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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.1 
 
 
 
 
 
 
 
 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA 
PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL FEYERABEND 
 
 
 
 
Resumo 
Esse  artigo  tem  como  objetivo  refletir  as  ideias  de  Paul 
Feyerabend  proporciona  ao  leitor,  por  meio  de  uma 
pesquisa  bibliográfica,  esclarecimentos  em  relação  ao 
“Anarquismo  Epistemológico”  de  Paul  Feyerabend, 
mostrando  que  suas  ideias  não  são  uma  rebeldia  pueril, 
mas,  um  amadurecimento  do  espírito  científico.  Para  ele 
não havia a intensão de criar um método, como de fato não 
criou, pois para ele há muitos meios de se chegar à verdade. 
Feyerabend foi influenciado por Popper e Wittgenstein, os 
quais foram influenciados por Schopenhauer. Sua ideia é o 
progresso  científico,  através  do  amadurecimento  dos 
Homens, assim, consequentemente se dará o progresso da 
Humanidade.  Propõe  o  “Anarquismo  Epistemológico”.  As 
ideias  de  Foucault  também  convergem  com  as  suas,  pois 
são pensadores de vanguarda que buscam abalar o status 
quo e promover o progresso. 
 
Palavras‐chave: anarquismo; epistemológico; métodos. 
 
 
Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
Universidade Estadual de Ponta Grossa ‐ UEPG 
diegodivardim@gmail.com 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.2 
 
XAnpedSul
A proposta para esse artigo é traçar algumas reflexões sobre as argumentações de 
Paul  Feyerabend  sobre  o  método  e  a  pesquisa,  as  teorias  e  a  relação  com  os 
pesquisadores. São reflexões, considerações, pontos de vista sobre sua obra. Por meio de 
uma pesquisa bibliográfica, notar‐se‐á que  Feyerabend  não criou nenhum método, foi 
inquieto e ousado, não se privou de apontar tudo o que lhe incomodava, sem preocupar‐
se  com  a  opinião  dos  conservadores,  esperava  a  réplica  de  seu  amigo  Imre  Lakatos. 
Feyerabend  preocupava‐se  muito  mais  com  o  progresso  científico,  consequentemente 
com  o  progresso  da  humanidade,  do  que  com  a  opinião  alheia.  Por  esse  e  por  tantos 
outros motivos, fora escolhido para essa reflexão. 
Paul  Feyerabend,  nasceu  em  Viena  em  1924  e  em  1944  feriu‐se  em  combate 
durante a Segunda Guerra Mundial. Antes de se voltar a filosofia, estudou canto e direção 
teatral  em  Viena.  Em  Londres  estudou  com  Karl  Popper  e  na  Escola  de  Economia  de 
Londres, foi seu discípulo (HARWOOD, 2013). 
A  influência  de  Popper  na  vida  de  Feyerabend,  contribuiu  para  seus 
questionamentos entorno do método. Para aquele (HARWOOD, 2013, p.151) não existe 
“algo como uma certeza duradoura” e que o melhor que se pode fazer é substituir as 
teorias  existentes  por  outras  melhores.  Então,  Fyerebend  na  sua  busca  pela  melhor 
teoria, pelo melhor método, acabou por refutar as ideias de Popper. Sobre isso Harwood 
(2013, p.176) diz que: 
 
Feyerabend  foi  um  dissidente  filosófico  –  alguns  de  seus  numerosos 
críticos o classificaram mais como um “inconveniente” do que como um 
filósofo  sério.  “Os  cientistas”,  disse  ele,  “tem  mais  dinheiro,  mais 
autoridade,  mais  encanto  sensual  do  que  merecem.  Os  procedimentos 
mais estúpidos e os resultados mais risíveis são cercados por uma aura de 
excelência. É hora de dar‐lhes a dimensão que merecem”. 
 
Feyerabend não só refutou as ideias de Popper, como também outras concepções 
filosóficas que segundo ele detém glamour e não a verdade. Quando diz que é hora de 
“dar‐lhes  a  dimensão  que  merecem”,  esta  demonstrando  que  há  algo  que  aqueles 
“cientistas”, pois estão voltados a procedimentos estúpidos, precisam conhecer. Faz‐se 
necessário segundo ele demonstrar que o conhecimento pode se dar de maneira diversa 
como  se  aceitava  até  então.  Para  ele  o  metodismo  tem  sido  um  entrave  ao 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.3 
 
XAnpedSul
conhecimento, afirmava que se houve algum progresso foi porque houveram  espíritos 
autênticos que ousaram e não ficaram presos aos velhos paradigmas. 
Pode‐se  entender  que  as  ciências  exatas  estabeleceram  o  método  como  um 
paradigma. Através do qual as coisas são aceitas como verdades.  
Jörn  Rüsen  (2010,  p.  96)  busca  “a  ciência  da  história,  como  forma  peculiar  do 
pensamento  histórico,  deve  ser  entendida,  praticada  e  fundamentada  a  partir  dos 
pressupostos e das condições de seu mundo existencial, e não interpretada como isolada e 
independente dele”. 
De acordo com Rüsen (2010) a ciência tem como objetivo na história, a validação 
histórica,  pois  que  através  das  operações  intelectuais  metodizadas  dão  validade  a 
pesquisa. Há uma regulação metódica que reivindica a verdade. Pode‐se entender que 
isso ocorre da seguinte maneira: A Ciência dá a validação Histórica à História através do 
trabalho cientifico. 
O  objetivo,  para  Rüsen  (2010,  p.99)  é  a  “metodização  do  pensamento  histórico 
como  princípios”.  Desta  maneira  busca‐se  a  verdade  através  do  método,  da 
fundamentação que vão validar as sentenças passadas. 
Pode‐se  constatar  que  o  método  não  é  de  todo  refutável,  e  que  não  se  pode 
ignorá‐lo,  mas  é  preciso  cuidado  para  que  não  se  perca  tempo  com  métodos  e 
procedimentos que não levam a lugar algum. Nesta linha de raciocínio traz‐se a tona a 
ideia  de  que  a  academia  é  uma  gaiola  de  ratos  brancos,  os  quais  sabem  que  os  ratos 
pardos (população em geral) estão em busca de alimento, mas estão distraídos correndo 
em suas rodinhas (ciência), correm em busca de algo que não sabem o que. O dono da 
gaiola é o Estado o qual distribui grãos de girassol (bolsas) para os ratos brancos ficarem 
distraídos, assim o burguês que esta por trás do Estado pode fazer o que quiser sem que 
os ratos se deem conta de que a vida poderia ser bem melhor. Há uma zona de conforto 
muito grande dentro da academia, esse falso conforto é um entrave para a produção do 
conhecimento. Os grandes pensadores eram espíritos inquietos que não se conformaram 
com o que era tido como verdade. 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.4 
 
XAnpedSul
Não é do dia para noite que os ratos brancos se darão conta de que é possível 
fazer mais e ir além da gaiola, contribuindo significativamente para a sociedade, enfim 
para que todos os ratos consigam ver a luz. Com Feyerabend não aconteceu de maneira 
diversa, Harwood (2013, p.177) diz que: 
 
A ciência, insistiu Feyerabend, simplesmente não é racional e progressiva, 
como as gerações anteriores de filósifos afirmaram. Se houve progresso, 
foi  porque  alguns  cientistas  se  dispuseram  a  quebrar  todas  as  regras 
consagradas,  adotando  o  princípio  de  que  “vale  tudo”.  Esse  é  o  único 
princípio  que  Feyerabend  acreditava  defensável  em  todas  as 
circunstâncias, nas diversas fases do desenvolvimento humano. Apesar 
do que seus inimigos posteriormente afirmaram, Feyerabend não chegou 
a  essa  conclusão  de  maneira  leviana.  Foi  preciso  um  bom  tempo  para 
renunciar a seus pontos de vista empíricos iniciais. Ele começou como um 
positivista  lógico  e  um  ardente  admirador  de  seu  professor,  Popper, 
chegando mesmo a traduzir para o alemão sua obra A sociedade aberta e 
seus  inimigos.  Mais  tarde,  porém,  repudiou  Popper  por  sua  defesa  do 
racionalismo  científico  –  em  especial  a  teoria  da  falseabilidade  que 
Popper  postulara  como  um  meio  de  chegar  à  verdade  científica.  Aos 
poucos,  Feyerabend  veio  a  acreditar  que  não  existe  tal  coisa, 
sustentando  que  as  teorias  isoladas  simplesmente  não  são  coerentes 
entre  si.  Além  disso,  já  que  não  existe  um  método  científico  único,  o 
sucesso científico deve‐se tanto a uma mistura de subterfúgios, retórica, 
conjecturas, política e propaganda quanto a um argumento racional. 
 
