. O pólo sindical e das organizações da agricultura familiar da Borborema em parceria com a AS-PTA, vem estimulando e aprimorando as experiências desenvolvidas pelas famílias na região. A formação de agricultor para agricultor através de visitas de intercâmbio, foi o caminho encontrado e que levou muitas famílias a fortalecerem as experiências de captação armazenamento e um bom manejo de água em suas propriedades. Experiência no semi-árido: maneira de armazenamento quando o seu Zé de Pedro e Dona Maria do Carmo chegaram a suas terras, perceberam que ao cair da chuva, as águas desciam rapidamente pelo roçado. Para um melhor aproveitamento eles decidiram impedir o escoamento total da água plantando faixas de capim e implantando barreiras de pedras, diminuindo assim a velocidade da água. O capim que começou a crescer pode também alimentar os animais. A partir disso em 2000 a família constitui com seus próprios recursos uma barragem subterrâneo, que foi pensada para segurar a terra e a água que descia. Hoje no local se cultiva plantas para a alimentação da família e para seu sustento. Desta mesma forma fez o senhor João Miranda e Dona Terezinha, onde antes só existia um deserto, a terra era seca e rachada, a família fez brotar esperança. Além de construírem leirões atravessados para melhor aproveitamento de água, constituíram barreiras de pedras para filtrar a água e segurar a terra. Para seu Inácio Tato, a barragem subterrânea possui inúmeras vantagens em relação às outras barragens com espelho d’água. A grande diferença, é que ela fica cheia, pios a água não aparecendo, diminui-se o efeito ao vento e do solo, evitando evaporação. Zé Pedro e Maria do Carmo além bom manejo da água e solo na propriedade, se preocupavam com outra água. Construiu uma cisterna de placas, que é cuidada e limpa diariamente por dona Maria e sua filha, com capacidade de armazenar 16 mil litros de água, por também recolher a água da chuva. 3 Graduanda de Tecnologia em Agroecologia da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia - UFRB 20
  • 21. Através das cisternas de placas, os moradores da seca, obtiveram água limpa para seu consumo, além disso, fazem uso deste em casa, para os animais, e para o alto sustento dessas famílias que irrigam suas hortaliças, frutos e verduras, para poderem vender-las nas feiras de rua ou feiras agroecológicas. Os irmãos Maciel, observaram que a folha da orquídea pode funcionar como uma bica, então colocou um tonel debaixo pra reservar água. Uma só chuva já da pra encher o tonel, e a água é aproveitada em casa. A barragem subterrânea é construída em rios ou riachos abertos que ficam vazios no verão. Abre-se uma valeta, até encontrar um chão duro. Depois com lona ou barro batido, fecha- se a valeta para que não passe água. Assim forma-se um lençol de água podendo plantar no local ou até abrir poços para usar essa água no consumo familiar ou das plantas. Seu Ramiro, que antes trabalhava de meia ou alugada, hoje tem sua independência. Planta suas verduras e hortaliças, cuida da produção e sustenta toda família, graças a essa barragem subterrânea que descobrir em uma visita de intercâmbio. A mandala, com um poço com 1 metro e meio de fundura, em forma de funil, serve para irrigação, criar peixes, marrecos e galinhas, um sistema integrado. O farelo de milho alimenta o marreco, e as sobras servem de comida para as galinhas, as fezes dos marrecos servem de ração para engorda dos peixes e a água irriga as plantas. Tudo isso melhora as condições de vida. Organização da comunidade: as famílias, igrejas, movimentos sociais e sindicais e as organizações das comunidades apostam nas práticas tradicionais de organizações através das práticas coletivas. Mas as políticas públicas governamentais em vez de fortalecerem estas dinâmicas locais, contribuem para desestrutura-las na medida que negariam este espaço de organização, e incentivam a criação de associações legais para gerar projetos governamentais sem a devida participação das famílias na proposição de suas ações de gestão. Muitas comunidades resistiram e foram fortalecidas com o trabalho das ações de convivência com o semi-árido desenvolvido na região. Uma solução imediata foi a construção das cisternas de placas, mas os recursos tornaram- se mínimos diante de tantas famílias. Foi criado então, neste caso, um fundo rotativo, com participação inicial de 30 a 90 famílias que necessitavam do benefício. Foi decidido que cada família pagaria 20 reais por mês. Passaram então a sortear cisternas por mês, e em 20 meses foram construídas 20 cisternas, contemplando todos os participantes do primeiro grupo. O sucesso da experiência logo mobilizou outras famílias da comunidade, e em 4 anos a comunidade que recebeu recursos para 35, chegaram a construir mais de 77 cisternas com a arrecadação local totalizando 112 unidades. Ou seja, triplicou o recurso inicial. No semi árido é possível viver bem. O problema maior não estar na falta de água, pois sentem anos de muita chuva. Nos anos que chove pouco, ainda é possível juntar água, bons exemplos foram mostrados pelos agricultores em seus depoimentos. O maior problema é a falta de uma política que de condições às famílias de estruturar melhor suas propriedades, para captar e armazenar a água da chuva e dela tirar seu sustento. Como a água parte de casa, as famílias despertam crença em um novo jeito de relacionar-se com a natureza para melhorar o sistema de produção. 21
  • 22. CANCIONEIRO Sobradinho Capim Guiné Sá e Guarabyra Raul Seixas / Wilson Aragão O homem chega, já desfaz a natureza Plantei um sítio No sertão de Piritiba Tira gente, põe represa, diz que tudo vai mudar Dois pés de guataiba O São Francisco lá pra cima da Bahia Caju, manga e cajá Peguei na enxada Diz que dia menos dia vai subir bem devagar Como pega um catingueiro E passo a passo vai cumprindo a profecia do Fiz acero, botei fogo beato que dizia que o Sertão ia alagar "Vá ver como é que tá" Tem abacate, jenipapo O sertão vai virar mar, dá no coração E bananeira O medo que algum dia o mar também vire Milho verde, macaxeira sertão Como diz no Ceará Cebola, coentro Adeus Remanso, Casa Nova, Sento-Sé Andu, feijão-de-corda Adeus Pilão Arcado vem o rio te engolir Vinte porco na engorda Até o gado no currá Debaixo d'água lá se vai a vida inteira Com muita raça Por cima da cachoeira o gaiola vai, vai subir Fiz tudo aqui sozinho Vai ter barragem no salto do Sobradinho Nem um pé de passarinho Veio a terra semeá E o povo vai-se embora com medo de se Agora veja afogar. Cumpadi, a safadeza Remanso, Casa Nova, Sento-Sé Cumeçô a marvadeza Todo bicho vem prá cá Pilão Arcado, Sobradinho Num planto capim-guiné Adeus, Adeus ... Pra boi abaná rabo Eu tô virado no diabo Eu tô retado cum você Tá vendo tudo E fica aí parado Asa Branca Cum cara de viado Luiz Gonzaga / Humberto Teixeira Que viu caxinguelê Suçuarana só fez perversidade Pardal foi pra cidade Quando oiei a terra ardendo Piruá minha saqüé Qüé! Qüé! Qual a fogueira de São João Dona raposa Eu preguntei a Deus do céu,ai Só vive na mardade Por que tamanha judiação Me faça a caridade Se vire e dê no pé Que braseiro, que fornaia Sagüi trepado Nem um pé de prantação No pé da goiabeira Por farta d'água perdi meu gado Sariguê na macaxeira Tem inté tamanduá... Morreu de sede meu alazão Minhas galinha Inté mesmo a asa branca Já num fica mais parada E o galo de madrugada Bateu asas do sertão Tem medo de cantá "Intonce" eu disse adeus Rosinha Num planto capim-guiné Guarda contigo meu coração Pra boi abaná rabo Eu tô virado no diabo Hoje longe muitas légua Eu tô retado cum você Numa triste solidão Tá vendo tudo Espero a chuva cair de novo E fica aí parado Cum cara de viado Pra mim vortar pro meu sertão Que viu caxinguelê Quando o verde dos teus óio Num planto capim-guiné Pra boi abaná rabo Se espanhar na prantação Eu tô virado no diabo Eu te asseguro não chore não, viu Eu tô retado cum você Que eu vortarei, viu Tá vendo tudo E fica aí parado Meu coração Cum cara de viado Que viu caxinguelê 22
  • 23. Prá se bater A Vida do Viajante Com poder lá do sertão Luiz Gonzaga e Hervê Cordovil Mas lampião disse Que contra o flagelo Minha vida é andar Tem que lutar Por esse país Comparabelo na mão... Pra ver se um dia É Lamp, é Lamp, é Lamp Descanso feliz É Lampião Guardando as recordações Meu candeeiro encantado... Das terras por onde passei Falta o cristão Andando pelos sertões Aprender com São Francisco E dos amigos que lá deixei. Falta tratar Chuva e sol O nordeste como o sul Poeira e carvão Falta outra vez Longe de casa Lampião, trovão, corisco Sigo o roteiro Falta feijão Mais uma estação Invés de mandacaru E a saudade no coração Falei!... Minha vida é andar... Falta a nação Mar e terra Acender seu candeeiro Inverno e verão Faltam chegar Mostra o sorriso Mais Gonzagas lá de Exú Mostra a alegria Falta o Brasil Mas eu mesmo não De Jackson do Pandeiro E a alegria no coração Maculêlê, Carimbó, Maracatu... Minha vida é andar... A Massa - Raimundo Sodré Candeeiro Encantado - Lenine A dor da gente é dor de menino acanhado Lá no sertão Menino-bezerro pisado no curral do mundo a penar Cabra macho não ajoelha Que salta aos olhos igual a um gemido calado Nem faz parelha A sombra do mal-assombrado é a dor de nem poder Com quem é de traição chorar Moinho de homens que nem jerimuns amassados Puxa o facão, risca o chão Mansos meninos domados, massa de medos iguais Que sai centelha Amassando a massa a mão que amassa a comida Porque tem vez Esculpe, modela e castiga a massa dos homens Que só mesmo a lei do cão... normais É Lamp, é Lamp, é Lamp É Lampião Quando eu lembro da massa da mandioca mãe, da Meu candeeiro encantado massa Meu candeeiro encantado... When I remember of "massa" of manioc Enquanto a faca não sai Nunca mais me fizeram aquela presença, mãe Toda vermelha Da massa que planta a mandioca, mãe A massa que eu falo é a que passa fome, mãe A cabroeira A massa que planta a mandioca, mãe Não dá sossego não Quand je rappele de la masse du manioc, mére Revira bucho Quando eu lembro da massa da mandioca Estripa corno, corta orelha Lelé meu amor lelé no cabo da minha enxada não Quem nem já fez conheço "coroné" Virgulino, o Capitão... Eu quero mas não quero (camarão). Minha mulher É Lamp, é Lamp, é Lamp na função (camarão) É Lampião Que está livre de um abraço, mas não está de um Meu candeeiro encantado beliscão Meu candeeiro encantado... Torna a repetir meu amor: ai, ai, ai! É que o guarda civil não quer a roupa no quarador Já foi-se o tempo Meu Deus onde vai parar, parar essa massa Do fuzil papo amarelo 23
