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Canto V – Gigante Adamastor

      Plano narrativo: Viagem
      Narrador: Vasco da Gama


             Vasco     da       gama
      conta, agora, a viagem da
      sua armada, de Lisboa a
      Melinde.       Dos      vários
      obstáculos       que        os
      marinheiros     tiveram     de
      ultrapassar, destaca-se o Gigante Adamastor, que correspondia ao Cabo das
      Tormentas, mais tarde chamado Cabo da Boa Esperança.


      O episódio é narrado por Vasco da Gama ao rei de Melinde na 1.ª pessoa.


      Passaram-se cinco dias de navegação calma quando, de repente, numa noite,
uma nuvem escura nos aparece. Vinha tão carregada, que ficámos cheios de medo.
Tanto, que pedi ajuda a Deus. Mal começara a rezar, quando se nos apresenta a
nossos olhos uma figura enorme, gigantesca e horrenda. Tinha o rosto carregado, a
barba esquálida, os olhos encovados, a cor terrena e pálida; toda a postura era
medonha e má. Tinha os cabelos cheios de terra e crespos; os dentes eram amarelos e
a boca negra. Além disso, falou-nos em tom de voz horrendo e grosso/que pareceu sair
do mar profundo. Por isso ficámos, eu e todos, arrepiados.
      E disse em tom irado:
      - Ó gente ousada, já que, ultrapassando os limites proibidos, ousas navegar nos
meus mares, que nunca foram sulcados por nenhum humano, e vens ver os segredos
escondidos da natureza e do mar, o que é vedado aos humanos, ouve os castigos que
reservo para o vosso atrevimento. Sabe que, daqui para a frente, todas as naus que
fizerem esta viagem me terão como inimigo e eu farei com que haja naufrágios,
perdições de toda a sorte/que o menor mal de todos seja a morte.



                                          1
Será o caso da primeira
armada que por aqui passar depois
da vossa frota (a armada de Pedro
Álvares Cabral). Hei de vingar-me
de Bartolomeu Dias, que foi quem
primeiro me descobriu, fazendo-o
naufragar aqui mesmo. O mesmo
vai suceder a Dom Francisco de
Almeida, primeiro vice-rei da Índia,
que aqui morrerá, no seu regresso à pátria. E será o caso de Manuel de Sousa
Sepúlveda, que naufragará por estes sítios, com sua mulher amantíssima e com os
filhos. Antes de morrerem abraçados, verão morrer com grande sofrimento os seus
filhos, gerados de tanto amor, e serão sujeitos a maus-tratos pelos negros indígenas.
      Mais ia a dizer o monstro horrendo, quando, de pé, o interpelei, perguntando,
sem mostrar receio:
      - Quem és tu? Que esse estupendo corpo, certo me tem maravilhado!
      E então algo de estranho se passou. Dando um espantoso e grande brado,
respondeu-me, com voz amarga, como se a pergunta o tivesse magoado:
      - Eu sou o Cabo que vós chamais de Tormentório ou das Tormentas,
desconhecido dos grandes geógrafos antigos. Aqui termino toda a costa africana. Fui
um dos Gigantes que defrontaram os deuses do Olimpo, em guerra sangrenta. O meu
nome é Adamastor, andei na luta contra o meu deus, Júpiter, e depois tornei-me
capitão do mar. No entanto, apaixonei-me por Tétis, a princesa das águas, e por ela
desprezei todas as restantes deusas. Aconteceu um dia em que a vi nua na praia,
acompanhada das Nereidas. A partir daí senti-me irremediavelmente preso. Tendo
consciência de que seria difícil alcançá-la, dado que sou muito feio, decidi tomá-la pela
força das armas e fiz saber isto a Dóris, sua mãe, para que ela pudesse convencê-la a
aceitar-me. Dóris foi então falar com ela e ela respondeu-lhe: - Qual será o amor
bastante de ninfa, que sustente o de um Gigante? No entanto, eu vou encontrar uma
maneira de evitar a guerra, sem ficar prejudicada ou desonrada.
      Fiquei convencido e, ingenuamente, desisti da guerra. Numa noite, prometida
por Dóris, aparece-me o gesto lindo da branca Tétis, única, despida. Corro como louco
para ela, procurando abraçar aquela que era vida deste corpo e beijando-lhe as faces e
os cabelos.