Neste processo pode‐se considerar que Feyerabend chegou à conclusão de que a 
verdade  é  um  ponto  comum  a  que  muitos  meios  podem  levar.  Assim  busca‐se  provar 
aquilo  que  se  quer  pelo  melhor  meio.  Ele  não  nega  o  método,  mas  considera  que  há 
muitas maneiras de se fazer ciência se utilizando desses métodos diversos, um não basta, 
é preciso usa‐los de forma que um complemente o outro na busca do sucesso científico.  
Considera‐se que os subterfúgios citados por ele, também foram fortemente utilizados 
pelo governo nazista. Observa‐se que na retórica, Hitler foi um excelente orador, falava 
diretamente para o povo alemão, tinha conjecturas traçadas, falava de seu ideal, havia 
uma organização política e a propaganda não fora esquecida. Joseph Goebbels, doutor 
em filologia1
 pela Universidade de Heidelberg, foi ministro da propaganda do reich, na 
Alemanha de 1933 a 1945.  
                                                            
1
 Ciência da palavra. 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.5 
 
XAnpedSul
Goebbels, assim como Feyerabend, flertou com o teatro, escreveu peças teatrais. 
Enquanto ministro da propaganda, foi o responsável pela criação de Hitler como um mito, 
o "Führer" (líder, dirigente). David Rausch (1984, p.87) cita duas de suas frases sobre a 
propaganda, as quais dizem que: 
 
Uma mentira contada mil vezes, torna‐se uma verdade [...] a essência da 
propaganda é ganhar as pessoas para uma idéia de forma tão sincera, com 
tal vitalidade, que, no final, elas sucumbam a essa idéia completamente, de 
modo  a  nunca  mais  escaparem  dela.  A  propaganda  quer  impregnar  as 
pessoas  com  suas  idéias.  É  claro  que  a  propaganda  tem  um  propósito. 
Contudo,  este  deve  ser  tão  inteligente  e  virtuosamente  escondido  que 
aqueles  que  venham  a  ser  influenciados  por  tal  propósito  nem  o 
percebam”. 
 
De acordo com a citação acima e baseados na experiência nazista deve‐se saber 
utilizar dos subterfúgios, da retórica, conjecturas, política e da propaganda quanto a um 
argumento racional, para que a desdita científica não se faça presente, assim, como se 
deu  naquela  experiência.  Deve  ficar  bem  claro  que  uma  pesquisa  científica  não  é  uma 
propaganda, seu resultado sempre deve estar submetido à ética e ao bom senso. 
Feyerabend afirmou que o “pluralismo teórico” foi o que de fato levou à frente as 
pesquisas  teóricas.  Para  ele  as  afirmações  factuais  são  carregadas  de  teoria,  por  este 
motivo, os fatos não existem. Harwood (2013, p.177) diz que para Feyerabend, “o que as 
pessoas  consideram  fatos  dependem,  em  última  análise,  do  que  acreditam  ou  querem 
acreditar”. Ainda acrescenta que a melhor maneira de avançar é saber escolher a teoria 
que  mais  contribua  para  a  compreensão.  Para  exemplificar,  a  partir  dessa  ideia,  se  o 
objetivo é contar a história do Brasil para os brasileiros, para que estas a aceitem como 
verdade, utilizar‐se‐á do ponto de vista brasileiro. Mas se o objetivo for contar a história 
do Brasil aos portugueses, buscar‐se‐á utilizar o ponto de vista lusitano, para a melhor 
compreensão daqueles. Outra questão serve como exemplo: a América foi descoberta 
intencionalmente? Depende do ponto de vista.  
Segundo Inês Lacerda Araújo (2012, p.181), Feyeraband inspirado em Wittgenstein 
defende uma “teoria contextual do significado”, na qual critica o empirismo reducionista e 
aceita a ideia da incomensurabilidade das teorias ciêntificas. 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.6 
 
XAnpedSul
Em  1975  Feyerabend  publicou  uma  obra  intitulada  “Contra  o  método”,  obra 
dedicada a Imre Lakatos, na qual defende a liberdade do homem e diz que muitas vezes o 
método  apresenta‐se  como  uma  amarra.  Mais  uma  vez,  surge  outra  alusão,  na  qual  o 
pesquisador  apresenta‐se  como  um  cãozinho  preso  a  uma  coleira  (método),  seu 
proprietário  é  a  academia,  a  qual  com  medo  que  o  cãozinho  curioso  se  afaste  muito, 
controla  o  tamanho  da  corrente  impossibilitando  que  ele  conheça  novas  paisagens  e 
quando permite que ele saia mais longe, trata‐se de um passeio guiado, pois a coleira 
ainda esta em seu pescoço. Sobre isso Feyerabend (1977, p.21) diz que: 
 
A  educação  científica,  tal  como  hoje  a  conhecemos,  tem  precisamente 
esse objetivo. Simplifica a ciência, simplificando seus elementos: antes de 
tudo, define‐se um campo de pesquisa; esse campo é desligado do resto 
da  História  (a  Física,  por  exemplo,  é  separada  da  Metafísica  e  da 
Teologia)  e  recebe  uma  ‘lógica’  própria.  Um  treinamento  completo, 
nesse  tipo  de  ‘lógica’,  leva  ao  condicionamento  dos  que  trabalham  no 
campo delimitado; isso torna mais uniformes as ações de tais pessoas, ao 
mesmo  tempo  em  que  congela  grandes  porções  do  procedimento 
histórico.  ‘Fatos’  estáveis  surgem  e  se  mantêm,  a  despeito  das 
vicissitudes da História. Parte essencial do treinamento, que faz com que 
fatos  dessa  espécie  apareçam,  consiste  na  tentativa  de  inibir  intuições 
que  possam  implicar  confusão  de  fronteiras.  A  religião  da  pessoa,  por 
exemplo, ou sua metafísica ou seu senso de humor (seu senso de humor 
natural  e  não  a  jocosidade  postiça  e  sempre  desagradável  que 
encontramos  em  profissões  especializadas)  devem  manter‐se 
inteiramente  à  parte  de  sua  atividade  científica.  Sua  imaginação  vê‐se 
restringida  e  até  sua  linguagem  deixa  de  ser  própria.  E  isso  penetra  a 
natureza  dos  ‘fatos’  científicos,  que  passam  a  ser  vistos  como 
independentes de opinião, de crença ou de formação cultural. 
 
De acordo com essa última citação, existe uma simplificação na ciência e como se 
o pesquisador fosse treinado a seguir por caminhos delimitados, as especialidades, isso 
torna os pesquisadores padronizados e consequentemente as pesquisas, enfim, a ciência 
padroniza sujeitos e ações. 
Essa  obra  foi  planejada  para  ser  escrita  em  parceria  com  Imre  Lakatos,  o  qual 
escreveria a réplica às argumentações de Fyerebend.  
No prefácio da obra “Contra o Método”, Fyerebend (1977) diz que: 
 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.7 
 
XAnpedSul
Este ensaio é a primeira parte de um livro a propósito do anarquismo que 
seria  escrito  por  Lakatos  e  por  mim.  Cabia‐me  atacar  a  posição 
racionalista2
;  Lakatos,  por  seu  turno,  reformularia  essa  posição,  para 
defendê‐la e, de passagem, reduzir meus argumentos a nada. Juntas, as 
duas partes deviam retratar nossos longos debates em torno desse tema. 
 
Nesta citação Feyerabend diz que o seu ensaio é a primeira parte de um livro a 
propósito  do  anarquismo,  para  ele  Lakatos  era  seu  amigo,  colega  e  companheiro 
anarquista, vale salientar que anarquismo não significa bagunça. 
As  argumentações  são  um  incentivo  a  reflexão,  assim,  deve‐se  ler  a  obra  “Contra  o 
método” de maneira a imaginar as réplicas de Lakatos.  Araújo (2012, p.183) diz que: 
 
Lakatos  (1922‐1974)  defende  um  falsificacionismo  sofisticado  em  sua 
proposta  de  uma  “metodologia  de  programas  de  investigação 
científica”, que contém as regras a serem seguidas e as que precisam ser 
evitadas.  
 
Percebe‐se que para Lakatos a ciência é relativamente autônoma e possui certa 
racionalidade.    Para  Feyerabend  a  ciência  é  apenas  uma  das  formas  de  pensamento, 
desenvolvida pelo homem, mas não é necessariamente a melhor. Segundo ele, a ciência é 
uma instituição cheia de dogmas. 
Assemelhando‐se  a  um  animal  adestrado  o  estudioso,  o  racionalista,  estão  com 
suas ações condicionadas, sobre isso Feyerabend (1977, p.31) diz que: 
 
Assim  como  um  animal  bem  adestrado  obedecerá  ao  dono,  por  maior 
que  seja  a  perplexidade  em  que  se  encontre  e  por  maior  que  seja  a 
necessidade  de  adotar  novos  padrões  de  comportamento;  assim 
também  o  racionalista  convicto  se  curvará  à  imagem  mental  de  seu 
mestre,  manter‐se‐á  fiel  aos  padrões  de  argumentação  que  lhe  foram 
transmitidos e aceitará esses padrões por maior que seja a perplexidade 
em que se encontre mostrando‐se incapaz de compreender que a ‘voz da 
razão’ a que dá ouvidos é apenas o efeito causal tardio do treinamento 
que recebeu. Não está em condições de descobrir que o apelo à razão, 
diante  do  qual  tão  prontamente  sucumbe,  nada  mais  é  que  manobra 
política. 
 