  • 24. Cio da Terra Xote Ecológico Chico Buarque e Milton nascimento Luíz Gonzaga Debulhar o trigo Não posso respirar, não posso mais nadar Recolher cada bago do trigo A terra está morrendo, não dá mais pra plantar Forjar no trigo o milagre do pão Se planta não nasce se nasce não dá E se fartar de pão Até pinga da boa é difícil de encontrar Decepar a cana Cadê a flor que estava aqui? Recolher a garapa da cana Poluição comeu. Roubar da cana a doçura do mel E o peixe que é do mar? Se lambuzar de mel Poluição comeu Afagar a terra E o verde onde que está ? Conhecer os desejos da terra Poluição comeu Cio da terra, a propícia estação Nem o Chico Mendes sobreviveu E fecundar o chão Jumento Celestino Foguete De Reis (ou A Guerra) Mamonas Assassinas Cordel Do Fogo Encantado (De quem é esse jegue? No derradeiro luar De quem é esse jegue? O sol saiu De quem é esse jegueee... Ô rapaz! Um trovão avermelhado Não é jegue não, é jumentio!) O sol saiu Tava ruim lá na Bahia, profissão de bóia-fria Solta fogo do passado Trabalhando noite e dia, num era isso que eu queria O sol saiu Eu vim-me embora pra "Sum Paulo", No peito de quem tá vivo Eu vim no lombo dum jumento com pouco Salva conhecimento Eu quero ver rodar Enfrentando chuva e vento e dando uns peido fedorento (vish) A planta que vingará Até minha bunda fez um calo O sol saiu Chegando na capital, uns puta predião legal O medo de lampião As mina pagando um pau, mas meu jumento tava O sol saiu mal As dores de Iemanjá Precisando reformar O sol saiu Fiz a pintura, importei quatro ferradura E a lua quilariou Troquei até dentadura e pra completar a belezura E eu vi o meu amor Eu instalei um Road-Star! Dentro do canaviá Descendo com o jumento na mó vula E haja guerra e haja guerra Ultrapassei farol vermelho e dei de frente com uma mula Haja guerra no ar Saí avuando, parecia um foguete Boa noite senhor e senhora Só não estourei meu côco pois tava de capacete Eu cheguei agora Me alevantei, o dono da mula gritando Me preste atenção O povo em volta tudo olhando e ninguém pra me Nesse mundo de fogo e de guerra socorrer O santo da terra Fugi mancando e a multidão se amontoando Tem calo na mão Em coro tudo gritando: "Baiano, cê vai morreêeê !" Depois desse sofrimento, a maior desilusão Pra aumentar o meu lamento, foi-se embora meu jumento E me deixou c'as prestação E hoje eu tô arrependido de ter feito imigração Volto pra casa fudido, com um monte de apelido O mais bonito é cabeção! 24
  • 25. Sociedade Alternativa Pra Não Dizer Que Não Falei Das Flores Raul Seixas Geraldo Vandré Viva! Viva! Viva A Sociedade Alternativa Caminhando e cantando E seguindo a canção Se eu quero e você quer Somos todos iguais Tomar banho de chapéu Braços dados ou não Nas escolas, nas ruas Ou esperar Papai Noel Campos, construções Ou discutir Carlos Gardel Caminhando e cantando Então vá! E seguindo a canção... Faz o que tu queres Vem, vamos embora Pois é tudo Que esperar não é saber Da Lei! Da Lei! Quem sabe faz a hora Viva! Viva!Viva A Sociedade Alternativa... Não espera acontecer...(2x) "-Faz o que tu queres Pelos campos há fome Há de ser tudo da Lei" Em grandes plantações Viva! Viva! Pelas ruas marchando Indecisos cordões Viva A Sociedade Alternativa Ainda fazem da flor "-Todo homem, toda mulher Seu mais forte refrão É uma estrêla" E acreditam nas flores Viva! Viva! Vencendo o canhão... Viva A Sociedade Alternativa Vem, vamos embora (Viva! Viva!) Que esperar não é saber Viva! Viva! Quem sabe faz a hora Viva A Sociedade Alternativa Não espera acontecer...(2x) Han!... Há soldados armados Mas se eu quero e você quer Amados ou não Quase todos perdidos Tomar banho de chapéu De armas na mão Ou discutir Carlos Gardel Nos quartéis lhes ensinam Ou esperar Papai Noel Uma antiga lição: Então vá! De morrer pela pátria Faz o que tu queres E viver sem razão... Pois é tudo Vem, vamos embora Da Lei! Da Lei! Que esperar não é saber Viva! Viva! Viva A Sociedade Alternativa Quem sabe faz a hora Viva! Viva! Não espera acontecer...(2x) Viva A Sociedade Alternativa... Nas escolas, nas ruas Campos, construções "-O número 666 Somos todos soldados Chama-se Aleister Crowley" Armados ou não Viva! Viva! Caminhando e cantando Viva! A Sociedade Alternativa E seguindo a canção "-Faz o que tu queres Somos todos iguais Há de ser tudo da lei" Braços dados ou não... Viva! Viva! Os amores na mente Viva! A Sociedade Alternativa As flores no chão "-A Lei de Thelema" A certeza na frente Viva! Viva! A história na mão Caminhando e cantando Viva A Sociedade Alternativa E seguindo a canção "-A Lei do forte Aprendendo e ensinando Essa é a nossa lei Uma nova lição... E a alegria do mundo" Vem, vamos embora Viva! Viva! Que esperar não é saber Viva A Sociedade Alternativa Quem sabe faz a hora (Viva! Viva! Viva!)... Não espera acontecer...(4x) 25
  • 26. Stab Cidadão Marcelo D2 Edson e Hudson Eu me apresento em alto e bom som, para que todos Tá vendo aquele edifício, moço? possam ouvir.Cara sagaz e cascudo, direto do Andaraí. Ajudei a levantar Eu vou do M para o A,para o R, para o C, para o E, para o L, para o O, espaço, D, 2:sempre representando o hip- Foi um tempo de aflição, era quatro condução hop. Não tem Faustão nem Gugu eu sou o primeiro do Duas pra ir, duas pra voltar Ibope. Revolução eu vou fazer de maneira diferente: tiro o Hoje, depois dele pronto ódio do coração e tento usar mais a mente. Botam Olho pra cima e fico tonto barreiras no caminho mas sou persistente. Posso cair, mas me levanto e sigo em frente. Seguro a bronca, dou Mas me vem um cidadão um 2 e mantenho a calma. Se eu vacilar, um filho da puta Que me diz desconfiado: rouba a minha alma. Cê tá ai admirado, ou tá querendo roubar? Entra Fernando e sai Fernando e quem paga é o povo, Meu domingo está perdido que pela falta de cultura vota nele de novo. E paga caro, Vou pra casa entristecido com corpo e calma, e entrega nas mão de um pastor, pra ver se salva. Com a barriga vazia não conseguem pensar. Dá vontade de beber Eu peço proteção a Deus e a Oxalá. De infantaria que eu E pra aumentar meu tédio sou e to na linha de frente. Rio de Janeiro, fim de século, Eu nem posso olhar pro prédio a chapa tá quente! Que eu ajudei a fazer Vários irmãos se recolhem, vão em frente. Vários também Tá vendo aquele colégio, moço? escravizam sua mente. Eu sei bem, quebro a corrente, e Eu também trabalhei lá onde passo planto a minha semente. Lá eu quase me arrebento Gafanhotos nunca tomam de quem tem, predadores Fiz a massa, pus cimento senhores que mentem. Esperem sentados a rendição, Ajudei a rebocar nossa vitória não será por acidente. Minha filha inocente Voltar rimando na batida cumpadi, é só prá quem pode. Veio pra mim toda contente: Corpo fechado, rima acesa, cumpadi, ninguém me fode. O Pai, vou me matricular bumbo bate forte, só escapa quem tem sorte. Misturo hip- Mas me diz um cidadão: hop e samba com sangue da zona norte. Tão impressionante quanto o b-boy rodando, não deixo Criança de pé no chão aqui não pode estudar queimarem o meu filme, eu tou sempre me valorizando. Essa dor doeu mais forte Revolução? Quem sabe faz na hora e fica antenado. Nem Nem sei porque deixei o norte tudo o que reluz é ouro, nem televisionado. Eu tou de aqui Então me pus a dizer de passagem, mas não vim a passeio. De ciclos em ciclos Lá a seca castigava percorro o meu caminho sem receios. O meu discurso tem recheio. Acerto em cheio e creio que o nosso destino mas o pouco que eu plantava final é estar em paz no seio do universo. Campo de visão tinha direito a colher aberto. Minha serenidade eu conservo com versos. Tá vendo aquela igreja, moço? Converso com meus netos, como preto velho que sou, sei Onde o padre diz amém daonde vim e sei pra onde vou. Na moral! Com papel e caneta te forneço o material prá feitura do seu alvará de Pus o sino e o badalo soltura espiritual. Não cesse suas preces. Pensamentos Enchi minha mão de calo negativos são como fezes: infestam todo o lugar, à Lá eu trabalhei também procura de alguém que os considere, que os preze. Por Mas ali valeu a pena isso delete informações desse naipe do seu leque. E siga Tem quermesse, tem novena para o alto, ao som hipnótico do stab! Eu levo a vida e não sou levado por ela. Na luta, um bom E o padre me deixa entrar guerreiro nunca amarela. Pra "mim" poder crescer, me Foi lá que Cristo me disse: deixe enlouquecer, só você sabe o que é melhor para Rapaz, deixe de tolice você. Eu ergo o peito e vou em frente na parada, não sou não se deixe amedrontar controlado e durmo com alma lavada. Sigo o meu caminho e tranco ele sozinho. Eu mato a cobra e ainda fui eu quem criou a terra dou bico no ninho. Vários irmão se recolhem, vão em enchi os rios e fiz as serras frente. Vários também escravizam sua mente. Eu sei bem, não deixei nada faltar quebro a corrente, e onde passo planto a minha semente. hoje o homem criou asas E na maioria das casas Gafanhotos nunca tomam de quem tem predadores, senhores que mentem. Esperem sentados a rendição. Eu também não posso entrar Nossa vitória não será por acidente. Represento o que sou, com quem ando, onde vou. Traço bem meu caminho, Hip Hop Rio. 26
  • 27. Presente De Um Beija Flor Árvore Natiruts Edson Gomes Beija-flor que trouxe meu amor Vem me regar mãe Voou e foi embora Vem me regar Olha só como é lindo meu amor Vem me regar mãe, êa Estou feliz agora Vem em regar Veja só a névoa branca que sai de trás do Todo santo dia bambuzal Pois todo dia é santo Será que ela me faz bem ou será que me faz E eu sou mal Uma árvore bonita Eu vou surfar no céu azul de nuvens doidas Que precisa ter seus cuidados Da capital do meu país Me regar mãe Pra ver se esqueço da pobreza e violência Vem me regar Que deixa o meu povo infeliz Vem me regar mãe, êa Beija-flor que trouxe meu amor Vem em regar Voou e foi embora E ando sobre a terra Olha só como é lindo meu amor E vivo sob o sol Estou feliz agora E as, e as minhas raízes E a menina que um dia por acaso veio me dizer Eu balanço Que não gostava de meninos tão largados Eu balanço Que tocam reggae e MPB Eu balanço Mas isso é coisa tão banal perto da beleza do Me regar mãe Planalto Central Vem me regar E das pessoas que fazem do Cerrado Vem me regar mãe, êa O habitat quase ideal Vem em regar Beija-flor que trouxe meu amor Voou e foi embora Olha só como é lindo meu amor Forró com Reggae Estou feliz agora Estakazero Agradeço por está aqui Manisfestar a emoção Não sei de nada sou um eterno aprendiz E coloca minhas idéias, sentimentos O som que agrada amigo é você quem diz Em forma de canção E eu assumo agora tudo que fiz fiz só Agradeço por poder cantar E esse som é diferente eu sei eu não fiz nada amigo E ver você ouvir só inovei E tentar entender essa mensagem Estakazero amigo esse é meu forte Que eu quero transmitir Meu Bob Marley se chamava Luiz não era rei do Beija-flor que trouxe meu amor reggae e sim do baião Voou e foi embora Minha Jamaica é o nordeste o sertão Olha só como é lindo meu amor É o som da terra Regue o pé da serra que nasce o forró Estou feliz agora Forró pesado xote colado e a menina na ponta do Fim de ano vou embora de Brasília que é pra pé eu ver o mar È cantica reggae forró com reggae é o que faz a Mas diz pra mãe lá pro final de fevereiro é que poeira subir eu vou voltar Forró pesado xote colado e a menina na ponta do Que é pra surfar no céu azul de nuvens doidas pé Da capital do meu país È cantica reggae forró com reggae venha se Pra ver se esqueço da pobreza e violência entregue e vamos fugir. Que deixa o meu povo infeliz Beija-flor que trouxe meu amor Voou e foi embora Olha só como é lindo meu amor Estou feliz agora 27