                                           2
Mas, eu nem sei como contá-lo, achei-me abraçado, não à minha amada, mas a
um duro monte, frente a um penedo, e eu próprio transformado em penedo!
       - Ó Ninfa, a mais formosa do Oceano,/já que minha presença não te agrada,/que
te custava ter-me neste engano,/ou fosse monte, nuvem, sonho, ou nada?
       Por esta altura já todos osmeusirmãostinham sido vencidos e transformadosem
montes e também eu comecei a sentir que me transformava neste Cabo.
       Mas o que mais me dói ainda é que, por mais dobradas mágoas, /me anda Tétis
cercando destas águas.
       Assim contava o Gigante e, chorando, afastou-se de nós. Eu então fiz uma prece
a Deus, pedindo-lhe que as profecias do Adamastor se não viessem a verificar.




Síntese da 1.ª parte (est. 37 - 38)
       Vasco da Gama narra ao rei de
Melinde que, depois de ver uma nuvem
escura e carregada de tal forma que
causava terror, perguntara a Deus que
ameaça ou que segredo seria aquele.



Síntese da 2.ª parte (est. 39 - 41)
       Não    tinha    terminado    as   suas
exclamações,        quando   já    uma   figura
gigantesca se erguia.        O aspeto      era
medonho e temível, era tão gigantesco
que poderia ser um segundo colosso de
Rodes, uma das sete maravilhas do mundo.
Os navegadores arrepiaram-se de medo só
de o ouvir e ver.


Síntese da 3.ª parte (est. 41 - 48)
       O Adamastor inicia o seu discurso dirigido aos navegadores portugueses.
Começa por designar os portugueses de “gente ousada”, mais audaz do que qualquer
outro povo.



                                             3
O Adamastor ameaça ter preparado grandes males para castigar o atrevimento
dos portugueses e afirma que todas as naus que ali chegarem serão castigadas. O
gigante refere que irá vingar-se do primeiro que o descobriu - Bartolomeu Dias - mas
que não ficará por aí, que todos os anos causará naufrágios, perdições de toda a
espécie de forma que o menor mal será ainda o da morte.
        Adamastor continua a profetizar,
mencionando que D. Francisco de
Almeida morrerá e o seu corpo jazerá no
seu espaço territorial, que Manuel de
Sousa     Sepúlveda      e     sua       família
sobreviverão    a   um       naufrágio     para
sofrerem até à morte em terra maus-
tratos dos indígenas.


Síntese da 4.ª parte (est. 49)
O Adamastor continua a vaticinar o destino dos navegadores, quando Vasco da Gama
o interrompe e lhe pergunta quem é.
        Ele retorceu os olhos, deu um espantoso brado como se a pergunta lhe tivesse
doído, e respondeu.


Síntese da 5.ª parte (est. 50 - 59)

        O Adamastor responde ao Gama que é aquele oculto e grande cabo a quem
chamam das Tormentas e que se sente muito ofendido com a ousadia dos
portugueses.
        Ele conta que foi filho da Terra como outros gigantes revoltados, andou na
guerra contra Júpiter e contra Neptunoe que foi o seu amor por Tétis, esposa de Peleu,
que o levou a ser quem é.
        Como era muito feio, resolveu conquistar Tétis à força e expor o assunto à mãe
dela - Dóris. Com medo, Dóris transmite a mensagem à sua filha que manda responder
a Adamastor que o amor de uma ninfa não satisfará o de um gigante mas, para evitar a
guerra e respeitando a sua honra, irá arranjar forma de evitar danos. Assim,
Adamastor, cego de amor, fica cheio de esperanças.
        Certa noite, Adamastor foi ao encontro de Tétis, como tinha sido prometido por
ela e, ao ver o seu vulto, corre como louco e beija-a. Na realidade, não era Tétis mas

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um duro monte. Ele próprio se sentiu pedra. Cheio de vergonha e desgosto, fugiu em
busca de um lugar onde ninguém o conhecesse.
Seus irmãos gigantes, filhos da Terra, já tinham sido vencidos e sepultados em vários
montes e, como contra a vontade divina, os homens nada podem, Adamastor começou
a sentir o castigo pelos seus atrevimentos, transformando-se no cabo das Tormentas,
rodeado por Tétis nas águas.