                                                            
2
  Racionalismo: A visão de que a razão é a fonte fundamental de todo conhecimento e que a única forma 
válida de obter o conhecimento do mundo é vivenciando‐o. Entre os filósofos racionalistas famosos 
estão Descartes, Spinoza e Leibniz. 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.8 
 
XAnpedSul
De  acordo  com  essa  citação,  assim  como  os  animais,  os  homens  são  instruídos 
para  o  desempenho  de  determinadas  funções.  Um  será  carpinteiro,  o  outro  médico, 
engenheiro,  afiador,  motorista,  há  os  estudiosos,  os  pesquisadores,  os  mestres, 
adestradores, todos obedientes. Com o “racionalista convicto” não é diferente, seguirá 
os  padrões  impostos  por  seu  mestre,  o  qual  da  mesma  forma  segue  padrões  de  seu 
mestre,  que  seguia  padrões  e  assim,  sucessivamente.  Se  fosse  perguntado  a  um 
pesquisador: ‐ Por que você faz isso? E ele respondesse: ‐ Não sei, meu mestre fazia assim. 
E se a mesma pergunta fosse feita ao mestre, a resposta seria a mesma. Sem falar na 
manobra política que mostra‐se sempre interesseira, apresentando‐se muitas vezes como 
um meio de proteção ao status quo, ao intelectualismo e a suposta “verdade”. Existe um 
aparelhamento conceptual da teoria e uma paixão associada, os quais insinuam‐se: 
 
em todos os meios de comunicação, em todas as ações e, afinal, em toda 
a vida da comunidade, passam a garantir o êxito de métodos tais como o 
da dedução transcendental, da análise de uso, da análise fenomenológica 
— meios de emprestar maior solidez ao mito (o que mostra, assinalemos 
de  passagem,  que  todos  esses  métodos,  característicos  de  escolas 
filosóficas antigas e modernas, apresentam um traço comum: tendem a 
preservar  o  status  quo  da  vida  intelectual).  Também  os  resultados  de 
observação  falarão  em  favor  da  teoria,  de  vez  que  formulados  com 
observância de seus termos. E surge a impressão de se haver, finalmente, 
alcançado a verdade (FEYERABEND, 1977, p.56). 
 
Na  citação  acima,  pode‐se  confirmar  que  o  êxito  de  tais  métodos  é  uma 
consequência de todo um aparelhamento, maior do que se imagina. Assim o mito torna‐
se  verossímil.  Mas  para  que  o  status  quo  seja  mantido,  os  resultados  das  observações 
serão organizados de maneira a preservar a teoria, a qual se assemelha a um trilho do 
qual  ninguém  pode  se  afastar.  Como  em  uma  corrida  de  autorama,  desta  maneira, 
enquanto os carrinhos estão no trilho, há energia para que possam avançar, mesmo a 
pista  estando  fechada,  o  carrinho  que  sai  do  trilho,  falta‐lhe  energia,  ou  seja,  sai  da 
brincadeira. Essa brincadeira torna os pesquisadores alheios ao mundo, como acontece 
com muitos jovens que se trancam em casa ou em universidades para se divertirem com 
jogos em rede ou pesquisas acadêmicas, vivem como se em um mundo a parte, enquanto 
o  mundo  se  move,  estão  presos  a  párvoas  concepções.  Sobre  isso  Feyerabend  (1977, 
p.56) diz que: 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.9 
 
XAnpedSul
 
Torna‐se evidente, ao mesmo tempo, que se perdeu todo contato com o 
mundo e que a estabilidade atingida, a aparência de verdade absoluta, 
não passa do resultado de um conformismo absoluto. Com efeito, como 
será possível submeter a teste ou aprimorar a verdade de uma teoria, se 
ela é elaborada de maneira tal que qualquer acontecimento concebível 
pode  ser  descrito  e  explicado  nos  termos  de  seus  princípios?  A  única 
maneira de estudar esses princípios que a tudo abrangem seria compará‐
los com um conjunto de outros princípios igualmente abrangentes — mas 
a possibilidade desse procedimento está, desde o início, afastada. O mito 
não  tem,  pois,  relevância  objetiva;  continua  a  existir  apenas  como 
resultado do esforço da comunidade de crentes e de seus orientadores 
sejam estes sacerdotes ou vencedores do Prêmio Nobel. Esse é, a meu 
ver,  o  mais  forte  argumento  contra  qualquer  método  que  estimule  a 
uniformidade,  quer  seja  esse  método  empírico  ou  não.  Cada  método 
dessa espécie é, em última análise, um método decepcionante. Dá forças 
a  um  conformismo  sombrio  e  fala  de  verdade;  leva  à  deterioração  das 
capacidades  intelectuais,  do  poder  de  imaginação  e  fala  de  introvisão 
profunda; destrói o mais precioso dom da juventude — o enorme poder 
de imaginação — e fala em educar. 
 
Enquanto o pesquisador esta distraído cumprindo procedimentos, seus resultados 
serão  falhos.  O  que  aceitará  como  verdade,  não  passará  de  um  resultado  do  seu 
conformismo. O mito não tem relevância objetiva, é como as pesquisas acadêmicas que 
depois de concluídas serão comemoradas e arquivadas em salas que cheiram a mofo. É 
decepcionante  tudo  aquilo  que  não  concorra  para  com  o  progresso,  que  promova  o 
conformismo  e  que  destrua  a  imaginação  dos  mais  jovens.  Assim,  após  todos  esses 
apontamentos, o que falar da educação? 
Na  música  “Another  brick  in  the  wall”3
  diz  que  os  alunos  não  querem  mais 
educação  e  querem  que  os  professores  os  deixem  em  paz.  No  clipe  desta  musica,  os 
alunos caminham por uma linha de produção, onde são apenas um produto que ao final 
da linha, serão todos iguais, ou seja, como se a educação padronizasse os homens. De 
fato isso acontece, não só nos níveis iniciais, mas em todos os níveis da educação. Até 
mesmo no mais alto grau de instrução acadêmica, aquele que se comportar de maneira 
diversa da aceitação acadêmica, será repudiado ou ignorado pelos conservadores. Assim 
                                                            
3
  Composição de Roger Waters e executada pela banda de rock inglesa Pink Floyd, formada 
em Cambridge em 1965, que atingiu sucesso internacional com sua música psicodélica e progressiva. Seu 
trabalho foi marcado pelo uso de letras filosóficas, experimentações musicais, capas de álbuns 
inovadoras e shows elaborados. 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.10 
 
XAnpedSul
se deu com Arthur Schopenhauer, o qual, segundo Harwood (2013), influenciou Ludwig 
Wittgenstein  e  Karl  Popper,  os  quais  tiveram  papel  fundamental  na  formação  de 
Feyerabend. 
O exemplo da música ilustra a padronização presente, que normatiza e normaliza 
os procedimentos acadêmicos, tornando os pesquisadores produtos padronizados. Para 
que  se  possam  apresentar  novos  resultados  é  preciso  enquadrá‐los  nos  moldes 
aceitáveis.  Os  métodos  e  teorias,  estáticos  (que  não  se  modificam  e  não  inovam)  são 
resultado  da  inocência  humana,  o  progresso,  o  avanço  científico  se  dá  quando  o 
pesquisador se afasta desses modelos, utilizando‐se de outros recursos, é a idéia de que 
“tudo vale” (FEYERABEND. 1977). 
A  ideia  do  “tudo  vale”,  remete  a  uma  metodologia  pluralista,  sobre  isso 
Feyerabend (1977, p.40) diz que: 
 
O  cientista  que  deseja  ampliar  ao  máximo  o  conteúdo  empírico  das 
concepções que sustenta e que deseja entender aquelas concepções tão 
claramente  quanto  possível  deve,  portanto,  introduzir  concepções 
novas. Em outras palavras, o cientista deve adotar metodologia pluralista. 
 
Para uma visão mais clara dos fatos é preciso uma visão ampliada do todo. Se um 
ponto  de  vista  se  faz  insuficiente  é  preciso  agregar  outros  pontos  de  vista,  novas 
concepções. O pluralismo deve servir como a caixa de ferramentas de um mecânico, o 
qual  não  consegue  consertar  um  motor  apenas  com  uma  chave  de  fenda,  faz‐se 
necessário  o  auxílio  de  mais  ferramentas.  Outro  exemplo  cabível  é  a  ideia  de  que  um 
cientista esta numa torre com quatro lados e quatro janelas e quer conhecer e descrever 
o  mundo  ao  redor  da  torre.  Mas,  abriu  apenas  uma  janela  e  começou  a  observar  e  a 
descrever o que via, então, intitulou sua obra como “O mundo ao redor da torre”. Trata‐
se de uma visão restrita, de uma irrealidade, pois o que se vê apenas por um ângulo não é 
o  mundo,  apenas  uma  paisagem.  Para  que  sua  obra  fosse  de  fato  uma  visão  sobre  o 
mundo  ao  redor  da  torre,  seria  necessário  abrir  as  quatro  janelas  da  torre,  observar  e 
descrever,  descer  as  escadas  da  torre  abrir  a  porta  e  sair  ao  seu  redor,  caminhar, 
observar,  descrever,  voltar  à  torre  e  observar  novamente,  agora  com  uma  nova 
sensibilidade  reescrever  a  obra.  Apenas  abrir  as  quatro  janelas  da  torre  e  observar  o 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.11 
 
XAnpedSul
mundo lá fora, proporcionaria a “visão do mundo ao redor da torre, a partir da torre”. 
Assim acontece com a ciência. 
Sobre aquilo que se busca Araújo (2012, p.185) diz que: 
 
Desse modo, o conhecimento não culmina nunca em um ideal realizado, 
pois  há  sempre  várias  alternativas  por  vezes  incompatíveis  entre  si,  e 
mesmo incomensuráveis, que competem entre si. É impossível que uma 
teoria seja compatível com todos os fatos que ela abriga em seu domínio. 
Às vezes a verificação dos fatos é difícil, ou mesmo impossível. Em alguns 
casos é preciso criar um sistema de conceitos inteiramente novo para dar 
conta da pesquisa. E isso não deve ser visto como um conjunto de regras 
para substituir outro conjunto, pois “todas as metodologias, inclusive as 
mais  óbvias,  tem  limitações”  (1989,  p.43)4
,  mesmo  a  indução  por 
falseamento.  
 