  • 28. É fogo Lenine Não é Sério Negra Li Éramos uma pá de apocalípticos, De meros hippies, com um falso alarme... Eu vejo na TV o que eles falam sobre o jovem não é Economistas, médicos, políticos sério Apenas nos tratavam com escárnio. O jovem no Brasil nunca é levado a sério Nossas visões se revelaram válidas, Sempre quis falar E eles se calaram mas é tarde. Nunca tive chance As noites tão ficando meio cálidas... Tudo que eu queria E um mato grosso em chamas longe arde Estava fora do meu alcance O verde em cinzas se converte logo, logo... Sim, já É fogo! é fogo! Já faz um tempo Éramos uns poetas loucos, místicos Mas eu gosto de lembrar Cada um, cada um Éramos tudo o que não era são; Cada lugar, um lugar Agora são com dados estatísticos Eu sei como é difícil Os cientistas que nos dão razão. Eu sei como é difícil acreditar De que valeu, em suma, a suma lógica Mas essa porra um dia vai mudar Do máximo consumo de hoje em dia, Se não mudar, prá onde vou... Duma bárbara marcha tecnológica Não cansado de tentar de novo E da fé cega na tecnologia? Passa a bola, eu jogo o jogo Há só um sentimento que é de dó e de Malogro... Eu vejo na TV o que eles falam sobre o jovem não é É fogo... é fogo... sério O jovem no Brasil nunca é levado a sério Doce morada bela, rica e única, A polícia diz que já causei muito distúrbio Dilapidada só como se fôsseis O repórter quer saber porque eu me drogo A mina da fortuna econômica, O que é que eu uso A fonte eterna de energias fósseis, Eu também senti a dor O que será, com mais alguns graus celsius, E disso tudo eu fiz a rima De um rio, uma baía ou um recife, Agora tô por conta Ou um ilhéu ao léu clamando aos céus, se os Pode crer que eu tô no clima Mares subirem muito, em tenerife? Eu tô no clima.... segue a rima E dos sem-água, o que será de cada súplica, Revolução na sua vida você pode você faz De cada rogo Quem sabe mesmo é quem sabe mais Revolução na sua mente você pode você faz É fogo... é fogo... Quem sabe mesmo é quem sabe mais Em tanta parte, do ártico à antártida Revolução na sua vida você pode você faz Deixamos nossa marca no planeta: Quem sabe mesmo é quem sabe mais Aliviemos já a pior parte da Também sou rimador, também sou da banca Tragédia anunciada com trombeta. Aperta muito forte que fica tudo a pampa O estrago vai ser pago pela gente toda; Eu to no clima! Eu to no clima ! Eu to no clima É foda! é fogo!... Segue a Rima! É a vida em jogo! (repete tudo) Sempre quis falar.... "O que eu consigo ver é só um terço do problema É o Sistema que tem que mudar Não se pode parar de lutar Se não não muda A Juventude tem que estar a fim Tem que se unir O abuso do trabalho infantil, a ignorância Só faz diminuir a esperança Na TV o que eles falam sobre o jovem não é sério entao Deixa ele viver. É o que Liga" 28
  • 29. Não quero flores jogadas Em meu peito Quero a força das águas Que fogem do leito. Quero a magia da vida Que corre nas mãos. Quero o sangue jorrado  Dos mártires Assassinados por quem Não aprendeu a lição. A lição da vida é amar, Sonhar com o mundo de utopia Onde o povo fique nos tópicos, Não jogados nos becos, nos guetos. Sonho a vida brotando das frestas Como orquídeas, bromélias do campo. Quero a vida brotando das frestas Das lacunas que o sistema deixou, Perfumando cada palmo Deste sonhado chão Que um dia há ser habitado Por um mundo de irmãos Amauri Adolfo agricultor agroecológico poeta Do Livro Redemoinho 29
  • 30. ANEXOS 30
  • 31. A questão de gênero no desenvolvimento agroecológico Maria Emília Lisboa Pacheco4 As mulheres adquiriram historicamente um vasto saber dos sistemas agroecológicos. Desempenham importante papel como administradoras dos fluxos de biomassa, conservação da biodiversidade e domesticação das plantas, demonstrando em muitas regiões do mundo um significativo conhecimento sobre as espécies de recursos genéticos e fitogenéticos, e assegurando por meio de sua atividade produtiva as bases para a segurança alimentar. Nas últimas décadas, esse reconhecimento passou a manifestar-se em fóruns e acordos internacionais. A Convenção da Diversidade Biológica, por exemplo, menciona o “papel fundamental da mulher na conservação e na utilização sustentável da diversidade biológica, afirmando a necessidade de sua plena participação em todos os níveis de formulação e execução de políticas para a conservação da diversidade biológica”.5 Esse papel é tão mais importante quando consideramos que a conservação e o uso da biodiversidade constituem-se como ponto-chave para a defesa da agricultura e do agroextrativismo familiar, bem como, simultaneamente, que a biodiversidade é protegida pela diversidade cultural. As influências sobre o pensamento agroecológico estão ancoradas nas ciências agrícolas, no movimento ambientalista, na ecologia, na antropologia, nos estudos sobre desenvolvimento. Só nos últimos anos, porém, a perspectiva de gênero vem sendo associada ao debate agroecológico. O conceito de relações sociais de gênero, uma conquista das lutas feministas, trouxe várias contribuições para a explicação teórica da opressão das mulheres: • as identidades e os papéis masculinos e femininos caracterizam-se como construção histórica e social, sujeita, portanto, à mudança. Essa construção tem uma base material e não apenas ideológica, que se expressa na divisão sexual do trabalho; • as relações de gênero são hierárquicas e de poder dos homens sobre as mulheres; por meio dessas relações começamos a apreender o mundo;. • as relações de gênero estruturam o conjunto das relações socais; os universos do trabalho, da cultura e da política se organizam a partir dos papéis masculinos e femininos; • gênero contribui para superar as dicotomias entre produção e reprodução, entre privado e público e mostra como mulheres e homens estão ao mesmo tempo em todas essas esferas.6 Aplicadas ao campo, as análises de gênero têm mostrado a subordinação e a subvalorização do trabalho das mulheres. Têm revelado também que as relações entre homens e mulheres no âmbito familiar e a forma como a família é constituída e reproduzida são tão importantes quanto as relações de classe, quando se trata de explicar as diferenças sociais do campesinato, assim como sua reprodução social. Incorporar a perspectiva de gênero, articulada com uma concepção agroecológica apoiada na agricultura e no agroextrativismo familiares, requer um triplo desafio: revisão de nossas categorias de análise, revisão de nossas práticas político-educativas e aprofundamento das críticas às propostas de políticas públicas para a proposição de alternativas. Há elos a estabelecer entre os debates sobre sustentabilidade e as relações sociais de gênero. Ambas as noções colocam-se contra uma visão produtivista e economicista. Por um lado, a noção de sustentabilidade remete ao campo das lutas sociais, de novas relações entre sociedade e natureza, numa perspectiva democrática, para a contestação da exploração de classe e da injustiça social e ambiental. Por outro lado, a crítica ao paradigma dominante da economia, feita pelo pensamento feminista, quer insistir na perspectiva segundo a qual um exame do desenvolvimento sustentável deve levar em conta as dimensões sociais e de gênero, e integrar nesse conceito uma distribuição justa dos recursos materiais, conhecimentos e poder, um sistema de valoração econômica adequado e a sustentabilidade do meio ambiente. Problematizar diagnósticos e propor mudanças, eis aí uma grande tarefa. A Agenda 21, em seu 4 Antropóloga, Diretora da Fase – Solidariedade e Educação. 5 Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo. Convenção da Biodiversidade. São Paulo: Sema, 1997, p.14. 6 Faria, Nalu e Nobre, Miriam. Gênero e desigualdade. Cadernos Sempreviva. São Paulo: SOF, 1997, p.31-32. 31
  • 32. Capítulo 24, preconiza a necessidade de desenvolvimento de bancos de dados, sistemas de informação, pesquisas participantes orientadas para ação e análises de políticas sensíveis de gênero, indicando, entre outros, os seguintes aspectos: (i) conhecimento e experiência por parte da mulher no manejo e na conservação dos recursos naturais; (ii) impacto da degradação ambiental sobre a mulher, em particular secas, desertificação e produtos químicos tóxicos; (iii) integração do valor do trabalho não remunerado, incluído o que se chama atualmente doméstico, nos mecanismos de contabilização dos recursos, a fim de representar melhor o verdadeiro valor da contribuição da mulher à economia.7 Efetuar uma releitura de metodologias existentes, como o Diagnóstico Rural Rápido Participativo, com abordagem de gênero e realizar estudos etnográficos são algumas possibilidades. Há grande carência de estudos básicos a respeito do conhecimento, das experiências e da posição das mulheres no manejo dos agroecossistemas, com perspectiva agroecológica, nos vários biomas no Brasil. A problematização dos diagnósticos, todavia supõe também a revisão de categorias de análise adotadas nas estatísticas censitárias. A condição de “membro não remunerado da família” expressa uma desigualdade de gênero e mascara o significado da inserção produtiva das mulheres. Embora elas participem de numerosas atividades agrícolas e extrativas em dupla ou tripla jornada, a invisibilidade de seu trabalho permanece. Quando mulheres e crianças realizam o mesmo trabalho que o homem, é comum dizer-se que estão “ajudando”. Desde 1991 os movimentos de mulheres lançaram campanha por seu reconhecimento como trabalhadoras rurais. O paradigma dominante na economia reforça duplamente essas desigualdades. Ignora o trabalho reprodutivo não pago, tornando invisível a maior parte da produção feminina, e ignora a divisão sexual do trabalho. Como contra-face da invisibilidade do trabalho da mulher estão as políticas cegas de gênero8 ou estratégias cegas de gênero, isto é, que não se apóiam nas relações sociais de gênero e tendem a excluir as mulheres. Elas ainda representam apenas 12,6% dos beneficiários diretos da Reforma Agrária. Só no ano 2000, como resultado da luta dos movimentos das mulheres, o Incra anunciou a modificação de suas normas, facilitando o acesso das mulheres a terra e à titulação. A mudança, no entanto, terá vigência em um contexto totalmente adverso, pois estão em marcha um processo de contra-reforma agrária, a chamada Reforma Agrária de Mercado, por meio de programas financiados pelo Banco Mundial, e, com ele, discriminação mais ampla das mulheres, como já mostram alguns estudos. Uma pequena parcela de mulheres, cerca de 6%, tem acesso ao crédito rural no Brasil. Recentemente também a luta por crédito por parte dos grupos e movimentos de mulheres resultou na criação, em 2002, de uma linha de crédito destinada às mulheres (Portaria n° 121 do Incra, de 22/05/2001). Serão necessárias análises futuras para verificar a implementação dessas definições e seu sentido para as mulheres. Ainda prevalece, contudo, a inadequação da política de crédito para a valorização e o fortalecimento dos sistemas agrícolas tradicionais de forma integrada. A lógica dos créditos não se baseia no sistema de produção com seus vários componentes, o que tanto põe em risco a conservação da biodiversidade e da sociodiversidade como reforça as desigualdades de gênero. Em várias regiões do país, constata-se também que as mulheres em geral ou são excluídas, ou têm participação minoritária e eventual nos cursos voltados para a capacitação e o aprofundamento de conhecimentos técnicos da produção agrícola ou agrossilvopastoril. O acesso limitado das mulheres a esse recurso constitui restrição para a igualdade de oportunidades entre os gêneros. Uma perspectiva de trabalho baseada na sustentabilidade e igualdade de gênero terão que garantir o empoderamento das mulheres, reconhecendo seu papel como produtoras de bens e gestoras do meio ambiente. Simultaneamente, terá que lhes assegurar apoio organizativo, controle sobre recursos produtivos — como terra e crédito — e capacitação técnica. 7 Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara dos Deputados. Agenda 21. Brasília: Centro de Documentação e Informação, 1995, p. 366. 8 Imagem que tomei emprestada da autora Naila Keeber. 32
