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PERSONAGEM


CHARLE
CHRISTIAN
Hmas foi guitarristasCharlie Chris-
—
  ouve

          o jazzista
                      que tocaram
  violões amplificados antes dele
                                          la música começou a se manifestar
                                          cedo. Aos doze anos de idade, já
                                          dominava o trompete. Um pouco
                                                                                    um captador magnético adaptado.
                                                                                    O som desse instrumento tornou-se
                                                                                    tão vinculado a Charlie Christian
tian quem transformou a guitarra          mais tarde, aprendeu a tocar violão       que, posteriormente, seus captado-
elétrica numa proposta séria. Chris-      e construiu sua primeira guitarra a       res passaram a levar o nome do gui-
tian foi o principal responsável pelo     partir de uma caixa de charutos. Em       tarrista.
desenvolvimento do solo nota-por-         pouco tempo, era capaz também de              O artista voltou para o conjunto
-nota na guitarra, que a partir daí       executar outros instrumentos, como        de Al Trent, desta vez como guitar-
deixou de ser apenas um instrumen-        o contrabaixo e o piano. E foi como       rista. A reação à sua música, tanto
to de acompanhamento e marcação           contrabaixista que Charlie conseguiu      do público como dos outros músi-
rítmica para assumir também a fun-        seu primeiro trabalho profissional,       cos, Combinava assombro e admira-
ção de solista, da mesma forma que        em 1934, no conjunto de Alphonso          ção. Embora outros guitarristas —
o saxofone, o trompete, o clarinete       Trent. Tocou em diversos outros           especialmente Django Reinhardt —
e outros instrumentos do jazz. A pró-     grupos, e já era um dos músicos lo-       tenham dominado o violão como
pria função de acompanhamento             cais mais admirados em Oklahoma,          instrumento de solo, essa era a pri-
ganhou também novos contornos             quando entrou em contato com Ed-          meira vez que uma guitarra elétrica
com Christian, que combinava um           die Durham, por volta de 1937.            assumia esse papel.
estilo rítmico percussivo com estru-      Durham era arranjador, trombonis-             Christian era uma espécie de he-
turas harmónicas pouco usadas pe-         ta e um dos pioneiros da guitarra elé-    rói local em Oklahoma, na época em
los guitarristas da época. Essas estru-   trica, na orquestra de Count Basie.       que foi descoberto por John Ham-
turas, baseadas no emprego de acor-           Christian se interessou pelo traba-   mond, influente empresário de jazz.
des alterados, e a abordagem rítmi-       lho de Durham na guitarra, bem co-        Eles se encontraram pela primeira
ca, cheia de acentos inesperados e        mo pelo de Floyd Smith, que toca-         vez quando Hammond estava a ca-
com predileção pelos andamentos           va uma guitarra havaiana amplifica-       minho da costa oeste, para realizar
mais rápidos, constituíram uma das        da. Quando conheceu Durham, quis          uma gravação com o quinteto do
grandes contribuições do guitarrista      saber tudo sobre sua técnica musi-        clarinetista Benny Goodman. Ham-
ao que ele e seus co-inovadores cha-      cal. Na época, Christian não possuía      mond telegrafou avisando Christian
maram de jazz "moderno" — embo-           uma guitarra; quando Durham lhe           de que estava chegando — e, ao
ra essa forma tenha ficado mais co-       sugeriu que conseguisse uma para si,      descer do avião, foi recepcionado
nhecida como "bop", ou "bebop".           ele apareceu com um instrumento           pelos integrantes do conjunto de
    Charlie Christian nasceu em Dai-      de 5 dólares, de qualidade compa-         Charlie, que foram até o aeroporto
las, Texas, EUA, em 1919 — ape-           tível com esse preço. Durham achou        a bordo de um Buick velho. Ao che-
sar de alguns historiadores do jazz si-   o instrumento divertido, mas ficou        gar ao Hotel Ritz, onde Hammond
tuarem sua data de nascimento um          impressionado com o insaciável de-        se hospedou, depararam-se com
pouco antes, em 1916. Quando              sejo de Christian em aprender — e         Charlie, vestido com um chapéu de
Charlie tinha dois anos, a família        com sua habilidade em assimilar ins-      caubói, um terno verde brilhante, ca-
mudou-se do Texas para Oklahoma.          tantaneamente tudo o que lhe era          misa violeta, gravata-borboleta listra-
O estímulo para a música veio do          mostrado.                                 da e sapatos de bico, que pareciam-
próprio ambiente familiar: seu pai            Em 1938, Christian já havia ad-       lhe machucar os pés. No entanto,
era cantor e violonista, e acredita-se    quirido uma guitarra Gibson "Elec-        assim que o conjunto começou a to-
que todos os seus quatro irmãos           tric Spanish" ES-150 e, muito pro-        car, Hammond percebeu que esta-
também tocavam instrumentos mu-           vavelmente, um amplificador Gib-          va ouvindo algo especial. Christian
sicais.                                   son. A guitarra era o primeiro mo-        produzia um fluxo aparentemente
   Assim, o interesse de Charlie pe-      delo a ser vendido completo, com          infindável de ideias musicais inven-
PERSONAGE
                                                                                    de tocar e adaptar-se ao novo esti-
                                                                                    lo. Acostumados com o swing, es-
                                                                                    cola do jazz em que os temas eram
                                                                                    simples, permeados por refrões for-
                                                                                    tes e melódicos, os artistas da ve-
                                                                                    Iha-guarda passaram a encarar o bop
                                                                                    como uma verdadeira tentativa de
                                                                                    golpe de estado contra as mais sa-
                                                                                    gradas tradições da música popular
                                                                                    americana. O som daqueles jovens
                                                                                    era todo entrecortado, sem uma me-
                                                                                    lodia linear, facilmente memorizável.