Síntese da 6.ª parte (est. 60)
      E, dizendo isto, com um medonho choro o Adamastor desapareceu diante
dos olhos dos marinheiros. Desfez-se a nuvem negra e o mar soou lá longe. Vasco da
Gama pediu a Deus que removesse as trágicas profecias do Adamastor.




                               O Discurso do Adamastor
      Na primeira parte do seu discurso (est.41 a 48) o Adamastor apresenta-se como
senhor do mar desconhecido (meus longos mares), ameaçando os portugueses, que
queriam devassar os seus domínios secretos, e profetizando paraeles castigos futuros.
Surge, portanto, como um super-homem, quer no aspeto físico (focado atrás na
caracterização direta feita pelo narrador) quer no aspeto psicológico, conhecendo o
passado dos portugueses e profetizando os seus desastres futuros.
      Na segunda parte do seu discurso (est. 49 a 59), o Adamastor, começando
embora por referir a sua força física de super-homem, identificando-se o cabo
Tormentório, ufanando-se da sua intervenção numa guerra entre deuses, sendo contra
o próprio Júpiter e conseguindo o domínio dos mares logo que se abre em confidências
acerca da sua vida sentimental, revela-se um herói frustrado nos seus amores, iludido
a ponto de julgar que apertava a branca Tétis, quando abraçava um duro monte,
castigado pelos deuses de tal maneira que converteram o seu gigantesco corpo no
próprio Cabo Tormentório.
      À realidade gigantesca do seu corpo de super-homem (1ª parte do discurso)
sucede a fragilidade psicológica de um herói enganado e vencido que perde a sua
própria individualidade transformando-se em penedos.




                                          5
Intenção da 1.ª parte do discurso do gigante:
      A intenção da 1ª parte do discurso do gigante é demover os portugueses da
viagem empreendida. O Adamastor começa por reconhecer a valentia dos
portugueses, manifestada em muitas guerras, para logo lhes declarar que nunca os
segredos do mar (os vedados términos do húmido elemento) foram a nenhum grande
humano concedidos / de nobre ou de imortal merecimento. Após mostrar assim que
não tinha havido precedentes em tal atrevimento, o gigante começa a agitar os castigos
que vibrará sobre os transgressores: inimiga terão esta paragem, / Eu farei de
improviso tal castigo / Que seja mor o dano que o perigo! / Que o menor mal de todos
seja a morte! Note-se que os castigos apontados se sucedem em progressão
ascendente de grandeza (dos apontados o pior é a morte, mas o poeta sugere outros
males, não indicados, piores do que a própria morte). Os destinatários destes castigos
são primeiramente apontados em abstrato (quantas naus esta viagem fizerem, inimiga
terão esta paragem), sucedendo-se os casos concretos de vinganças sobre
personalidades ilustres portuguesas: a primeira armada que passagem fizer... (a
armada de Pedro Álvares Cabral), o primeiro ilustre (D. Francisco de Almeida), outro
também virá (Sepúlveda) e consigo a formosa dama (esposa de Sepúlveda).
Esta progressão ascendente da gravidade dos castigos a vibrar sobre os
transgressores e esta transição do plano geral para planos particulares (individuais)
são processos estilísticos muito adequados a um discurso em que predomina a função
apelativa da linguagem, que tinha por fim afastar, pelo medo, os navegantes daquelas
paragens.