  • 33. Assentamentos e outras formas de apropriação da terra e agroecologia Carlos Eduardo Mazzetto Silva9 A abordagem agroecológica propõe mudanças profundas nos sistemas e nas formas de produção. Na base dessa mudança está a filosofia de se produzir de acordo com as leis e as dinâmicas que regem os ecossistemas – uma produção com e não contra a natureza. Propõe, portanto, novas formas de apropriação dos recursos naturais, que se devem materializar em estratégias e tecnologias condizentes com a filosofia- base. Entretanto, três fatores fundamentais devem ser contemplados nessa problemática: • a eqüidade enquanto indicador fundamental da sustentabilidade dos agroecossistemas; • a diversidade e a compatibilidade cultural como base de construção de agroecossistemas biodiversificados e includentes e de uma pedagogia de troca de saberes; • a relação entre território disponível e capacidade de suporte dos ecossistemas e a organização espacial/territorial necessária ao desenvolvimento de sistemas agroecológicos de produção. Esses três fatores nos levam a: • reafirmar o repúdio ao latifúndio (produtivo ou improdutivo) e a necessidade de reforma agrária no Brasil, para que o critério da eqüidade possa concretizar-se, numa dimensão maior de busca de justiça e paz social; essa posição implica defender e apoiar a campanha pelo limite do tamanho da propriedade da terra (35 módulos) deflagrada pelo Fórum Nacional pela Reforma Agrária e o mecanismo da desapropriação como instrumento insubstituível de justiça agrária; • pensar essa reforma agrária no contexto de um processo mais amplo de reorganização territorial do Brasil que propicie a articulação entre políticas fundiárias/agrárias e de gestão ambiental; • formular e implementar modelos de assentamentos rurais baseados no conhecimento e análise da capacidade de suporte dos ecossistemas (potencialidades e limitações) e no respeito às formas tradicionais de apropriação dos recursos. As Reservas Extrativistas – Resex,10 são, talvez, o exemplo mais didático para se perceber como é possível a articulação desses fatores. Elas procuram democratizar, regularizar e definir um determinado território no qual a produção agroextrativista possa ocorrer de forma sustentável de acordo com as formas tradicionais de exploração dos recursos, autogerida pela comunidade, mas submetida a um plano de uso que normatize as formas de utilização desse território. Vale lembrar que as Resex hoje não se restringem à Floresta Amazônica (produtos da floresta, pesca e agricultura de subsistência), mas se estendem às matas de cocais (babaçu, pesca e agricultura de subsistência), a ecossistemas marítimos (pescadores e coletores de caranguejo e frutos do mar) e vêm sendo pensadas para ecossistemas fluviais (populações ribeirinhas e barranqueiras) que articulam pesca, agricultura de vazante e criação de gado. Os assentamentos agroextrativistas do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra procuram também imitar algumas virtudes das Resex, com algumas diferenças: nesse caso, os assentados serão titulados como proprietários, enquanto nas Resex a terra será sempre do Estado, que fornece apenas concessão de uso às populações. Outras formas tradicionais de uso também procuram seguir princípios equivalentes, como os faxinais no Paraná (ecossistema das matas de araucária), a dos geraizeiros nos cerrados (agricultura familiar nas encostas e fundos de vale; extrativismo e solta do gado em comum nas chapadas) e mesmo a dos nordestino-sertanejos na caatinga (roçado familiar e solta de caprinos em comum na caatinga). Todas essas formas de uso originaram-se de modelos que combinavam (ou ainda combinam) democraticamente áreas de exploração familiar e de uso comum. Em geral, essas formas conseguiram, ao longo de muitas décadas e, às vezes, séculos, garantir segurança alimentar, preservação da biodiversidade e sustentabilidade dos agroecossistemas. Consolidaram-se mediante o aprendizado permanente de convivência com os ambientes e de ajuste a seus limites e potencialidades. São, portanto, modelos territorial-produtivos que aplicaram e aplicam na prática os princípios agroecológicos, antes de essa ciência se organizar e consolidar do ponto de vista teórico e científico. Esses modelos vêm, certamente, sofrendo forte pressão oriunda do processo de modernização agrícola dos últimos 40 anos, ao longo dos quais 9 Engenheiro agrônomo, doutorando em Ordenamento Territorial e Ambiental (Geografia/UFF), consultor em Agroecologia/Reforma Agrária/Agricultura Familiar. 10 Categoria de unidade de conservação de uso sustentável prevista no Sistema Nacional de Unidades de Conservação – Snuc (Lei nº 9.985/2000). 33
  • 34. grande parte das áreas de uso comum foram griladas e roubadas dessas populações no contexto de projetos e programas governamentais de desenvolvimento que favoreceram a expansão de grandes empresas rurais – a contra-reforma agrária. É evidente também o fato de que, em muitos locais, a pressão sobre a terra aumentou sobremaneira, fruto do próprio crescimento populacional e da excessiva divisão das propriedades. Apesar disso, esses modelos tradicionais não deverão ser portadores de formas de organização territorial-fundiária-produtiva capazes de potencializar as propostas contidas na abordagem agroecológica? A combinação de sua lógica espacial, produtiva e ecológica com o conhecimento agroecológico atual não poderá servir de base para a formulação de modelos sustentáveis de assentamentos rurais? Do ponto de vista da organização espacial, esses modelos não nos levariam a questionar a restrição do universo da agricultura familiar brasileira à pequena propriedade privada “geométrica”?11 Nessa perspectiva, além da agroecologia estrito senso, não serão necessárias outras abordagens, como a etnoecologia, a geografia ambiental e o manejo dos ecossistemas naturais (terrestres, marítimos e fluviais)? Se as respostas forem positivas, mudanças profundas deverão ocorrer nas políticas agrárias e ambientais, no sentido de sua integração, e nos critérios técnicos em que se baseia hoje a atuação de órgãos como o Incra, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais – Ibama e a Agência Nacional de Águas – ANA, para não especificar também os órgãos dos níveis estadual e municipal. Nessa perspectiva, a articulação das políticas agrária, de recursos hídricos (gestão participativa das bacias hidrográficas) e das unidades de conservação não deveria ser priorizada? Afinal, são todas políticas de regulação de uso do território, e o território é um só. Há exemplos concretos que ilustram o desencontro das legislações ambiental e agrária, ou da primeira com políticas de apoio à agricultura familiar sustentável, como: • impedimentos legais para o uso sustentável das áreas de preservação permanente, que são, em muitos locais, as áreas preferenciais da agricultura familiar; • não existência de proteção às chapadas dos cerrados – áreas de recarga desse bioma –, utilizadas historicamente pelos camponeses como área de extrativismo e solta de gado, e hoje ocupadas com monoculturas; • não regulamentação do pré-requisito do uso racional dos recursos naturais para o cumprimento da função social da propriedade, restringindo o universo da reforma agrária ao latifúndio improdutivo (terras mais pobres e mais cobertas por vegetação), deixando o latifúndio produtivo (o mais predatório) incólume. Deve ser ressaltado aqui o fato de que, no caso dos novos assentamentos rurais, muitas vezes não há nem o componente da tradição estabelecido, nem identidade com a terra construída. Todo o desenho do assentamento e a construção de seu modelo devem, portanto, fazer parte, desde o início, de um processo participativo e interativo, em que a ampliação do conhecimento agroecológico ande lado a lado com o processo socioorganizativo da comunidade, propiciando a construção simultânea das identidades socioculturais e territoriais. A sustentabilidade se constrói mediante o enraizamento e a territorialidade das populações Importante salientar que, apesar dessas argumentações, devemos defender a pluralidade nos modelos de assentamentos rurais, pois, além dos ecossistemas e da cultura, há fatores como localização geográfica, perfil dos assentados, preço da terra, oportunidades econômicas e mercado consumidor que podem induzir modelos de assentamento mais voltados, por exemplo, para a horticultura orgânica intensiva (áreas de cinturão verde), artesanato, ecoturismo ou para sua combinação. Os modelos sustentáveis de assentamentos podem ter vários formatos e funções, cumprindo papéis complementares no processo de inclusão social, segurança alimentar, desconcentração populacional e territorial, diversificação e estabilidade econômica e equilíbrio ambiental. Para construir o desenho desse assentamentos, é necessária a introdução dos instrumentos técnicos da estratificação ambiental das áreas e de seu zoneamento agroecológico para fins de assentamento. O zoneamento agroecológico é uma projeção básica de ocupação do espaço e organização territorial baseada na estratificação ambiental (identificação e mapeamento dos ambientes fundamentais que compõem a área). Esse zoneamento deve definir num mapa as áreas: a) de proteção ambiental – reserva legal, áreas de preservação permanente, corredores ecológicos; b) próprias para o cultivo mais intensivo – agricultura, pastagens plantadas; c) para uso mais extensivo e restrito – extrativismo, manejo visando a uso múltiplo, pastagem natural, etc. E pode destacar também das áreas de uso comum àquelas mais próprias para uso familiar, apontando as possibilidades de futura organização territorial do assentamento (anteprojeto de parcelamento). 11 No contexto da reforma agrária, essa visão materializa-se na implementação do chamado “quadrado burro”. 34