De acordo com as palavras de Araújo (2012), em relação às ideias de Feyerabend, 
pode‐se entender novamente com o exemplo do pesquisador e da torre, ele nunca irá 
alcançar  o  seu  ideal  (conhecer  o  mundo  ao  redor  da  torre),  por  causa  das  inúmeras 
alternativas. Certas vezes é necessário criar novos conceitos para viabilizar a pesquisa. 
Pode‐se  considerar  que  as  ideias  de  Feyerabend  e  de  Michel  Foulcault  (1988) 
convergem.  Partindo  do  princípio  que  para  ambos  existem  inúmeras  maneiras  de  se 
interpretar as coisas, Foucault (1988, p.4), utilizando como base para reflexões “Isso não 
é um cachimbo” de René Magritte, diz que: 
 
Há  dois  cachimbos.  Não  seria  necessário  dizer,  em  vez  disso:  dois 
desenhos  de  um  mesmo  cachimbo?  Ou  ainda  um  cachimbo  e  seu 
desenho,  ou  ainda  dois  desenhos  representando  cada  um  deles  um 
cachimbo,  ou  ainda  dois  desenhos  dos  quais  um  representa  um 
cachimbo, mas o outro não, ou ainda dois desenhos que, nem um nem 
outro  são  ou  representam  cachimbos,  ou  ainda  um  desenho 
representando  não  um  cachimbo,    mas  um  outro  desenho  que,  ele, 
representa um cachimbo, de tal forma que sou obrigado a perguntar: a 
que se refere a frase escrita no quadro? 
 
Para  Foucault  os  homens  estão  presos  a  conceitos,  a  procedimentos,  a  regras, 
normas  e  a  tantas  outras  questões  tidas  como  verdades.  É  preciso  sair  da  zona  de 
conforto, vislumbrando patamares maiores. Neste exemplo do quadro de Magritte, fica 
                                                            
4
 FEYERABEND, Paul. Contra o método. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989. 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.12 
 
XAnpedSul
claro que a proposta do artista foi mexer com a tranquilidade do observador, fez com que 
Foucault escrevesse uma obra homônima, na qual traça reflexões sobre as verdades as 
quais são tomadas como regras pela população em geral. Ao ler esta obra o leitor deve 
estar ciente de que para entendê‐la deve desprender‐se de qualquer formalidade, pois 
sua  mensagem  esta  nas  entrelinhas.  Para  ele  é  preciso  desprendimento  e  ousadia. 
Desprendimento  de  tudo  aquilo  que  se  tem  como  verdade  e  ousadia  para  ir  além,  na 
busca por mais conhecimento, pois a verdade é um ideal. 
Feyerabend (1977, p.41) exemplifica a tomada de conhecimento com uma mesa, 
assim afirma que: 
 
[...]  é  costume  dizer  ‘a  mesa  é  marrom’  ,  quando  a  contemplamos 
circunstâncias  normais,  com  nossos  sentidos  em  equilíbrio,  e  dizer  ‘a 
mesa parece ser marrom’ quando as condições de luz deixam a desejar 
ou quando nos sentimos inseguros quanto a nosso poder de observação 
— e isso expressa a convicção de que há circunstâncias comuns em que 
nossos sentidos se mostram aptos a ver o mundo ‘como ele realmente é’ 
e de que há circunstâncias, igualmente comuns, em que nossos sentidos 
se enganam. Expressa a convicção de que algumas de nossas impressões 
sensoriais são corretas e outras não são. E damos também como certo 
que  o  meio  material  que  se  interpõe  entre  nós  e  o  objeto  não  exerce 
influência deturpadora e que a entidade física de que o contato depende 
— a luz — veicula um quadro verdadeiro. Trata‐se, em todos os casos, de 
pressupostos  abstratos  e  altamente  discutíveis  que  dão  forma  à  nossa 
concepção do mundo, sem se tornarem acessíveis a uma crítica direta. 
Em geral, nem sequer nos damos conta desses pressupostos e só lhes 
reconhecemos os efeitos quando nos defrontamos com uma cosmologia 
inteiramente  diversa:  os  preconceitos  são  descobertos  graças  a 
contraste  e  não  graças  a  análise.  O  material  de  que  o  cientista  dispõe, 
inclusive  suas  mais  elaboradas  teorias  e  suas  técnicas  mais  refinadas, 
estrutura‐se de modo exatamente idêntico. 
 
Quando se observa uma mesa, já se esta fazendo uso dos sentidos, carregando 
pressupostos, os quais são abstratos. Isso irá interferir na concepção de mundo que se 
faz. Esses pressupostos estão enraizados na mente humana. Para Feyerabend é preciso 
romper com esse circulo vicioso e criar um sistema conceptual novo. 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.13 
 
XAnpedSul
A história de Kaspar Hauser5
 serve como exemplo de ingenuidade conceptual, não 
é isso que se busca, mas ir além de tudo aquilo que se tem como conceitos e verdades. 
Sobre essa questão Feyerabend (1977, p.57) diz que: 
 
Unanimidade  de  opinião  pode  ser  adequada  para  uma  igreja,  para  as 
vítimas temerosas ou ambiciosas de algum mito (antigo ou moderno) ou 
para os fracos e conformados seguidores de algum tirano. A variedade 
de  opiniões  é  necessária  para  o  conhecimento  objetivo.  E  um  método 
que estimule a variedade é o único método compatível com a concepção 
humanitarista. (Na medida em que a condição de coerência restringe a 
variedade, ela encerra um elemento teológico, elemento que se traduz 
na  adoração  dos  "fatos",  que  é  um  traço  característico  de  quase  todo 
empirismo). 
  
Busca‐se com o pluralismo metodológico tirar os homens da zona de conforto que 
gera a estagnação intelectual, trata‐se de um compromisso humanitarista. 
Em tempos de guerra a necessidade, faz com que a ciência seja simplificada e em 
tempo  de  paz,  a  supervalorização  da  ciência  a  torna  mais  rebuscada,  mais  complexa 
(FEYERABEND, 1977). 
Tome‐se, por exemplo, a arte minimalista, da qual todos pensam se tratar de uma 
modalidade de arte simplista, sem importância. Afirmações errôneas, proporcionadas por 
uma  denominação  criada  pela  Crítica  de  Arte,  a  qual  nada  sabia  de  fato  sobre  aquele 
movimento artístico. A arte minimalista é gigante naquilo que propõe.  O minimalismo 
serve para exemplificar o que o anarquismo epistemológico propõe, um amadurecimento 
do Homem, pois sem amadurecimento, não tem como se conhecer a realidade a que se 
volta o olhar. O olhar de uma criança é sempre mais restrito e fantasioso que o olhar de 
um adulto. 
Sobre o amadurecimento Feyerabend (1977, p.464) diz que: 
 
Um  cidadão  amadurecido  não  é  um  homem  que  foi  instruído  em  uma 
especial ideologia — como o puritanismo ou o racionalismo crítico — e 
que  agora  é  portador  dessa  ideologia,  como  de  um  tumor  mental;  um 
cidadão  amadurecido  é  uma  pessoa  que  aprendeu  a  tomar  decisões  e 
                                                            
5
 Kaspar Hauser: ( 1812‐1833) foi uma criança abandonada, envolta em mistério, encontrada na praça 
Unschlittplatz em Nuremberg, Alemanha do século XIX, com alegadas ligações com a família real 
de Baden. 
O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL 
FEYERABEND 
 Diego Alexandre Divardim de Oliveira 
X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.14 
 
XAnpedSul
que decidiu em favor daquilo que mais lhe convém. É pessoa de alguma 
solidez espiritual (não se apaixona pelo primeiro trovador ideológico que 
lhe  cruze  o  caminho)  e  que,  portanto,  está  apta  a  escolher 
conscientemente a tarefa que lhe pareça mais atraente, em vez de deixar‐
se dominar por ela. 
 
Ter instrução não significa ser maduro, pois a instrução pode assemelhar‐se a um 
“tumor  mental”,  dificultando  o  raciocínio  daqueles  que  portam  tais  “ideologias”.  O 
cidadão  amadurecido,  aprendeu  a  tomar  decisões,  sabe  decidir  e  sabe  o  que  mais  lhe 
convém e possui a sensatez e é cônscio de si mesmo. Chega‐se então a descrição das 
qualidades  do  artista,  feita  por  Aristoteles  (2006)  o  qual  diz  que  o  que  diferencia  um 
artista de um artesão, é a capacidade para ensinar. O artista sabe o que faz, como faz e 
porque  faz,  tem  conhecimento  e  conhece  as  razões,  enquanto  o  artesão  apenas  sabe 
fazer por hábito. Isso ocorre na ciência, há pesquisadores por hábito. 
 De acordo com Feyerabend, o progresso da humanidade se dará quando, não só o 
pesquisador, mas todos os cidadãos se tornarem artistas. Pois, segundo Oliveira (2012) a 
arte é a busca empreitada pelo espírito do Homem por Humanidade. 
 