    Evolução do comportamento do gigante e de Vasco da Gama




             Repara que a evolução dos comportamentos é oposta.
                                          6
Simbologia do Episódio
       Já no meio da viagem, os portugueses encontram-se face a face com o maior
dos perigos e dos medos: o gigante Adamastor.
       “O Adamastor” é um episódio simbólico e representa os perigos e as dificuldades
que se apresentam ao Homem que sente o impulso de conhecer e descobrir. Só
superando o medo, o Homem poderá vencer (princípio do Humanismo). O Adamastor
é, portanto, uma figura mitológica criada por Camões como forma de concentrar todos
os perigos e dificuldades a transpor pelos portugueses.
       Repara que, depois da passagem do cabo pelos portugueses, este passou a
designar-se de Cabo da Boa Esperança.
       Perpassa neste episódio a mentalidade renascentista: o homem afirma-se
vencendo com o vigor físico e intelectual as forças cósmicas que continuamente o
limitam. A destruição completa do gigante simboliza o completo domínio dos mares
pelos portugueses. O Adamastor surge, no fim, como anti-herói, para dar lugar a heróis
de carne e osso, a heróis reais, do tamanho do homem. A sequência gradativa
verificada no verso «Ou fosse monte, nuvem, sonho, ou nada»: monte é o material, a
natureza real que limita o homem; nuvem é material, mas menos palpável; sonho é o
imaterial; nada é o zero absoluto, o aniquilamento.
       O Adamastor, enquanto foi realidade, foi um monte, ele identificou-se com o
cabo das Tormentas (eu sou aquele oculto e grande cabo). Este cabo constituía o
ponto mais difícil de dobrar. À medida que a força do gigante se vai desvanecendo, até
chegar a nada (anti-herói) a vitória dos portugueses (heróis) vai estando mais próxima,
até chegarem à Índia. Nota que, quando o gigante desaparece dos olhos dos
marinheiros, o poeta acrescenta: e cum sonoro bramido muito longe o mar soou. Isto é,
a figura simbólica (o Adamastor) reduziu-se a zero, mas a coisa simbolizada, o mar
terrível, estava ainda a bramir. Mas os portugueses, vencedores desse mar, seguiam
vitoriosos.
       O significado simbólico deste episódio foi ainda realçado pelo facto de o poeta o
ter colocado no centro do canto V que é também o centro d'Os Lusíadas. Deste modo,
o episódio do Adamastor, em que se associam admiravelmente a realidade (perigos do
mar) com o maravilhoso (profecias), em que não falta mesmo uma fantasiada história
de lirismo amoroso, em que é simbolizada a vitória do homem sobre os elementos
cósmicos adversos, constitui uma espécie de abóbada da grande catedral que é o
poema.