  • 35. Recursos hídricos no semi-árido: um desafio para a sustentabilidade Jean Marc von der Weid12 Já se diz que a água vai ser o insumo estratégico neste século, tal como o petróleo o foi no século XX, e o carvão no século XIX. Essa percepção deriva do fato de que esse recurso básico para a sobrevivência humana começa a escassear e não apenas nas zonas áridas e semi-áridas. Frente à tendência à escassez, a reação das sociedades capitalistas é a de colocar preço na água, tornando seu uso condicionado à capacidade de pagamento de cada usuário. Os usos da água são múltiplos, desde os individuais até os industriais e agrícolas. Na distribuição dos diferentes tipos de consumo, entretanto, a agricultura é a maior consumidora de água e também a maior fonte de poluição dos recursos hídricos. Além do problema da quantidade, a qualidade da água consumida também é preocupante. A má qualidade da água consumida é a maior responsável pelas doenças endêmicas mais comuns nos países em desenvolvimento, em particular nas zonas rurais. Nas regiões semi-áridas o problema da água é, obviamente, mais relevante e antigo do que nas outras. No entanto, a “falta de água” deve ser qualificada se quisermos entender o problema. Falta água para que tipo de uso? Quando falta água? Por que falta água? Essas são questões que precisam ser respondidas desde logo. Nas zonas rurais do semi-árido nordestino a água é necessária para o consumo doméstico (beber, cozinhar, lavar louça e roupas, banho, outros); para consumo dos animais criados nos quintais (diversos); para as hortas de vários tipos, jardins e fruteiras; para a agricultura e as criações maiores e diversos outros usos. Nas cidades, onde a demanda é centralizada em espaços restritos, o Estado cria infra- estruturas para concentrar a oferta, canalizando rios ou construindo grandes reservatórios em que a água é tratada para garantir qualidade em seu consumo. O crescimento desordenado e acelerado de muitas cidades de grande e médio porte provocou forte pressão sobre os recursos hídricos e vem dando lugar a projetos mirabolantes, tais como a transposição do São Francisco ou do Tocantins. As soluções de centralização da oferta de água nas zonas rurais com grandes obras de infra-estrutura predominaram na história do Nordeste sem nunca ter resolvido o problema. Não se trata apenas de quem se apropria das grandes obras, mas da inadequação da solução para resolver o problema. As experiências das ONGs e organizações de agricultores vêm optando por uma estratégia que se dirige à busca de soluções diferenciadas para os diferentes tipos de demanda de água nas propriedades rurais. Algumas são soluções de manejo de recursos para economizar a água disponível, e outras são infra-estruturas baratas para captação e conservação de água para diferentes fins. Essas perguntas nos deixa a refletir: essa estratégia responde aos problemas dos agricultores? Há soluções técnicas adequadas a todos os tipos de demandas de água dos agricultores e suas famílias? O que é necessário para levar essas soluções a todos os agricultores? O que as experiências dos participantes informam para responder a essas perguntas? 12 Economista, mestre em Desenvolvimento Agrícola, fundador da ONG Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa – AS-PTA, onde atua como Coordenador do Programa de Políticas Públicas. 35
  • 36. Crítica ao modelo atual de desenvolvimento agrícola e à transição agroecológica no semi-árido Eduardo Martins Barbosa13 O semi-árido brasileiro é marcado pela singularidade de ser a única região semi-árida tropical do planeta, pela diversidade ecológica decorrente de seus diversos ambientes naturais, pela complexidade social originária do processo de colonização e pelo desafio do desenvolvimento, devido à persistente situação de miséria e pobreza da maioria da população, especialmente aquela que vive nos espaços rurais. É uma das maiores regiões semi-áridas do planeta em extensão geográfica e em população. São 858.000 km2, mas o polígono das secas é estimado em 1.083.790 km2. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA, em 2001, o semi-árido abrigava pouco mais de 21 milhões de pessoas em 1.031 municípios situados no Norte de Minas Gerais, nos sertões da Bahia, Paraíba, de Sergipe, Alagoas, Pernambuco, do Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí. Outras fontes incluem o Norte do Espírito Santo e uma parte do Sudeste do Maranhão na região semi- árida. As áreas dos Tabuleiros Costeiros do Ceará, Rio Grande do Norte e parte da Paraíba, embora não sejam consideradas pertencentes aos domínios do semi-árido, sofrem os efeitos do regime de chuvas da região e se enquadram no polígono das secas. Os clássicos estudos de Guimarães Duque registram essa diversidade, com a identificação e caracterização das seguintes regiões naturais: Seridó, Sertão, Caatinga, Cariris Velhos, Curimataú, Carrasco, Agreste e Serras. A Embrapa, em seu Zoneamento Agroecológico do Nordeste, publicado em 1993, caracteriza o total de 172 unidades geoambientais em 20 unidades de paisagem, bem como oito tipos e 16 subtipos de sistemas de produção. Desse conjunto, uma boa parte está presente na região semi-árida. Portanto, longe de se caracterizar como um espaço homogêneo, o semi-árido pode ser apresentado como um “grande mosaico”. Em termos climáticos, destacam-se as temperaturas médias elevadas e precipitações médias anuais inferiores a 800mm, extremamente concentradas, gerando os períodos de chuvas e estiagens. Cerca de 50% dos terrenos são de origem cristalina, e os outros 50% são terrenos sedimentares, sendo os primeiros de baixa capacidade, e os segundos de alta capacidade de acumulação de águas subterrâneas. A vegetação predominante é a caatinga, mas são observadas outras formações florestais nos microclimas existentes na região. A ocupação do semi-árido nordestino pelos colonizadores vinculou-se historicamente à atividade pecuária, base econômica da região por alguns séculos. O sistema de grandes fazendas, originárias das sesmarias, é a forma típica de ocupação do território. Formada pelo “coronel” e seus familiares mais próximos, e contando com as famílias trabalhadoras vivendo agregadas ao núcleo familiar proprietário das terras, a fazenda era uma unidade econômica e social marcada por complexas relações de dominação e compadrio. A criação de gado e a indústria da charqueada constituíram o apogeu desse sistema. Além disso, a criação tanto de gado como de caprinos e ovinos estava voltada para a alimentação da população local e para o aproveitamento do couro nas necessidades da fazenda. As famílias trabalhadoras desenvolviam uma pequena agricultura diversificada composta de cultivos alimentares e de uso doméstico e a criação de porcos e aves, também voltada para o consumo da população local. Essas atividades eram praticadas no interior das fazendas de gado ou nas posses situadas nas terras devolutas. A hegemonia da pecuária sobre a agricultura se expressa na lei “cerca quem planta”, geradora do sistema de roçados cercados para o cultivo agrícola e da criação solta, ferrada a fogo, com a marca identificadora do proprietário. 13 Engenheiro agrônomo e consultor da Serviços Técnicos Associados S.A. Ltda – Seta. 36
  • 37. Centrada inicialmente na pecuária, a expansão da agricultura no semi-árido deveu-se ao cultivo em larga escala do algodão-mocó, que se integrou à criação formando o binômio gado/algodão. Os sistemas de produção incluíam ainda culturas alimentares e outras culturas de expressão regional como a mamona, o sisal e o extrativismo da carnaúba, da oiticica e do caju. A florescente agroindústria algodoeira e dos demais produtos cultivados ou extrativistas, mesmo passando por momentos críticos, foi à base econômica do semi-árido desde a década de 1930, até meados da década de 1980, quando o sistema praticamente entrou em colapso, devido a um conjunto de problemas sociais, ambientais, tecnológicos e comerciais, que não foram solucionados pelo setor produtivo e pelas instituições públicas atuantes no semi-árido. A dinâmica de modernização tecnológica da agricultura nacional empreendida pelos governos militares foi bastante desigual nas grandes regiões brasileiras. No semi-árido expressou- se de maneira localizada, por meio dos projetos de irrigação do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas – DNOCS, na forma de enclaves, não se verificando disseminação generalizada do pacote tecnológico químico-mecânico nem a constituição dos complexos agroindustriais, na proporção verificada em outras regiões. Isso, entretanto, não significa a inexistência de profundas transformações no espaço rural do semi-árido. Essas se deram muito mais pelas transformações nas relações sociais de produção da região, em especial na relação de parceria entre os grandes proprietários fundiários e as famílias de agricultores, que moravam e trabalhavam nas grandes fazendas. A quebra dessa relação de parceria e, principalmente, da condição de moradia foi uma medida preventiva do segmento patronal, contra a reivindicação de direitos trabalhistas e a luta pela reforma agrária, fundamentadas no “bem de raiz”, proporcionado pelo cultivo do algodão- mocó pelos parceiros-moradores. Essas medidas geraram uma situação de conflito social generalizado. O Estado militarizado, aliado às oligarquias rurais locais, procurou controlar essa situação e modernizar a economia do semi-árido, combinando diversas medidas, destacando-se a repressão à crescente organização dos trabalhadores rurais, a política assistencialista, por intermédio do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural – Funrural, e o generoso financiamento da “pecuarização” e/ou “reflorestamento”, mediante incentivos fiscais, crédito subsidiado e trabalho das frentes produtivas nos períodos de seca. Um dos resultados dessa política foi o “desenraizamento” das famílias rurais, gerando intenso fluxo migratório para outras regiões do país. Além dessas dinâmicas demográficas e territoriais e do enriquecimento ilícito de muitos, esse processo resultou na montagem de significativa infra-estrutura produtiva nas grandes propriedades do sertão, representada pelos açudes, estábulos, silos e cercamento das terras. Por outro lado, a formação de pastagem nativa e exótica provocou o desmatamento e o uso de herbicida em proporções mais elevadas. Também do ponto de vista econômico essa opção configurou-se em fracasso, comprometendo ainda mais as dinâmicas econômicas locais já ressentidas da progressiva desestruturação da agroindústria algodoeira e dos produtos regionais e extrativistas. Outro resultado observado foi à desarticulação entre as dinâmicas dos demais espaços agrários subsidiários e a hegemônica dinâmica pecuária/algodoeira do sertão. Nas serras e agrestes, constituíram-se pólos hortifrutigranjeiros orientados para o abastecimento das grandes cidades e pólos alcooleiros. Na região subcosteira foram formados pólos de produção de caju, coco e cana para a produção de álcool, além daqueles dedicados à avicultura e à pecuária leiteira, possibilitando o direcionamento da economia dessas regiões para as grandes cidades e para o mercado externo. No bojo do processo de redemocratização da década de 1980 e da fase neoliberal da década de 1990, aprofundam-se no semi-árido a diferenciação e a desarticulação interna entre os enclaves de agricultura irrigada e os amplos territórios de predomínio da agricultura de sequeiro. Ampliando-se o foco sobre o cenário, podem-se observar a progressiva decadência produtiva e econômica dos perímetros irrigados, resultado do esgotamento do padrão tecnológico, organizativo e gerencial adotado pelo DNOCS, e o dinamismo econômico dos novos pólos de 37