 
Referências 
ARAÚJO, I.L. Curso de teoria do conhecimento e epistemologia. Barueri, SP: Minha Editora, 2012. 
ARISTÓTELES. Metafísica. Bauru, SP: Edipro, 2006. 
David A. Rausch. A legacy of hatred. Chicago: Moody Press, 1984. 
FEYERABEND, P. Contra o método. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1977. 
FOUCAULT, Michel. Isto não é um cachimbo. São Paulo: Paz e Terra, 1988. 
HARWOOD, J. Filosofia: um guia com as ideias de 100 grandes pensadores. São Paulo: Planeta, 
2013. 
OLIVEIRA, D.A.D. Introdução a Visão Teórica da Arte: reflexões históricas e filosóficas. 2012, 58f, 
Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Artes Visuais) – Universidade Estadual de Ponta 
Grossa, Ponta Grossa, UEPG, 2012. 

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Feyerabend

  • 1.   X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.1                  O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA  PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL FEYERABEND          Resumo  Esse  artigo  tem  como  objetivo  refletir  as  ideias  de  Paul  Feyerabend  proporciona  ao  leitor,  por  meio  de  uma  pesquisa  bibliográfica,  esclarecimentos  em  relação  ao  “Anarquismo  Epistemológico”  de  Paul  Feyerabend,  mostrando  que  suas  ideias  não  são  uma  rebeldia  pueril,  mas,  um  amadurecimento  do  espírito  científico.  Para  ele  não havia a intensão de criar um método, como de fato não  criou, pois para ele há muitos meios de se chegar à verdade.  Feyerabend foi influenciado por Popper e Wittgenstein, os  quais foram influenciados por Schopenhauer. Sua ideia é o  progresso  científico,  através  do  amadurecimento  dos  Homens, assim, consequentemente se dará o progresso da  Humanidade.  Propõe  o  “Anarquismo  Epistemológico”.  As  ideias  de  Foucault  também  convergem  com  as  suas,  pois  são pensadores de vanguarda que buscam abalar o status  quo e promover o progresso.    Palavras‐chave: anarquismo; epistemológico; métodos.      Diego Alexandre Divardim de Oliveira  Universidade Estadual de Ponta Grossa ‐ UEPG  diegodivardim@gmail.com                       
  • 2. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.2    XAnpedSul A proposta para esse artigo é traçar algumas reflexões sobre as argumentações de  Paul  Feyerabend  sobre  o  método  e  a  pesquisa,  as  teorias  e  a  relação  com  os  pesquisadores. São reflexões, considerações, pontos de vista sobre sua obra. Por meio de  uma pesquisa bibliográfica, notar‐se‐á que  Feyerabend  não criou nenhum método, foi  inquieto e ousado, não se privou de apontar tudo o que lhe incomodava, sem preocupar‐ se  com  a  opinião  dos  conservadores,  esperava  a  réplica  de  seu  amigo  Imre  Lakatos.  Feyerabend  preocupava‐se  muito  mais  com  o  progresso  científico,  consequentemente  com  o  progresso  da  humanidade,  do  que  com  a  opinião  alheia.  Por  esse  e  por  tantos  outros motivos, fora escolhido para essa reflexão.  Paul  Feyerabend,  nasceu  em  Viena  em  1924  e  em  1944  feriu‐se  em  combate  durante a Segunda Guerra Mundial. Antes de se voltar a filosofia, estudou canto e direção  teatral  em  Viena.  Em  Londres  estudou  com  Karl  Popper  e  na  Escola  de  Economia  de  Londres, foi seu discípulo (HARWOOD, 2013).  A  influência  de  Popper  na  vida  de  Feyerabend,  contribuiu  para  seus  questionamentos entorno do método. Para aquele (HARWOOD, 2013, p.151) não existe  “algo como uma certeza duradoura” e que o melhor que se pode fazer é substituir as  teorias  existentes  por  outras  melhores.  Então,  Fyerebend  na  sua  busca  pela  melhor  teoria, pelo melhor método, acabou por refutar as ideias de Popper. Sobre isso Harwood  (2013, p.176) diz que:    Feyerabend  foi  um  dissidente  filosófico  –  alguns  de  seus  numerosos  críticos o classificaram mais como um “inconveniente” do que como um  filósofo  sério.  “Os  cientistas”,  disse  ele,  “tem  mais  dinheiro,  mais  autoridade,  mais  encanto  sensual  do  que  merecem.  Os  procedimentos  mais estúpidos e os resultados mais risíveis são cercados por uma aura de  excelência. É hora de dar‐lhes a dimensão que merecem”.    Feyerabend não só refutou as ideias de Popper, como também outras concepções  filosóficas que segundo ele detém glamour e não a verdade. Quando diz que é hora de  “dar‐lhes  a  dimensão  que  merecem”,  esta  demonstrando  que  há  algo  que  aqueles  “cientistas”, pois estão voltados a procedimentos estúpidos, precisam conhecer. Faz‐se  necessário segundo ele demonstrar que o conhecimento pode se dar de maneira diversa  como  se  aceitava  até  então.  Para  ele  o  metodismo  tem  sido  um  entrave  ao 
  • 3. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.3    XAnpedSul conhecimento, afirmava que se houve algum progresso foi porque houveram  espíritos  autênticos que ousaram e não ficaram presos aos velhos paradigmas.  Pode‐se  entender  que  as  ciências  exatas  estabeleceram  o  método  como  um  paradigma. Através do qual as coisas são aceitas como verdades.   Jörn  Rüsen  (2010,  p.  96)  busca  “a  ciência  da  história,  como  forma  peculiar  do  pensamento  histórico,  deve  ser  entendida,  praticada  e  fundamentada  a  partir  dos  pressupostos e das condições de seu mundo existencial, e não interpretada como isolada e  independente dele”.  De acordo com Rüsen (2010) a ciência tem como objetivo na história, a validação  histórica,  pois  que  através  das  operações  intelectuais  metodizadas  dão  validade  a  pesquisa. Há uma regulação metódica que reivindica a verdade. Pode‐se entender que  isso ocorre da seguinte maneira: A Ciência dá a validação Histórica à História através do  trabalho cientifico.  O  objetivo,  para  Rüsen  (2010,  p.99)  é  a  “metodização  do  pensamento  histórico  como  princípios”.  Desta  maneira  busca‐se  a  verdade  através  do  método,  da  fundamentação que vão validar as sentenças passadas.  Pode‐se  constatar  que  o  método  não  é  de  todo  refutável,  e  que  não  se  pode  ignorá‐lo,  mas  é  preciso  cuidado  para  que  não  se  perca  tempo  com  métodos  e  procedimentos que não levam a lugar algum. Nesta linha de raciocínio traz‐se a tona a  ideia  de  que  a  academia  é  uma  gaiola  de  ratos  brancos,  os  quais  sabem  que  os  ratos  pardos (população em geral) estão em busca de alimento, mas estão distraídos correndo  em suas rodinhas (ciência), correm em busca de algo que não sabem o que. O dono da  gaiola é o Estado o qual distribui grãos de girassol (bolsas) para os ratos brancos ficarem  distraídos, assim o burguês que esta por trás do Estado pode fazer o que quiser sem que  os ratos se deem conta de que a vida poderia ser bem melhor. Há uma zona de conforto  muito grande dentro da academia, esse falso conforto é um entrave para a produção do  conhecimento. Os grandes pensadores eram espíritos inquietos que não se conformaram  com o que era tido como verdade. 
  • 4. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.4    XAnpedSul Não é do dia para noite que os ratos brancos se darão conta de que é possível  fazer mais e ir além da gaiola, contribuindo significativamente para a sociedade, enfim  para que todos os ratos consigam ver a luz. Com Feyerabend não aconteceu de maneira  diversa, Harwood (2013, p.177) diz que:    A ciência, insistiu Feyerabend, simplesmente não é racional e progressiva,  como as gerações anteriores de filósifos afirmaram. Se houve progresso,  foi  porque  alguns  cientistas  se  dispuseram  a  quebrar  todas  as  regras  consagradas,  adotando  o  princípio  de  que  “vale  tudo”.  Esse  é  o  único  princípio  que  Feyerabend  acreditava  defensável  em  todas  as  circunstâncias, nas diversas fases do desenvolvimento humano. Apesar  do que seus inimigos posteriormente afirmaram, Feyerabend não chegou  a  essa  conclusão  de  maneira  leviana.  Foi  preciso  um  bom  tempo  para  renunciar a seus pontos de vista empíricos iniciais. Ele começou como um  positivista  lógico  e  um  ardente  admirador  de  seu  professor,  Popper,  chegando mesmo a traduzir para o alemão sua obra A sociedade aberta e  seus  inimigos.  Mais  tarde,  porém,  repudiou  Popper  por  sua  defesa  do  racionalismo  científico  –  em  especial  a  teoria  da  falseabilidade  que  Popper  postulara  como  um  meio  de  chegar  à  verdade  científica.  Aos  poucos,  Feyerabend  veio  a  acreditar  que  não  existe  tal  coisa,  sustentando  que  as  teorias  isoladas  simplesmente  não  são  coerentes  entre  si.  Além  disso,  já  que  não  existe  um  método  científico  único,  o  sucesso científico deve‐se tanto a uma mistura de subterfúgios, retórica,  conjecturas, política e propaganda quanto a um argumento racional.    Neste processo pode‐se considerar que Feyerabend chegou à conclusão de que a  verdade  é  um  ponto  comum  a  que  muitos  meios  podem  levar.  Assim  busca‐se  provar  aquilo  que  se  quer  pelo  melhor  meio.  Ele  não  nega  o  método,  mas  considera  que  há  muitas maneiras de se fazer ciência se utilizando desses métodos diversos, um não basta,  é preciso usa‐los de forma que um complemente o outro na busca do sucesso científico.   Considera‐se que os subterfúgios citados por ele, também foram fortemente utilizados  pelo governo nazista. Observa‐se que na retórica, Hitler foi um excelente orador, falava  diretamente para o povo alemão, tinha conjecturas traçadas, falava de seu ideal, havia  uma organização política e a propaganda não fora esquecida. Joseph Goebbels, doutor  em filologia1  pela Universidade de Heidelberg, foi ministro da propaganda do reich, na  Alemanha de 1933 a 1945.                                                                1  Ciência da palavra. 