                                                                                    As deixas para as partes solo suce-
                                                                                    diam-se num ritmo alucinante nas
                                                                                    animadas jam-sessions.
                                                                                       Um bom exemplo do assombro
                                                                                    que o bop causou nos antigos jazzis-
                                                                                    tas está nesta declaração de Louis
                                                                                    Armstrong: "O que eles querem é
                                                                                    dar um golpe baixo em todos os ou-
                                                                                    tros, estão cheios de malícia e que-
                                                                                    rem jogar a gente longe. E é o que
                                                                                    acontece quando uma música anti-
                                                                                    ga é tocada de modo diferente do
                                                                                    que se tocava antes. O que eles fa-
Um dos pioneiros do bebop, Christian revolucionou o papel da guitarra no jazz.      zem agora não vale nada. Parece
                                                                                    coisa boa, e o pessoal fica cheio de
tivas, tocando num estilo jamais ou-        bre ela com a maior facilidade. E, em   curiosidade, mas acaba cansando
vido na guitarra elétrica.                  vez de ficar de fora, Christian tocou   disso logo porque a verdade é que
    Hammorid imaginou que Chris-            solos magníficos chorus após chorus.    não presta mesmo; não tem uma
tian seria perfeito para o pequeno          O conjunto encerrou o número 45         melodia que fique na memória, nem
grupo de jazz de Benny Goodman              minutos mais tarde, para ser sauda-     mesmo uma cadência adequada pa-
e o levou à Califórnia para uma au-         do com a maior ovação que Ham-          ra dançar. Acabam todos ficando
dição. No entanto, Goodman assu-            mond jamais vira um grupo de            pobres outra vez, ninguém quer tra-
miu uma atitude de "bons músicos            Goodman receber. Naquela noite, o       balhar. Eis o que a malícia de agora,
existem às dúzias". Não demonstrou          quinteto de Benny Goodman tor-          dos modernos, acabou nos fazen-
qualquer interesse especial por             nou-se um sexteto.                      do". Charlie Christian participou das
Christian, alegando estar preocupa-            Christian ficou no grupo até sua     primeiras gravações que registraram
do com coisas mais importantes.             morte, menos de dois anos depois.       essa revolução dentro do jazz, jun-
Mas, naquela noite, Hammond ins-            Mas, após tocar com Goodman à           tamente com o trompetísta Joe Guy,
talou sorrateiramente o amplificador        noite, ele frequentemente se dirigia    o pianista Thelonius Monk e o con-
de Christian no palco, enquanto             ao Minton's Playhouse, um clube de      trabaixista Nick Fentos.
Goodman jantava antes de tocar.             jazz do Harlem, em Nova York. Lá           Após os primeiros anos, o bop
Quando o conjunto estava pronto             tocava por horas, com músicos de        deixou de causar espanto e empla-
para iniciar o concerto, a porta da         jazz da categoria de Dizzy Gillespie,   cou no gosto dos apreciadores de
cozinha se abriu e Goodman viu              Thelonius Monk e Charlie "The           jazz. Ironicamente, como um dos
Christian se dirigindo também ao            Bird" Parker. Esses quatro músicos      criadores do novo estilo, Charlie
palco. Furioso, mas forçado a dei-          são considerados os fundadores do       Christian acabou não participando
xar o guitarrista tocar ao menos um         jazz bebop. Charlie Christian é des-    de sua fase áurea. Em julho de
número, Goodman ordenou ao                  crito pelos críticos musicais como o    1941, o guitarrista teve um colapso
conjunto executasse "Rose room",            "pai espiritual do grupo", já que foi   e foi internado no Hospital Bellevue
música que um guitarrista negro de          ele o primeiro músico a retirar do      de Nova York, com tuberculose.