  • 38. desenvolvimento da agricultura irrigada, centrados na fruticultura de exportação, mediados por poderosos grupos empresariais, com integração dos agricultores de menor porte e com forte apoio estatal. Esses pólos, entretanto, reproduzem os processos de degradação ambiental, de exploração da força de trabalho integrada e de exclusão socioeconômica de parcelas significativas da população local, observados nas áreas mais antigas. Por outro lado, nos territórios de predomínio da agricultura de sequeiro, três dinâmicas podem ser identificadas: a dos sertões, a dos agrestes e serras e a da região subcosteira. Nesta última observa-se a crescente queda de produtividade da cajucultura e dos coqueirais, com incidência crescente de pragas e doenças. Nos agrestes e serras, a degradação dos solos e a contaminação por agrotóxicos são os problemas mais relevantes. É no sertão, entretanto, que residem os maiores desafios, pois a desestruturação socioprodutiva descrita ainda não foi superada, em decorrência dos fracos resultados em termos da revitalização da cultura do algodão e dos produtos regionais e extrativistas, bem como do insuficiente desenvolvimento e difusão de alternativas de renda. Essa difícil situação geral, entretanto, é pontuada por numerosas situações localizadas que se diferenciam pela emergência de processos de reestruturação produtiva, por meio da incorporação da agricultura irrigada de pequena escala aos sistemas existentes, bem como pela própria modernização de atividades tradicionais, em especial da ovinocaprinocultura e da bovinocultura leiteira. Esse complexo quadro de ocupação do território do semi-árido também gerou grande diferenciação nos empreendimentos agrícolas da região. Convivem nos mesmos espaços empresas agrícolas modernizadas, empresas tradicionais pouco tecnificadas, latifúndios improdutivos, agricultores familiares modernizados e tradicionais. Estes dois últimos comportam formas variadas de acesso a terra, que definem diversas categorias sociais. No geral, a pressão da agricultura familiar sobre a terra é cada vez maior e combina-se com o empobrecimento generalizado, provocando fluxos migratórios, principalmente nos anos de ocorrência de seca. Desde a ocupação inicial até as dinâmicas mais recentes, vêm-se acumulando impactos socioambientais negativos no semi-árido. Os mais amplos são, sem dúvida, a degradação da vegetação e dos solos, observando-se crescente processo de desertificação em diversas regiões. Segundo o Instituto Desert, esse processo vem comprometendo de forma “muito grave” uma área de 98.595km2 e de forma “grave” 81.870km2, totalizando 181.000km2. Nas áreas de agricultura irrigada, os problemas de contaminação por agrotóxicos e salinização das terras são os mais relevantes. As grandes barragens geraram impactos muitos fortes sobre o ambiente e as populações locais, que pouco se beneficiaram dos altos investimentos realizados pelo Estado. De modo geral, prevaleceu a chamada “solução hidráulica” e não se desenvolveu a cultura de convivência com o semi-árido. As linhas mestras do modelo de desenvolvimento concentrador e excludente, historicamente estabelecidas, continuam vigorando, sendo determinantes na configuração do quadro de miséria e pobreza vigente no semi-árido brasileiro. A TRANSIÇÃO PARA A AGROECOLOGIA Nesse contexto geral, a agroecologia tem servido de base para a construção de uma cultura de convivência no semi-árido, possibilitando o renascimento e o rejuvenescimento de vertentes de conhecimento e de proposições tecnológicas, que tinham sido ceifadas pela concepção químico-mecânico, estabelecidas em universidades, centros de pesquisa, instituições de crédito e empresas de assistência técnica e extensão rural. As dinâmicas de promoção da agroecologia originam-se das iniciativas de estudantes e profissionais da área agronômica e ambiental que recuperam os postulados de Guimarães Duque, Vasconcelos Sobrinho e outros estudiosos e entusiastas do semi-árido e da região nordestina em geral. A agroecologia permite revisitar e atualizar essa linha de pensamento, desenvolvendo-a na perspectiva da construção de uma cultura de convivência com o semi-árido, fundamentada na interação entre os conhecimentos e as técnicas geradas pela vivência da população local com seu meio e aqueles originários dos processos de pesquisa científica da atualidade. 38
  • 39. A partir de meados da década de 1980 essas iniciativas das ONGs no campo da tecnologia alternativa começam a articular-se com as organizações dos trabalhadores rurais e com as estruturas de base das igrejas, gerando um movimento crescente, voltado para a construção de um novo modelo de desenvolvimento agrícola para o semi-árido. Esse trabalho desenvolve-se por meio da estruturação de centros e de redes de tecnologia alternativa, construindo-se pontos de contato com as universidades e outras instituições de pesquisa e extensão rural. A estratégia seguinte orienta-se para a ação local, em municípios selecionados, tendo como base a metodologia do diagnóstico rápido e participativo dos agroecossistemas e de elaboração de planos de desenvolvimento agroecológicos para comunidades rurais, em algumas situações com abrangência municipal. Esses trabalhos envolvem um significativo conjunto de temas técnicos, tendo alguns deles passado a ser o elemento de constituição de redes temáticas, com destaque para as sementes, a apicultura e a água. Essas ações evoluíram e se disseminaram para muitas áreas do semi-árido, constituindo-se em estratégias de ação que podem ser assim classificadas: A primeira delas pode ser caracterizada como Ação de Pesquisa, Desenvolvimento e Difusão Ampla de uma Tecnologia Específica. Iniciou-se com o desenvolvimento de uma tecnologia específica, de amplo alcance, de fácil reprodução e adaptação, que responde a uma necessidade fundamental da população. A referência dessa estratégia é o trabalho em torno da cisterna de placas, que começou com a sistematização da experiência de um pedreiro, passou pela adaptação e melhoramento do método de construção e pelo desenvolvimento da metodologia de treinamento e de financiamento pelas ONGs, sendo incluído em programas de ação de prefeituras e estados, e chegando até a formulação atual do Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semi-Árido – Um Milhão de Cisternas – P1MC. Essa estratégia ampliada só foi possível devido à simultânea estruturação da Articulação do Semi-Árido – ASA, que atualmente envolve 613 diferentes organizações da sociedade civil. A segunda estratégia que pode ser identificada é a Ação de Pesquisa, Desenvolvimento e Difusão Local de uma Base Tecnológica Agroecológica. Diversas entidades situadas no semi-árido adotam essa estratégia, de forma mais ou menos elaborada. Normalmente há significativo investimento no desenvolvimento de tecnologias agroecológicas, com formação de grupos de interesse e difusão em escala local. Trabalha-se com a complexidade dos sistemas de produção local, vinculando-se às organizações dos agricultores familiares. Trabalhando ou não com a agroecologia, a Ação de Resgate, Valorização, Fortalecimento e Inclusão de Segmentos e Grupos Sociais é outra estratégia presente nas intervenções no semi- árido, principalmente em relação a mulheres e jovens. Ações de natureza educacional, artística, cultural, de geração de trabalho e renda, de apoio jurídico, etc. caracterizam as organizações desse campo. Também não direcionada especificamente para a transição agroecológica, verifica- se estratégia focada na Ação de Fortalecimento da Cidadania e Democratização das Políticas Públicas, que tem na capacitação das lideranças populares para a gestão social do desenvolvimento local um de seus principais focos de trabalho. Quando essa estratégia aponta para a discussão da Agenda 21, abre-se um grande campo para o debate do modelo agrícola e da necessidade de uma agricultura sustentável. Nesse mesmo sentido, apresenta-se a estratégia de Desenvolvimento Local, que tanto pode ser uma iniciativa das organizações populares, das ONGs ou de instituições públicas estatais. São exemplos desse trabalho o Programa de Desenvolvimento Local Sustentável – PDLS do movimento sindical, as ONGs participantes da Rede Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável – Dlis, os programas públicos desenvolvidos por instituições como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – Sebrae, Banco do Nordeste, Conselho da Comunidade Solidária, etc. Aqui, a transição agroecológica, normalmente via agricultura orgânica, também começa a ganhar algum espaço, principalmente pela discussão da Agenda 21. 39
  • 40. Além dessas estratégias mais gerais, têm-se dinâmicas específicas que estão contribuindo significativamente para o avanço da agroecologia. A constituição de associações de consumidores e produtores orgânicos, visando ao planejamento da produção e à comercialização direta tem sido um caminho bastante promissor. Associações de produtores orgânicos voltadas para a venda em feiras agroecológicas ou mesmo para redes de supermercados têm mostrado a viabilidade técnica e econômica da proposta, reforçando a transição agroecológica no semi-árido. Algumas poucas grandes empresas rurais também começam a investir na produção orgânica, a exemplo do caju, mostrando que a agricultura familiar não é a única interessada nesse assunto. Em síntese, pode-se concluir que, de forma semelhante ao que ocorre em outras regiões do Brasil, no semi-árido também estão se constituindo diversas dinâmicas de promoção da agroecologia, com vários atores envolvidos. De modo geral, elas ainda são incipientes, restritas e pouco articuladas, sendo necessário um grande esforço de integração, expansão e consolidação, para que se possa avançar na transição agroecológica no semi-árido brasileiro. As dinâmicas de promoção da agroecologia no semi-árido estão referenciadas no conjunto das experiências que podem ser analisadas a partir de grandes temas e questões, identificando- se em cada um os acúmulos e os pontos de estrangulamento, de modo a se ter um painel do nível de construção da proposta agroecológica no semi-árido. Esse esforço de análise é apresentado a seguir. O acesso a terra continua sendo ponto de estrangulamento para milhares de famílias de agricultores do semi-árido. De modo geral, duas situações bem diferenciadas podem ser observadas. Nas áreas sertanejas e subcosteiras, a presença das grandes propriedades, passíveis de desapropriação, aponta para a necessidade de ampliação do número de assentamentos federais, capaz de absorver parcela significativa dos “sem terra” dessas regiões. Por outro lado, nas unidades geoambientais dos agrestes e serras, a resolução da questão fundiária passa por outros mecanismos, tais como a reorganização e o crédito fundiários. Embora muito aquém das necessidades, a política de assentamento do governo federal e de alguns governos estaduais vem criando uma realidade diferenciada para um conjunto de famílias rurais, e, em alguns municípios e microrregiões do semi-árido, as transformações na estrutura fundiária são relevantes. Entretanto, um ponto extremamente preocupante é a recorrente dificuldade de os assentamentos situados no semi-árido viabilizarem-se produtiva e economicamente, observando- se níveis de pobreza semelhantes aos da situação rural das áreas em que estão inseridos. Vale ressaltar que um número significativo desses assentamentos dispõe de infra-estrutura básica, teve acesso aos créditos da reforma agrária para a estruturação das atividades produtivas, e alguns também foram beneficiados com programas de alfabetização e de assistência técnica, embora com as descontinuidades típicas das ações governamentais nesse campo. No semi-árido o recurso natural crítico é a água. Seu uso indevido na agricultura irrigada, a precariedade do gerenciamento e a poluição das fontes de armazenamento são problemas crescentes ainda pouco trabalhados. A degradação dos recursos vegetais e do solo é um forte impacto ambiental negativo dos sistemas de produção “tradicionais” e “modernizados” existentes no semi-árido nordestino. Em algumas áreas essa degradação está evoluindo para a desertificação, com risco do comprometimento definitivo da sustentabilidade da agricultura. A gravidade da situação e as respostas positivas que os sistemas agroecológicos de produção vêm apresentando criam ambiente favorável para a difusão ampliada das soluções. O desafio de conhecer a singularidade e a diversidade do trópico semi-árido requer significativo investimento em pesquisa, o que está muito longe do que se tem atualmente. A condição de região com índices de desenvolvimento muito abaixo da média nacional e o pouco investimento na produção de conhecimento sobre a realidade regional são fatores que se alimentam mutuamente, reforçando o círculo vicioso de pouca pesquisa, baixo desenvolvimento e vice-versa. Essa situação geral da pesquisa na região agrava-se quando se analisa a base científica para a transição agroecológica no semi-árido. Entretanto, nesse campo específico, os 40