  • 5. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.5    XAnpedSul Goebbels, assim como Feyerabend, flertou com o teatro, escreveu peças teatrais.  Enquanto ministro da propaganda, foi o responsável pela criação de Hitler como um mito,  o "Führer" (líder, dirigente). David Rausch (1984, p.87) cita duas de suas frases sobre a  propaganda, as quais dizem que:    Uma mentira contada mil vezes, torna‐se uma verdade [...] a essência da  propaganda é ganhar as pessoas para uma idéia de forma tão sincera, com  tal vitalidade, que, no final, elas sucumbam a essa idéia completamente, de  modo  a  nunca  mais  escaparem  dela.  A  propaganda  quer  impregnar  as  pessoas  com  suas  idéias.  É  claro  que  a  propaganda  tem  um  propósito.  Contudo,  este  deve  ser  tão  inteligente  e  virtuosamente  escondido  que  aqueles  que  venham  a  ser  influenciados  por  tal  propósito  nem  o  percebam”.    De acordo com a citação acima e baseados na experiência nazista deve‐se saber  utilizar dos subterfúgios, da retórica, conjecturas, política e da propaganda quanto a um  argumento racional, para que a desdita científica não se faça presente, assim, como se  deu  naquela  experiência.  Deve  ficar  bem  claro  que  uma  pesquisa  científica  não  é  uma  propaganda, seu resultado sempre deve estar submetido à ética e ao bom senso.  Feyerabend afirmou que o “pluralismo teórico” foi o que de fato levou à frente as  pesquisas  teóricas.  Para  ele  as  afirmações  factuais  são  carregadas  de  teoria,  por  este  motivo, os fatos não existem. Harwood (2013, p.177) diz que para Feyerabend, “o que as  pessoas  consideram  fatos  dependem,  em  última  análise,  do  que  acreditam  ou  querem  acreditar”. Ainda acrescenta que a melhor maneira de avançar é saber escolher a teoria  que  mais  contribua  para  a  compreensão.  Para  exemplificar,  a  partir  dessa  ideia,  se  o  objetivo é contar a história do Brasil para os brasileiros, para que estas a aceitem como  verdade, utilizar‐se‐á do ponto de vista brasileiro. Mas se o objetivo for contar a história  do Brasil aos portugueses, buscar‐se‐á utilizar o ponto de vista lusitano, para a melhor  compreensão daqueles. Outra questão serve como exemplo: a América foi descoberta  intencionalmente? Depende do ponto de vista.   Segundo Inês Lacerda Araújo (2012, p.181), Feyeraband inspirado em Wittgenstein  defende uma “teoria contextual do significado”, na qual critica o empirismo reducionista e  aceita a ideia da incomensurabilidade das teorias ciêntificas. 
  • 6. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.6    XAnpedSul Em  1975  Feyerabend  publicou  uma  obra  intitulada  “Contra  o  método”,  obra  dedicada a Imre Lakatos, na qual defende a liberdade do homem e diz que muitas vezes o  método  apresenta‐se  como  uma  amarra.  Mais  uma  vez,  surge  outra  alusão,  na  qual  o  pesquisador  apresenta‐se  como  um  cãozinho  preso  a  uma  coleira  (método),  seu  proprietário  é  a  academia,  a  qual  com  medo  que  o  cãozinho  curioso  se  afaste  muito,  controla  o  tamanho  da  corrente  impossibilitando  que  ele  conheça  novas  paisagens  e  quando permite que ele saia mais longe, trata‐se de um passeio guiado, pois a coleira  ainda esta em seu pescoço. Sobre isso Feyerabend (1977, p.21) diz que:    A  educação  científica,  tal  como  hoje  a  conhecemos,  tem  precisamente  esse objetivo. Simplifica a ciência, simplificando seus elementos: antes de  tudo, define‐se um campo de pesquisa; esse campo é desligado do resto  da  História  (a  Física,  por  exemplo,  é  separada  da  Metafísica  e  da  Teologia)  e  recebe  uma  ‘lógica’  própria.  Um  treinamento  completo,  nesse  tipo  de  ‘lógica’,  leva  ao  condicionamento  dos  que  trabalham  no  campo delimitado; isso torna mais uniformes as ações de tais pessoas, ao  mesmo  tempo  em  que  congela  grandes  porções  do  procedimento  histórico.  ‘Fatos’  estáveis  surgem  e  se  mantêm,  a  despeito  das  vicissitudes da História. Parte essencial do treinamento, que faz com que  fatos  dessa  espécie  apareçam,  consiste  na  tentativa  de  inibir  intuições  que  possam  implicar  confusão  de  fronteiras.  A  religião  da  pessoa,  por  exemplo, ou sua metafísica ou seu senso de humor (seu senso de humor  natural  e  não  a  jocosidade  postiça  e  sempre  desagradável  que  encontramos  em  profissões  especializadas)  devem  manter‐se  inteiramente  à  parte  de  sua  atividade  científica.  Sua  imaginação  vê‐se  restringida  e  até  sua  linguagem  deixa  de  ser  própria.  E  isso  penetra  a  natureza  dos  ‘fatos’  científicos,  que  passam  a  ser  vistos  como  independentes de opinião, de crença ou de formação cultural.    De acordo com essa última citação, existe uma simplificação na ciência e como se  o pesquisador fosse treinado a seguir por caminhos delimitados, as especialidades, isso  torna os pesquisadores padronizados e consequentemente as pesquisas, enfim, a ciência  padroniza sujeitos e ações.  Essa  obra  foi  planejada  para  ser  escrita  em  parceria  com  Imre  Lakatos,  o  qual  escreveria a réplica às argumentações de Fyerebend.   No prefácio da obra “Contra o Método”, Fyerebend (1977) diz que:   
  • 7. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.7    XAnpedSul Este ensaio é a primeira parte de um livro a propósito do anarquismo que  seria  escrito  por  Lakatos  e  por  mim.  Cabia‐me  atacar  a  posição  racionalista2 ;  Lakatos,  por  seu  turno,  reformularia  essa  posição,  para  defendê‐la e, de passagem, reduzir meus argumentos a nada. Juntas, as  duas partes deviam retratar nossos longos debates em torno desse tema.    Nesta citação Feyerabend diz que o seu ensaio é a primeira parte de um livro a  propósito  do  anarquismo,  para  ele  Lakatos  era  seu  amigo,  colega  e  companheiro  anarquista, vale salientar que anarquismo não significa bagunça.  As  argumentações  são  um  incentivo  a  reflexão,  assim,  deve‐se  ler  a  obra  “Contra  o  método” de maneira a imaginar as réplicas de Lakatos.  Araújo (2012, p.183) diz que:    Lakatos  (1922‐1974)  defende  um  falsificacionismo  sofisticado  em  sua  proposta  de  uma  “metodologia  de  programas  de  investigação  científica”, que contém as regras a serem seguidas e as que precisam ser  evitadas.     Percebe‐se que para Lakatos a ciência é relativamente autônoma e possui certa  racionalidade.    Para  Feyerabend  a  ciência  é  apenas  uma  das  formas  de  pensamento,  desenvolvida pelo homem, mas não é necessariamente a melhor. Segundo ele, a ciência é  uma instituição cheia de dogmas.  Assemelhando‐se  a  um  animal  adestrado  o  estudioso,  o  racionalista,  estão  com  suas ações condicionadas, sobre isso Feyerabend (1977, p.31) diz que:    Assim  como  um  animal  bem  adestrado  obedecerá  ao  dono,  por  maior  que  seja  a  perplexidade  em  que  se  encontre  e  por  maior  que  seja  a  necessidade  de  adotar  novos  padrões  de  comportamento;  assim  também  o  racionalista  convicto  se  curvará  à  imagem  mental  de  seu  mestre,  manter‐se‐á  fiel  aos  padrões  de  argumentação  que  lhe  foram  transmitidos e aceitará esses padrões por maior que seja a perplexidade  em que se encontre mostrando‐se incapaz de compreender que a ‘voz da  razão’ a que dá ouvidos é apenas o efeito causal tardio do treinamento  que recebeu. Não está em condições de descobrir que o apelo à razão,  diante  do  qual  tão  prontamente  sucumbe,  nada  mais  é  que  manobra  política.                                                                 2   Racionalismo: A visão de que a razão é a fonte fundamental de todo conhecimento e que a única forma  válida de obter o conhecimento do mundo é vivenciando‐o. Entre os filósofos racionalistas famosos  estão Descartes, Spinoza e Leibniz. 