                                           7

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  • 1. Canto V – Gigante Adamastor Plano narrativo: Viagem Narrador: Vasco da Gama Vasco da gama conta, agora, a viagem da sua armada, de Lisboa a Melinde. Dos vários obstáculos que os marinheiros tiveram de ultrapassar, destaca-se o Gigante Adamastor, que correspondia ao Cabo das Tormentas, mais tarde chamado Cabo da Boa Esperança. O episódio é narrado por Vasco da Gama ao rei de Melinde na 1.ª pessoa. Passaram-se cinco dias de navegação calma quando, de repente, numa noite, uma nuvem escura nos aparece. Vinha tão carregada, que ficámos cheios de medo. Tanto, que pedi ajuda a Deus. Mal começara a rezar, quando se nos apresenta a nossos olhos uma figura enorme, gigantesca e horrenda. Tinha o rosto carregado, a barba esquálida, os olhos encovados, a cor terrena e pálida; toda a postura era medonha e má. Tinha os cabelos cheios de terra e crespos; os dentes eram amarelos e a boca negra. Além disso, falou-nos em tom de voz horrendo e grosso/que pareceu sair do mar profundo. Por isso ficámos, eu e todos, arrepiados. E disse em tom irado: - Ó gente ousada, já que, ultrapassando os limites proibidos, ousas navegar nos meus mares, que nunca foram sulcados por nenhum humano, e vens ver os segredos escondidos da natureza e do mar, o que é vedado aos humanos, ouve os castigos que reservo para o vosso atrevimento. Sabe que, daqui para a frente, todas as naus que fizerem esta viagem me terão como inimigo e eu farei com que haja naufrágios, perdições de toda a sorte/que o menor mal de todos seja a morte. 1
  • 2. Será o caso da primeira armada que por aqui passar depois da vossa frota (a armada de Pedro Álvares Cabral). Hei de vingar-me de Bartolomeu Dias, que foi quem primeiro me descobriu, fazendo-o naufragar aqui mesmo. O mesmo vai suceder a Dom Francisco de Almeida, primeiro vice-rei da Índia, que aqui morrerá, no seu regresso à pátria. E será o caso de Manuel de Sousa Sepúlveda, que naufragará por estes sítios, com sua mulher amantíssima e com os filhos. Antes de morrerem abraçados, verão morrer com grande sofrimento os seus filhos, gerados de tanto amor, e serão sujeitos a maus-tratos pelos negros indígenas. Mais ia a dizer o monstro horrendo, quando, de pé, o interpelei, perguntando, sem mostrar receio: - Quem és tu? Que esse estupendo corpo, certo me tem maravilhado! E então algo de estranho se passou. Dando um espantoso e grande brado, respondeu-me, com voz amarga, como se a pergunta o tivesse magoado: - Eu sou o Cabo que vós chamais de Tormentório ou das Tormentas, desconhecido dos grandes geógrafos antigos. Aqui termino toda a costa africana. Fui um dos Gigantes que defrontaram os deuses do Olimpo, em guerra sangrenta. O meu nome é Adamastor, andei na luta contra o meu deus, Júpiter, e depois tornei-me capitão do mar. No entanto, apaixonei-me por Tétis, a princesa das águas, e por ela desprezei todas as restantes deusas. Aconteceu um dia em que a vi nua na praia, acompanhada das Nereidas. A partir daí senti-me irremediavelmente preso. Tendo consciência de que seria difícil alcançá-la, dado que sou muito feio, decidi tomá-la pela força das armas e fiz saber isto a Dóris, sua mãe, para que ela pudesse convencê-la a aceitar-me. Dóris foi então falar com ela e ela respondeu-lhe: - Qual será o amor bastante de ninfa, que sustente o de um Gigante? No entanto, eu vou encontrar uma maneira de evitar a guerra, sem ficar prejudicada ou desonrada. Fiquei convencido e, ingenuamente, desisti da guerra. Numa noite, prometida por Dóris, aparece-me o gesto lindo da branca Tétis, única, despida. Corro como louco para ela, procurando abraçar aquela que era vida deste corpo e beijando-lhe as faces e os cabelos. 2