  • 41. esforços das ONGs, articulados com as organizações dos agricultores familiares e com a colaboração de alguns poucos pesquisadores das instituições públicas, possibilitaram a geração de um conjunto mínimo de técnicas, capaz de responder aos problemas básicos dos sistemas de produção da maioria dos agricultores familiares do semi-árido. Nesse sentido destacam-se as técnicas de recuperação e conservação dos solos; a captação, o armazenamento e a utilização da água na propriedade, o manejo da vegetação, em especial da caatinga, mediante os sistemas agropastoris, silvopastoris ou agrossilvopastoris, a criação de bovinos, ovinos, caprinos, suínos e aves caipiras, a agroindustrialização familiar ou comunitária de diversos produtos e muitas outras tecnologias apropriadas às condições da agricultura familiar no semi-árido. O principal ponto de estrangulamento está na insuficiência e na ineficiência do sistema público estatal de assistência técnica e extensão rural, bem como em sua fragilidade e insuficiente articulação, com as instituições de pesquisa e com o setor público não estatal formado por ONGs, cooperativas de trabalho e empresas prestadoras de serviços. Este último setor, por sua vez, articula-se em redes diversas, mas não conseguiu estabelecer-se como um sistema organicamente estruturado, e seu funcionamento depende, por um lado, dos recursos da cooperação internacional e, por outro, dos programas governamentais, havendo raríssimos mecanismos de auto-sustentação em prática. Mesmo sujeito a esses condicionantes, o setor tem desempenhado um importante papel na geração do conhecimento agroecológico no semi-árido e tem sido o maior responsável por sua difusão junto aos agricultores familiares. A dimensão econômica tem-se configurado num dos principais pontos críticos do processo de transição agroecológica no semi-árido. Submetidos à condição de miséria, pobreza ou descapitalização, cujas causas já foram expostas, os agricultores familiares e as organizações atuantes no semi-árido enfrentam o grande desafio de conciliar os investimentos necessários à recuperação dos recursos naturais e o manejo agroecológico de seus sistemas de produção, com a geração de produtos para o autoconsumo e de uma renda mínima, capaz de viabilizar o consumo dos demais itens que compõem a cesta familiar de produtos e serviços – o que vem sendo feito de forma bastante coerente e conseqüente por agricultores familiares, suas organizações representativas e pelas entidades de apoio. O ponto de partida é o trabalho em torno do tema segurança alimentar, que se dá por meio das casas de sementes, da diversificação dos roçados e quintais, das cisternas de placa, das pequenas barragens subterrâneas, dos cacimbões, dos barreiros-trincheira, das hortas, dos pomares, da apicultura e da criação de pequenos animais. No semi-árido a prioridade econômica da maioria dos agricultores familiares é a regularidade da produção de alimentos nas condições de alta irregularidade do regime de chuvas. Isso pode ser obtido com pequenos investimentos financeiros orientados fundamentalmente para a capacitação e o acompanhamento sistemático de todos os que formam o núcleo familiar e para as pequenas obras de infra-estrutura produtiva e reprodutiva, voltadas para a melhoria da qualidade de vida da família. Essa estratégia básica, incluindo as melhores formas de financiamento, está técnica e metodologicamente muito bem elaborada, testada e implementada em diversas situações agrossocioambientais do semi-árido e pode ser considerada o maior patrimônio do conjunto das organizações envolvidas nesses trabalhos. Essa forte perspectiva de autoconsumo presente em parcelas significativas da agricultura familiar não está dissociada de uma perspectiva mercantil, que vai desde a venda parcial da própria força de trabalho, realizada pelos segmentos mais empobrecidos, até a inserção no mercado internacional, a exemplo de alguns grupos de produtores de frutas frescas e castanha- de-caju. Considerando as diversas formas de inserção no mercado, viabilizadoras da renda monetária bruta dos agricultores familiares, pode-se observar que o conjunto diversificado de produtos trabalhados nos processos de transição agroecológica traz mais oportunidades de comercialização, e certos produtos passam a ser uma “atividade de renda” em função dos volumes de produção alcançados. Analisando um pouco mais detalhadamente esse aspecto econômico, podem-se observar dinâmicas distintas. Uma primeira diz respeito à revitalização de atividades tradicionais de mercado, como o algodão, o sisal, a castanha-de-caju, a cera de 41
  • 42. carnaúba, o artesanato e o próprio café. Outras podem ser consideradas atividades tradicionais em processo de mercantilização ampliada, como é o caso do mel, dos ovinos e caprinos e de frutas regionais, cajá, cajarana, umbu, goiaba, graviola e ata, por exemplo. Uma terceira dinâmica está mais relacionada a produtos de introdução mais recente, como as hortaliças e algumas frutas, entre elas o melão, o abacaxi, a acerola e a uva. Por fim, existem produtos em fase de introdução na região, a exemplo do nim e do carmim de cochonilha, que formam mercados especiais. Em todas essas atividades existem agricultores e entidades de apoio trabalhando em processos de transição para a agroecologia, a maioria com bons resultados produtivos e até com certificação orgânica. Entretanto alguns produtos, a exemplo do algodão e do mel, apresentam significativos estrangulamentos comerciais, resultado de dificuldades de venda em pequena escala ou do escoamento da produção mais elevada e de preços não compensadores. Em outras situações o mercado é franco comprador dos produtos orgânicos, mas a transição agroecológica está restrita a um pequeno número de agricultores, com taxa de expansão muito lenta; é o caso da castanha-de-caju. Observam-se também casos de integração de produtores de hortaliças orgânicas a redes de supermercados. Por outro lado, agricultores produzindo “novos produtos de mercado” , como a semente de nim e carmim de cochonilha, têm aproveitado esse diferencial tecnológico para faturar renda expressiva com pouco trabalho. A venda de cestas padronizadas e a venda direta para consumidores cadastrados ou para a vizinhança, bem como as feiras de produtos da agricultura familiar e/ou de produtos agroecológicos, são estratégias comerciais em processo de expansão nas grandes e pequenas cidades do semi-árido, mostrando a importância dos mercados locais, principalmente para os produtos alimentícios e medicinais. Em muitos casos, o diferencial de renda é decorrente do máximo aproveitamento de todos os produtos de origem vegetal e animal, por meio da agroindustrialização descentralizada. Em algumas situações, estruturas mais centralizadas, combinadas ou não com estruturas descentralizadas, têm propiciado o melhor aproveitamento da produção e a comercialização mais vantajosa, especialmente quando se trata de exportação. Em síntese, podemos concluir que, do ponto de vista econômico, sob a lógica de combinação de autoconsumo e mercantilização, característica da maioria dos tipos de agricultura familiar do semi-árido, a transição agroecológica tem conseguido demonstrar sua viabilidade, principalmente no campo da segurança alimentar, registrando também avanços nos aspectos comerciais, proporcionando incrementos na renda monetária das unidades produtivas. Observam- se, entretanto, muitas deficiências e insuficiências nos aspectos de organização da produção e da comercialização. Isso sugere que os investimentos das organizações dos agricultores e das entidades de apoio nesse campo são fundamentais em termos da viabilidade econômica da transição agroecológica em escala mais ampla no semi-árido. No início da discussão sobre a transição agroecológica no semi-árido, a disputa no campo ideológico era marcada pela tentativa de desqualificação dos agricultores e profissionais envolvidos no trabalho, mediante sua classificação como utópicos, românticos, atrasados ou malucos. A crescente crise dos padrões tradicional e convencional, e os resultados positivos alcançados pela agroecologia no semi-árido, no contexto da ampliação da consciência ambiental do conjunto da população, vêm propiciando inversão de valores expressa na valorização e na demanda crescente de produtos naturais. Essa mudança de tendência ocorre de forma mais generalizada e consistente nas populações urbanas de maior renda e escolaridade e em meio às pessoas participantes de organizações sociais de diversos tipos. Entretanto, esse reconhecimento da importância do meio ambiente e dos produtos naturais ainda não está diretamente relacionado com o papel potencial da agricultura familiar do semi-árido na sociedade. Devido à condição de miséria e pobreza da maioria da população rural do semi-árido, ainda predomina na população urbana a visão estigmatizada desse segmento social. Também é comum a autovisão negativa por parte dos agricultores familiares, principalmente em meio à população mais jovem. Desse modo, os esforços recentes de valorização da agricultura familiar empreendidos pelas organizações de representação e entidades de apoio são fundamentais. Os resultados iniciais, ainda 42