  • 8. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.8    XAnpedSul De  acordo  com  essa  citação,  assim  como  os  animais,  os  homens  são  instruídos  para  o  desempenho  de  determinadas  funções.  Um  será  carpinteiro,  o  outro  médico,  engenheiro,  afiador,  motorista,  há  os  estudiosos,  os  pesquisadores,  os  mestres,  adestradores, todos obedientes. Com o “racionalista convicto” não é diferente, seguirá  os  padrões  impostos  por  seu  mestre,  o  qual  da  mesma  forma  segue  padrões  de  seu  mestre,  que  seguia  padrões  e  assim,  sucessivamente.  Se  fosse  perguntado  a  um  pesquisador: ‐ Por que você faz isso? E ele respondesse: ‐ Não sei, meu mestre fazia assim.  E se a mesma pergunta fosse feita ao mestre, a resposta seria a mesma. Sem falar na  manobra política que mostra‐se sempre interesseira, apresentando‐se muitas vezes como  um meio de proteção ao status quo, ao intelectualismo e a suposta “verdade”. Existe um  aparelhamento conceptual da teoria e uma paixão associada, os quais insinuam‐se:    em todos os meios de comunicação, em todas as ações e, afinal, em toda  a vida da comunidade, passam a garantir o êxito de métodos tais como o  da dedução transcendental, da análise de uso, da análise fenomenológica  — meios de emprestar maior solidez ao mito (o que mostra, assinalemos  de  passagem,  que  todos  esses  métodos,  característicos  de  escolas  filosóficas antigas e modernas, apresentam um traço comum: tendem a  preservar  o  status  quo  da  vida  intelectual).  Também  os  resultados  de  observação  falarão  em  favor  da  teoria,  de  vez  que  formulados  com  observância de seus termos. E surge a impressão de se haver, finalmente,  alcançado a verdade (FEYERABEND, 1977, p.56).    Na  citação  acima,  pode‐se  confirmar  que  o  êxito  de  tais  métodos  é  uma  consequência de todo um aparelhamento, maior do que se imagina. Assim o mito torna‐ se  verossímil.  Mas  para  que  o  status  quo  seja  mantido,  os  resultados  das  observações  serão organizados de maneira a preservar a teoria, a qual se assemelha a um trilho do  qual  ninguém  pode  se  afastar.  Como  em  uma  corrida  de  autorama,  desta  maneira,  enquanto os carrinhos estão no trilho, há energia para que possam avançar, mesmo a  pista  estando  fechada,  o  carrinho  que  sai  do  trilho,  falta‐lhe  energia,  ou  seja,  sai  da  brincadeira. Essa brincadeira torna os pesquisadores alheios ao mundo, como acontece  com muitos jovens que se trancam em casa ou em universidades para se divertirem com  jogos em rede ou pesquisas acadêmicas, vivem como se em um mundo a parte, enquanto  o  mundo  se  move,  estão  presos  a  párvoas  concepções.  Sobre  isso  Feyerabend  (1977,  p.56) diz que: 
  • 9. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.9    XAnpedSul   Torna‐se evidente, ao mesmo tempo, que se perdeu todo contato com o  mundo e que a estabilidade atingida, a aparência de verdade absoluta,  não passa do resultado de um conformismo absoluto. Com efeito, como  será possível submeter a teste ou aprimorar a verdade de uma teoria, se  ela é elaborada de maneira tal que qualquer acontecimento concebível  pode  ser  descrito  e  explicado  nos  termos  de  seus  princípios?  A  única  maneira de estudar esses princípios que a tudo abrangem seria compará‐ los com um conjunto de outros princípios igualmente abrangentes — mas  a possibilidade desse procedimento está, desde o início, afastada. O mito  não  tem,  pois,  relevância  objetiva;  continua  a  existir  apenas  como  resultado do esforço da comunidade de crentes e de seus orientadores  sejam estes sacerdotes ou vencedores do Prêmio Nobel. Esse é, a meu  ver,  o  mais  forte  argumento  contra  qualquer  método  que  estimule  a  uniformidade,  quer  seja  esse  método  empírico  ou  não.  Cada  método  dessa espécie é, em última análise, um método decepcionante. Dá forças  a  um  conformismo  sombrio  e  fala  de  verdade;  leva  à  deterioração  das  capacidades  intelectuais,  do  poder  de  imaginação  e  fala  de  introvisão  profunda; destrói o mais precioso dom da juventude — o enorme poder  de imaginação — e fala em educar.    Enquanto o pesquisador esta distraído cumprindo procedimentos, seus resultados  serão  falhos.  O  que  aceitará  como  verdade,  não  passará  de  um  resultado  do  seu  conformismo. O mito não tem relevância objetiva, é como as pesquisas acadêmicas que  depois de concluídas serão comemoradas e arquivadas em salas que cheiram a mofo. É  decepcionante  tudo  aquilo  que  não  concorra  para  com  o  progresso,  que  promova  o  conformismo  e  que  destrua  a  imaginação  dos  mais  jovens.  Assim,  após  todos  esses  apontamentos, o que falar da educação?  Na  música  “Another  brick  in  the  wall”3   diz  que  os  alunos  não  querem  mais  educação  e  querem  que  os  professores  os  deixem  em  paz.  No  clipe  desta  musica,  os  alunos caminham por uma linha de produção, onde são apenas um produto que ao final  da linha, serão todos iguais, ou seja, como se a educação padronizasse os homens. De  fato isso acontece, não só nos níveis iniciais, mas em todos os níveis da educação. Até  mesmo no mais alto grau de instrução acadêmica, aquele que se comportar de maneira  diversa da aceitação acadêmica, será repudiado ou ignorado pelos conservadores. Assim                                                               3   Composição de Roger Waters e executada pela banda de rock inglesa Pink Floyd, formada  em Cambridge em 1965, que atingiu sucesso internacional com sua música psicodélica e progressiva. Seu  trabalho foi marcado pelo uso de letras filosóficas, experimentações musicais, capas de álbuns  inovadoras e shows elaborados. 
  • 10. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.10    XAnpedSul se deu com Arthur Schopenhauer, o qual, segundo Harwood (2013), influenciou Ludwig  Wittgenstein  e  Karl  Popper,  os  quais  tiveram  papel  fundamental  na  formação  de  Feyerabend.  O exemplo da música ilustra a padronização presente, que normatiza e normaliza  os procedimentos acadêmicos, tornando os pesquisadores produtos padronizados. Para  que  se  possam  apresentar  novos  resultados  é  preciso  enquadrá‐los  nos  moldes  aceitáveis.  Os  métodos  e  teorias,  estáticos  (que  não  se  modificam  e  não  inovam)  são  resultado  da  inocência  humana,  o  progresso,  o  avanço  científico  se  dá  quando  o  pesquisador se afasta desses modelos, utilizando‐se de outros recursos, é a idéia de que  “tudo vale” (FEYERABEND. 1977).  A  ideia  do  “tudo  vale”,  remete  a  uma  metodologia  pluralista,  sobre  isso  Feyerabend (1977, p.40) diz que:    O  cientista  que  deseja  ampliar  ao  máximo  o  conteúdo  empírico  das  concepções que sustenta e que deseja entender aquelas concepções tão  claramente  quanto  possível  deve,  portanto,  introduzir  concepções  novas. Em outras palavras, o cientista deve adotar metodologia pluralista.    Para uma visão mais clara dos fatos é preciso uma visão ampliada do todo. Se um  ponto  de  vista  se  faz  insuficiente  é  preciso  agregar  outros  pontos  de  vista,  novas  concepções. O pluralismo deve servir como a caixa de ferramentas de um mecânico, o  qual  não  consegue  consertar  um  motor  apenas  com  uma  chave  de  fenda,  faz‐se  necessário  o  auxílio  de  mais  ferramentas.  Outro  exemplo  cabível  é  a  ideia  de  que  um  cientista esta numa torre com quatro lados e quatro janelas e quer conhecer e descrever  o  mundo  ao  redor  da  torre.  Mas,  abriu  apenas  uma  janela  e  começou  a  observar  e  a  descrever o que via, então, intitulou sua obra como “O mundo ao redor da torre”. Trata‐ se de uma visão restrita, de uma irrealidade, pois o que se vê apenas por um ângulo não é  o  mundo,  apenas  uma  paisagem.  Para  que  sua  obra  fosse  de  fato  uma  visão  sobre  o  mundo  ao  redor  da  torre,  seria  necessário  abrir  as  quatro  janelas  da  torre,  observar  e  descrever,  descer  as  escadas  da  torre  abrir  a  porta  e  sair  ao  seu  redor,  caminhar,  observar,  descrever,  voltar  à  torre  e  observar  novamente,  agora  com  uma  nova  sensibilidade  reescrever  a  obra.  Apenas  abrir  as  quatro  janelas  da  torre  e  observar  o 