Oklahoma provavelmente não sabe-            swing uma série de elementos para       Morreu em 2 de março de 1942, de-
ria tocar. Mas o band-leader não sa-        criar uma nova forma de tocar.          pois de contrair pneumonia. Sua
bia que Christian só precisava ouvir            Isso gerou muita polémica, já que   obra musical ficou registrada em vá-
uma sequência de acordes uma úni-           os músicos veteranos sentiam gran-      rias gravações, a maior parte delas
ca vez para conseguir improvisar so-        de dificuldade em mudar sua forma       no conjunto de Benny Goodman.

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Sistema Solar

Charlie Christian

  • 1. PERSONAGEM CHARLE CHRISTIAN Hmas foi guitarristasCharlie Chris- — ouve o jazzista que tocaram violões amplificados antes dele la música começou a se manifestar cedo. Aos doze anos de idade, já dominava o trompete. Um pouco um captador magnético adaptado. O som desse instrumento tornou-se tão vinculado a Charlie Christian tian quem transformou a guitarra mais tarde, aprendeu a tocar violão que, posteriormente, seus captado- elétrica numa proposta séria. Chris- e construiu sua primeira guitarra a res passaram a levar o nome do gui- tian foi o principal responsável pelo partir de uma caixa de charutos. Em tarrista. desenvolvimento do solo nota-por- pouco tempo, era capaz também de O artista voltou para o conjunto -nota na guitarra, que a partir daí executar outros instrumentos, como de Al Trent, desta vez como guitar- deixou de ser apenas um instrumen- o contrabaixo e o piano. E foi como rista. A reação à sua música, tanto to de acompanhamento e marcação contrabaixista que Charlie conseguiu do público como dos outros músi- rítmica para assumir também a fun- seu primeiro trabalho profissional, cos, Combinava assombro e admira- ção de solista, da mesma forma que em 1934, no conjunto de Alphonso ção. Embora outros guitarristas — o saxofone, o trompete, o clarinete Trent. Tocou em diversos outros especialmente Django Reinhardt — e outros instrumentos do jazz. A pró- grupos, e já era um dos músicos lo- tenham dominado o violão como pria função de acompanhamento cais mais admirados em Oklahoma, instrumento de solo, essa era a pri- ganhou também novos contornos quando entrou em contato com Ed- meira vez que uma guitarra elétrica com Christian, que combinava um die Durham, por volta de 1937. assumia esse papel. estilo rítmico percussivo com estru- Durham era arranjador, trombonis- Christian era uma espécie de he- turas harmónicas pouco usadas pe- ta e um dos pioneiros da guitarra elé- rói local em Oklahoma, na época em los guitarristas da época. Essas estru- trica, na orquestra de Count Basie. que foi descoberto por John Ham- turas, baseadas no emprego de acor- Christian se interessou pelo traba- mond, influente empresário de jazz. des alterados, e a abordagem rítmi- lho de Durham na guitarra, bem co- Eles se encontraram pela primeira ca, cheia de acentos inesperados e mo pelo de Floyd Smith, que toca- vez quando Hammond estava a ca- com predileção pelos andamentos va uma guitarra havaiana amplifica- minho da costa oeste, para realizar mais rápidos, constituíram uma das da. Quando conheceu Durham, quis uma gravação com o quinteto do grandes contribuições do guitarrista saber tudo sobre sua técnica musi- clarinetista Benny Goodman. Ham- ao que ele e seus co-inovadores cha- cal. Na época, Christian não possuía mond telegrafou avisando Christian maram de jazz "moderno" — embo- uma guitarra; quando Durham lhe de que estava chegando — e, ao ra essa forma tenha ficado mais co- sugeriu que conseguisse uma para si, descer do avião, foi recepcionado nhecida como "bop", ou "bebop". ele apareceu com um instrumento pelos integrantes do conjunto de Charlie Christian nasceu em Dai- de 5 dólares, de qualidade compa- Charlie, que foram até o aeroporto las, Texas, EUA, em 1919 — ape- tível com esse preço. Durham achou a bordo de um Buick velho. Ao che- sar de alguns historiadores do jazz si- o instrumento divertido, mas ficou gar ao Hotel Ritz, onde Hammond tuarem sua data de nascimento um impressionado com o insaciável de- se hospedou, depararam-se com pouco antes, em 1916. Quando sejo de Christian em aprender — e Charlie, vestido com um chapéu de Charlie tinha dois anos, a família com sua habilidade em assimilar ins- caubói, um terno verde brilhante, ca- mudou-se do Texas para Oklahoma. tantaneamente tudo o que lhe era misa violeta, gravata-borboleta listra- O estímulo para a música veio do mostrado. da e sapatos de bico, que pareciam- próprio ambiente familiar: seu pai Em 1938, Christian já havia ad- lhe machucar os pés. No entanto, era cantor e violonista, e acredita-se quirido uma guitarra Gibson "Elec- assim que o conjunto começou a to- que todos os seus quatro irmãos tric Spanish" ES-150 e, muito pro- car, Hammond percebeu que esta- também tocavam instrumentos mu- vavelmente, um amplificador Gib- va ouvindo algo especial. Christian sicais. son. A guitarra era o primeiro mo- produzia um fluxo aparentemente Assim, o interesse de Charlie pe- delo a ser vendido completo, com infindável de ideias musicais inven-