  • 43. numericamente pouco expressivos, são de grande importância para a construção da cidadania no campo. Nesse contexto, o trabalho mais relevante tem sido empreendido pelas mulheres trabalhadoras rurais. A construção de suas identidades a partir da reflexão das relações de gênero na unidade familiar, em suas organizações e na sociedade tem avançado de maneira ampla e consistente, reconhecendo-se, entretanto, o longo caminho a se percorrer. A ação mais recente, mas ainda menos estruturada, está sendo desenvolvida junto à juventude rural. Nesse caso tem- se o duplo desafio de sensibilizar seus membros para a valorização de sua condição de jovem agricultor (a) e, ao mesmo tempo, criar as condições de trabalho e renda capazes de garantir sua permanência no campo. Observa-se também um incipiente trabalho relacionado às questões étnicas no conjunto da agricultura familiar do semi-árido. A auto-identificação de comunidades indígenas e negras, o resgate de suas identidades, o reconhecimento de seus direitos pela sociedade e pelo Estado são passos importantes na valorização da diversidade da população que vive e trabalha no semi-árido brasileiro. A análise dos avanços e dos pontos de estrangulamento da dimensão político-organizativo na construção da transição agroecológica passa inicialmente pela identificação dos principais atores interessadas em um novo modelo de desenvolvimento rural, para o Brasil e para o semi- árido em particular. Nesse sentido, considera-se a seguinte base organizativa: movimento sindical dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, movimento dos sem terra, movimento associativo e cooperativo, ONGs, instituições vinculadas às igrejas e partidos políticos progressistas. Parte-se também da idéia de que a transformação da consciência social agroecológica em força política depende do nível de organização do “bloco agroecológico” no interior desse conjunto. De início vale observar que possivelmente nessa dimensão residem as maiores fragilidades para a transição agroecológica no semi-árido. Esta síntese está relacionada com a análise de cada segmento, conforme se segue: Do ponto de vista quantitativo e territorial, o Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais – MSTTR é sem dúvida a estrutura organizativa mais forte no semi-árido. Entretanto, sua estratégia central, a construção do Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável – PADRS, de âmbito nacional, implementada pelas ações de massa, como o Grito da Terra Brasil e a Marcha das Margaridas e por ações mais permanentes por meio do PDLS, não tem a agroecologia como referência teórica para sua construção. Diversos sindicatos e algumas regionais, pólos sindicais e federações, contudo, já incorporaram, em graus variados, a agroecologia e a convivência com o semi-árido como elementos centrais na construção do PADRS. Ainda no campo sindical, vale ressaltar que a entrada da Central Única dos Trabalhadores – CUT, por intermédio da Agência de Desenvolvimento Solidário – ADS, no debate e na construção de um novo modelo de desenvolvimento, mesmo sem vinculação direta com a agroecologia, é um elemento favorável para o trabalho desse tema no semi-árido. Outro importante ator nacional atuante no semi-árido é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST. Até pouco tempo atrás, essa organização não poderia ser relacionada no campo da agroecologia, mas parece estar havendo um redirecionamento em função de questões mais gerais. No semi-árido, a tentativa inicial de modernização tecnológica químico- mecânica dos assentamentos mediante projetos de financiamento, aliada à organização coletivista da produção, mostrou-se bastante inadequada. Não foi possível obter informações confiáveis sobre até que ponto a agroecologia e a convivência no semi-árido têm sido trabalhadas pelo MST para reverter essas dificuldades. De modo geral, poucos assentamentos localizados no semi- árido, vinculados ao MST e/ou ao MSTTR, têm conseguido avançar nas dimensões produtiva, ambiental e comercial, o que gerou a formulação de uma ação específica do governo federal, o Projeto Dom Helder Câmara, que aponta a agroecologia como base técnica para o semi-árido. A transição agroecológica nessa região vai exigir uma organização de base muito ampla, representada pelas associações comunitárias e de produtores. Também não foi possível trabalhar 43
  • 44. com informações seguras nesse campo, mas é corrente a análise apontando a vinculação e a dependência da maioria dessas organizações aos programas governamentais, desde sua criação. Por outro lado, são muitas as organizações desse tipo que dão suporte ao trabalho com agroecologia junto às famílias dos agricultores familiares, e sem dúvida elas têm desempenhado papel fundamental na expansão da agroecologia no semi-árido. Um dos pontos de estrangulamento desse trabalho é a relativa dispersão e desarticulação entre essas formas organizativas e o MSTTR. Além do movimento associativista, deve-se também considerar o cooperativista, que, no geral, tem histórico bastante negativista, ainda que exista uma dinâmica de renovação, com criação de novas e pequenas cooperativas de agricultores familiares, incluindo algumas de crédito. A interiorização da agroecologia nessas estruturas organizativas pode ser observada, sendo necessário avançar nesse campo, até para viabilizar o crédito para a transição agroecológica. Analisando-se o papel das ONGs e da estrutura das igrejas em termos Políticos- organizativos, pode-se observar a importância da articulação entre esses dois atores na constituição da ASA e na implementação do P1MC, o que pode resultar numa forte organização mais permanente, abrangendo todo o semi-árido. Em relação aos partidos políticos progressistas, tem-se ainda um distanciamento em relação ao que está sendo construído, embora exista certa valorização dessa experiência. Em alguns temas, como a transposição de bacias, há sinais de posicionamentos diferenciados entre os partidos e as demais organizações atuantes na questão dos recursos hídricos. A transformação das diversas experiências agroecológicas em políticas públicas para a agricultura familiar tem sido uma batalha constante de todas as organizações da sociedade civil atuantes no semi-árido. Do ponto de vista mais geral, as ações relacionadas com captação, armazenamento e uso da água, em especial a cisterna de placas, têm sensibilizado os gestores públicos em todos os níveis administrativos, resultando em parcerias efetivas para a elaboração e implementação de programas com recursos públicos. As propostas de transformação dos sistemas produtivos têm apresentado mais dificuldades, mas algumas delas, como a apicultura, as casas de sementes, o manejo da caatinga e a criação de ovinos e caprinos e de aves, o algodão orgânico, o processamento da produção, etc., também têm sido incorporadas por um pequeno número de prefeituras e programas de financiamento, a exemplo do Programa de Financiamento à Conservação e Controle do Meio Ambiente do Banco do Nordeste – FNE Verde. Propostas mais ousadas, como a agroflorestação, ainda estão restritas às dinâmicas da própria sociedade civil. Os serviços de assistência técnica para a transição agroecológica e de apoio à comercialização também têm sido objeto de poucas iniciativas em termos de políticas públicas. Se no geral os avanços foram poucos, alguns bons resultados nas ações específicas vêm sendo alcançados, os que permite construir um banco de idéias e projetos para a expansão das políticas públicas baseadas na agroecologia. Apontar tendências, a partir de um conjunto de experiências pontuais parcialmente conectadas, é certamente uma temeridade, mas a importância e a pertinência do debate justificam os risco dessa empreitada com sabor de futurologia. O desafio consiste em fazer uma prospeção sobre para qual padrão de organização técnica, fundiária e socioeconômica tende esse conjunto de experiências em desenvolvimento no semi-árido. Considerando as imensas desigualdades existentes na atualidade, de modo geral, a tendência para o semi-árido é a de coexistência, por um largo tempo, de quatro padrões tecnológicos: o tradicional, o químico-mecânico, o biotecnológico/transgênico e o agroecológico. A falta de perspectiva de futuro para quem adota o padrão tradicional e as dificuldades de estabelecimento do padrão químico-mecânico na complexa realidade socioambiental do semi- árido sinaliza que esses dois padrões tendem ao declínio progressivo, estando a velocidade e a orientação dessas mudanças relacionadas com a capacidade de ação do “bloco agroecológico”. Considerando os processos desencadeados por esse bloco, expressos nos resultados positivos das referências agroecológicas já estabelecidas e no crescente envolvimento das organizações 44
  • 45. sindicais, associativas e cooperativas e das entidades de apoio com a difusão dessas experiências, pode-se conjecturar que o padrão agroecológico, articulado a uma mecanização mais criteriosa, será a base tecnológica de um significativo contingente da agricultura familiar e possivelmente de parcela da própria agricultura patronal. Quanto ao padrão fundiário que está sendo construído, considerando os avanços e percalços da reforma agrária no semi-árido até o momento, podem-se antever as seguintes tendências: diminuição do número de unidades familiares entre um e quatro módulos fiscais de cada região e expansão do número de propriedades abaixo de um módulo fiscal, pois a subdivisão por herança é um processo de difícil estancamento nas próximas décadas. Mesclados a essas pequenas unidades familiares, os assentamentos de maior porte, originários da desapropriação das grandes fazendas pelo governo federal, devem ter seu número aumentado, principalmente nas áreas sertanejas mais secas. Além disso, pode-se antever um significativo incremento de assentamentos de menor porte, viabilizados por programas estaduais de reforma agrária e de crédito fundiário. Eles permitirão o acesso a terra aos atuais sem terra, moradores em regiões que dispõem de poucas áreas passíveis de desapropriação. Vale lembrar que muitos deles são integrantes das várias associações comunitárias existentes, fruto do crescente processo de organização social da população rural, com todas as dificuldades e distorções observadas. Registre-se também que parte da população urbana dos numerosos pequenos municípios espalhados pelo semi-árido, ainda vinculada às atividades agrícolas, será beneficiária desse processo e também deverá estar inserida na estrutura fundiária de forma mais segura, superando a precariedade atual em termos de posse e uso da terra. Em síntese, a tendência geral de democratização do acesso a terra deve consolidar-se, podendo o ritmo e a velocidade do processo acelerarem-se, em função do perfil dos próximos governantes. Analisando os aspectos socioeconômicos que estão sendo geridas pelas experiências do bloco da agricultura sustentável, podem-se perceber dois caminhos. Um deles está apostando na difusão desse padrão tecnológico para todas as formas de organização socioeconômicas, sem distinção entre agricultura patronal e agricultura familiar. O outro caminho, referenciado no desenvolvimento rural solidário e sustentável, aponta para a articulação entre agricultura familiar, agroecologia e socioeconômica solidária como base para a convivência no semi-árido. Seguindo os passos do poeta, é nesse segundo caminho, construído no próprio caminhar, que residem às esperanças de construção de um novo padrão de organização social e técnica da agricultura do semi-árido. Caminhemos. A FEAB É... … DE LUTA 45