  • 11. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.11    XAnpedSul mundo lá fora, proporcionaria a “visão do mundo ao redor da torre, a partir da torre”.  Assim acontece com a ciência.  Sobre aquilo que se busca Araújo (2012, p.185) diz que:    Desse modo, o conhecimento não culmina nunca em um ideal realizado,  pois  há  sempre  várias  alternativas  por  vezes  incompatíveis  entre  si,  e  mesmo incomensuráveis, que competem entre si. É impossível que uma  teoria seja compatível com todos os fatos que ela abriga em seu domínio.  Às vezes a verificação dos fatos é difícil, ou mesmo impossível. Em alguns  casos é preciso criar um sistema de conceitos inteiramente novo para dar  conta da pesquisa. E isso não deve ser visto como um conjunto de regras  para substituir outro conjunto, pois “todas as metodologias, inclusive as  mais  óbvias,  tem  limitações”  (1989,  p.43)4 ,  mesmo  a  indução  por  falseamento.     De acordo com as palavras de Araújo (2012), em relação às ideias de Feyerabend,  pode‐se entender novamente com o exemplo do pesquisador e da torre, ele nunca irá  alcançar  o  seu  ideal  (conhecer  o  mundo  ao  redor  da  torre),  por  causa  das  inúmeras  alternativas. Certas vezes é necessário criar novos conceitos para viabilizar a pesquisa.  Pode‐se  considerar  que  as  ideias  de  Feyerabend  e  de  Michel  Foulcault  (1988)  convergem.  Partindo  do  princípio  que  para  ambos  existem  inúmeras  maneiras  de  se  interpretar as coisas, Foucault (1988, p.4), utilizando como base para reflexões “Isso não  é um cachimbo” de René Magritte, diz que:    Há  dois  cachimbos.  Não  seria  necessário  dizer,  em  vez  disso:  dois  desenhos  de  um  mesmo  cachimbo?  Ou  ainda  um  cachimbo  e  seu  desenho,  ou  ainda  dois  desenhos  representando  cada  um  deles  um  cachimbo,  ou  ainda  dois  desenhos  dos  quais  um  representa  um  cachimbo, mas o outro não, ou ainda dois desenhos que, nem um nem  outro  são  ou  representam  cachimbos,  ou  ainda  um  desenho  representando  não  um  cachimbo,    mas  um  outro  desenho  que,  ele,  representa um cachimbo, de tal forma que sou obrigado a perguntar: a  que se refere a frase escrita no quadro?    Para  Foucault  os  homens  estão  presos  a  conceitos,  a  procedimentos,  a  regras,  normas  e  a  tantas  outras  questões  tidas  como  verdades.  É  preciso  sair  da  zona  de  conforto, vislumbrando patamares maiores. Neste exemplo do quadro de Magritte, fica                                                               4  FEYERABEND, Paul. Contra o método. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989. 
  • 12. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.12    XAnpedSul claro que a proposta do artista foi mexer com a tranquilidade do observador, fez com que  Foucault escrevesse uma obra homônima, na qual traça reflexões sobre as verdades as  quais são tomadas como regras pela população em geral. Ao ler esta obra o leitor deve  estar ciente de que para entendê‐la deve desprender‐se de qualquer formalidade, pois  sua  mensagem  esta  nas  entrelinhas.  Para  ele  é  preciso  desprendimento  e  ousadia.  Desprendimento  de  tudo  aquilo  que  se  tem  como  verdade  e  ousadia  para  ir  além,  na  busca por mais conhecimento, pois a verdade é um ideal.  Feyerabend (1977, p.41) exemplifica a tomada de conhecimento com uma mesa,  assim afirma que:    [...]  é  costume  dizer  ‘a  mesa  é  marrom’  ,  quando  a  contemplamos  circunstâncias  normais,  com  nossos  sentidos  em  equilíbrio,  e  dizer  ‘a  mesa parece ser marrom’ quando as condições de luz deixam a desejar  ou quando nos sentimos inseguros quanto a nosso poder de observação  — e isso expressa a convicção de que há circunstâncias comuns em que  nossos sentidos se mostram aptos a ver o mundo ‘como ele realmente é’  e de que há circunstâncias, igualmente comuns, em que nossos sentidos  se enganam. Expressa a convicção de que algumas de nossas impressões  sensoriais são corretas e outras não são. E damos também como certo  que  o  meio  material  que  se  interpõe  entre  nós  e  o  objeto  não  exerce  influência deturpadora e que a entidade física de que o contato depende  — a luz — veicula um quadro verdadeiro. Trata‐se, em todos os casos, de  pressupostos  abstratos  e  altamente  discutíveis  que  dão  forma  à  nossa  concepção do mundo, sem se tornarem acessíveis a uma crítica direta.  Em geral, nem sequer nos damos conta desses pressupostos e só lhes  reconhecemos os efeitos quando nos defrontamos com uma cosmologia  inteiramente  diversa:  os  preconceitos  são  descobertos  graças  a  contraste  e  não  graças  a  análise.  O  material  de  que  o  cientista  dispõe,  inclusive  suas  mais  elaboradas  teorias  e  suas  técnicas  mais  refinadas,  estrutura‐se de modo exatamente idêntico.    Quando se observa uma mesa, já se esta fazendo uso dos sentidos, carregando  pressupostos, os quais são abstratos. Isso irá interferir na concepção de mundo que se  faz. Esses pressupostos estão enraizados na mente humana. Para Feyerabend é preciso  romper com esse circulo vicioso e criar um sistema conceptual novo. 
  • 13. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.13    XAnpedSul A história de Kaspar Hauser5  serve como exemplo de ingenuidade conceptual, não  é isso que se busca, mas ir além de tudo aquilo que se tem como conceitos e verdades.  Sobre essa questão Feyerabend (1977, p.57) diz que:    Unanimidade  de  opinião  pode  ser  adequada  para  uma  igreja,  para  as  vítimas temerosas ou ambiciosas de algum mito (antigo ou moderno) ou  para os fracos e conformados seguidores de algum tirano. A variedade  de  opiniões  é  necessária  para  o  conhecimento  objetivo.  E  um  método  que estimule a variedade é o único método compatível com a concepção  humanitarista. (Na medida em que a condição de coerência restringe a  variedade, ela encerra um elemento teológico, elemento que se traduz  na  adoração  dos  "fatos",  que  é  um  traço  característico  de  quase  todo  empirismo).     Busca‐se com o pluralismo metodológico tirar os homens da zona de conforto que  gera a estagnação intelectual, trata‐se de um compromisso humanitarista.  Em tempos de guerra a necessidade, faz com que a ciência seja simplificada e em  tempo  de  paz,  a  supervalorização  da  ciência  a  torna  mais  rebuscada,  mais  complexa  (FEYERABEND, 1977).  Tome‐se, por exemplo, a arte minimalista, da qual todos pensam se tratar de uma  modalidade de arte simplista, sem importância. Afirmações errôneas, proporcionadas por  uma  denominação  criada  pela  Crítica  de  Arte,  a  qual  nada  sabia  de  fato  sobre  aquele  movimento artístico. A arte minimalista é gigante naquilo que propõe.  O minimalismo  serve para exemplificar o que o anarquismo epistemológico propõe, um amadurecimento  do Homem, pois sem amadurecimento, não tem como se conhecer a realidade a que se  volta o olhar. O olhar de uma criança é sempre mais restrito e fantasioso que o olhar de  um adulto.  Sobre o amadurecimento Feyerabend (1977, p.464) diz que:    Um  cidadão  amadurecido  não  é  um  homem  que  foi  instruído  em  uma  especial ideologia — como o puritanismo ou o racionalismo crítico — e  que  agora  é  portador  dessa  ideologia,  como  de  um  tumor  mental;  um  cidadão  amadurecido  é  uma  pessoa  que  aprendeu  a  tomar  decisões  e                                                               5  Kaspar Hauser: ( 1812‐1833) foi uma criança abandonada, envolta em mistério, encontrada na praça  Unschlittplatz em Nuremberg, Alemanha do século XIX, com alegadas ligações com a família real  de Baden. 
  • 14. O AMADURECIMENTO DO ESPIRITO CIENTÍFICO E A BUSCA PELA VERDADE O PENSAMENTO DE PAUL  FEYERABEND   Diego Alexandre Divardim de Oliveira  X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.14    XAnpedSul que decidiu em favor daquilo que mais lhe convém. É pessoa de alguma  solidez espiritual (não se apaixona pelo primeiro trovador ideológico que  lhe  cruze  o  caminho)  e  que,  portanto,  está  apta  a  escolher  conscientemente a tarefa que lhe pareça mais atraente, em vez de deixar‐ se dominar por ela.    Ter instrução não significa ser maduro, pois a instrução pode assemelhar‐se a um  “tumor  mental”,  dificultando  o  raciocínio  daqueles  que  portam  tais  “ideologias”.  O  cidadão  amadurecido,  aprendeu  a  tomar  decisões,  sabe  decidir  e  sabe  o  que  mais  lhe  convém e possui a sensatez e é cônscio de si mesmo. Chega‐se então a descrição das  qualidades  do  artista,  feita  por  Aristoteles  (2006)  o  qual  diz  que  o  que  diferencia  um  artista de um artesão, é a capacidade para ensinar. O artista sabe o que faz, como faz e  porque  faz,  tem  conhecimento  e  conhece  as  razões,  enquanto  o  artesão  apenas  sabe  fazer por hábito. Isso ocorre na ciência, há pesquisadores por hábito.   De acordo com Feyerabend, o progresso da humanidade se dará quando, não só o  pesquisador, mas todos os cidadãos se tornarem artistas. Pois, segundo Oliveira (2012) a  arte é a busca empreitada pelo espírito do Homem por Humanidade.      Referências  ARAÚJO, I.L. Curso de teoria do conhecimento e epistemologia. Barueri, SP: Minha Editora, 2012.  ARISTÓTELES. Metafísica. Bauru, SP: Edipro, 2006.  David A. Rausch. A legacy of hatred. Chicago: Moody Press, 1984.  FEYERABEND, P. Contra o método. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1977.  FOUCAULT, Michel. Isto não é um cachimbo. São Paulo: Paz e Terra, 1988.  HARWOOD, J. Filosofia: um guia com as ideias de 100 grandes pensadores. São Paulo: Planeta,  2013.  OLIVEIRA, D.A.D. Introdução a Visão Teórica da Arte: reflexões históricas e filosóficas. 2012, 58f,  Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Artes Visuais) – Universidade Estadual de Ponta  Grossa, Ponta Grossa, UEPG, 2012.