  • 2. PERSONAGE de tocar e adaptar-se ao novo esti- lo. Acostumados com o swing, es- cola do jazz em que os temas eram simples, permeados por refrões for- tes e melódicos, os artistas da ve- Iha-guarda passaram a encarar o bop como uma verdadeira tentativa de golpe de estado contra as mais sa- gradas tradições da música popular americana. O som daqueles jovens era todo entrecortado, sem uma me- lodia linear, facilmente memorizável. As deixas para as partes solo suce- diam-se num ritmo alucinante nas animadas jam-sessions. Um bom exemplo do assombro que o bop causou nos antigos jazzis- tas está nesta declaração de Louis Armstrong: "O que eles querem é dar um golpe baixo em todos os ou- tros, estão cheios de malícia e que- rem jogar a gente longe. E é o que acontece quando uma música anti- ga é tocada de modo diferente do que se tocava antes. O que eles fa- Um dos pioneiros do bebop, Christian revolucionou o papel da guitarra no jazz. zem agora não vale nada. Parece coisa boa, e o pessoal fica cheio de tivas, tocando num estilo jamais ou- bre ela com a maior facilidade. E, em curiosidade, mas acaba cansando vido na guitarra elétrica. vez de ficar de fora, Christian tocou disso logo porque a verdade é que Hammorid imaginou que Chris- solos magníficos chorus após chorus. não presta mesmo; não tem uma tian seria perfeito para o pequeno O conjunto encerrou o número 45 melodia que fique na memória, nem grupo de jazz de Benny Goodman minutos mais tarde, para ser sauda- mesmo uma cadência adequada pa- e o levou à Califórnia para uma au- do com a maior ovação que Ham- ra dançar. Acabam todos ficando dição. No entanto, Goodman assu- mond jamais vira um grupo de pobres outra vez, ninguém quer tra- miu uma atitude de "bons músicos Goodman receber. Naquela noite, o balhar. Eis o que a malícia de agora, existem às dúzias". Não demonstrou quinteto de Benny Goodman tor- dos modernos, acabou nos fazen- qualquer interesse especial por nou-se um sexteto. do". Charlie Christian participou das Christian, alegando estar preocupa- Christian ficou no grupo até sua primeiras gravações que registraram do com coisas mais importantes. morte, menos de dois anos depois. essa revolução dentro do jazz, jun- Mas, naquela noite, Hammond ins- Mas, após tocar com Goodman à tamente com o trompetísta Joe Guy, talou sorrateiramente o amplificador noite, ele frequentemente se dirigia o pianista Thelonius Monk e o con- de Christian no palco, enquanto ao Minton's Playhouse, um clube de trabaixista Nick Fentos. Goodman jantava antes de tocar. jazz do Harlem, em Nova York. Lá Após os primeiros anos, o bop Quando o conjunto estava pronto tocava por horas, com músicos de deixou de causar espanto e empla- para iniciar o concerto, a porta da jazz da categoria de Dizzy Gillespie, cou no gosto dos apreciadores de cozinha se abriu e Goodman viu Thelonius Monk e Charlie "The jazz. Ironicamente, como um dos Christian se dirigindo também ao Bird" Parker. Esses quatro músicos criadores do novo estilo, Charlie palco. Furioso, mas forçado a dei- são considerados os fundadores do Christian acabou não participando xar o guitarrista tocar ao menos um jazz bebop. Charlie Christian é des- de sua fase áurea. Em julho de número, Goodman ordenou ao crito pelos críticos musicais como o 1941, o guitarrista teve um colapso conjunto executasse "Rose room", "pai espiritual do grupo", já que foi e foi internado no Hospital Bellevue música que um guitarrista negro de ele o primeiro músico a retirar do de Nova York, com tuberculose. Oklahoma provavelmente não sabe- swing uma série de elementos para Morreu em 2 de março de 1942, de- ria tocar. Mas o band-leader não sa- criar uma nova forma de tocar. pois de contrair pneumonia. Sua bia que Christian só precisava ouvir Isso gerou muita polémica, já que obra musical ficou registrada em vá- uma sequência de acordes uma úni- os músicos veteranos sentiam gran- rias gravações, a maior parte delas ca vez para conseguir improvisar so- de dificuldade em mudar sua forma no conjunto de Benny Goodman.