  • 3. Mas, eu nem sei como contá-lo, achei-me abraçado, não à minha amada, mas a um duro monte, frente a um penedo, e eu próprio transformado em penedo! - Ó Ninfa, a mais formosa do Oceano,/já que minha presença não te agrada,/que te custava ter-me neste engano,/ou fosse monte, nuvem, sonho, ou nada? Por esta altura já todos osmeusirmãostinham sido vencidos e transformadosem montes e também eu comecei a sentir que me transformava neste Cabo. Mas o que mais me dói ainda é que, por mais dobradas mágoas, /me anda Tétis cercando destas águas. Assim contava o Gigante e, chorando, afastou-se de nós. Eu então fiz uma prece a Deus, pedindo-lhe que as profecias do Adamastor se não viessem a verificar. Síntese da 1.ª parte (est. 37 - 38) Vasco da Gama narra ao rei de Melinde que, depois de ver uma nuvem escura e carregada de tal forma que causava terror, perguntara a Deus que ameaça ou que segredo seria aquele. Síntese da 2.ª parte (est. 39 - 41) Não tinha terminado as suas exclamações, quando já uma figura gigantesca se erguia. O aspeto era medonho e temível, era tão gigantesco que poderia ser um segundo colosso de Rodes, uma das sete maravilhas do mundo. Os navegadores arrepiaram-se de medo só de o ouvir e ver. Síntese da 3.ª parte (est. 41 - 48) O Adamastor inicia o seu discurso dirigido aos navegadores portugueses. Começa por designar os portugueses de “gente ousada”, mais audaz do que qualquer outro povo. 3
  • 4. O Adamastor ameaça ter preparado grandes males para castigar o atrevimento dos portugueses e afirma que todas as naus que ali chegarem serão castigadas. O gigante refere que irá vingar-se do primeiro que o descobriu - Bartolomeu Dias - mas que não ficará por aí, que todos os anos causará naufrágios, perdições de toda a espécie de forma que o menor mal será ainda o da morte. Adamastor continua a profetizar, mencionando que D. Francisco de Almeida morrerá e o seu corpo jazerá no seu espaço territorial, que Manuel de Sousa Sepúlveda e sua família sobreviverão a um naufrágio para sofrerem até à morte em terra maus- tratos dos indígenas. Síntese da 4.ª parte (est. 49) O Adamastor continua a vaticinar o destino dos navegadores, quando Vasco da Gama o interrompe e lhe pergunta quem é. Ele retorceu os olhos, deu um espantoso brado como se a pergunta lhe tivesse doído, e respondeu. Síntese da 5.ª parte (est. 50 - 59) O Adamastor responde ao Gama que é aquele oculto e grande cabo a quem chamam das Tormentas e que se sente muito ofendido com a ousadia dos portugueses. Ele conta que foi filho da Terra como outros gigantes revoltados, andou na guerra contra Júpiter e contra Neptunoe que foi o seu amor por Tétis, esposa de Peleu, que o levou a ser quem é. Como era muito feio, resolveu conquistar Tétis à força e expor o assunto à mãe dela - Dóris. Com medo, Dóris transmite a mensagem à sua filha que manda responder a Adamastor que o amor de uma ninfa não satisfará o de um gigante mas, para evitar a guerra e respeitando a sua honra, irá arranjar forma de evitar danos. Assim, Adamastor, cego de amor, fica cheio de esperanças. Certa noite, Adamastor foi ao encontro de Tétis, como tinha sido prometido por ela e, ao ver o seu vulto, corre como louco e beija-a. Na realidade, não era Tétis mas 4
  • 5. um duro monte. Ele próprio se sentiu pedra. Cheio de vergonha e desgosto, fugiu em busca de um lugar onde ninguém o conhecesse. Seus irmãos gigantes, filhos da Terra, já tinham sido vencidos e sepultados em vários montes e, como contra a vontade divina, os homens nada podem, Adamastor começou a sentir o castigo pelos seus atrevimentos, transformando-se no cabo das Tormentas, rodeado por Tétis nas águas. Síntese da 6.ª parte (est. 60) E, dizendo isto, com um medonho choro o Adamastor desapareceu diante dos olhos dos marinheiros. Desfez-se a nuvem negra e o mar soou lá longe. Vasco da Gama pediu a Deus que removesse as trágicas profecias do Adamastor. O Discurso do Adamastor Na primeira parte do seu discurso (est.41 a 48) o Adamastor apresenta-se como senhor do mar desconhecido (meus longos mares), ameaçando os portugueses, que queriam devassar os seus domínios secretos, e profetizando paraeles castigos futuros. Surge, portanto, como um super-homem, quer no aspeto físico (focado atrás na caracterização direta feita pelo narrador) quer no aspeto psicológico, conhecendo o passado dos portugueses e profetizando os seus desastres futuros. Na segunda parte do seu discurso (est. 49 a 59), o Adamastor, começando embora por referir a sua força física de super-homem, identificando-se o cabo Tormentório, ufanando-se da sua intervenção numa guerra entre deuses, sendo contra o próprio Júpiter e conseguindo o domínio dos mares logo que se abre em confidências acerca da sua vida sentimental, revela-se um herói frustrado nos seus amores, iludido a ponto de julgar que apertava a branca Tétis, quando abraçava um duro monte, castigado pelos deuses de tal maneira que converteram o seu gigantesco corpo no próprio Cabo Tormentório. À realidade gigantesca do seu corpo de super-homem (1ª parte do discurso) sucede a fragilidade psicológica de um herói enganado e vencido que perde a sua própria individualidade transformando-se em penedos. 5
  • 6. Intenção da 1.ª parte do discurso do gigante: A intenção da 1ª parte do discurso do gigante é demover os portugueses da viagem empreendida. O Adamastor começa por reconhecer a valentia dos portugueses, manifestada em muitas guerras, para logo lhes declarar que nunca os segredos do mar (os vedados términos do húmido elemento) foram a nenhum grande humano concedidos / de nobre ou de imortal merecimento. Após mostrar assim que não tinha havido precedentes em tal atrevimento, o gigante começa a agitar os castigos que vibrará sobre os transgressores: inimiga terão esta paragem, / Eu farei de improviso tal castigo / Que seja mor o dano que o perigo! / Que o menor mal de todos seja a morte! Note-se que os castigos apontados se sucedem em progressão ascendente de grandeza (dos apontados o pior é a morte, mas o poeta sugere outros males, não indicados, piores do que a própria morte). Os destinatários destes castigos são primeiramente apontados em abstrato (quantas naus esta viagem fizerem, inimiga terão esta paragem), sucedendo-se os casos concretos de vinganças sobre personalidades ilustres portuguesas: a primeira armada que passagem fizer... (a armada de Pedro Álvares Cabral), o primeiro ilustre (D. Francisco de Almeida), outro também virá (Sepúlveda) e consigo a formosa dama (esposa de Sepúlveda). Esta progressão ascendente da gravidade dos castigos a vibrar sobre os transgressores e esta transição do plano geral para planos particulares (individuais) são processos estilísticos muito adequados a um discurso em que predomina a função apelativa da linguagem, que tinha por fim afastar, pelo medo, os navegantes daquelas paragens. Evolução do comportamento do gigante e de Vasco da Gama Repara que a evolução dos comportamentos é oposta. 6
  • 7. Simbologia do Episódio Já no meio da viagem, os portugueses encontram-se face a face com o maior dos perigos e dos medos: o gigante Adamastor. “O Adamastor” é um episódio simbólico e representa os perigos e as dificuldades que se apresentam ao Homem que sente o impulso de conhecer e descobrir. Só superando o medo, o Homem poderá vencer (princípio do Humanismo). O Adamastor é, portanto, uma figura mitológica criada por Camões como forma de concentrar todos os perigos e dificuldades a transpor pelos portugueses. Repara que, depois da passagem do cabo pelos portugueses, este passou a designar-se de Cabo da Boa Esperança. Perpassa neste episódio a mentalidade renascentista: o homem afirma-se vencendo com o vigor físico e intelectual as forças cósmicas que continuamente o limitam. A destruição completa do gigante simboliza o completo domínio dos mares pelos portugueses. O Adamastor surge, no fim, como anti-herói, para dar lugar a heróis de carne e osso, a heróis reais, do tamanho do homem. A sequência gradativa verificada no verso «Ou fosse monte, nuvem, sonho, ou nada»: monte é o material, a natureza real que limita o homem; nuvem é material, mas menos palpável; sonho é o imaterial; nada é o zero absoluto, o aniquilamento. O Adamastor, enquanto foi realidade, foi um monte, ele identificou-se com o cabo das Tormentas (eu sou aquele oculto e grande cabo). Este cabo constituía o ponto mais difícil de dobrar. À medida que a força do gigante se vai desvanecendo, até chegar a nada (anti-herói) a vitória dos portugueses (heróis) vai estando mais próxima, até chegarem à Índia. Nota que, quando o gigante desaparece dos olhos dos marinheiros, o poeta acrescenta: e cum sonoro bramido muito longe o mar soou. Isto é, a figura simbólica (o Adamastor) reduziu-se a zero, mas a coisa simbolizada, o mar terrível, estava ainda a bramir. Mas os portugueses, vencedores desse mar, seguiam vitoriosos. O significado simbólico deste episódio foi ainda realçado pelo facto de o poeta o ter colocado no centro do canto V que é também o centro d'Os Lusíadas. Deste modo, o episódio do Adamastor, em que se associam admiravelmente a realidade (perigos do mar) com o maravilhoso (profecias), em que não falta mesmo uma fantasiada história de lirismo amoroso, em que é simbolizada a vitória do homem sobre os elementos cósmicos adversos, constitui uma espécie de abóbada da grande catedral que é o poema. 7